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De vez em quando publico aqui uns posts em causa mais ou menos própria, é o caso deste.
A Montis é uma associação de conservação da natureza focada na gestão directa de terrenos, prioritariamente na gestão de terras marginais, isto é, aquelas que não interessam a ninguém, nem à generalidade dos conservacionistas.
Sou um dos seus fundadores, fui o seu primeiro presidente e continuo empenhado na associação, fica a declaração de interesses feita.
Quando começámos a falar na hipótese de fazermos uma associação de conservação (éramos três, passámos a quatro, voltámos a ser três) a ideia era mais ou menos copiar o modelo da Associação Transumância e Natureza (também sou sócio, fui seu funcionário algum tempo, mas actualmente acompanho relativamente pouco), que é uma outra associação de conservação da natureza - não sei quantos hectares gere agora, mas não devo andar muito longe da verdade se disser que são à roda dos mil hectares, quase todos no vale do Côa.
Por necessidade ou convicção, queríamos apenas copiar o modelo de gestão directa de terrenos, mas não o modelo de gestão organizacional.
A ATN foi fundada muito assente na sua parceria com uma fundação holandesa (a STN, hoje extinta) e tinha fontes de financiamento externas a que nós, na Montis, não nos pareceria que fosse possível ter acesso no curto prazo, por isso concentrámo-nos em tentar resolver o financiamento da associação - a gestão de terrenos com objectivos de conservação é, de maneira geral, deficitária - em Portugal.
Olhando para o conjunto das organizações de conservação em Portugal, o que eu via (a partir daqui prefiro limitar-me ao meu ponto de vista, não garanto que as outras pessoas envolvidas tivessem exactamente os meus pontos de vista) era uma excessiva dependência de projectos de financiamento, e uma quase irrelevância dos sócios nesse aspecto.
Para mim, estas organizações pareciam-me - e ainda parecem - organizações de prestação de serviços, embora orientadas para o mercado especial dos financiadores de conservação, isto é, o Estado, as grandes empresas e as grandes organizações filantrópicas.
Para mim isto não é um defeito, é uma característica que tem vantagens e desvantagens, a principal das quais é a das organizações responderem progressivamente menos aos seus sócios e progressivamente mais às agendas dos seus financiadores.
A Montis procurou fugir disso tendo uma política de sócios agressiva - quem se quiser fazer sócio tem aqui uma ficha de inscrição e paga uma quota anual de vinte euros - e procurando usar subscrições públicas, que agora se chama crowdfunding, para financiar compra de terra e projectos concretos.
Na altura havia gente com muitas dúvidas de que isso fosse viável em Portugal, e poucos, se algum, acreditava que conseguíssemos juntar os primeiros quinze mil euros para comprar terra dessa forma, mas avançou-se para a primeira campanha, com muitas dúvidas e com a ideia de que mesmo que a campanha falhasse o seu objectivo, os ganhos de notoriedade justificavam o esforço.
Foi assim que descobrimos que o que parecia impossível em Portugal, afinal, não só era possível como havia um grande número de pessoas que jamais se ligariam a qualquer uma das grandes associações de conservação em Portugal, por discordarem dos seus pontos de vista ou dos seus métodos de actuação, ou dos dois, que não eram insensíveis à ideia de se ir comprando terra por aí para a retirar do processo económico e a dedicar à conservação da natureza.
O facto da Montis não ter pontos de vista (os seus membros e dirigentes com certeza têm, a organização, enquanto tal, não se pronuncia sobre opções de política) facilitou essa aproximação, mas tem um custo na dificuldade de mobilização que a associação tem porque é incomparavelmente mais fácil mobilizar pessoas contra qualquer coisa que a favor do que quer que seja.
Ainda assim o que gostaria de sublinar é que acaba nesta sexta-feira a quinta subscrição pública da Montis que consegue o objectivo, o que significa que a Montis mobilizou qualquer coisa como oitenta e cinco mil euros em campanhas deste tipo, ou seja, recorrendo à disponibilidade das pessoas comuns.
Para além da Montis, há outras organizações de conservação a recorrer ao crowdfunding para as suas acividades, com êxito.
Por isso quando me dizem que os portugueses não se mobilizam, que não é possível contar com a filantropia em Portugal fora dos temas sociais clássicos, e que a única solução possível é depender do Estado, seja do Estado central, seja do Estado local, eu não tenho a menor dúvida em responder que não é forçosamente assim, embora seja verdade que fazer de outra maneira dá muito trabalho, exige muita transparência, obriga a planear e executar com algum rigor, para além da sorte também ajudar.
E que a maior parte dos dirigentes das organizações, se quisermos, as elites, preferem, com alguma razão, usar as suas redes de contactos para intervir na sociedade: o preço que se paga pela liberdade, em Portugal é, frequentemente, um preço especulativo que só se paga por amor, que interesse não tem nenhum.
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