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Breve reflexão em torno de uma entrevista

por Luísa Correia, em 24.02.10

Quando alguém troçava ontem do empolgamento que pus na análise da entrevista de Miguel Sousa Tavares ao nosso «Premier», estava, sem o saber, a fornecer-me material de reflexão e tema para este post. A ideia dele era que ando obcecada com a política. E eu sei que alimento a ideia. Mas é apenas uma ilusão, porque a minha curiosidade pela política é quase nula. Nos termos em que a vejo exercida por cá e um pouco por toda a parte, considero a política uma actividade que se especializou – e amesquinhou - na gestão de um punhado de interesses particulares em detrimento do interesse geral, num percurso sem recuo, como não recua a bola de neve que provoca a avalanche. Tenho, por isso, a convicção – que é quase uma certeza - de que talvez ganhássemos em «despedir» a política, que nos esbanja os bens públicos, que nos administra deficientemente os serviços e que nos atrofia o tal génio empreendedor, de que não regateamos provas «extra-muros». O que está em causa não é, portanto, a actividade política, mas os seus protagonistas. E a minha curiosidade é - confesso-o - de «profiler». Tenho o gosto da especulação sobre a natureza humana e a variedade de caracteres que nos oferece, e reconheço que o mundo da política é, a par do tráfego citadino, o meio que melhor testa a elasticidade «nervosa» e «valorativa» do homem, provocando tensões capazes de lhe quebrar o fio condutor e de nos surpreender com extraordinários fenómenos de inflexão de rumo, de duplicação de personalidade ou até de total metamorfose. E que vi eu de curioso na dita entrevista? Vi o combate de um homem repousado no sucesso do seu trabalho com um homem enrijecido na luta pela sua sobrevivência. Vi um homem politicamente diletante ao ataque de um homem politicamente escudado numa impenetrável armadura de lugares comuns. Mas, sobretudo, vi ou revi, no primeiro desses dois homens, aquilo que realmente sou: uma portuguesa irritada porque a tomam por parva, mas mais ainda frustrada e desistente perante a sua própria incapacidade de derrubar a muralha da estupidez do mundo.


13 comentários

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De Isto digo eu, sem ofensa para ninguém a 24.02.2010 às 16:14

Será, no entanto, estranho que num novo contrato e numa nova série de programas ("Sinais de Fogo") esteja um homem repousado no sucesso do seu trabalho, politicamente diletante, frustrado e desistente perante a sua própria incapacidade de derrubar a muralha da estupidez do mundo.


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De Luísa Correia a 24.02.2010 às 18:15

Eu não quis dizer, Isto-digo-eu-,-sem-ofensa-para-ninguém, que o MST não tenha brio ou sentido profissional: que não se tenha preparado e que não estivesse nervoso com a estreia. O que quis dizer foi que, objectivamente, estavam em confronto dois homens em posições diferentes, um já pouco tendo a ganhar (o MST), o outro tendo tudo a perder (o PM). E que isso me explica, a mim, a progressiva quebra de vigor e interesse do primeiro, quando percebeu que não ia conseguir arrancar ao segundo o que pretendia, que era uma versão nova e genuína da personagem; e o consequente «crescimento» do segundo, que se apressou a ocupar o espaço que o primeiro lhe cedeu.
P.S.: Quanto a diletantismos, diria ainda que tenho, às vezes, a sensação de que o MST não aprofunda exaustivamente certas questões (até jurídicas). Esse facto, a ser verdadeiro e não apenas uma sensação minha, pode bem criar-lhe algumas inseguranças e facilitar – quando o osso se torna demasiado duro de roer - a tal quebra de vigor e interesse.
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De Peço desculpa pelo uso das s/ palavras a 24.02.2010 às 19:12

Obrigado pela resposta.

E eu só quis dizer que, de uma pessoa que -em minha opinião- na TVI já era completamente previsível, batia quase sempre nas mesmas teclas e demonstrava uma grande falta de trabalho de casa nos comentários que por lá ia fazendo, não era de todo expectável que fosse ter um grande desarrincanço na SIC.

Acho que o primeiro programa confirmou tudo isso.

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De Luísa Correia a 25.02.2010 às 13:09

Dou-lhe razão, Peço-desculpa-pelo-uso-das-s/-palavras. O MST vinha dando a ideia de pessoa razoavelmente conciliada com este poder. Por isso, os primeiros minutos de entrevistas foram, para mim, uma surpresa agradável pelo lado que respeita ao MST: vi-o frontal, aguerrido, sem papas na língua. Mas foi deixando cair os assuntos (imaginei eu que por exaustão) e, na parte económica, quase nem reagiu. Talvez esteja conciliado mesmo… :-S
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De CRF a 24.02.2010 às 16:20

'Rien n' est épuisant comme de creuser la bêtise humaine !" Não desista.
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De Luísa Correia a 24.02.2010 às 18:25

Eu não queria desistir, CRF. Mas se até o MST, que é homem, é intelectual e é vigoroso, acabou por ceder àquela tortura da «gotinha de água», ou da «cassette», ou da «exasperação pela repetição sistemática de vazios», ou lá como deva chamar-lhe, como poderei eu, mulher de pensamentos simples e um bocadinho anémica, aguentar? ;-D
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De Perdoe-me mas prefiro continuar anonimo. a 24.02.2010 às 18:34

"mas mais ainda frustrada e desistente perante a sua própria incapacidade de derrubar a muralha da estupidez do mundo."

