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Já despachei os sete episódios de “O Gambito de Rainha”, minissérie da Netflix. É muito bem feita e representada, embora a história seja banal, do tipo “jovem heroína vence todas as adversidades, apesar de vir de baixo, graças a uma vocação extraordinária”. É uma espécie de “Karate Kid” do xadrez, filme de êxito nos anos 80, que motivou várias sequelas. Adivinho que este “Gambito” também terá mais temporadas, porque de facto a fórmula funciona e eu vi a série com rapidez e agrado, facto ao qual o recolher obrigatório não é alheio. Ao que consta, a minissérie está a causar interesse pelo xadrez um pouco por toda a parte, sobretudo entre os jovens, o que é louvável. O mais estranho é que, apesar de ter consultores ilustres (como o antigo campeão Garry Kasparov), pareceu-me que quase não se aprende sobre o xadrez, nem se percebem as jogadas para quem vê a série descontraidamente. Talvez voltando atrás, parando as imagens e analisando-as, mas não estou para isso.
Foi impossível não me lembrar do celebérrimo encontro entre Boris Spassky e Bobby Fischer, ocorrido em Reiquiavique em 1972, que, embora só tivesse 9 anos de idade, acompanhava todas as noites nas reconstituições que a RTP de então transmitia em horário nobre. Sete anos mais tarde, acompanhei no Rio de Janeiro, onde vivia, um torneio interzonal (uma espécie de eliminatória para decidir quais os candidatos a desafiar o campeão) e vi como o xadrez pode ser absorvente. Durante mais de três semanas, para mim e alguns amigos adolescentes igualmente entusiastas pelo xadrez, o mundo esteve todo no Copacabana Palace – o fantástico hotel onde decorria o torneio – e, quando não estávamos lá, íamos para casa uns dos outros reconstituir as partidas e discutir as peripécias do dia. Encontrei na Internet um recorte de um jornal da altura, em que estão os participantes, que acima reproduzo. Foi ganho pelo húngaro Lajos Portisch, ficando em segundo o soviético-arménio Tigran Petrosian, que já tinha sido campeão do mundo, perdendo o título precisamente para Spassky, em 1969. Pude então confirmar algo que se vê no “Gambito”, que os jogadores soviéticos, apesar de competirem entre si, se ajudavam mutuamente nos intervalos das sessões. Lembro-me de ver Petrosian, sempre acompanhado pela mulher, numa sala à parte a analisar as suas partidas com Balashov e Vaganian. Rezavam as más-línguas que estas sessões se prolongavam noite fora, com muita vodka à mistura.
O que me pareceu pior na série da Netflix foi dar a ideia que tudo se resolve numa só partida, quando é quase sempre em longos (e, por vezes, enfadonhos) encontros com várias partidas. Mas aceito que, para a economia dramática da ficção, resultasse melhor desta maneira. Há ainda algo que continua a intrigar-me: porque é que existem campeonatos só para mulheres? Sendo-lhes permitida a participação dos campeonatos ditos “masculinos” - como se vê na série - e não havendo as razões físicas que motivam a separação entre sexos noutras modalidades, julgo que é extremamente sexista organizá-los. Deve haver uma boa explicação, sobretudo quando temos no mundo de hoje tanta atenção a estes assuntos (e ainda bem), mas não consigo encontrá-la.
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Muito bom
Muito obrigado António Cabral
Mais ou menos, o vento é sempre muito complicado, ...
Teoricamente era mais importante decorar - é o que...
A 4ª classe dos tempos idos era muito boa. EM 1910...