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Ide ao teatro

por Tiago Moreira Ramalho, em 11.07.09

Com a história da Maria João Pires e com o texto do Carlos Guimarães Pinto houve quem viesse, nomeadamente o Daniel Oliveira, utilizar um argumento que, muito honestamente, me parece estapafúrdio.

Diz-se que quem estuda em escolas públicas não têm o direito de discordar da atribuição de subsídios, por exemplo, à cultura. Mais, que quem estudou no público, sendo parasita, não pode condenar outros parasitas. Este argumento tem dois problemas fundamentais que é preciso esclarecer.
Em primeiro lugar, estudar no público é completamente diferente de beneficiar de apoios pontuais para a cultura e para projectos pessoais – por muito louváveis que possam ser. O sistema de ensino público implica que todos os portugueses paguem com os seus impostos a existência de escolas, o pagamento de salários – alguns deles quase imorais nos últimos escalões –, e até o funcionamento do próprio Ministério da Educação e os salários dos boys e burocratas do costume. Significa isto que quando uma pessoa estuda no público, está apenas a usufruir de um serviço que foi obrigada a pagar, via impostos. Pelo que seria muito, muito estúpido ir para o privado pagar duas vezes. E exigir-se isto é ainda mais estúpido. Ainda para mais quando o ensino privado está manifestamente encarecido devido aos salários praticados no público – que sendo reduzidos nos primeiros anos são bastante elevados nos últimos escalões.
Posto isto, vamos ao outro ponto. Ao contrário do que o Daniel e outros possam pensar, um parasita pode criticar outro parasita. Já afirmei que não considero que haja parasitismo quando se estuda no público (há apenas uma cedência a algo a que se é quase obrigado). No entanto, para o exercício, imaginemos que há mesmo parasitismo. A ideia de que uma pessoa que faz uma coisa de mal não pode condenar os erros dos outros é sempre uma bela forma de fugir à argumentação e eu até chamaria a esta «estratégia argumentativa» um manifesto Ad Hominem. Se o facto de se cometerem erros implica que não se podem condenar os erros dos outros, então, os juízes teriam as mãos e os pés atados e nunca teria havido um filósofo da ética. Adeus Singer, até depois Mill, beijinhos Kant.
Pode-se perfeitamente apoiar a cultura. Aliás, eu penso que a cultura é importantíssima e que sem ela somos muito pouco. Mas a forma ideal de apoiar a cultura é ir ao teatro, ir ao cinema ver filmes portugueses, ir a concertos, apoiar financeiramente instituições, dedicar-se à filantropia e ao mecenato. Uma forma completamente imoral de se fazer isto é impor aos outros que financiem aquilo que nós achamos bom. Sim, porque o Daniel Oliveira pode achar que Belgais é um projecto muito interessante. Eu posso achar que há outros mais interessantes e julgo que tenho o direito a isso. Ou não?


3 comentários

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De Anacoreta Cenobita a 12.07.2009 às 08:01

Sou Português, canto pior que uma cana rachada e não toco nenhum instrumento. Pior que tudo isto, ninguém me dá subsídios.
Os "intelectuais" e "artistas" Portugueses parecem pensar que porque tem jeito com o piano ou escrevem uns livros temos todos que lhes aturar as manias e pagar. Pois bem, não. O projecto da Maria João (ou de outro qualquer) se não é rentável , se não é auto-suficiente ...azar.
Se a Maria João, ou outra maria qualquer, quer mudar de nacionalidade, força. Não se perde nada. Portugal é mais e maior que isso. Basta que os Portugueses queiram. Não precisamos de D. Sebastião, de Maria João, ou de ....
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De Anacoreta Cenobita a 12.07.2009 às 16:43

Anacoreta Cenobita:

Precisamos então de quê?
Olhe, precisamos, por exemplo, de pessoas que não escrevam português ou portugueses com letra maiúscula e que escrevam intelectuais e artistas sem aspas.
Poderá parecer pouco mas já era um princípio.
E, quanto ao resto, se quiser cantar, cante, se quiser escrever, escreva. Pouco importa e pouco me importa.
Mas que a Maria João Pires se sinta desconfortável neste país não é bom sinal.
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De Manuel Leão a 12.07.2009 às 16:54

Peço desculpa mas o comentário anterior (das 16:43) não é do Anacoreta, é meu. Houve, por certo, uma troca de mãos, mas não houve troca nem de ideias nem de identidade. Felizmente!

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