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Notas olisiponenses: as quatro estações

por Luísa Correia, em 31.05.10

(No Jardim Lisboa Antiga...)

 

Lisboa não é, como realização urbanística, um obra merecedora de menção honrosa. Está, por isso, demasiado dependente dos «estados de alma» da natureza que a sustenta: o céu e a luz, as colinas, as árvores, o rio. Por isso, também, é volúvel como o tempo, produzindo tantos ou mais «extreme makeovers», quantas as estações do ano. No Verão, a sua face desidrata-se. Paira sobre ela uma poeira fina, que o calor arranca das calçadas, dos estaleiros das obras e das terras baldias para esbater as cores da vegetação, das casas e do panorama. É um Verão que sugere savanas e capins. Lisboa faz-se África - onde, aliás, lhe convém ir mantendo um pé. Mas no Outono, as brisas sacodem essa névoa de areias finas e de ondulações caniculares, e a atmosfera recupera a sua limpidez. Lisboa, contudo, entristece com o cair da folha: os verdes rarefazem-se e trazem para primeiro plano um casario envelhecido, sujo e sulcado de fendas, ou simplesmente desconexo. E nem a animação natalícia faz esquecer os riscos de que um dia a capital venha abaixo. Nalguns sítios, Alfama e Graça, já começou a vir. O Inverno é o Inverno: a minha estação favorita quando o sol brilha no ar lavado e frio. Mas o Inverno não favorece Lisboa, porque Lisboa não foi concebida para o Inverno. As imagens de desleixo e as incomodidades redobram, os dias, mesmo curtos, arrastam-se numa humidade pegajosa, que arrepia cabelos e nervos, e a própria tradição de temperança parece comprometida depois de um recente convívio com tornados. Felizmente, o Inverno traz consigo o anúncio da Primavera. E quando chega a Primavera, Lisboa renasce com tudo o que renasce nela. Os jardins, as flores nas sacadas das janelas e as áleas dos jacarandás, das tílias, dos plátanos, dos pinheiros, dos eucaliptos e dos lodãos escondem, num jogo de luzes e sombras, as fachadas carcomidas e as ruas esburacadas, emprestando-lhe um tom de saúde rija, uma frescura de alface realmente apetecível. Na Primavera, Lisboa apaixona-me. Razão por que em todas as Primaveras tenho a certeza – com uma força que me esquece de muitos desgostos… – de que Lisboa é a melhor cidade do mundo.


13 comentários

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De Cristina Ribeiro a 31.05.2010 às 19:51

Mas muito íngreme.Bem sei que outra cidade de que gosto muito -Roma -também o é. Porque é que toda a bela tem de ter um senão, Luísa? :)
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De Luísa Correia a 01.06.2010 às 12:34

Cristina, porque a «beleza» de Lisboa está sobretudo no seu enquadramento paisagístico, de que as colinas são parte. Os grandes panoramas, obtidos dos seus pontos altos, são o que de melhor a cidade oferece. Como escreve Matos Sequeira, «aqui o grande arquitecto é a Natureza». :-)

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De Cristina Ribeiro a 01.06.2010 às 22:30

Eu sei que assim é. Aliás por aqui, a nossa « Colina Sagrada », confirma isso, mas como é mais fácil de subir, porque é pequena ( embora muito grande em História :)...
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De Não sou tão optimista a 31.05.2010 às 19:57

Lisboa é a melhor cidade do mundo para se perceber como será preferível viver em muitos outros sítios. Por exemplo, algumas outras cidades portuguesas.

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De Luísa Correia a 01.06.2010 às 12:36

Meu caro Não-sou-tão-optimista, faço notar que o meu optimismo se limita à Primavera – e ainda assim, quando não estou com a «febre dos fenos». ;-)

 

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De Luísa Correia a 01.06.2010 às 12:37

Errata: onde se lê «febre dos fenos», leia-se «febre-dos-fenos».
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De Marquesa de Carabás a 31.05.2010 às 22:20

Lisoa é linda! A fotografia...é... digamos, a fotografia possível numa cidade quentissima, cheia de buracos, ladeiras assassinas dos saltos, esquinas a esborratar o rímel mais resistente.
A minha solidariedade total!
Aproveito para disponibilizar,desde já, umas floreiras onde não cresce quase nada, mas com uma vista magnífica no sentido da "diversidade": andaimes, gruas, viadutos etc...com elevador (até às ditas, bem entendido) e estacionamento.



Cumprimentos,



Marquesa de Carabás
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De Luísa Correia a 01.06.2010 às 12:50

Cara Marquesa, a minha visão é parcial porque é a tal visão, de que alguém um dia aqui falou, do caçador de tesouros. Inicialmente, só via a parte horrível. Agora, procuro só ver a parte atractiva. Ainda assim, reconheço todas as dificuldades que refere e, por isso, só na Primavera sinto o verdadeiro encantamento. Não com a cidade – como atrás disse à Cristina – mas com a sua natureza. Ou talvez seja apenas o ambiente primaveril, a luz e a cor, que me contagiam.

P.S.: Este «post» foi alinhavado no Domingo em que não saí de casa e tinha presente uma longa e muito agradável caminhada na Sexta-Feira anterior. Mas não devia tê-lo publicado ontem, tem razão. Ontem, na rua, julguei que morria com o calor. Ontem, Lisboa estava na sua pior «fardeta» estival, seca, pulverulenta, asfixiante. :-)

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De Marquesa de Carabás a 01.06.2010 às 21:15

Luísa,

Isto do humor às vezes tem destas coisas...não queria de forma nenhuma fazê-la pensar que não deveria ter publicado a fotografia.
As suas fotografias são bonitas e, são amadoras. Não se trata de estar a apreciar fotografia de um fotógrafo com responsabilidades na matéria. Se bem que são até bem esgalhadas.
O meu humor, ia no sentido de, como estava o tempo que estava, não subiu ladeiras...e fez muito bem, eu também não subiria.
Parece que a partir do dia 12 já vale a pena subir alguma coisa ali para os lados do chiado (Santini!!!!) :).



Cumprimentos,



Marquesa de Carabás
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De Luísa Correia a 02.06.2010 às 16:56

Cara Marquesa, não pensei que se referisse à fotografia, mas antes a uma Lisboa que só é tolerável escondida atrás de um muro (como o da fotografia). ;-)

Mas o que o seu comentário sobretudo me sugeriu foi que chegava ligeiramente atrasada nos encómios à Lisboa primaveril, porque o dia esteve péssimo, com aquele calor assanhado que derrota a melhor das boas vontades. A coisa, felizmente, parece que não veio ainda para ficar… :-)

 

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De Pedro Barbosa Pinto a 01.06.2010 às 09:03


Enquanto tiver a Portela, por onde ainda se pode escapar rapidamente. Quando o aeroporto for para Alcochete, vai ser uma desgraça! ;-)
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De Luísa Correia a 01.06.2010 às 12:57

Ai, Pedro, que negativista! ;-)))))

Mas é verdade que às vezes também me sabe bem ter uma Portela por perto. Ontem, teria rumado à Antárctida em dois tempos, tivesse eu capitais e um iglu confortável à minha espera.

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