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A plutocracia moçambicana

por henrique pereira dos santos, em 15.08.24

O regime moçambicano desde a independência - com algumas nuances, em especial ainda durante a chamada primeira república - é, essencialmente, uma plutocracia dominada por assimilados.

Como é normal em todos os regimes, o regime moçambicano assenta num mito fundador - o da luta anti-colonialista - e, para justificar a preponderância dos plutocratas, é-lhe útil apresentar uma moral aceitável.

Essa é a razão essencial pela qual os beneficiários do sistema, que inclui a academia pós-colonial e os seus "compagnon de route", insiste em torcer a realidade do último período colonial (entre 1961 e 1974), insistindo em caracterizá-lo a partir de realidades dos anos 30, 40 e 50, como se o colonialismo não fosse uma realidade em perpétuo movimento, empurrada pelos ventos da história.

Não é que não haja elementos de realidade nas histórias da carochinha que a academia vende como descrevendo a realidade, ou, no caso dos melhores, não é que não haja alguma razão para a cautela sobre testemunhos discordantes, mesmo que com preguiçosos argumentos desvalorizadores que insistem a caracterizar quem tem dúvidas como pobres de espírito incapazes de ver a luz,  "por não saírem do seu anacrónico saudosismo, continuam a remoer espúrias negações".

A questão de fundo é que é apenas uma parte da realidade, sendo sobretudo a realidade dos documentos normativos, muitos deles de aplicação mais que limitada (a mim faz-me lembrar as loas tecidas às reformas da educação do Marquês de Pombal, tecidas a partir dos diplomas com que justificou as suas decisões que, essencialmente, se traduziram em diminuir a população escolar em 90%).

Aparentemente desconhecem a sábia observação de um administrador (ou inspector?) colonial das primeiras décadas do século XX: "Eu, Ex.mo Sr., se fosse indigena, não hesitava um momento sobre o caminho a seguir, e V. Exª certamente faria o mesmo. Acima de todas as hegemonias, há uma que domina em absoluto todas as outras e todos os sentimentalismos, é a hegemonia económica que, em termos vulgares e correntes, se chama a defesa da barriga".

Escrever, podemos escrever o que quisermos, incluindo não escrever nada, mas quanto a comer, ao fim de umas horas a coisa começa a complicar-se, é um pormenor que os plutocratas que governam Moçambique esqueceram há muito, razão pela qual se esforçam em manter vivos os mitos que justificam moralmente governos tão maus.


4 comentários

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De José Monteiro a 16.08.2024 às 10:06

O autor abaixo, amante da liberdade africana, mas sem cultura (ou deformação) marxista, religioso e meio ocidentalizado, será talvez uma testemunha menos abonatória – Eduardo Mondlane:

A) 10/09/51 – Não sou cidadão da África do Sul, embora tenha sido educado em Johansburgo. Nasci na África Ocidental Portuguesa, na capital, chamada Lourenço Marques.

(…) Os problemas sociais, políticos e económicos do meu país são um pouco diferentes dos da União da África do Sul. Por exemplo, nós não temos uma barreira de cor ou discriminação racial no nosso país.

(…) Pessoalmente penso que há duas maneiras que ajudarão os africanos:

1.Educação massiva…

2.O espalhar da verdadeira cristandade.

(…) É esta a razão porque eu tenho a obrigação de regressar a África para fazer tudo o que puder para contribuir com a pequena parte de boa vontade com que eu sei que Deus quer que eu contribua na vida.

B) 24/09/51 – Lembra-te que eu próprio não sou cidadão sul-africano. Sou cidadão português. No meu país não temos leis de segregação… Eu farei tudo para lutar pelos direitos do meu povo no meu próprio país…

C) 24/04/54 – O meu desacordo com o governo tem pouco a ver com a sua política racial porque, embora não seja a ideal, não é tão má como a dos países vizinhos… O que não posso suportar é a falta de liberdade de expressão. Isto é verdade para todos os cidadãos portugueses, em Portugal e em África.

PS: enxertos das cartas de Mondlane a sua mulher Janet.

Livro de Nadja Manguezi, Maputo 2001, Centro de Estudos Africanos e Livraria Universitária:

Com “Uma história da vida de Janet Mondlane” com o título “O Meu Coração está nas Mãos de um Africano”

PS: réplica ao bronco Daniel Oliveira no Expresso de há tempos.

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De Francisco Almeida a 16.08.2024 às 16:59

Mondlane e Amílcar Cabral, os únicos líderes independentistas que não eram comunistas, foram ambos assassinados.

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