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É certo que tinha dito que o debate iria prosseguir por e-mail com as pessoas que referi no post anterior, no entanto, surgiu a necessidade de um novo post sobre o assunto a responder ao "Klatuu o Embuçado" do blogue Crónicas da Peste, ao qual não respondi inicialmente não por ter medo da sua argumentação, mas pelo tom ofensivo em que me respondeu. Uma lição a tirar de todo este debate é, efectivamente, a capacidade de pessoas com pensamentos opostos serem capazes de fazer uso das mais elementares regras da cortesia. Adiante. O Klatuu perguntou-me, então, num comentário "onde é que o ofendi". Eu digo: aqui, aqui e aqui fez o mais puro ataque pessoal e ao longo do seu texto foi bastante infeliz em comentários como: "a sua argumentação enferma de falácias" e "o seu segundo argumento (...) é quase ilegível à luz das normas de clareza do pensamento, mas vou esforçar-me". Em primeiro lugar, quanto às falácias, é bom dizer que elas não se anunciam, provam-se, e quanto ao segundo comentário, penso que fala por si.
Vamos então desmontar essa sua argumentação que "é inteligente, politicamente pertinente e fundamentada. Além de claríssima." segundo a sua claramente modesta opinião.
Quanto ao seu primeiro parágrafo não me vou pronunciar, por ser apenas um desabafo que assenta em premissas, no mínimo, questionáveis (como a do "desgosto de milhões") e por ser, também, paradoxal, dado dizer logo no início que não discute desgostos de ninguém.
Pensei que seria óbvio que estava a referir-me a João Franco e não ao Franco espanhol, mas como fez questão eu referi-o.
O Klatuu diz "esquecendo que nenhuma fase tirânica de nenhuma monarquia (e a comparação é temporalmente injusta, apesar da República não ser um regime moderno e remontar à antiguidade) foi tão lesiva à humanidade e à civilização como o conjunto dos republicanismos totalitários que, à Esquerda e à Direita, devastaram o século XX" . Esta pequena citação dá pano para mangas. Em primeiro lugar, em lado algum eu defendi um republicanismo totalitário, por isso, não entendo a introdução da questão. Para além disso, não há registos históricos verdadeiramente fiáveis dos números de mortes nas várias guerras e perseguições nas monarquias antigas: a chacina que ocorreu na América no tempo da colonização espanhola (naquela altura, os Aztecas, os Maias e os Incas ainda existiam - e eram monarquias) ou os inúmeros assassínios e perseguições religiosas autorizados pelos monarcas, que até apoiavam tais comportamentos por parte da Igreja Católica. E se a comparação que faço é temporalmente injusta, também a sua o é: pense o que seriam as guerras entre Reinos (como a Guerra dos Cem Anos) com os meios bélicos actuais, ou pense no que seria o controlo da sociedade por parte do Estado com os meios tecnológicos que actualmente temos. É certo que são apenas hipóteses, mas há que as ter em linha de conta.
A certa altura o Klatuu diz, também, que "a grande correcção que se exige, cada vez mais urgentemente, é matar o «bicho», dando aos Portugueses a oportunidade de se pronunciar sobre a questão fundamental: o Regime". O recorrente argumento que não houve consulta popular que legitimasse a transição para a República é muito válido e até concordo com a realização de um referendo. O que muitas vezes é esquecido, dado que só esquecimento poderia justificar tanta "raiva" quando se aborda o assunto, é que o povo também não escolheu viver em monarquia enquanto nela viveu: ninguém imagina o Afonso Henriques a fazer um referendo. No entanto, a dualidade de critérios é flagrante: um regime surgiu naturalmente, o outro foi imposto. Bem sei que Espanha referendou, mas é provavelmente o único exemplo, o que me deixa confuso com as defesas dos regimes monárquicos europeus que tendo taxas de "aceitação" (sondagens, obviamente) altíssimas, nunca tiveram uma verdadeira consulta popular de modo a questionar qual o regime preferido.
