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Luís Montenegro resolveu trocar as voltas ao jornalismo e à militância que manipula o jornalismo, procurando saltar por cima dos intermediários de comunicação e falar directamente para as pessoas (não há novidade nisto, todos os políticos com má imprensa procuram contornar o problema, uns, conhecendo tão bem o jornalismo que usam os truques todos que conhecem para ganhar espaço, como André Ventura, outros encontrando formas de saltar por cima da intermediação).
A história, como a vejo, descreve-se assim.
Numa operação policial que correu mal, a polícia mata uma pessoa.
Na sequência imediata, a extrema direita cavalga politicamente a necessidade de segurança e a extrema esquerda cavalga politicamente as injustiças sociais, à boleia da violência que se instala nalgumas periferias de Lisboa.
A imprensa, naturalmente, cavalga o potencial dramático da situação.
Para um primeiro-ministro com uma imprensa pouco favorável, não há maneira de, no momento, sair airosamente, da situação, o que quer que faça, será sempre por um lado abafado pela avalanche de notícias, por outro pela má imprensa e o barulho da coligação dos descontentes.
Montenegro, como tem feito noutras situações, deu um passo atrás, aguentou as críticas de não reacção, falta de empatia e essas coisas que, de qualquer maneira, iria sempre ouvir, e esperou.
Esperou um mês até ter nomes, pessoas, caras, histórias de vida das pessoas que tinham incendiado um homem que só não morreu por acaso.
Nesse momento, em que poderia contrapor à conversa dos injustiçados que justamente se revoltam contra os opressores a cara, idade e cadastro de dois criminosos anteriormente condenados por tráfico de droga, Montenegro faz um número que lhe permite prescindir dos intermediários e põe os jornalistas todos a transmitir, e ouvir, sem interrupções, a sua visão política do problema, respondendo à exigência de mão pesada à sua direita e à história da carochinha da justa indignação dos oprimidos, à sua esquerda.
Pessoalmente, acho que a execução do número não foi brilhante.
No entanto, ninguém me tira da cabeça que a mais que evidente irritação de jornalistas e comentadores com a comunicação de Montenegro não tem qualquer relação com a dignidade das instituições, ou a oposição à "caça às percepções" (Mariana Mortágua esquece-se que, pelo meio, o seu anterior parceiro de Governo tinha deixado escrito, de forma clara, que era preciso "combater as perceções fáceis com a realidade dos factos", sem que ela tivesse ficado enxofrada com isso, duvido até que tenha reparado), essa evidente irritação é apenas com o facto de Montenegro ter ignorado os mecanismos de controlo do discurso político que os jornalistas dominam.
Montenegro limitou-se, numa matéria muito difícil para ele, a prescindir dos jornalistas e dizer-lhes que consegue fazer chegar o que quer, a quem quer, sem ter de andar a passar a mão pelo pêlo dos jornalistas.
E os jornalistas políticos entendem essa capacidade como uma ameaça existencial.
Com razão.
O jornal Expresso (Isabel Leiria e Joana Pereira Bastos, não conheço) titula que Fernando Alexandre fez um mea culpa, eu leio a notícia e acho que Fernando Alexandre admite erros e, explicitamente, recusa fazer qualquer mea culpa.
“Lamento ter apresentado aquele dado. Obviamente que, se tivesse o conhecimento que tenho hoje das fragilidades dos sistemas de informação, não teria quantificado o objetivo [redução de 90%] por referência aos elementos do ano passado. Mas não me parece que tenhamos de pedir desculpas", dizem as jornalistas que disse Fernando Alexandre, ou seja, explicitamente recusa qualquer mea culpa.
E com razão, quem deve um mea culpa aos leitores são os jornalistas.
Fernando Alexandre comete dois erros, o primeiro, ter usado valores de referência que não foram solidamente verificados, o segundo, de que decorre o primeiro, foi ter confiado excessivamente nos serviços do ministério da educação.
Aparentemente, não há, neste Governo, uma consciência clara do que é hoje a administração pública portuguesa, que há anos é gerida por pessoas que não fazem ideia do que andam a fazer, porque saem directamente dos bancos da escola para as juventudes partidárias, daí para os gabinetes dos governos, daí para os cargos governamentais (na melhor das hipóteses, como nos casos de Fernando Alexandre ou Joaquim Sarmento, duas pessoas deste governo por quem tenho muita consideração (e que uso apenas como exemplo dos melhores), têm carreiras académicas sólidas, com ligações mais ou menos breves com o dia a dia da administração pública geral). A actual Secretária de Estado da Administração Pública não tem o curriculum que descrevi acima, é especialista em gestão de recursos humanos em contexto empresarial, e nunca trabalhou na administração pública.
O governo, aparentemente, desconhece o estado de decomposição da administração pública, com chefias de topo e, sobretudo, intermédias, cujo traço mais frequente é o apreço (na melhor das hipóteses, a complacência) pela mediocridade, de que resulta um convívio tranquilo com o lero, lero habitual dos documentos de gestão (comando e controlo, incluindo avaliação e auditoria) de que dou este exemplo, apenas por estar à mão: "À questão "1.2 É efetuada internamente uma verificação efetiva sobre a legalidade, regularidade e boa gestão?", o relatório, exultante com o êxito, responde: "A verificação tem lugar no quadro da segregação de funções que é assegurada pelas diversas unidades orgânicas no quadro das suas ações em cada momento dos processos que se interpenetram e reforçam o cumprimento dos princípios de legalidade, economia e eficiência, regularidade e boa gestão. A atuação do Gabinete de Auditoria e Desempenho, bem como os diversos normativos existentes nas áreas de suporte e nas áreas operacionais, contribuem para o processo de verificação, tendo decorrido em 2020 uma ação de auditoria interna, embora não tenha sido concluída".
A pouca e má informação de gestão que é produzida está centrada na captação de financiamento, sobretudo comunitário, e na garantia de que os dirigentes não são responsabilizados por coisa nenhuma.
Na peça que dá origem a este post, João Costa não poderia ser mais elucidativo: "“Todos os dados têm de ser vistos com muito cuidado para não se partir para declarações bombásticas que não estejam devidamente sustentadas. O meu tempo como ministro da Educação ensinou-me isto”, começa por dizer, corroborando a fragilidade dos sistemas de informação do ministério".
Não posso deixar de notar a diferença entre um politiquinho cuja única preocupação é defender a sua imagem pública (o problema da fragilidade dos sistemas de informação não é o facto de isso conduzir a má gestão, é resultar em declarações políticas mal sustentadas) e um responsável que, como Fernando Alexandre, tendo sido surpreendido pela fragilidade da informação que lhe é prestada, não atira responsabilidades pelo seu erro para terceiros, e diz que vai fazer uma auditoria a esse sistema de produção de informação.
