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As contas fazem-se no fim

por João Távora, em 16.07.19

Eleições.jpg

Parece-me que já vi este filme algumas vezes. Com o prenúncio de um resultado histórico das esquerdas, que arriscam em Outubro alcançar 2/3 dos lugares no parlamento pela primeira vez desde o 25 de Abril, a direita a dois meses da campanha eleitoral entretém-se furiosamente à caça da própria cauda. São indisfarçáveis as contagens de espingardas, os julgamentos e distribuição de culpas que escapam entre dentes dos barões, sargentos e soldados que gravitam neste espectro político. Por exemplo, a  liderança e os actores principais do CDS passaram de bestiais a bestas, surgem crenças messiânicas, e voltam a ser invocadas as maiorias silenciosas adormecidas desde 1975, eternamente escondidas no espectro da abstenção. As razões apontadas para o anúnciado descalabro (uma profecia auto-realizável) são muitas: há quem diga que pagamos o preço duma má governação durante a Troika, que não há projecto nem mensagem,  que a Assnção Cristas declarou-se a favor do casamento entre homossexuais, que falta um líder para o povo seguir.
O que há é uma conjugação extraordinária de circunstâncias negativas, por demais evidenciado nas eleições europeias; e o prodigioso erro na questão dos professores não explica tudo, há que considerar o histórico não muito distante: houve a humilhação da direita em 2015 (que não chegou à maioria porque com os anos de chumbo do resgate perdeu a sua quota de funcionários do Estado e seus familiares) por uma coligação inimaginável dos socialistas com a extrema esquerda que arrefeceu de forma radical a conflitualidade social, que evitando agitar em demasia as águas (reformas) apanhou boleia da inevitável retoma e abrandamento da austeridade... e o diabo não veio, que a Europa nos proteja. 

É em consequência destas fragilidades que se assiste, a par com um fenómeno meramente emocional de desmotivação, a um perigoso fraccionamento da direita em novos projectos mais ou menos pessoais mais ou menos ideológicos. Os liberais já não querem nada com os conservadores, que cortam com os democratas cristãos que viram costas aos sociais-democratas. E há os oportunistas.  

Mas de nada serve ter razão antes de tempo. A dinâmica para ser vencedora deveria ser exactamente no sentido contrário, de unidade, para uma alternativa clara ao fado do socialismo. Acontece que um partido vencedor terá sempre de ser uma federação de opiniões que concorram entre si sem se anularem. Afinal a pureza ideológica que muitos reclamam é um sinal de perigosa decadência, simplesmente porque tal coisa não existe, e quando e existir certamente será proveniente dos últimos dois militantes em véspera de uma cisão. 

Por agora há que fazer das tripas coração e evitar uma humilhação à direita. Os próximos meses serão decisivos no alerta e na mobilização contra uma esmagadora hegemonia da esquerda que torne o ambiente do país ainda mais fracturado e irrespirável. As contas fazem-se no fim.


2 comentários

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De Branca de neve a 16.07.2019 às 18:27

Não há direita em Portugal. Os aviários (jotas) dos partidos desde a abrilada de 74 apenas produziram políticos profissionais mais interessados no próprio umbigo do que no destino do país que, pasme-se ou não, está a agonizar e em vias de desaparecer por falta de herdeiros (elites com valores e convicções) legítimos. Além do mais, Portugal tem uma elite pequena e insuficiente.
Acidentes históricos vários contribuíram para isso. D. João III expulsou os judeus e, com eles muito da elite que havia. Os Descobrimentos e o Império consumiram muita gente de qualidade. Alcácer Quibir matou o que de melhor havia e o Terramoto dizimou milhares. A ida da Corte para o Brasil levou quase toda a elite e grande parte dela ficou lá e não regressou. O século XIX foi muito mau, por falta de uma elite que conseguisse adaptar o país ao tempo e a existência
de uma plêiade de escritores não superou a carência de uma competência técnica. O salazarismo congelou a sociedade, as empresas e as posições e o poder em mãos herdeiras, nem sempre com qualidade.
Uma sociedade pluralista, como é a sociedade liberal,
ou de direita, é muito exigente, não só em qualidade como também em quantidade de pessoas que desempenham cargos de responsabilidade.
Por outro lado, as convulsões e transformações que se deram na nossa sociedade nas duas ou três últimas gerações, fizeram desaparecer qualquer resquício do verdadeiro conceito de "elites". Quem são hoje? Ninguém sabe, porque os verdadeiros, os originais se remeteram quase à clausura... preservando os seus valores, distanciando-se das pseudo-elites modernas que tanto podem ser os novos-ricos analfabetos e broncos, os políticos recém-chegados dos aviários das jotas, que estão sentados das cadeiras do poder sem qualquer competência e formação intelectual ou técnica.
Não quero generalizar, seria muito injusta mas, até as excepções não estarão interessadas em aparecer, muito menos participar, ou antes, misturar-se com estas "elites de telenovela". Basta seguir o que se passa com o surrealismo das eleições, sejam elas quais forem!

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De Luís Lavoura a 17.07.2019 às 16:56

Parece que o João Távora está contente com o perfil ideológico do PSD: uma mistura de sociais-democratas com conservadores e liberais, tudo muito bem misturadinho de uma forma muito oportunista, pois o que interessa é ganhar o poder, que a performance ideológica fica para depois.

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