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"Eu, por exemplo, sou a favor do imposto sobre heranças e doações, eu acho mal que Pedro Nuno Santos e Catarina tenham uma vida tão confortável e um monte no Alentejo só porque são filhos de pais aparentemente ricos, e depois muito ricos, no caso de Pedro Nuno Santos".
Susana Peralta, falando sobre as casas de Pedro Nuno Santos e Montenegro (neste último caso, sem o menor problema em propalar boatos sem qualquer fundamento, apenas porque servem o seu ponto de vista político, cada vez mais indisfarçavelmente alinhado com o LIVRE), tem esta tirada cristalina que me ajuda a falar sobre a famosa herança social que o LIVRE acha uma grande ideia e que o PS copiou, embora envergonhadamente porque tem medo de ser considerado despesista e contabilisticamente irresponsável.
Estranhamente, uma ideia completamente errada e sem qualquer utilidade prática, circula calmamente pelo debate público quase sem contraditório (para além dos seu custo eventual), mas Susana Peralta não nos deixa adormecer sobre o assunto: o que está em causa é a censura moral à riqueza e à família, e não o combate à probreza.
A ideia é vendida como sendo uma herança (há um certo pudor em reconhecer que o capital é um bem, e não um mal, por isso lhe chamam herança e não capital) de que toda a gente deve dispor, de forma igualitária, ao fazer 18 anos.
Eu não vejo nenhuma utilidade social em entregar capital a Pedro Nuno Santos, por fazer 18 anos, retirado a toda a sociedade e sem qualquer condição.
Pedro Nuno Santos, se a família achasse fundamental, como achou quando o ajudou a comprar uma casa, entregar-lhe-ia capital, não por fazer 18 anos, mas por precisar de uma casa em Lisboa para a sua vida, quando achou que o futuro que Pedro Nuno Santos estava a desenhar para si justificava resolver essa falta de capital inicial.
Repito, não vejo nenhuma utilidade social em meter o Estado ao barulho, entregando-lhe um capital definido, aos 18 anos, sem qualquer avaliação do que pretendia Pedro Nuno Santos fazer com esse capital.
Resumindo o primeiro ponto, não faz o menor sentido que os filhos de famílias que têm capital beneficiem de uma entrega de capital, feita pelo Estado, aos 18 anos.
E não faz sentido, por questões de justiça social (esta entrega de capital inicial será sempre financiada com impostos, e os impostos terão sempre uma parte que provém de gente que precisa muito mais desse capital que o beneficiário), e por razões práticas (enquanto as famílias e a sociedade avaliam o momento e a utilidade desse capital para o futuro, a ausência de condições para o receber torna muito pouco eficiente a sua aplicação).
O primeiro ponto pode ser resolvido com uma condição de recursos, isto é, esta herança só seria entregue às pessoas provenientes de famílias com rendimentos inferiores a X, num determinado tempo Y, o que obrigaria à criação de um sistema de gestão e fiscalização da medida que, com toda a probabilidade, seria mais caro que a utilidade social da medida.
Admitamos, no entanto, que as questões práticas não eram relevantes e que em vez da fonte de financiamento da medida serem impostos indiferenciados, eram os tais impostos sucessórios que defende Susana Peralta e o LIVRE.
Para que a medida tivesse relevância, como diz o LIVRE, introduzindo uma condição de recursos que retirasse os filhos dos ricos da lista de beneficiários e ainda se mantivesse o equilíbrio financeiro, a colecta de imposto sucessório deveria ser desenhada em função da despesa esperada com a aplicação da medida.
Como ricos são poucos e pobres são muitos, para que o capital inicial tivesse algum significado para esses muitos pobres, o imposto sucessório colectado, sendo poucos os ricos, teria de ter uma dimensão muito relevante, isto é, num país em que um dos principais problemas é a escassez de capital (romper com o modelo de baixos salários que caracteriza a nossa economia exige capital), Susana Peralta e o LIVRE acham boa ideia taxar fortemente a transmissão de capital entre gerações, desviando recursos da economia para o Estado.
A mera simulação da dimensão da descapitalização da família Soares dos Santos que resultaria desta medida, permitiria perceber por que razão, rapidamente, a família passaria a sede de todas as suas operações para outro país qualquer onde o ódio aos ricos tivesse menos consequências práticas (é ver a quantidade de franceses ou reformados nórdicos que optaram por vir para Portugal, reforçando a economia portuguesa, à conta da loucura dos impostos nesses países).
Note-se que na citação inicial que fiz, o que é mais luminoso é a justificação dada por Susana Peralta para defender este absurdo económico: acha mal que alguém tenha uma vida tão boa por nascer numa família rica.
O que preocupa Susana Peralta, quando se distrai da cartilha moral sobre desigualdade que repete incessantemente, não é o facto de haver muita gente que tem uma vida tão dura por ser filha de quem é, mas sim que haja gente que tem uma vida tão boa por ser filha de quem é.
Independentemente da definição do que é uma vida excessivamente boa (a de filhos de professores universitários que estão seguramente nos cinco por cento dos mais bens remunerados do país já é suficientemente boa para ser moralmente condenável?), a verdade é que o problema é a vida excessivamente dura dos que são filhos da pobreza e a que nós, como sociedade, não temos conseguido dar oportunidades suficientes que lhes permitam sair da armadilha de pobreza em que nasceram.
Seguramente não são 10 mil euros aos 18 anos que permitem alterar o seu futuro.
Do que precisamos é de não ter a educação dual que temos (uma educação de ricos e outra de pobres), de não ter um sistema de saúde dual (uma saúde de ricos e outra de pobres), um sistema de justiça dual (uma justiça de ricos e outra de pobres), um sistema de protecção social focado em sintomas e não orientado para alterar o futuro de cada pessoa concreta que a ele recorre em alturas de maior vulnerabilidade, um sistema de reabilitação prisional que funcione, um sistema de acolhimento de imigrantes que os integre, etc., etc., etc..
A treta da herança social financiada pela taxação das heranças reais resulta da desvalorização da família como o grupo social mais capaz de formatar o futuro de cada um de nós, substituindo-a pelo Estado, e de um preconceito contra a riqueza e a acumulação de capital cujos resultados são os que conhecemos: um modelo económico de baixos salários, sem acumulação e capacidade de atracção de capital que permita o investimento que altere o nosso futuro.
Eu também posso fazer declarações de Miss Mundo a dizer que acho mal a guerra, mas isso não altera rigorosamente nada a realidade da guerra, tal como este discurso da esquerda caviar condenando moralmente a desigualdade não altera nada da vida dos mais pobres.
O mais grave, no entanto, é quando esse tipo de discursos que sinalizam os bons sentimentos são transformados em políticas públicas que são, elas próprias, muito boas para os sinalizadores de virtude, mas o desastre que conhecemos do ponto de vista do combate à pobreza e ao modelo de baixos salários que caracteriza a nossa economia.
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