O erro do governo anterior é estar-se nas tintas para a qualidade da gestão em políticas públicas, focando-se na capacidade de produzir declarações políticas favoráveis, o erro deste governo é acreditar que a administração pública, hoje, desempenha os serviços mínimos que lhe são exigíveis.
O erro dos jornalistas é fazerem uma manchete com declarações de Fernando Alexandre e só depois, em função das críticas da oposição, se dedicarem a verificar a solidez do que disse Fernando Alexandre.
Se, de forma sistemática, nomeadamente nos oito anos de António Costa, um especialista em declarações políticas que prometem amanhãs que cantam, sem se preocupar minimamente em concretizar o futuro anunciado, os senhores jornalistas questionassem as declarações políticas, coligissem informação, confrontassem os políticos com a informação objectiva ou mesmo com a ausência de informação objectiva que possa fundamentar o que os senhores políticos dizem, a política em Portugal teria muito melhor qualidade, e as políticas públicas seriam muito mais que anúncios sistemáticos de milhões para isto e aquilo.
Mea culpa, sim, mas por parte dos senhores jornalistas, seria um primeiro passo.
Por coincidência, o Observador tem duas peças sobre Lisboa, uma de jornalismo e outra de opinião.
Na que é jornalismo, diz-se que o PS diz que Moedas não cumpriu as promesas que fez, os compromissos que assumiu antes das eleições "não passavam de promessas de quem não contava ser presidente da maior câmara municipal do país".
O PS diz que Moedas, nestes três anos não conseguiu construir nada, vai deixar uma cidade sem obra e sem rumo, com lixo que se acumula, trânsito caótico e com preferência indisfarçável pelo alojamento local em detrimento de uma política de habitação acessível. Além disso, com degradação da situação financeira da Câmara.
Margarida Bentes Penedo, pelo contrário, num artigo de opinião fala de três anos de uma certa normalidade, fala das obras do Plano Geral de Drenagem, que estão em curso (não estavam antes), da comparação entre os zero centros de saúde feitos por Medina, dos 14 prometidos, contra os cinco já inaugurados por Moedas, três em construção e mais um adjudicado, da comparação entre a década de 2011 a 2021 em que se construíram 17 casas de habitação pública por ano, para comparar com as duas mil entregues por Moedas e 2800 famílias apoiadas com subsídio de renda, para além de umas cooperativas de habitação que estão a concurso, embora, até agora, sem candidatos porque as regras definidas pela oposição de esquerda, maioritária, dificultam muito o processo.
Que Margarida Bentes Penedo fale apenas do que acha que está melhor, é normal, é membro da coligação de Moedas.
O que me chateia, como leitor de jornais, é que a jornalista se limite a reproduzir o que diz o PS, sem avaliar criticamente a informação que recebe, perguntando se acham mesmo irrelevante que estejam a decorrer as obras do plano de drenagem, se acham que tudo o que Moedas tem feito, nomeadamente na entrega de casas, é apenas o resultado normal do que aconteceria com qualquer presidente de câmara, já que tinha sido tudo preparado por Medina, se a possibilidade de Medina inaugurar cinco centro de saúde, contra zero, resulta apenas de Moedas estar a apropriar-se do trabalho da vereação anterior (e, se assim é, não seria caso para dizer que o projecto recentemente apresentado para a Almirante Reis, por Moedas, não cabe no mesmo conceito de trabalho para a vereação seguinte, ou é irrelevante?), e por aí fora.
A mim, pobre homem da Póvoa, não me interessa muito que o jornalismo seja um mero retransmissor de coisas ditas por terceiros (é uma função relevante do jornalismo, claro, mas meramente instrumental e subsidiária), o que me interessa mesmo é que o jornalismo me tire o trabalho de verificar o que é dito por toda a gente.
E não entendo por que razão os senhores jornalistas se demitem de fazer perguntas, de ir aos sítios, de avaliar por si, apresentando as suas conclusões e os fundamentos para elas, não com o que cada um disse, mas com os fundamentos do que diz o jornalista, depois de verificar o que toda a gente disse com base em fontes independentes.
Portugal tem um bom nível de liberdade de imprensa. De facto, não há por cá presos por delito de opinião e as poucas pessoas condenadas por opiniões veem, normalmente, as suas sentenças revertidas pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos.
Tendo formalmente boas condições para o exercício da liberdade de imprensa, não creio que um jovem jornalista, a iniciar-se, tenha, de facto, as condições subjectivas para o exercício dessa liberdade.
Um factor, ainda que menor neste contexto, são as condições de baixos salários e precaridade. Eu penso que algum conforto económico é uma condição de liberdade e de não-condicionamento. Estando os media a viver momentos economicamente menos bons, não estarão em condições de proporcionar esse conforto que potencia a independência.
Mas não considero que esse seja o principal factor que limitaria a liberdade do nosso jovem jornalista. Na minha opinião, o principal factor é o enorme "groupthinking" que enferma a classe jornalística.
Imaginem o que seria de um jovem, com a natural necessidade de aceitação e validação social pelos seus pares, a colocar as questões incómodas e a ter uma perspectiva diferente da dominante.
Imaginem esse jovem a querer saber quais eram as queixas acerca dos ciganos na zona de Elvas, a ter questões acerca das vacinas ou a não ter Kamala Harris como referência. Facilmente seria olhado de lado nas redações, almoçaria sozinho e seria visto como muito pouco sexy e trendy. Seria apelidado de chegano, chalupa e trumpiano. Como as pessoas tendem a ajustar os seus comportamentos, o nosso jovem cedo abandonaria a quixotesca conduta e afinaria pelo diapasão dominante.
Sim, a liberdade não é feita só de condições objectivas, que, felizmente, até são boas por cá. Existe uma enorme dimensão subjectiva que poderá explicar muita coisa.
Montenegro disse qualquer coisa sobre o facto do aumento estatístico dos casos de violência doméstica poder resultar mais de um maior reporte que de um aumento do problema.
É uma afirmação perfeitamente banal, pode estar certa ou errada, mas em qualquer domínio da produção de informação se pode admitir que as alterações aos números reportados se podem dever a alterações de substância ou a alterações de reporte (e, por isso, é fundamental manter registos com a mesma base, sempre que é possível, para que possam serr comparáveis).