A incapacidade não é sua. O Pais já era assim. Permita-me que lhe aconselhe a não ser tão dura consigo mesmo. Não se culpe pela incapacidade de todo um povo, do qual também eu faço parte...
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De Luísa Correia a 25.02.2010 às 13:16

Meu caro Perdoe-me-mas-prefiro-continuar-anonimo, está perdoado. O anonimato é uma opção que respeito. Quanto à minha incapacidade, é verdade que falo na primeira pessoa, porque sou a única pessoa que verdadeiramente conheço e por que posso falar. Mas desconfio de que deveria partilhar as minhas culpas, sim. Como povo, aprendemos pouco com o passado, até o recente. Melhor dizendo: há uma parte do povo que aprende, mas continua a haver uma parte maior que não. :-)
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De Velho da floresta a 24.02.2010 às 18:47

Minha Senhora considero interessante no geral esta sua reflexão, porém se analisarmos a história verificaremos que a politica, tem sido em regra "uma actividade que se especializou... na gestão de um punhado de interesses particulares em detrimento do interesse geral", retirando algumas excepções de estadistas e/ou idealistas tem sido assim sucessivamente através dos tempos. Simpatizo com o principio de "«despedir» a política, que nos esbanja os bens públicos, que nos administra deficientemente os serviços e que nos atrofia o tal génio empreendedor", agora gostaria de saber que tipo de politico no sistema actual fará o oposto, assim como não posso estar mais de acordo com "O que está em causa não é, portanto, a actividade política, mas os seus protagonistas", sem dúvida que assim é, mas se estes fossem substituídos na integra por novos protagonistas, quanto tempo levaria o sistema politico partidário, implantado na nossa sociedade a moldá-los em protagonistas de sempre.
O Sousa Tavares pode ser muita coisa mas politicamente diletante é que não é, ao nível a que foi feita (preparada) aquela entrevista muito pouco acontece por acaso, pode ser que o peso do tempo me tenha tornado demasiado desconfiado e as minhas suspeitas sejam infundadas, mas que me pareceu tudo demasiado espontâneo e sincero quase coreografado pareceu e reforço aquele nível nada acontece por acaso.
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De Luísa Correia a 25.02.2010 às 13:30

Caro Velho da floresta, infelizmente já vi as suas opiniões partilhadas por muita gente, e alguma do «milieu» televisivo. É bem possível que esta entrevista tenha sido preparada ao pormenor. Não acredito, aliás, que o PM se prestasse a ela sem conhecer previamente o teor do interrogatório a que ia submeter-se. Mas também não acho que tenha saído vencedor. Do confronto com o MST, talvez. Do confronto connosco, os que o vimos e ouvimos, não. Essencialmente, porque não trouxe nada de novo: já todos lhe conhecíamos bem demais (ao ponto do enfartamento total) a versão - neste caso, de fera semi-amansada -, o discurso, as teses, as palavras, as modulações de voz, a pose, as expressões faciais, os olhares, os pestanejos, os gestos de mãos e, estava capaz de jurar, o fato e a gravata. ;-)
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De Cristina Ribeiro a 24.02.2010 às 20:18

Luísa, eu confesso que a política é uma actividade a que não consigo ficar indiferente, porque está na origem de todos os males, ou não, que me rodeiam. Quando me vê,
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De Cristina Ribeiro a 24.02.2010 às 20:29

o comentário fugiu :)
...quando me vê - sei que bato muitas vezes na mesma tecla, mas é porque me põe fora do sério - a vociferar contra esses politiqueiros quando, por exemplo, deixam descaracterizar a paisagem da minha região a troco de untadelas de mãos, faço-o porque entendo que temos de fazer o que está ao nosso alcance ( eu sei que é nada, mas ao menos ficamos aliviados :) ) para chamar os bois pelo nome; por isso é que a Luísa já me ouviu muitas vezes clamar pelo Municipalismo. Sei que é falar para as paredes, mas...
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De Luísa Correia a 25.02.2010 às 13:36

Cristina, mas ficamos aliviados, tem razão. Infelizmente, só temos como verdadeiramente intervir pelo voto, que não é nada. Mas podemos falar, clamar, escrever, vociferar, e mesmo que ninguém nos oiça – mas eu oiço-a sempre, Cristina! – ficamos aliviados. Só por isso, já não desisto, nem me calo. ;-D

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