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A idade «mais avançada». Esse conceito que, de tão abstracto, se torna tão concreto aos olhos de quem o vê, lhe toca. Na demente fuga à velhice, esse infeliz futuro ao qual apenas os desafortunados não chegam; as rugas, a voz gasta, o cabelo grisalho, em coro, gritam baixinho, quando necessário é: «pois é, já tenho uma idade avançada». É a negação no seu estado mais puro. É a negação que se evidencia nas mais absurdas formas.
É de idade mais avançada aquele indivíduo que, quando no meio de jovens, quem sabe se amigos dos filhos, se tenta fazer passar por novo e, ajeitando as calças e desapertando a camisa, faz uma conversa de tanto tempo quanto tempo tiver para ela sem nunca utilizar outros termos que não «bué», «muita fixe», «fatela» e tudo aquilo que já nem eu, que não tenho um branquinho para amostra, uso. Não há nada de mais triste e, até, confrangedor que ver esta malta a falar com a pequenada como se a pequenada fosse doutra terra, falasse outra língua. É aflitivo ver o esforço destas gentes quando assim querem falar e, no meio do pranto em que ficamos por solidariedade para com o pranto que não é nosso, acabamos a soltar um sorriso que, as mais das vezes, morre gargalhada.
Ó velhos deste mundo e do outro, uni-vos! Criai um prontuário só vosso onde surja «garoto» e não «chavalo», onde surja «porreiro» e não «bacano», onde surja «bonito» e não «bué-de-lindo». Aproveitai a era dourada que a Fortuna vos deixou viver e fazei questão de mostrar ao mundo, ou menos, o que for, que haveis tido tal bafejo. Usai boinas pretas, camisas de xadrez, casacos de fazenda, tudo perfumado com naftalina que é bom. Fugi da tirania do estereótipo do avô-fixe. Usai bengala e falai do que aprendíeis na primária. Contai histórias do Salazar e dizei quantas vezes a PIDE vos prendeu. Falai do tempo em que nos arredores de Lisboa havia apenas e só um amontoado de quintas e pastos. Reclamai da sopa, mesmo que esteja soberba, e do frio, mesmo que o suor vos escorra debaixo das vestes.
Sejam aquilo que o mundo espera e não aquilo que o mundo quer. Na vida que é já memória, foram muitos os anos para agradar o mundo e sobram agora poucos para lhe cuspir em cima.
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Eu sou uma das parvas que le tudo e ha' dias estav...
Pereira dos Santos,Para mim, é sempre agradável lê...
Mendonça da Cruz,Breve e limpo.Continua no post de...
José Mendonça da Cruz,Muito bem. Os comentários co...
"Merdia" portuguesa, um imenso , ignorante , mas p...