Os profissionais da indignação, por exemplo, Pedro Nuno Santos e Mariana Mortágua, rasgaram as vestes, que era inaceitável dizer isto e uma falta de respeito pelas vítimas (como se os problemas das vítimas de violência doméstica fossem o que dizem os políticos).
O que acho extraordinário é que Pedro Nuno Santos e Mariana Mortágua, cada um à sua maneira, são responsáveis políticos há tempo suficiente para terem uma quota parte de responsabilidade no governo do país, o que significa que se acreditam que o fenómeno da violência doméstica está a aumentar, isso não é da responsabilidade do governo mais recente, nem dos governos anteriores (os governos não determinam a evolução da sociedade, é a evolução da sociedade que determina os limites do poder dos governos), mas seguramente todas as políticas de combate ao fenómeno, pelas quais eles são parcialmente responsáveis, falharam no seu objectivo de limitar e, se possível, diminuir o problema.
Felizmente, o número de mortes relacionadas com violência doméstica, um indicador menos dependente da percepção do problema e das queixas, não parece dar razão aos profissionais da indignação.
E que tal se ganhassem juízo e preocupassem mais com a realidade que com os discursos?
Naquele tempo, comentavam alguns que o Templo estava ornado com belas pedras e piedosas ofertas. Jesus disse-lhes: «Dias virão em que, de tudo o que estais a ver, não ficará pedra sobre pedra: tudo será destruído». Lucas 21, 5
Agarramo-nos à iconografia do nosso tempo como se fetiches se tratassem. Pretendemos que o nosso tempo se deixe tomar para nós, como se fossemos suficientemente importantes. Chega a ser comovente como nos empenhamos a preservar as obras que nos foram significativas, livros, discos, filmes, pinturas. Restauramos os templos e os palácios, quantas vezes adulterados da sua essência, para se parecerem com o que queremos, para nos justificarmos para lá da nossa época. Somos todos assim: é por isso que os avós contam histórias aos netos, a filha guarda o anel que foi da mãe, e alguns até escrevem memórias… para amparar as paredes do Templo, ameaçado pela ruína, pelo fim.
“Aqueles que por obras valerosas se vão da lei da morte libertando” escreveu Camões a abrir os Lusíadas, o próprio a esculpir em pedra os feitos ímpares dos heróis portugueses, o próprio na obra que o viria a eternizar. Ou talvez não. O que é que fica no mundo gravado para sempre se o próprio planeta e universo são finitos?
Mas, descendo um pouco à terra, ao concreto, quantos dos nossos heróis resistirão na memória comum, depois da partida dos seus contemporâneos? Quantos dos nossos ídolos, no desporto, na literatura, na música e nos espetáculos em geral serão lembrados daqui a cem anos? Curioso como a maioria dos actores e actrizes, cantores e cantoras, escritores e cronistas, de grande sucesso no século XIX foram completamente esquecidos pela voragem do tempo e das novas modas?
E quisemos tanto preservar esses nossos heróis, partilhá-los entre amigos, para legitimar paixões vãs, ou até espúrias... Há uns tempos convidei a minha filha a ver comigo um filme que marcou bastante a minha geração, o Amarcord dirigido pelo cineasta italiano Federico Fellini em 1973. Dotada de sentido critico e interessada nas coisas das artes, certo é que ao fim de meia hora disfarçava mal a impaciência. Tentei então ver o filme pelos olhos dela, e apercebi-me da vulgaridade daquele guião, que sem o contexto que se vivia naquela década desconchavada, soava tão mal na inocência da miúda. Não viu o filme até ao fim e compreendi lindamente. O mesmo acontece com a maioria das centenas de discos e livros que guardo com esmero, cuja “validade” vai caducando aos olhos das novas impiedosas tendências. Talvez por isso há muito que deixei de comprar livros ou música nova, que acompanho com prudente equidistância. Quanto aos livros poupo o tempo para os clássicos e nos discos, além das paixões de juventude, cultivo os esquecidos cantores de vaudeville americanos e anónimos actores e fadistas gravados no princípio do séc. XX em goma-laca ou cera num fonógrafo. Perdido por um, perdido por mil…
Se é certo que nenhuma destas traquitanas, a que nos apegamos, a longo prazo terá qualquer valor, se é certo que aqui estamos de passagem, é indiscutível que na nossa alma nos advém a pulsão de construir, de preservar, de alcançar a eternidade.
De onde nos virá este impulso?
Na imagem: Mosteiro dos Jerónimos, ruínas causadas pelo desmoronamento do corpo central em1878
Não há vantagem nenhuma em ser pequeno e artesanal, é apenas uma circunstância num determinado momento.
Mas é isso que define a Montis, neste momento, um pequeno produtor artesanal de biodiversidade.
Como acontece com pequenos produtores artesanais, não tem recursos para fazer planeamento sofisticado, não tem recursos para fazer monitorização e avaliação extensiva, não tem recursos para produzir comunicação de elevada qualidade.
Concentra-se no essencial: ter um controlo suficiente sobre o processo produtivo e investir tudo o que tem na construção de uma boa reputação, na base da qual possa ir crescendo para um dia passar a ser um grande produtor de biodiversidade.
Amanhã apresenta resultados num colóquio sobre restauro de ecossistemas.
Não é sobre financiamento europeu com base numa lei maluca de restauro da natureza, é mesmo sobre a substância do restauro que se vai conseguindo fazer.
Mas como muita gente não quer ou não pode ir a Pampilhosa da Serra (a natureza é tão mais acessível num ecrán), sugiro que leiam a última actualização do que se anda a fazer na reconversão de uns eucaliptais sem interesse produtivo para uma coisa qualquer que produza mais biodiversidade.
Tecnicamente reconverter eucaliptais não tem dificuldade nenhuma (por isso é absurdo a insistência em misturar eucaliptos com invasoras agressivas, como acácias ou háqueas), é cortar, pulverizar a rebentação com glifosato e já está, o resto vem por acréscimo, mais devagar sem ajudas, mais depressa com ajudas.
Mas como a aplicação de químicos exige formação adequada e nem toda a gente está disponível para isso, a Montis tem ensaiado um método que qualquer pequeno proprietário pode executar numa propriedade sua, corte, seguido de eliminação da rebentação, partindo sucessivamente as varolas que forem aparecendo.
Demora mais tempo, mas qualquer um pode fazer, desde que esteja disposto a perder umas horas de vez em quando a fazer isso, e tem a vantagem dos eucaliptos funcionarem como bombas de nutrientes captados em camadas mais profundas e depositados à superfíce, quando se partem as varolas e se deixam no chão, isto é, em solos esqueléticos, uma introdução relevante de matéria orgânica.
