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... e uma imprensa acéfala repete a mentira, sem verificar os factos, e deputados mal preparados engolem a mentira sem questionar incongruências e nós todos continuamos sujeitos a medidas absurdas porque achamos o respeitinho muito bonito.
Compreendo que haja quem considere excessivo eu dizer que Jorge Buescu mente sobre as escolas, mas aos que dizem que o rio é violento, convém lembrar a opressão das margens sobre ele.
E aqui ficam as minhas justificações.
“Nós sabemos o que acontece quando abrem as escolas. Em Setembro abriram as escolas todas, portanto, se nós queremos ter a noção do efeito de abrir as escolas, é olhar, por exemplo, para o que aconteceu ao R(t), o R(t) aumentou 20 a 25% em quinze dias depois da abertura das escolas, ou melhor, seis dias depois da abertura das escolas o R(t) começou a subir e aumentou cerca de 20 a 25%, portanto, eu diria o seguinte, se nós pensarmos que vai acontecer a mesma coisa se abrirmos as escolas … nós estamos com um R(t) suficiente para que com um aumento de 20% continuemos abaixo de 1?”, disse ontem Jorge Buescu numa audição parlamentar.
Vejamos então os factos.
Este é o gráfico de pormenor da variação do R(t) na altura da abertura do ano lectivo, com a indicação de 1) abertura do ano lectivo, foi entre 14 e 17, estou a usar o dia 15 de Setembro; 2) os tais seis dias de descida de que fala Buescu; 3) o ponto em que o R(t) começa a subir, a 26 de Setembro (10 dias, e não seis, como diz Buescu); 4) o dia 3 de Outubro, que assinalei aqui para ligar com o gráfico vou usar já a seguir; 5) O ponto em que o R(t) estabiliza depois da subida iniciada a 26 de Setembro, por volta de 9 de Outubro; 6) o ponto, a 15 de Outubro, mais coisa, menos coisa, em que o R(t) começa a descer, apesar das escolas abertas.
Não está aqui visível, mas os tais 20 a 25% de aumento de R(t) em quinze dias, na verdade são, considerando o dia com o R(t) nos mínimos deste perído (19 de Setembro) e o dia com R(t) mais elevado (10 de Outubro), menos de 20% (19%) em três semanas.
Em matéria de rigor na avaliação temporal que permite estabelecer relações de causa e efeito, estamos conversados.
Agora olhemos para este gráfico.
Sem surpresa, e sem qualquer ligação com os calendários escolares dos diferentes países, é no fim de Setembro e princípios de Outubro (a tal barra 4 que coloquei na curva do R(t) a 3 de Outubro) que a incidência da covid, em toda a Europa, dispara (por alguma razão os sistemas de vigilância da gripe e doenças afins são activados na semana 40 do ano que, em 2020, é a semana que começou a 28 de Setembro).
Portanto, é mentira que saibamos o que acontece quando abrimos as escolas, quer porque é preciso martelar muito a interpretação do gráfico do R(t) para encontrar uma correlação sólida com a abertura de escolas, quer porque a análise global da evolução da epidemia na Europa não autoriza qualquer relação directa entre calendário escolar e incidência da epidemia, ao mesmo tempo que mostra uma simultaneidade que não pode dever-se aos diferentes calendários escolares.
Mas há, por omissão, uma mentira muito mais grave.
Olhemos para o mesmo gráfico, mas no período do Natal.
Neste gráfico assinalei 1) o começo das férias de Natal (ou seja, encerramento das escolas); 2) a verde, o início de uma anomalia meteorológica excepcional; 3) o Natal; 4) a abertura das escolas após o Natal; 5) o fim da anomalia meteorológica; 6) o fecho de escolas.
Aqui sim, neste período, há uma subida do R(t) de 25%, em seis dias (sensivelmente entre 25 de Dezembro e 31 de Janeiro), mas com as escolas fechadas.
Jorge Buescu, que afirma taxativamente que as alterações do R(t) de Outubro (que são temporalmente coincidentes em praticamente toda a Europa temperada e com o começo o Outono) se devem à abertura das escolas, omite toda a evolução do R(t) no fim de Dezembro e princípios de Janeiro, omite que não há qualquer descida do R(t) nas férias escolares, não há qualquer aumento relevante com a abertura a 4 de Janeiro e que a descida da terceira semana de Janeiro dificilmente pode ser relacionada com o fecho das escolas.
Olhe-se para este gráfico, também ontem apresentado na audição da Assembleia da República, mas por Carlos Antunes, que já há alguns dias o tinha apresentado como uma evidência inquestionável da relação entre o fecho de escolas e o aumento da velocidade de descida da incidência (note-se que há uma evolução relevante da posição de Carlos Antunes, que inicialmente atribuía a descida de casos ao fecho de escolas mas, perante a evidência, passou a falar apenas da sua influência no aumento da velocidade de descida, reconhecendo que a alteração de tendência se deu antes do fecho das escolas).
Antes da audição, que foi à tarde, na manhã de ontem, na minha página de Facebook, houve uma cordial troca de argumentos sobre o que significa este gráfico, que penso que vale a pena sintetizar aqui.
Carlos Antunes refere-se à barra da direita como sendo a evidência do efeito do fecho das escolas, relacionando a quebra da variação diária da incidência acumulada a 31 de janeiro com qualquer coisa que se passou pelo menos sete dias antes.
O que a troca de argumentos havida ontem permitiu confirmar, pelo próprio Carlos Antunes, foi que a tendência na incidência, medida pela data de sintomas, deu-se a 22 de Janeiro, acentuando-se a 24 de Janeiro e acentuando-se ainda mais a 28 de Janeiro (esta última corresponderia à tal barra a 31 de Janeiro, dependendo os desfasamentos temporais da forma como se calculam os valores).
Como o que está no gráfico é a incidência acumulada a sete dias, não centrada (isto é, contando com os valores dos seis dias anteriores e não com três dias anteriores e três posteriores), significa que a alteração de tendência identificada no gráfico deu-se, na realidade, três dias antes (três e meio, para o caso usei o meio dia contra o meu argumento), isto é, a 25 de Janeiro.
Como, por outro lado, o gráfico é de incidência por data de sintomas, significa que temos de andar cinco dias (em média) para trás, para saber quando ocorreram os contágios que dão origem a esta incidência.
Ou seja, os contágios que deram origem à evolução conhecida, nomeadamente à alteração de tendência identificada (pela incidência acumulada de sete dias, não centrada) a 22, 24 e 28, ocorrem a 14, 16 e 20, isto é, sem qualquer possibilidade de se relacionarem com um fecho de escolas na Sexta 22 (seguido de umas eleições no Domingo 24).
De resto, se houvesse uma relação clara entre abertura de escolas e evolução do R(t), o normal seria estar toda a gente à procura das escolas que abriram a 12 de Fevereiro, onde é evidente uma nova alteração de tendência, agora no sentido da subida, com as escolas fechadas.
Activistas mascarados de cientistas, jornalistas que não verificam factos, deputados que olham mais para a percepção pública que para o bem comum é uma receita infalível para empobrecermos alegremente e, o que é mais difícil de engolir, cavar maiores diferenças sociais num país tão desigual e em que o elevador social passa a vida na manutenção.
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