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Alexandra e os privados

por henrique pereira dos santos, em 16.08.24

"Invocando que quer concorrência de privados, o Ministro das Infraestruturas recusa comprar os comboios de alta velocidade que a CP entende necessários. Descapitalizar o setor público para defender os privados é a noção de interesse público do Governo da AD".

Não percebi  bem como impedir uma compra é descapitalizar o que quer que seja (podemos discutir a alocação do capital, mas quer comprando carruagens, quer ficando com o dinheiro na mão, o capital da CP é o mesmo com ou sem compra de carruagens), mas o que interessa aqui é a afirmação de que esta opção na alocação do capital é para defender os privados.

É uma ideia interessante, esta, de Alexandra Leitão, o aumento da concorrência não é interesse público, é defesa dos privados.

"tendo em conta que muito recentemente o Senhor Ministro das Infraestruturas disse que não ia comprar os comboios que a CP pedia, porque tinham de favorecer a concorrência privada, pergunto-me em que comboios o passe ferroviário vai servir para andar, provavelmente em nenhuns ou em comboios privados".

Ora aqui está o desenvolvimento das ideias de Alexandra Leitão (poderia usar muitos outros exemplos, como o de João Paulo Correia que admite discutir com o PSD a questão da saúde, desde que não haja desvio de recursos para os privados, Alexandra Leitão é só uma das mais histriónicas vozes dos estatistas, largamente preponderantes no actual PS e no resto da esquerda).

O governo anuncia um passe ferroviário (não tenho opinião sobre isso a não ser a opinião genérica de que sou a favor do princípio do utilizador pagador, portanto este tipo de medidas, em tese (na minha tese), deveriam ser sempre com condição de recursos) e qual é o problema de Alexandra Leitão e dos estatistas em geral?

Que o serviço ferroviário tem problemas do lado da oferta e portanto o efeito de baixar preços de utilização arrisca-se a não resolver problema nenhum e a degradar o serviço (quer por aumento da procura, quer por diminuição das fontes de recursos para a sua gestão e melhoria)?

Que os principais problemas dos utilizadores se prendem com a fiabilidade do serviço e não com o seu preço, portanto o impacto é relativamente reduzido na melhoria da vida das pessoas?

Que alocar recursos para mitigar os problemas para as pessoas que resultam da macrocefalia do país tende a potenciar essa macrocefalia e não a resolver esses problemas (como é exemplo a concentração dos recursos do PRR na habitação das grandes cidades em detrimento da sua concentração na criação de emprego nas pequenas e médias cidades)?

Não, nada disso, o problema de Alexandra Leitão é que o Estado deve usar os seus recursos para fortalecer o Estado, independentemente do facto de poder não estar no Estado a forma mais eficiente de resolver os problemas concretos das pessoas.

Não, não se pense que isto é mera demagogia de Alexandra Leitão para malhar nos adversários, isto é mesmo a convicção profunda de Alexandra Leitão, como se demonstra pela energia e desonestidade que colocou na destruição de contratos de associação que poupavam dinheiro ao Estado e garantiam maior satisfação aos utilizadores dos serviços de educação.

Alexandra Leitão sabe perfeitamente que o Estado é um instrumento de repressão nas mãos das classes dominantes e, tendo os filhos na escola alemã, acha que esse privilégio deve ser exclusivo das classes dominantes, para o povo o ensino estatal é perfeitamente razoável, independentemente da sua qualidade e do seu custo para os contribuintes.

Os elitistas defendem que bens e serviços sofisticados são naturalmente elitistas, portanto acham que não vale a pena fazer um esforço para democratizar o acesso à ópera, o que vale a pena é garantir que os que merecem integram as elites capazes de apreciar espetáculos elitistas.

Os marxistas da primeira geração, os que diziam que a libertação dos trabalhadores só podia ser obra dos próprios trabalhadores e que tinham como objectivo a destruição do Estado, por saberem da capacidade das classes dominantes usarem o Estado a seu favor, pretendiam que a ópera deixasse de ser elitista e que o povo tivesse acesso aos espectáculos de ópera.

Alexandra Leitão, e os modernos estatistas pretendem que o Estado garanta o acesso do povo a umas óperas quaisquer, sendo irrelevante a sua qualidade, desde que sejam do Estado, como a melhor forma das classes dominantes, a que sempre pertenceu, poderem frequentar as óperas que podem pagar, sem a maçada de aturar o povo.

Alexandra Leitão é um bom exemplo de política sempre, sempre ao lado do povo, mas nunca no meio dele.