Essa é uma das vantagens de ser um pequeno produtor artesanal, pode-se fazer o que se quiser, com muito mais liberdade e flexibilidade, e continua a ser verdade quando se produz biodiversidade.
O 25 de Novembro foi a vitória da esquerda moderada sobre a esquerda radical. Se situarmos isso em termos de partidos, terá sido a vitória do PS sobre o PCP e o Bloco (ao tempo UDP).
Porque é que, sendo assim, terá o PS tantos "mixed feelings" acerca da data, porque é que esta lhe é, actualmente, tão incómoda? É que o PS sabe que só poderá aspirar a regressar poder se o fizer de braço dado com os derrotados do 25 de Novembro. É essa a razão do incómodo, o PS sabe que não pode hostilizar os aliados de que precisa.
Acresce ainda a tal facto a personalidade de Pedro Nuno, irreverente, "gauchiste", algo inconsequente e irresponsável. O Pedro Nuno de 2024 talvez não esteja certo de que lado da barricada estaria um hipotético Pedro Nuno de 1975. O facto de, em 2024, não abraçar de forma inequívoca, e não-ambígua, o 25 de Novembro é a forma de Pedro Nuno desculpar o seu alter-ego que em 1975, de uma forma guerrilheira guevarista, ainda que eventualmente generosa, poderia ter estado no lado errado da barricada.
Na sexta-feira fui à antestreia do filme "Côa mais selvagem".
Conheço bem o realizador, João Cosme, uma das quatro pessoas que fundaram a Montis, um pequeno produtor artesanal de biodiversidade (a Montis, não o João Cosme, que é um óptimo fotógrafo de natureza, não um produtor de biodiversidade).
O filme é bastante interessante e há poucos filmes de natureza daquele nível em Portugal, só tendo sido possível por ser um filme da Rewilding Portugal.
A Rewilding Portugal é o ramo português da multinacional de comunicação, Rewilding Europe.
Conheço a organização há bastantes anos, tive muitas horas de discussão sobre a aplicabilidade da ideia base com Wouter Helmer, um dos seus mais importantes e interessantes ideólogos, e visitei, com outras pessoas, a primeira experiência de rewilding, nos Países Baixos, Oostvaardersplassen.
A razão directa para esta ligação é o facto de eu ter sido o director geral da ATN, exactamente na altura em que se estabeleceu a Rewilding Europe, que tinha a ATN como parceiro, até que o meu sucessor no cargo de director geral da ATN resolveu levar parceria, projectos e recursos para uma nova organização, a Rewilding Portugal, de que ainda hoje é o director executivo. Na altura já não tinha grande contacto com o dia a dia da ATN (continuo sócio, isto é, pago as minhas quotas) e portanto não sei os pormenores deste divórcio.
Acresce que um dos meus orientadores de doutoramento, Miguel Bastos Araújo, é um importante membro dos orgãos sociais da Rewilding Portugal, mas antes disso já era um grande defensor da existência de grandes áreas, pelo menos 100 mil hectares, sem intervenção humana, muito antes da existência das organizações que citei acima.
A ideia base da Rewilding Europe é bastante interessante (embora pouco original): aproveitar para ganhar espaço para a conservação da natureza no processo de abandono rural que se verifica, com o consequente regresso de muitos dos valores naturais que foram empurrados para as margens pela produção de alimentos e fibras.
Esta foi, aliás, a ideia inicial de Oostvaardersplassen.
O problema foi que a evolução dos sistemas não parecia caminhar-se para ecossistemas mais ricos, havendo probemas complicados, porque faltavam muitas peças ao sistema, em especial grandes ungulados e seus predadores.
Se a introdução de predadores de topo é sempre socialmente complicada, pelo contrário, fazer de aprendiz de feiticeiro refazendo espécies extintas mas simpáticas, como os auroques ou os cavalos pristinos, é uma ideia com enorme potencial de comunicação e apoio social.
É assim que a Rewilding Europe passa a ter como um dos seus grandes objectivos reintroduzir espécies extintas (o projecto Taurus consiste em fazer retro cruzamentos para ressuscitar o auroque, ou pelo menos um primo suficiente próximo), ou pelo menos espécies parecidas que cumpram as mesmas funções ecológicas, acabando a reintroduzir bisontes na Península Ibérica, questão bastante controversa.
Claro que ninguém anda a introduzir Taurus e Bisontes na natureza (muito menos elefantes, que a Rewilding Portugal pretende pôr no Altentejo, no quadro de um acordo qualquer com uma organização que recupera elefantes), o que se está a fazer são brincadeiras caras em espaços fechados, sendo os animais postos nesses grandes cercados tratados como gado, para efeitos legais.
Mas para efeitos de comunicação, e consequente apoio social e financeiro, é preciso dizer que se andam a fazer introduções, coisa que já a ATN fazia com vacas maronesas, cavalos garranos e sorraias, há bastante tempo.
Sem surpresa, nada destas opções se traduz em menor intensidade de gestão: os apoiantes destes projectos não estão disponíveis para ver os animais morrer à fome no Verão, não podendo os animais fazer grandes migrações, para sobreviver, como faziam antes da generalização da agricultura.
Para além de não terem predadores cuja dinâmica populacional interaja naturalmente com a dinâmica populacional destas populações de herbívoros.
Nada disto tem, em si, nenhum problema, desde que alguém esteja disposto a pagar, o que não vale a pena é vender a ideia de que isto é o futuro da conservação da natureza, apresentando filmes que apresentam os resultados de 70 anos de abandono agrícola como o resultado de quatro ou cinco anos de gestão rewilding.
Nem vale a pena dizer que têm muito bons resultados na gestão do fogo, e em cinco anos conseguiram diminuir a frequência e a intensidade dos fogos (uma contradição nos termos, porque a frequência e intensidade do fogo relacionam-se inversamente).
Muito menos se justifica a mistificação histórica que esquece todo o trabalho feito no Côa pela ATN, ignorando-a no filme produzido, evitando qualquer referência à Reserva da Faia Brava, uma das mais relevantes áreas de conservação do vale do Côa, ao mesmo tempo que se destaca o paul de Toirões que, por acaso, até nem é no vale do Côa.
Tenho muita simpatia pela ideia de rewilding, embora ache, há vários anos, que é uma ideia que não pode ser aplicada como pretende a multinacional de comunicação "Rewilding Europe" porque esquece interacções sociais relevantes, como o impacto dos grandes animais selvagens nas comunidades, e interacções ecológicas relevantes, como a ecologia do fogo.
