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"A economia política dos incêndios em Portugal"

por henrique pereira dos santos, em 08.09.25

Antes do post: sobre o acidente do elevador da Glória tenho ouvido insistentemente a afirmação de que a culpa não pode morrer solteira, sem que ninguém me responda a uma pergunta básica: qual culpa?

O título deste post reproduz o título do artigo que Ricardo Paes Mamede publica hoje no Público.

"A prevalência de um enorme número de propriedades de dimensão muito reduzida é, em si mesma, uma fonte de baixa rentabilidade da floresta. Boa parte das actividades associadas à produção florestal - construção de acessos, preparação do terreno, plantação, manutenção, gestão técnica e mobilização da maquinaria - envolvem custos fixos elevados. Isso significa que os custos médios por hectare são mais reduzidos em propriedades de maiores dimensões, aumentando a rentabilidade. Pelo contrário, prédios exíguos têm retorno proporcionalmente baixos", diz Ricardo Paes Mamede.

O que diz tem lógica, portanto, a ser verdade, o que teríamos seriam propriedades pequenas abandonadas e sem gestão, e propriedades médias e grandes em plena produção.

Só que não é assim, não só a maior parte do Valor Acrescentado Bruto Florestal provém das regiões do minifúndio, como o que não faltam são propriedades com dimensões adequadas que estão abandonadas ou com gestão insuficiente (escusamos de ir buscar o direito sucessório português, em Lisboa ou Porto o direito sucessório é o mesmo a a generalidade dos terrenos não estão ao abandono).

O que explica então o desfasamento entre a teoria e a realidade, partindo do princípio de que a realidade raramente está errada?

Dois aspectos da economia da gestão florestal que Ricardo Paes Mamede não refere.

O primeiro, a produtividade da estação - os hectares não são todos iguais, uma coisa é produzir 4 metros cúbicos por hectare, outra coisa é produzir 16 metros cúbicos por hectare e, para a mesma espécie, variações destas existem facilmente - que, por sinal, é uma coisa que está relacionada com a estrutura da propriedade.

O segundo, os custos da operação, se gerir matos for uma operação cara que consome os lucros potenciais - sobretudo quando essa operação está relacionada com o aumento do risco de incêndio, isto é, poupanças na gestão, aumentam os riscos - os ganhos de escala a que se refere Ricardo Paes Mamede podem ser insuficientes para resolver o problema de uma operação ruinosa, logo, quanto maior é a área a gerir, maior é o prejuízo potencial.

Há muitas coisas do artigo de Ricardo Paes Mamede com que estou de acordo, nomeadamente a sua crítica à ideia de que resolvendo os problemas de propriedade, o assunto se resolve por si e a sua conclusão de que, nas actuais circunstâncias de mercado, a intervenção do Estado é imprescindível para gerir sensatamente o fogo.

Mas, infelizmente, a partir de um diagnóstico fundamentalmente errado, só por mero acaso se consegue chegar a soluções úteis e praticáveis sobre que intervenções deve o Estado fazer para ganharmos controlo sobre o fogo.


11 comentários

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De G. Elias a 08.09.2025 às 15:38

Sobre a nota introdutória creio ser relevante referir o seguinte: quando caiu a ponte de Entre-os-Riis, Jorge Coelho demitiu-se, dizendo que o fazia porque a culpa não podia morrer solteira. Passados alguns anos, já dizia que não tinha ido culpa daquela desgraça e que tinha assumido a responsabilidade política.
Esta confusão entre culpa e responsabilidade é frequente e Jorge Coelho contribuiu para ela.
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De Raposo a 08.09.2025 às 20:03

Assim como o actual comentadeiro de Belém, na altura a comentar de Queluz de Baixo, que teceu as maiores loas a Jorge Coelho, pela nobreza de carácter deste ao demitir-se ... 
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De Anónimo a 09.09.2025 às 09:36


sem que ninguém me responda a uma pergunta básica: qual culpa?


Já que ninguém responde ao Henrique, tento eu responder.


A culpa de ter a funcionar um funicular sem travões, isto é, sem qualquer meio de travar o veículo caso este comece a acelerar.


A culpa de ter a funcionar um veículo cuja única forma de o segurar não é regularmente inspecionada na sua totalidade, porque uma das peças cruciais para esse mecanismo de travagem fica num sítio invisível a olho nu e que exigiria o incómodo de se colocar um homem sob o veículo e desmontar umas peças para poder inspecionar o sistema na totalidade.


E, cereja no topo do bolo, ser esse um veículo de utilização repetitiva e quase sempre nos limites da sua capacidade de carga, dado o grande afluxo de turistas, desta forma esforçando ao máximo esse mecanismo de travagem único que nunca era inspecionado.
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De henrique pereira dos santos a 09.09.2025 às 10:15

Resumindo, Carlos Moedas é culpado de um erro de projecto com mais de cem anos e que, durante cem anos, nunca foi identificado por ninguém.
Quando ao resto é seguramente falso, a peça é desmontada e regularmente inspeccionada, há mais de cem anos.
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De cela.e.sela a 09.09.2025 às 10:41

a RPT1 gastou os primeiros 10 minutos a falar do elevador e aos 25 ainda não tinha referido a viagem de Estado do PM à China.
nunca sairemos da pocilga.
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De Anónimo a 09.09.2025 às 11:25


Resumindo, Carlos Moedas é culpado


Eu não escrevi que Carlos Moedas fosse culpado!!!


Escrevi que há culpa. Não atribuí essa culpa a ninguém em particular, nem a Carlos Moedas nem a nenhuma outra pessoa.


Mas que há culpa, há.
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De henrique pereira dos santos a 09.09.2025 às 12:19

Mas qual culpa? A de haver um erro de projecto com mais de cem anos, é mesmo essa a culpa que não pode morrer solteira? Vão ressuscitar o projectista para o julgar?
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De Anónimo a 09.09.2025 às 12:49


A [culpa] de haver um erro de projecto com mais de cem anos


Não. Repito: a culpa de (1) não haver um travão que consiga parar o funicular, e (2) a culpa de o sistema que sustenta o funicular não ser convenientemente inspecionado, ou pelo menos de essa inspeção não ter detetado que uma determinada peça não estava em condições.
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De henrique pereira dos santos a 09.09.2025 às 13:56

Foi o que eu disse, um erro de concepção com mais de 100 anos e que nunca foi detectado depois disso. Qual foi o dever que não foi cumprido pelo projectista, para haver culpa?
Está enganado, o sistema foi convenientemente inspeccionado, mas ninguém tinha ainda dado pelo erro de concepção do sistema que obrigasse a inspecções diferentes das que foram feitas (e foram feitas).
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De cela.e.sela a 09.09.2025 às 10:37

tem razão.
são elevadíssimos os custos de abate de eucaliptos e pinheiros: chegam a 150€ diários e falta a mão de obra.
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De Luis Alho a 09.09.2025 às 11:03

Bom dia. Tenho acompanhado a sua "luta" contra o mau jornalismo que por cá se vai praticando e gostaria de lhe chamar a atenção para o execrável editorial que Eduardo Dâmaso publica no CM de hoje.

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