por António Figueira, em 26.07.09
Quando era miúdo, eu detestava os chamados “semi-frios”: extremistazinho desde pequenino, eu gostava era de gelados mesmo, desses que fazem doer os dentes. Hoje, incomodam-me as “semi-finais” (um termo à atenção do Pedro Correia) que fazem as vezes das meias-finais de antigamente (muito antigamente, quando o Benfica até conseguia chegar a uma ou outra sem a ajuda do Lucílio e sem acabar jogos à pedrada). Mas eu devo resignar-me ao semi-mundo em que vivo: e perante vós confessar que o que me preocupa mesmo, nos difíceis tempos que correm, é a praga dos semi-cultos. Definição: semi-culto é todo aquele que sabe um pouco mais que um ignorante mas muito menos do que uma pessoa culta, e é infinitamente mais perigoso do que o primeiro, pois ao contrário dele, que sabe que nada sabe (e habitualmente condimenta a sua ignorância com outros dotes), o semi-culto julga que tudo sabe quando não sabe - sendo o resultado disso, infalivelmente, a recipe for disaster. Os exames por fax, os diplomas pela net e toda a vasta nebulosa das chamadas “novas oportunidades” são demasiado caricaturais para merecerem o tempo que possamos perder com eles: le danger est ailleurs. Em primeiro lugar, na televisão, reino por excelência dos semi-cultos: há que evitá-la (e alguns blogs também: a regra deve ser que uma palavra vale mais que mil imagens). Depois, nas revistas: é preciso lembrar ao semi-culto que leu na "Vanity Fair" um artigo sobre, lets say, Nabokov, e julga por isso que já leu todo o Nabokov e toda a crítica de Nabokov, que não leu coisa nenhuma, e que se quer opinar sobre Nabokov tem de fazer o trabalho de casa primeiro. Enfim, nos best-sellers: urge evitar a facilidade e procurar o que é difícil, o que parece custar – porque só isso recompensa mesmo. Porque se nos conformamos com o que é fácil, o melhor a que podemos aspirar é ao melhor dos mundos assim-assim.