Tenho menos simpatia pelo filial portuguesa da multinacional, a Rewilding Portugal, por razões institucionais, parece-me uma organização opaca que foge ao escrutínio por terceiros e, a partir de agora, tenho ainda menos simpatia pela tentativa de reescrever a história dos movimentos rewilding em Portugal, rasurando da fotografia a ATN e as pessoas que a criaram.
A ingratidão é uma coisa feia.
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São João
Naquele tempo, disse Pilatos a Jesus: «Tu és o Rei dos Judeus?». Jesus respondeu-lhe: «É por ti que o dizes, ou foram outros que to disseram de Mim?». Disse-Lhe Pilatos: «Porventura eu sou judeu? O teu povo e os sumos sacerdotes é que Te entregaram a mim. Que fizeste?». Jesus respondeu: «O meu reino não é deste mundo. Se o meu reino fosse deste mundo, os meus guardas lutariam para que Eu não fosse entregue aos judeus. Mas o meu reino não é daqui». Disse-Lhe Pilatos: «Então, Tu és Rei?». Jesus respondeu-lhe: «É como dizes: sou Rei. Para isso nasci e vim ao mundo, a fim de dar testemunho da verdade. Todo aquele que é da verdade escuta a minha voz».
Palavra da salvação.
Esta peça do Observador sobre o que eles chamam uma "guerra de números" entre o PS e o Governo é exemplar como ilustração da responsabilidade dos jornalismo na desvalorização do jornalismo.
Não, não é um problema de incompetência ou militância desta jornalista em concreto (que não conheço), é uma opção de desvalorização do papel de editor, isto é, de verificação independente de aplicação dos critérios jornalístico definidos pelo jornal antes de publicar alguma coisa.
A história é simples de contar: o Governo apresenta uns números sobre uma coisa, a oposição não gosta dos números e diz que são manipulações, o Governo diz quais são as suas fontes e sugere aos jornalistas que perguntem à oposição quais são as suas fontes e os jornalistas limitam-se a transmitir este ping-pong sem se dar ao trabalho de fazer aquilo que as pessoas esperam que o jornalista faça: avaliar as declarações de uns e outros, perguntar-lhes onde estão as fontes verificáveis do que dizem, consultar essas fontes, e concluir o que há de verdadeiro e obscuro em cada um dos lados.
A menos que eu tenha acesso fácil às fontes de uns e outros (e que perceba o que estão a dizer), eu, leitor, não tenho grande maneira de saber, com alguma segurança, quem anda a brincar com os números e quem está a ser sério.
Formei uma convicção: se o Governo diz estes são os números, a fonte é esta e podem verificar, e o que o PS diz não se percebe, acha que não é assim, que o governo está a aldrabar, mas não diz exactamente o que está certo ou errado nos números, o mais natural é que o Governo esteja a ser sério e o PS esteja a ser fiel a uma escola de mistificação da realidade que tem uma longa tradição no partido.
O problema é que esta minha convicção está fortemente influenciada pelo facto de conhecer Fernando Alexandre e Alexandre Homem Cristo há muitos anos e nunca os ter visto a fazer manipulações grosseiras de números, e também conhecer Alexandra Leitão há anos suficientes para não acreditar numa única palavra do que diz, sem confirmação prévia por fontes independentes.
Só que isso não garante nada, numa situação concreta os primeiros podem estar errados e a segunda estar certa, é por isso que preciso do jornalismo, para que, por mim, porque tem melhores instrumentos que eu para isso, vá validar o que é dito por uns e outros no caso em concreto.
A jornalista não o faz, não percebo porquê, e não há um editor no jornal que lhe diga que esse é o seu trabalho, ouvir uns e outros é apenas um passo intermédio para melhor poder fazer esse escrutínio, não substitui o escrutínio.
Ou seja, uma peça comprida, cheia de diligências mas que, no essencial, é inútil, ou pelo menos, muito menos útil do que poderia ser se a jornalista estivesse perfeitamente consciente de que o papel do jornalista não é ouvir pessoas, é escrutinar o que ouve das pessoas.
A discussão sobre o INEM é um bom retrato do país.
O INEM tem, há muito tempo, problemas muito grandes de pessoal, equipamento, informação, gestão, etc..
Tal como a generalidade do Estado, está num estado lastimável.
Como o jornalismo se tem especializado no ping-pong de declarações de meia dúzia de políticos, esquecendo a substância dos problemas (ver como o jornalismo trata a inacreditável reacção da FENPROF e do PS ao facto do Ministério da Educação ter apresentado números que revelam uma boa evolução do número de alunos sem aulas, pondo as suas declarações ao mesmo nível dos dados oficiais, em vez de referir que a FENPROF e o PS estão a martelar os números de forma inaceitável), o Estado pode estar em estado de ruína que não se nota muito, a não ser em serviços como as urgências ou o socorro médico.
Até ao dia em que um responsável comete, ou parece cometer, um erro, como se não fosse normal que se cometam muito mais erros quando se trabalha num estado de degração institucional e financeira como o que caracteriza, actualmente, o Estado português.
Nessa altura cai toda a gente em cima do responsável, não para perceber como tenciona o responsável gerir o problema para melhorar o desempenho, mas pedindo a sua demissão, como se o problema fosse a falta de qualidade do responsável e não o contexto miserável em que trabalha, e outro responsável qualquer, no mesmo contexto, não corresse o risco de cometer erros.
E é assim que o Estado não sai do estado de estupor em que vive, triturando quem quer fazer alguma coisa, na melhor das hipóteses promovendo quem é bom a resolver problemas e afastando quem é bom a evitar problemas.
Essa é a melhor das hipótese, na maior parte dos casos nem isso acontece, vai-se só promovendo quem convive bem com a mediocridade geral, especializando-se na nobre tarefa de nunca ser responsável por coisa nenhuma.
E é aqui que estamos (pessoalmente, do que mais me entristece é ver a Iniciativa Liberal alinhar nesta coisa de reivindicar demissões dia sim, dia não, a típica atitude populista de sinalização de virtude quando não se tem nada a dizer).
Preocupa-me o progressivo desaparecimento das referências cristãs no Natal pelas nossas paragens. Afonso Costa, cúmplice no assassinato do rei, exulta na sua campa, ou suspeito que não, porque não é possível alegria a quem arde no fogo eterno da Geena. Mas a minha preocupação não é tanto a questão da envangelização, mas a da viabilidade a longo prazo deste condomínio em que se vai transformando Portugal. Uma nação, requer uma alma, sabiam?
