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Gosto muito de séries policiais britânicas. Dentro do género encontram-se verdadeiras pérolas, sofisticadas histórias hoje contadas com técnicas aprimoradas de realização e suspense com actores muito bons, que nos lembram pessoas normais e não os modelos “artificiais” que quase sempre nos oferecem as congéneres americanas. Claro que estas séries, mesmo quando baseadas na literatura clássica do crime, reflectem o ar do tempo; de uma certa forma espelham a realidade sociocultural da contemporaneidade. Essas liberdades criativas, quanto a mim ameaçam a qualidade do produto, tornando-o mais com uma bandeira de um activismo qualquer, uma manifestação das virtudes e moralidade contemporâneas. Dir-me-ão que isso em cada época sempre assim foi, e é inevitável. Eu tenderia a concordar, se não fosse aquilo que me parece um exagero crescente, de fazer reflectir em quase toda a produção, até num mistério de Agatha Christie, toda a tralha de preconceitos e lugares-comuns às novas gerações, dispostos em democraticas quotas.
Mas o que me vem saltando aos olhos, há já algum tempo, é o retrato sociocultural da normalidade vigente nas grandes cidades britânicas – uma premonição daquilo que também chegará a este jardim à beira-mar plantado. Acontece que a velha caricatura do indígena, no caso do “bife”, aquela personagem pálida, de bochechas rosadas e gravata de fantasia histriónica, submerge perante a multiculturalidade, do mosaico de etnias que compõe por estes dias a paisagem urbana do reino de Sua Majestade. No seu lugar, entre figurantes e personagens principais ou secundários, encontram-se latino-americanos, africanos, muçulmanos, uma profusão de etnias, que curiosamente assumem um sotaque de inglês não convencional, um calão propositadamente carregado, seja de Manchester, seja de Newcastle ou duma região qualquer da Escócia. Assim como o modelo da família natural, o chamado "inglês BBC" caiu em desuso, suspeito que seja hoje malvisto, favorecem-se os regionalismos, o calão e os palavrões insistentemente repetidos capazes de fazer corar um tripeiro… Reflexo destes nossos tempos, as séries espelham a preponderância de lares monoparentais, pessoas sós e sem família, a normalização das plataformas de encontros, enfim, a representação porventura “martelada” dos temas fracturantes em voga, das chamadas minorias e múltiplas identidades sexuais, já para não falar das relações homossexuais cada vez mais explicitas, cenas a que não consigo assistir sem bastante incómodo.
Insisto: os britânicos são mestres a realizar séries policiais, mesmo quando nos revelam a sua estranha e decadente realidade. Uma das últimas que segui com agrado foi Vera, passada na enregelada região de Newcastle, protagonizado por uma solteirona de meia-idade, DCI Vera Stanhope. Dir-me-ão que a realidade sociocultural dos britânicos é bem mais prosaica do que os clichés da moda apresentados com os naturais exageros. Acredito, mas parece-me que os sinais de ruína dos valores tradicionais exibidos são claras marcas de uma sociedade profundamente fragmentada. Uma nação deslaçada pelo individualismo.
Porventura não escapará aos mais atentos, o símbolo que permanece e sob o qual trabalham os personagens destes dramas policiais: o monograma real de Sua Majestade o Rei Carlos III, encimado pela coroa real. Será que ela ainda inspira alguma coisa os britânicos?
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Obrigado pela demonstração de que a pessegada que ...
os jornalistas são 99% de esquerda. uma 'sociedade...
Caro Anónimo, aconselho-o vivamente a voltar para ...
Ha muito deixei de ver programas de debate, em áre...
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