Posso afirmar-me sensível a muitos dos argumentos invocados pelo
Nuno Castelo-Branco. Ele tem razão quanto muitos aspectos negativos que aponta no nosso regime. Mas é essa a questão: o Nuno Castelo-Branco refere-se ao nosso regime em vez de ao Regime no abstracto. E é aqui que quero colocar o debate, pois não se pode avaliar o todo pela parte e avaliar o sistema Republicano a partir da República Portuguesa, dado que isso seria um erro. Do mesmo modo não se pode avaliar o sistema Monárquico a partir da Monarquia Inglesa, que é efectivamente um caso de sucesso. O que eu pretendo é averiguar se o sistema Monárquico é ou não um sistema legítimo, aceitável do ponto de vista ético. Também gostava de salientar que ninguém, pelo menos que eu tivesse conhecimento, me respondeu directamente aos argumentos do segundo post desta série, mas enfim, provavelmente nem eram dignos de resposta. Então vamos lá começar.
A primeira questão que o Nuno coloca, por muito contraditório que possa parecer, não o ajuda. É verdade que os quase cem anos de República que tivemos não foram propriamente os nossos anos de glória, mas se ainda assim permanecemos com a convicção que a República é o melhor sistema, então é porque encontramos mais fundamento num regime republicano que num monárquico. E esse fundamento, creio eu, vem do facto de numa República não ser imposto ao povo o seu líder, seja ele bom ou mau.
Queria desde já advertir para um aspecto: vou-me repetir. E não é porque eu queira, é só porque o Nuno, creio que involuntariamente, repete com frequência o mesmo erro argumentativo ou, para ser mais técnico, a mesma falácia. E o erro é o de tomar a parte pelo todo e pegar na nossa República para atacar o sistema republicano, esquecendo-se das imensas repúblicas que funcionam lindamente.
Logo na segunda pergunta que me coloca, que não transcrevo de forma a poupar espaço no post, o Nuno cai neste mesmo erro: culpando o Regime pelos actos dos seus agentes. Isto é, diz-nos que Portugal é «um regime tão instável, desrespeitoso da decisão dos eleitores e refém de meros interesses económicos que na verdade, são quem controla de forma coerciva e bastante eficaz, o poder político», o que é em larga medida verdade, mas não é culpa do sistema republicano, mas sim das pessoas que têm assumido o poder. E se este é considerado um argumento forte contra a Republica, deixem-me então questionar o Nuno, que tem provas dadas de saber bastante sobre a história da nossa Monarquia, se nunca antes de 1910 se cometeram injustiças à conta dos interesses de uma parte – assim de repente lembro-me dos Távoras.
A seguir o Nuno diz: “Presidente da república, governo, AR, Supremos, PGR, etc, etc, servem hoje para uma simples partilha de cargos entre as acirradas rivalidades políticas que aliás, não têm - exceptuando-se o PCP - qualquer relevância do foro ideológico. É o prebendismo, a lambugem rotativa reconhecida como forma de organização nacional.”
Novamente confesso ter a mesma opinião, no entanto, e volto a reforçar, isto não é um problema do Regime Republicano mas sim das pessoas que assumem o poder, as quais não têm, de todo, competência. Temos imensas Repúblicas em que os órgãos de soberania funcionam na perfeição. Vou mais longe: quem nos diz que com uma Monarquia seria diferente?
O Nuno pergunta, então: «qual é a verdadeira relevância da existência de um "presidente da república"?», A resposta é simples: um Presidente da República tem as mesmas funções que um Rei, com a diferença que este último, bom ou mau, é imutável, enquanto o Presidente da República (eu escrevo com maiúsculas), caso não tenha competência é sujeito à maior das fiscalizações: o sufrágio.
Quanto à quarta pergunta, não percebo em que medida é que vem enriquecer o debate, mas basta-me dizer que nas listas dos mais ricos do mundo, a rainha de Inglaterra é convenientemente retirada por ser considerada incomparável. Mais, o casamento do Dr. Aníbal Cavaco Silva não teve certamente os mesmos custos para o erário público que o casamento da princesa Diana. No entanto, isto é irrelevante para o debate que travamos e que busca a justificação da Monarquia.
Já no último ponto, o Nuno lembra as cimeiras Ibero-americanas e diz «aponto apenas as Cimeiras Ibero-Americanas, nas quais a figura tutelar e de primeiro plano é sempre o rei de Espanha». Tem razão sim senhor, no entanto, isso é explicado com o facto de no conjunto dos países Ibero-Americanos ser a Espanha a mais forte das economias e prende-se também com os aspectos históricos, dado que a maior parte dos países fala castelhano, ao passo que apenas dois falam português. Não creio, de todo, que esse papel importante de Espanha venha do facto de ser uma monarquia. Aliás, basta pensarmos nas cimeiras do G8, nas quais não é a Inglaterra a assumir o principal papel, mas sim os EUA – que são uma República já bastante antiga.
Por fim, o Nuno diz: «para a esmagadora maioria dos monárquicos, o regime - ou forma de representação, se prefere assim - surge como algo de simplificador, homogéneo e perene. É útil». E é exactamente este o problema: o maior argumento para defender a Monarquia é o da sua utilidade e não o da sua legitimidade, ao contrário da República, onde a legitimidade se sobrepõe à utilidade. É isto que faz mudar divergir as opiniões: uns consideram ser preferível um regime útil mesmo que sem grande legitimidade enquanto que outros, como eu, preferem a legitimidade à utilidade.
Dado que o post já vai longo, deixo as outras respostas para os próximos.