A pouco mais de um mês da grande festa do nascimento de Jesus Cristo, inspiração fundacional da nossa Pátria e do nosso continente, o que se vislumbra no espaço publico aqui e no resto da Europa, na comunicação social, nas montras e nas nossas ruas, é o império de uma simbologia pagã, o simples, mas irresistível apelo ao consumo e ao prazer niilista. A ausência da iconografia cristã no espaço público salta-nos aos olhos, grita-nos aos ouvidos. Daqui a pouco tempo ninguém reparará.
A diluição, a fraqueza da simbologia e referências que deveriam ser o denominador comum de um povo constitui um factor de decadência. Defendem os materialistas que a lei é o que basta para garantir esse chão comum, mas eu duvido. O que nos garante os mínimos de urbanidade, o cimento que liga as vizinhanças, as freguesias, as cidades, constituídas á volta de uma língua e de uma história? O que estamos a fazer á nossa língua e à nossa História? E o problema não são os imigrantes, somos nós próprios, que, entretidos nos pequenos interesses imediatos desistimos de um sonho comum. Os imigrantes, perante o vazio que encontram no lugar dos nossos símbolos, cuidarão de o povoar com as suas narrativas inspiradoras, na luta por uma vida com sentido.
Talvez eu esteja enganado, mas suspeito que o iluminismo racionalista concebeu a mecânica para uma monstruosidade inviável a médio prazo. Prescindimos da espiritualidade que sustenta a empatia e confiança entre os vizinhos. Encerrados em quartos, isolados e desconfiados, o condomínio não inspira ninguém a enfrentar ameaças ou aceitar riscos. Isolados e estéreis, satisfazemo-nos com o Marcelo e a Selecção, para levantarmos o sobrolho no intervalo do entretenimento.
Na imagem: "O Milagre de Ourique" por Domingos Sequeira (1793)
Fiz um comentário simples numa coisa em que uma pessoa qualquer eolgiava a coragem de alguém que no parlamento israelita criticava duramente a intervenção israelita em Gaza, fazendo o habitual número de citar a contabilidade de mortos.
O meu comentário era só a lembrar que para criticar o governo israelita, ou a política do Estado israelita, não é preciso grande coragem porque é um estado de direito com liberdade de expressão, coragem era preciso para criticar as políticas de utilização de escudos humanos do Hamas, Hezbollah ou Irão, em Gaza, no Líbano ou no Irão.
Sem surpresa apareceram logo uns corações muito grandes, cheios de fúria e amor, manifestando a sua ofensa pela morte de inocentes, sobretudo crianças inocentes.
Até aqui acho normal, mesmo que não seja evidente para mim que estas pessoas saibam que a definição de criança vai pelo menos até aos 18 anos, numa região do mundo em que se adere facilmente a organizações armadas com 14 ou 15 anos.
O que acho menos normal é o grau de irracionalidade usado para falar de uma situação imensamente complexa, em que não há bons de um lado e maus do outro, o que há é bons e maus em todos os lados, e vítimas inocentes em todos os lados.
"o importante é o facto do exército israelita ter assassinado milhares de pessoas, deixando feridos e/ou sem casas muitos mais, numa “guerra”/morticínio sem justificao possível nem objetivo claro (ver demissão do Ministro da Defesa de governo de extrema direita)", foi a abertura das hostilidades, com uma referência à extrema-direita incompreensível (será que se fosse a extrema-esquerda ou o extremo-centro a decidir tudo isto já seria menos dramático?), um manifesto exagero ao classificar as mortes de civis como assassinatos e não danos colaterais de uma guerra e a afirmação, delirante, de que não há qualquer justificação para a intervenção israelita em Gaza (estão por lá uns reféns, mas deve ser só para lhes proporcionar um bocado de praia, com certeza).
Perante a observação (factual) de que os ataques israelitas são precedidos de pedidos (ou ordens, como escreve frequentemente a imprensa) para que as populações civis abandonem algumas áreas, para além de grande parte das acções com mais potencial de provocar vítimas civis serem precedidas de avisos, a resposta é estranhamente absurda: "Israel avisa sempre? Nesse caso os 40.000 mortos palestinianos (incluindo talvez uns 1000 ou 2000 guerrilheiros) andavam distraídos".
É absurda no tom, é absurda na negação de uma coisa facilmente verificável (o aviso prévio às populações e o pedido de abandono das zonas de risco, frequentemente contrariado Hamas, que tenta manter a população civil nas áreas sob ataque, mesmo pela força) e é absurda na utilização dos números de vítimas: ninguém sabe bem os números de vítimas, mas existem estimativas que dos cerca de 30 mil combatentes que o Hamas tinha em Outubro do ano passado, pouco mais de metade tenham entretanto morrido, ou seja, dez vezes mais que o número evidentemente irrisório que é referido para dramatizar o que já é dramático à partida, a morte de civis inocentes.
"40 civis por cada soldado morto, não me lembro de guerra assim", diz-se ignorando o relativamente vizinho Sudão, só para não ir muito longe, nem no espaço, nem no tempo, para já não falar do ataque do Hamas a Israel que foi exclusivamente centrado no ataque a civis.
"Israel só quer matar", diz-se sem medo de que afirmações tão absurdas possam minar a credibilidade do que é dito, conhecendo-se os factos referidos acima que demonstram o cuidado do exército israelita evitar mortes civis (e pode nem ser por razões morais ou de respeito pelas leis da guerra, pode ser mesmo porque a morte de civis é um enorme problema reputacional para Israel, que qualquer pessoa com dois dedos de testa tentaria evitar).
Eu sei que discussões sobre assuntos tão polarizados são sempre difíceis, mas será impossível que pessoas razoáveis, sensatas, informadas, façam um esforço de rigor na avaliação da situação, de modo a permitir a discussão civilizada de assuntos difíceis?
É que se isso for impossível, significa que estamos condenados a conversar sobre o tempo, ao mesmo tempo que os problemas reais da sociedade crescem como tumores que nem sempre é possível resolver mais tarde, sem dor.
Um oficial de alta patente, cuja identidade não revelo, contou-me um dia (sem pedir segredo) que nas vésperas do 25 de Novembro almoçara, num conhecido restaurante de Famalicão, com um grupo de civis nortenhos para preparar a defesa do que todos julgavam então iminente: uma iniciativa militar da Esquerda, talvez a guerra civil. Demos por assente que os ditos civis eram, todos eles, membros do "tenebroso" ELP, ou do MDLP de Spínola (que depois até foi marechal...).