No seu segundo ponto, insiste em enveredar por uma via de tirar legitimidade à República (e não só) apontando os seus males. Se quiser, e para ver que a linha de raciocínio é pouco interessante, também eu faço o mesmo: à data do fim da Monarquia, éramos um dos países com maiores taxas de analfabetismo da Europa - actualmente não -, éramos industrialmente atrasados e atente-se que foi no tempo da Dinastia Bragantina (1640-1910) que perdemos o combóio europeu, depois de termos sido uma super-potência mundial. Mas reforço que o facto de um regime funcionar mal num determinado momento ou conjuntura não justifica o seu abandono. Já percebi que não é adepto da analogia, mas ainda assim, arrisco: pelo facto de o ensino público português não ser bom, disso não se retira que ele deva ser privatizado. Muitos argumentos podem levar à privatização do ensino, mas a falta de qualidade da versão pública não será, certamente, um deles. Isto porque temos exemplos de ensinos públicos maus e ensinos públicos de excelência - o mal não está no sistema, mas sim em quem o corrompe e é sobre quem o corrompe que devem recair as críticas.
Depois o Klatuu diz: "defendemos uma monarquia dinástica (...) mas nunca um mau monarca. A possibilidade do plebiscito que convida um rei a abdicar está no pensamento monárquico actual". Então, se se aprova a possibilidade de o Rei ser alvo de sufrágio, qual é a diferença em relação a uma República. Não seria mais simples se pudessemos escolher à partida e que o cargo não tivesse uma limitação de tempo prevista na lei?
E ainda vai, segundo diz, mais longe: "um rei não herda apenas uma coroa, um rei tem que ser aclamado: rei que não seja desejado pelo Povo, nunca poderá ser rei, e para garantir isso existe aquela força maior que os reis: o Povo Português, sem o qual não há Reino nem Reinado!". Ora, se o Rei só o é se for desejado pelo povo, primeiro, isso não preverte o regime? - o Rei passa a ter de agradar - e, segundo, qual é a diferença prática entre um Rei que tenha de ser aceite pelo povo e um Presidente que para o ser é eleito, ou seja, tem de ser aceite pelo povo que manifesta a sua opinião de forma inequívoca? Poderá argumentar-se que a diferença reside na ligação à pátria, mas quem nos diz que um Rei é mais patriota que um Presidente? Temos o caso dos Presidentes Americanos, regra geral, profundamente patriotas e alguns Reis que chegaram a abdicar dos seus tronos por não gostarem do seu país - como chegou a acontecer na Rússia.
Explico a minha frase por si citada com todo o prazer. Eu disse que a Monarquia pode não ser eticamente aceitável e que na minha opinião pessoal não o era, pelo facto de, como já disse várias vezes, considerar que o filho do Rei não deve ser também ele Rei apenas por ser filho de quem é. A questão do "serem estáveis e tudo mais" é exactamente a mesma história das monarquias europeias serem muito boas: não me interessa, interessa-me analisar a legitimidade de um Regime e não as suas consequências práticas. Se as consequências práticas legitimassem um Regime, a ditadura de Estaline estava perfeitamente legitimada dado que foi durante o período que a Rússia se tornou um dos mais poderosos polos mundiais. No caso da ditadura comunista, para que houvesse crescimento económico, houve terror nacional, no caso da Monarquia, poderia haver um sistema de sucessão na chefia de Estado incorrecta. É óbvio que as consequências são mais graves num e menos graves noutro, no entanto, o facto de uma coisa ser menos grave que outra não leva, necessariamente, a que não demos importância à coisa menos grave.
E já agora, apesar de não necessitar deste parágrafo, os seus comentários relativos à minha pessoa são tão desnecessários como absurdos. Assino com três nomes e escrevo, pelo facto de ter sido convidado, num dos blogues mais respeitados do país, no entanto, daí não se infere absolutamente nada sobre a minha pessoa, e para lhe dar a conhecer um pormenor, nenhum corta-fiteiro sabe o que quer que seja sobre mim para além do meu nome e das minhas ideias expressas nos meus textos. Por isso, antes de fazer juízos desse teor, pense duas vezes, não vá ver-se novamente numa situação infeliz como esta.
E com isto dou, definitivamente, por terminado o debate aqui, até porque este post já está abusivamente grande e as pessoas com quem me deu prazer debater pelo grau de elevação que colocaram na contenda dispuseram-se, apesar de por outros meios, a continuar o debate, que no nosso caso não é um duelo em que tem de haver vendedores e vencidos, mas sim a busca da verdade, que é o verdadeiro propósito da discussão e debate de ideias e o fundamento primeiro da Filosofia.
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