14 comentários

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De Anonimus a 16.08.2024 às 11:18

Des/capitalizar não é apenas ,injectar ou retirar capital, a compra e venda de activos têm impacto nao só funcional como contabilístico. 
O longo curso em Portugal é ainda caro, a nível de custo para cliente não chega perto de um autocarro (quer RN quer Flix), e uma viagem a 3 entre Lx e Porto num Alfa não compensa em relação ao carro mesmo em A1.
Claro que uma corrida aos comboios só ia piorar a qualidade de serviço, como se viu há uns anos na área de Lisboa, mas pelo menos pode ajudar numa questão cultural,  pois nem todos confiam nos transportes públicos nem coordenam a sua vida consoante estes.
Por outro lado,  iremos (?) ter alta velocidade top, mas uma linha do Oeste (que podia aligeirar a pressão urbanística em Lisboa) de fazer inveja à Albânia. 
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De JPT a 16.08.2024 às 15:06


A ópera não é um exemplo feliz, porque mesmo "a ópera que as classes dominantes frequentam" (e que só alguns pagam, tal o número de convites e de ofertas de empresas) é, em grande parte (90%, creio), viabilizada pelos impostos pagos pelo povo todo e não pelas receitas de bilheteira.
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De henrique pereira dos santos a 16.08.2024 às 15:12

Não é um exemplo, é uma metáfora que tem a sua raiz numa célebre observação sobre os objectivos dos revolucionários russos de 1917
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De JPT a 16.08.2024 às 15:25

Certo. Só registo que, no caso português, as classes dominantes não se limitam a segregar-se (mais e mais) das restantes classes pela via que o HPS descreve, mas ainda têm a arte de pôr as restantes classes a pagar-lhe esses bens de luxo, a que estas últimas não podem (ou não querem) aceder. Ou seja, não é só não "democratizar" a ópera (credo!), é garantir que uns paguem para que outros possam continuar a frequentá-la sem terem de pagar o preço que corresponde ao que ela, de facto, custa.
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De henrique pereira dos santos a 16.08.2024 às 15:52

Sendo o Estado o que é (um instrumento nas mãos das classes dominantes), estranho seria se não defendesse os seus interesses
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De Anonimus a 16.08.2024 às 19:03

Quem diz ópera diz o Nel Monteiro na feira do enchido de Vila Nova de Alguidares.
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De José Nunes a 16.08.2024 às 22:02

Confirme essa localidade, por favor.
Ou então concede que se fale aqui de alguma Lísbia capital.
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De Anónimo a 16.08.2024 às 17:15

A teoria é lógica, mais concorrência igual a beneficio do consumidor. O problema é que em Portugal, exceptuando aparentemente o sector da distribuição, nunca resultou. Isto apesar de o sector ter sido acusado de cartelização, o que se calhar deita por terra o que parece.
Os casos da banca e da energia são exemplos claros de ausencia de beneficio para o consumidor.
Esperemos que seja diferente na ferrovia.
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De Anonimus a 16.08.2024 às 19:45

O mercado funciona sempre, basta cortar regulações. Ganham todos na cadeia de valor. Infelizmente Portugal recusa-se a destatizar por completo sectores como saúde, segurança e educação. 
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De IMPRONUNCIÁVEL a 16.08.2024 às 19:48

É igual.
Tanto uns (Liberais) como outros (Socialistas, Estado) fazem e são o mesmo.


Uns dizem mal do Estado, mas vivem dos subsídios e proteção que ele dá aos Liberais (ao Indivíduo). Veja-se por exemplo, os EUA, Japão, Reino Unido, Alemanha, Austrália ou Canadá, ou a China, a Índia, a Rússia ou o Brasil).


Os outros dizem mal do Liberalismo, mas vivem dos lucros e mordomias que a iniciativa privada e a elite dos ricos lhes dão.


Este impasse, entre Indivíduo (Liberalismo) e Sociedade (Estado) é uma falácia e um embuste. É a causa que impede o Desenvolvimento e a Prosperidade.
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De Anonimus a 16.08.2024 às 21:31

Também os há que trabalham para o Estado, mas fartam-se de falar mal do Estado e da vida como FP, em vez de virem para o privado onde a vida é bela e o sol brilha. 
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De Luis a 16.08.2024 às 21:21

Sobre os transportes é curioso que, por exemplo, a rede expressos seja privada e não tenha problemas com pontualidade, greves ou supressões de última hora constantes. Já na CP é a festa que toda a gente vê. Tal como a TAP era metê-la no prego para acabar de uma vez com o monopólio e os abusos constantes sobre os utentes. Hoje em dia tudo o que é público tem uma carrada de lobbies pendurados e nunca nada se consegue mudar. Por isso mesmo, gastamos cada vez mais para termos serviços cada vez piores com o SNS à cabeça. Era avaliar os serviços/funções que têm mesmo de ser do Estado e privatizar tudo o resto de uma vez para acabar a festarola duns valentes milhares de fp que não servem nem querem servir para nada de nada - os competentes (que os há), que me perdoem, mas estou farto de ser todos os meses saqueado pelas finanças e SS para depois me devolverem os serviços patéticos que me devolvem e ainda se acharem a última bolacha do pacote atrás dum qualquer balcão onde temos muitas vezes de pedir quase que por favor para nos ajudarem a nós utentes... uma vergonha absoluta!
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De Carlos a 17.08.2024 às 08:55

Tem razão. O funcionalismo público, de uma maneira geral, trabalha pouco e pouco se esforça para que os seu serviço melhore. a começar no varredor da rua e a acabar nos aboletados nos imensos Observatórios, Grupos de Trabalho, Comissões, Institutos e muitos outros lugares onde abundam empregos de luxo, ou seja, bem pagos e pouco exigentes. Que me desculpem os funcionários competentes e dedicados, mas que são muito menos da metade.
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De Anonimus a 17.08.2024 às 15:34

https://www.asbeiras.pt/opiniao-flixtrain/

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