Muito mais recentemente, confrontei o Gen. Pezarat Correia com este facto. E sempre sem revelar em público a identidade do oficial, forneci a Pezarat todos os dados curriculares que lhe deram a garantia de que eu sabia do que falava. Pezarat entupiu: na sua viciada comunicação nesse ciclo de conferências, concluía afirmando que o ELP tinha sido a derradeira manifestação terrorista em Portugal. Omitiu, pois, as FP/25; e não queria que se soubesse que a ala moderada do MFA (a do Grupo dos 9) dera a mão aos tais "terroristas" para vencer a Esquerda revolucionária.
Acresce, o oficial cujo nome não revelo, foi um eanista de alma e coração com quem discuti até á exaustão, eu um sá-carneirista convicto.
Ou seja, o 25 de Novembro limpou o 25 de Abril de todas as impurezas marxistas-leninistas e assegurou, entre muito mais, a efectividade da nossa liberdade e do direito a escolhermos livremente. Sem o 25 de Novembro, quiçá tivessemos de esperar pelo Muro de Berlim, para que cá a ditadura caísse também.
Agora (anteontem) o BE surgiu a anunciar, heroica e patrioticamente, na evocação dessa data - a única em que houve efectivamente combate entre militares, os Comandos e a PM do Major Tomé!!! - será representado apenas por um deputado, e só mesmo para deixar claro que discorda da comemoração...
O nédio Vasco Lourenço regrediu aos tempos do "Melena y Pá" para também se manifestar contra - porque, diz ele, quem festeja o 25 de Novembro são aqueles que o MFA queria pôr de lado. E oculta, assim, todas as manobras com os civis da Direita, bem explicáveis pelo facto de na outra margem do Tejo fervilharem os operários com as suas "boas mãos" armadas com as célebres G3 roubadas.
Tudo para dizer que falta ainda um "25". De que mês não sei; mas o que nos devolva a liberdade subtraída pelos wokes, a ditadura do "politicamente correcto", o modo habilidoso de acabar com a nossa cultura mesmo depois da ditadura do proletariado falir. Queremos poder continuar a gostar de caça, toiros, pesca, cavalos, corridas de galgos e quejandos; e não queremos esta opressão das palavras bem medidas sob pena de sermos acusados de homófobos, xenófobos, anti-ambientalistas, de sermos vítimas dessa nova fobia urbana e das manobras experimentalistas com que a Esquerda vai dando cabo da cidadania.
"As montanhas temperadas e mediterrânicas oceânicas estão a ser deglutidas pela Acacia dealbata, por vezes, secundada pela A. melanoxylon, Cortaderia e por Paspalum, e outras gramíneas de fora. E pela regeneração de semente de Eucalyptus, não vale a pena meter a cabeça na areia".
O que cito é de Carlos Aguiar, das pessoas que mais respeito no mundo da conservação da natureza e um dos melhores botânicos e ecólogos do país (declaração de interesses, conheço-o há muitos anos, foi um dos orientadores da minha tese de doutoramento, e o que lhe devo em compreensão do mundo rural é incalculável, em especial naquilo em que Carlos Aguiar é único, o conhecimento que tem das interacções entre a química do solo e a vegetação).
Na altura em que o Carlos escreveu isto não fiz qualquer comentário, mas à segunda referência à questão das invasoras, resolvi fazer este post.
A estratégia de gestão das invasoras (para efeitos deste post, estou sobretudo a falar das plantas lenhosas invasoras, mas muito do que digo é parcialmente aplicável a todas invasões biológicas que estão a ocorrer) tem um traço comum com algumas das estratégias de gestão do fogo ou de controlo de epidemias.
Sendo certo que é muito mais fácil e eficaz controlar invasoras (ou fogos, ou doenças contagiosas) no início do processo de invasão, as estratégias para as invasoras assumem como primeira prioridade controlar a entrada de invasoras num novo território (ou as ignições, ou os contágios).
Tal como no caso do fogo ou das epidemias, há um erro central nesta estratégia, o de não se aceitar que haverá sempre focos (ou ignições ou contágios) que fogem desse controlo inicial, e depois é tudo uma questão de gestão e contexto.
No caso das invasoras o problema central não está em estar tudo cheio de acácias ou háqueas, que progridem explosivamente pós-fogo, o problema está na falta de gestão e nos conceitos de gestão errados que esquecem o contexto, esquecem a doença, para se concentrar nos sintomas.
Por exemplo, a reverência ao mainstream de que o Carlos dá mostras ao referir o eucalipto (que se expande lentamente por semente e cuja expansão é fácil de controlar), tem consequências concretas quando o Fundo Ambiental inclui o controlo de eucalipto no financiamento a projectos de controlo de invasoras, desviando recursos que são mais que escassos para gerir uma ameaça real e explosiva (a expansão de háqueas e acácias) para os aplicar numa ameaça inexistente e facilmente controlável (a expansão não económica do eucalipto).
A questão não está em financiar o controlo de invasoras, a questão está em criar contextos menos favoráveis à expansão de invasoras, o que significa, forçosamente, encontrar sustentabilidade económica para actividades que possam resultar no controlo das invasoras, seja pelo seu uso e gestão, seja pela reconversão de áreas que possam representar melhores opções para o seu proprietário que o abandono.
Tal como no fogo, ou nas epidemias, o caminho que temos pela frente é aprender a conviver serenamente com estas ameaças, compreendê-las, perceber em que contexto se desenvolvem desfavoravelmente para nós, e encontrar as tecnologias, o conhecimento e os modelos de gestão que nos permitam limitar os seus efeitos negativos.
É disto que se trata, de aumentar a nossa sabedoria, reconhecendo que saberemos sempre menos do que precisaríamos e podemos sempre menos do que desejaríamos, o que nos impede, felizmente, de criar mundos de risco zero.
O título disto é retirado deste texto de Nuno Gonçalo Poças, um dos mais interessantes cronistas que por aí andam (se tiverem dúvidas, leiam a crónica da semana passada, "Um desabafo").
Uma das grandes virtudes do Observador foi ter dado visibilidade a gente fora da bolha mediático-jornalística que, por isso mesmo, tem pontos de vista que vale a pena conhecer.
Por isso não percebo para que raio o Observador segue a tendência de outros jornais e põe jornalistas que no seu trabalho jornalístico se concentram em dar as suas opiniões, a escrever artigos de opinião redundantes.
O que me interessa é realçar uma questão que não me parece inteiramente clara no dito texto de Nuno Gonçalo Poças, porque o texto se centra no sector da educação: "O Governo, que tem, neste sector, as pessoas mais capazes que podia ter, é quem pode cortar o mal pela raiz, ou atenuá-lo de alguma forma.".
