Felizmente houve algumas pessoas a responder ao meu repto e há margem para o debate. Como o João Távora me indicou, fui dar uma espreita ao Centenário da República, li um pouco na diagonal, mas pareceu-me que o texto que justificava a vossa posição era o do João Gomes, já transcrito em parte na caixa de comentários. Pego, portanto, nesse texto para começar.
No primeiro ponto, o João Gomes diz-se monárquico por estar desgostoso com a República, sucintamente, é isto. Diz-nos que em cem anos de República, quarenta foram de ditadura. E que em Monarquia o país é livre. Este argumento, desmontado, é: como a República não está a ser boa, devemos mudar para a Monarquia. O problema é que, até ver, a Monarquia não foi melhor, nem na prática, nem no princípio. Na prática, e pegando exactamente em D. Carlos, há que lembrar a ditadura de Franco – sim, quando o Rei via a coisa mal parada decidia fechar o Parlamento, muito na linha do que diz Ferreira Leite naquela frase do “por na ordem”. Quanto ao princípio, já sobre ele falei, por isso, não vou repetir.
No segundo ponto, o João Gomes toca num ponto sensível e é capaz de ser este o melhor dos seus argumentos. É certo que um Presidente vem, invariavelmente, do aparelho partidário e o Rei é alheio a tudo isso. No entanto, não é por haver promiscuidade no sistema que o sistema perde legitimidade. Passo a explicar com um exemplo. Sabemos que há maus padres, padres criminosos até – fará isso com que a religião perca o seu valor? Do mesmo modo que maus padres não tiram valor à religião, maus políticos também não retiram valor algum à República e, por consequência, à Democracia. A solução aqui é corrigir o que está mal e não mudar tudo.
No terceiro argumento, o João Gomes volta à análise prática, quando o que se pretende numa defesa destas é a análise do princípio, creio eu. Mas ainda assim, há que responder. O que o João Gomes defende é que um líder imposto tem mais legitimidade que um líder eleito. Isto é já de si perturbador na minha visão, não me dou muito bem com imposições. Essa legitimidade vem do facto de o Rei ser à nascença Rei do país, ao passo que o Presidente é-o apenas para a parte que nele votou. Isto é profundamente errado. Um Presidente quando é eleito passa a ser Presidente da nação tanto para quem votou nele como para quem não votou. E mesmo que muitos não se revejam no Presidente, verdade se diga, muitos também não se revêem nos seus Reis – é o pecado da opinião. Aliás, a prova que nem todos se revêem nos seus Reis é o próprio Regicídio, que aproveito para dizer que foi um dos maiores crimes da nossa História. Como chefe de Estado, o Presidente tem até mais legitimidade que o Rei dado o facto de ter sido escolhido pelo povo – para haver presidente pelo menos metade da população tem de votar nele, enquanto para haver Rei ninguém precisa de aceitar, nem ele precisa que aceitem.
Depois, tanto o Toupeira como o Costa usam o eterno argumento do estrangeiro. Na Europa há muitas Monarquias e os países funcionam bem, por isso não há problema em Portugal funcionar em Monarquia também. Isto é o mesmo que dizer: “em Itália existe uma máfia super organizada e o país faz parte do G8, por isso, não vejo mal em haver uma máfia organizada também em Portugal”, ou “na América, durante o tempo da escravatura, assistiu-se a um forte crescimento económico, por isso, não vejo mal em haver escravatura de novo”. Ou seja, assume-se a Monarquia como eticamente aceitável como princípio e a partir daí é que se retiram as conclusões. A questão é que a Monarquia pode não ser, e não acho que seja, eticamente aceitável, logo, são os outros países que estão mal ao ter sistema monárquico, apesar de serem estáveis e tudo mais.
Espero novas respostas, que não faltam monárquicos na nossa blogosfera e o debate parece-me ser francamente interessante.