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Meu Portugal brasileiro
O Pedro Correia convidou-me a escrevinhar no Corta-Fitas. Pois bem, aproveito o convite para confessar o meu lado mais reaccionário. A opção não se fundamenta em quaisquer preconceitos acerca desta casa e dos seus ilustres moradores, mas confissões deste calibre seriam intoleráveis no meu tugúrio. Em que se manifesta, então o meu lado mais "reaça"? Em pormenores tão simples como numa aversão epidérmica a certos processos de aculturação, o que, dito de outra forma, num conservadorismo inato quanto a matérias tão fundamentais como Carnaval, selecção nacional e língua portuguesa.
Já sei, colocar a língua portuguesa no mesmo patamar das restantes matérias é facilmente censurável. Como certo dia terá escrito Pessoa (facilmente compreenderão que ninguém pode estar certo de que tenha sido realmente Pessoa, o Fernando, a escrevê-lo): "Minha patria é a lingua portuguesa." E Pessoa escreveu isto num tempo em que sintaxe se escrevia "syntaxe", ortografia escrevia-se "ortographia", escrita era o mesmo que "escripta" e português terminava em "z". Pelo menos era assim que o Fernando escrevia. Nada disto pode servir de argumento a favor do acordo ortográfico. Como diria o meu amigo Victor (ou será Vítor?), Henrique, eu mesmo, jamais poderá ser Enrique. Faltando-me o "H" falta-me o pouco de aristocrático que o destino me outorgou.
Não sei se alguma vez pensaram nas consequências quotidianas de certas transformações na língua portuguesa. Desde logo, o quotidiano brasileiro é muito diferente do nosso. Não só por ser mais acalorado, mas simplesmente por ser cotidiano. Eles apanham ônibus em vez de autocarros ou, como ainda se diz na minha terra, carreiras, não tiram o chapéu ao vôo dos pássaros, tem menos umidade nas casas e insetos no teto. Eles não têm, eles tem. Eu não quero ter insetos no tecto da minha casa, muito menos quero um teto e, apesar dos problemas respiratórios, prezo muito a humidade das paredes, a qual, por vezes, assemelha-se com algumas obras de Tàpies. Pior que isto, o Deus dele é onipresente. Mas que raio de Deus pode ser "onipresente"?
Tudo o que acabei de afirmar vai servir para me acusarem de antibrasileirismo primário, e de nada me valerá declarar uma incomensurável paixão pela poesia de Drummond, pela música de Chico Buarque, pela bunda da Juliana Paes. Não me interessa. Estou irremediavelmente contra a brasileirização do Carnaval português e da nossa selecção de futebol. Basicamente, estou contra a brasileirização do meu país. Prefiro uma selecção nacional de futebol perdedora apenas com portugueses, a uma selecção nacional de futebol vencedora com jogadores brasileiros. O meu fanatismo nestas matérias é de tal ordem que só de pensar que o Deco pode marcar um golo com a camisola das quinas e o Pepe arranhar o hino nacional dá-me vontade de, num ímpeto nacionalista, pendurar uma bandeira de Portugal na varanda cá de casa.
E depois há o Carnaval. Não há Carnaval mais ridículo do que o Carnaval brasileiro realizado em Portugal por portugueses. As mulheres portuguesas não nasceram para usar cuecas fio-dental em pleno Inverno, muito menos para sambar com pernas pelo menos tão brancas como o algodão em rama com que limpam as feridas domésticas. Bolas, eu ouvi um português dizer este ano que o Carnaval lá da terra dele era o mais português de Portugal porque era o mais parecido com o do Brasil. Mas o que se passa com este país? Apanhou tudo a carona tropicalista?
Henrique Fialho (do blogue Insónia)
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