A greve, historicamente, é uma recusa de trabalho que visa prejudicar o patrão, mas a regulamentação sindical em Portugal, e a relativa paz social nas empresas, conduziu a um sistemático abuso sindical do direito à greve, que é usada por sindicatos que representam muito pouca gente, para obter ganhos políticos, prejudicando os utilizadores dos serviços públicos.
É inacreditável como dirigentes sindicais se mantêm dezenas de anos no mesmo sítio, sem que ninguém saiba muito bem que estranhos mecanismos de democracia interna levam a que Mário Nogueira ou Joana Bordalo e Sá (que tem dez vezes mais tempo de antena nas televisões que os responsáveis do Ministério da Saúde, tal como Mário Nogueira, no caso da educação) se mantenham, sem concorrência, nos mesmos postos electivos.
É inacreditável como os mecanismos de financiamento sindical, de sindicatos sem representatividade relevante, permitem que existam tantos sindicalistas profissionais, cuja ligação aos trabalhadores, e à vida quotidiana das pessoas que pretendem representar, seja pouco mais que uma miragem.
É inacreditável como não há jornalismo que investigue quer a democraticidade, quer a representatividade, quer o financiamento de sindicatos.
Não me parece que Montenegro, cuja estratégia tem sido a de adormecer os eleitorados potenciais dos adversários, sem perder muito do seu próprio eleitorado, vá comprar uma guerra com os sindicatos, mas é uma questão de tempo até que enfrentar os sindicatos, tal como existem e que infernizam a vida dos mais pobres e frágeis de forma sistemática como estratégia de sobrevivência, seja eleitoralmente benéfico.
Nessa altura não se queixem se o refluxo não levar os aspectos bons do sindicalismo na enxurrada, dentro do velho princípio de que a revolução é o preço a pagar por não reformar nada.
Parece que entre os comentadores, jornalistas e afins, não há dúvidas de que foi um erro brutal e infantil o Governo não ter previsto os efeitos das greves do INEM e Função Pública, chegando ao extremo de confundir as regras aplicáveis às diferentes estruturas sindicais (o que ainda não percebi é como se definem serviços mínimos para horas extraordinárias que, por definição, são voluntárias).
Na extraordinária argúcia de quem não tem dúvida de que era fácil prever o que aconteceu no INEM, sem que se apercebam da pornografia moral de juntar ao cocktail a classificação como erro primário a demissão de Fernando Araújo, não porque estivesse a fazer um trabalho extraordinário que toda a gente reconhece, mas porque era um bom escudo para ilibar o governo de responsabilidades (a sério, eu não sei mesmo se esta gente tem a bússola moral avariada, ou se é mesmo estúpida e não percebe o que está a dizer), a responsabilidade é da Ministra ou do Governo por não ter visto o que, depois de acontecer, era uma evidência.
Partamos então do princípio de que se o governo tivesse sido diligente, veria imediatamente o que iria acontecer nos dias seguintes à emergência médica e foi incompetente e irresponsável.
Pode ser.
Se isso era assim tão claro (vamos esquecer que não me lembro, antes e depois da campanha eleitoral, de alguém, incluindo Fernando Araújo, ter dito que a prioridade não era estabilizar as escolas e as polícias, mas o INEM), o que podemos concluir sobre a responsabilidade sindical associada à convocação da greve?
O sindicato tinha consciência dos efeitos da greve e mesmo assim convocou-a?
O sindicato convocou a greve, sabendo dos seus efeitos potenciais, e esforçou-se por informar os responsáveis políticos desses efeitos?
O sindicato sabia que os serviços mínimos do pré-aviso de greve eram insuficientes para assegurar o socorro e limita-se a dizer que se o governo quisesse podia contestar?
Não há por aí jornalistas interessados em perguntar qualquer coisinha aos sindicatos sobre a sua responsabilidade na situação criada e a consciência dos efeitos potenciais das suas opções sindicais?
Ontem o Observador tinha um texto meu que, modéstia à parte, embora comprido, até nem me pareceu mau, acho que saiu catita.
"podemos escolher dois ambientes: eucaliptais e pinhais com um ecossistema resinoso e combustível ou, um ecossistema de carvalhos e castanheiros com um ecossistema fresco e com sombra, não combustível.
...
O meu argumento é: espécies resinosas e combustíveis plantadas intensiva e extensivamente provocam incêndios. Carvalhais, soutos e sobrais são uma alternativa lógica.
...
o ambiente desenvolvido num eucaliptal e pinhal é mais combustível do que num carvalhal".
São comentários habituais nas discussões sobre fogos, e não adianta muito continuar a discussão, a generalidade das pessoas que repetem estes argumentos jamais deixarão que os factos influenciem as suas ideias, portanto manterão sempre esta ideia, muito difundida, embora claramente errada de acordo com o que se conhece hoje sobre ecologia do fogo.
Não me interessa, por isso, rebater estes argumentos mas voltar a uma linha de discussão a que já em tempos dediquei alguma atenção.
Como disse, os argumentos estão tecnicamente errados, mas vamos partir do princípio de que estariam certos e que seria bom cobrir o país de carvalhais para resolver os problemas de gestão do fogo, essa seria a nossa utopia.
Estabelecida a utopia, é preciso discutir o que fazer para se passar da situação actual para a utopia desejada.
Vamos admitir que um carvalhal maduro se faz em trinta anos (não faz, a não ser em condições muito favoráveis, mas relembro que estamos no domínio da utopia).
Para um prazo tão curto, é preciso plantar, retanchar (a taxa de sobrevivência de plantações de quercus, sobretudo sem rega, como seria forçoso numa plantação florestal em larga escala, é bastante baixa) e gerir nesses trinta anos, tendo em atenção que em trinta anos o mais natural é que haja dois fogos (a taxa de retorno anda, em média, por volta dos 12 a 15 anos).
Ou seja, antes do carvalhal estar maduro e a sua sombra controlar parte dos combustíveis finos, como se faz essa gestão?
Como se paga? Quem a paga? Com que técnicas? Como se lida com os mais que prováveis fogos intermédios? Que efeito têm na evolução do povoamento?
É isto, mesmo que a utopia estivesse certa nos seus pressupostos (que não está), a chatice da realidade sobrepõe-se à beleza da utopia, para aconselhar um caminho diferente que evite andar a gastar recursos numa ideia cuja viabilidade, em larga escala, é praticamente nula.
Acontece muito com as utopias.
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Pois, meu caro. Na altura é que a gente vê como re...
Viajavam dois imigrantes e as agressões focaram-se...
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