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O "caso" da transparência da Ana Moura tem uma dimensão estética, discussão essa na qual não tenho interesse em participar.
Mas tem também uma dimensão de discussão acerca dos limites da liberdade individual que, essa sim, me interessa.
Saber se é legítimo, e socialmente aceitável, envergar, num evento supostamente glamoroso, um vestido/ transparência que permite deslindar os seios é motivo de discussão. Para mim é claro que sim, usar uma transparência num momento glamoroso, ou fazer topless na praia, deveria ser entendido como algo normal, sendo que normal significa, neste contexto, algo parte da liberdade individual, que não deveria levantar ondas, nem discussões que ultrapassassem as do domínio da estética.
Regressando ontem de uma viagem vi que, por cá, não é bem assim e que o FB estava ao rubro com a indumentária de Ana Moura.
Uma discussão destas é uma discussão acerca de normas sociais. Em vários países muçulmanos, ainda que moderados, as normas sociais impedem que as mulheres andem de cabelo destapado. Já em culturas muçulmanas mais restritivas impede-se mesmo que a mulher mostre o rosto. Eu gosto de viver num país onde as normas sociais concedem a homens e mulheres um espaço de liberdade relativamente amplo.
Lamentavelmente, estamos a assistir no Ocidente a uma restrição progressiva das liberdades. Essa restrição é provocada por uma pinça que tem uma haste esquerda assim como uma haste direita. A esquerda propõe-nos uma cultura de cancelamento e higienista. Muita da direita, moralista e cheia de falsos pudores, também não preza especialmente a liberdade.
Curiosamente, as maiores críticas que ouvi à indumentária de Ana Moura partiram de mulheres. E, reforço, não me estou a referir a críticas com base estética, estou-me a referir a críticas em matérias "de costumes". Conforme a História já demonstrou muitas vezes, a ideia de que as pessoas querem ser "libertadas" é, em muitos casos, uma ficção. Há, quase sempre, um certo síndroma de Estocolmo que leva o prisioneiro a apaixonar-se por quem, ou por aquilo, que o aprisiona.
Mandaram-me uns vídeos e fotografias, mas não fui lá ver, preferia ter ido eu, mas não é possível.
Achei ontem que ia hoje fazer um post sobre isto, depois de ver fotografias e videos, mas depois vi que Paulo Fernandes tinha dito o essencial, portanto mais vale usar os bonecos dele e o texto dele, ficando eu só com o encargo de fechar o assunto, dizendo que me parece.
Primeiro os bonecos, depois o texto de Paulo Fernandes
"Testemunhos do campo
O incêndio com início em Gestaçô, Baião, é interessante pela prevalência de carvalhos e outras folhosas sobre outras espécies florestais. A 1ª foto mostra o panorama generalizado da severidade do fogo em carvalhal, nas formações mais representativas (5-10m de altura). O negro mais evidente registou-se em matos, nomeadamente em giestais de grande porte e, tal como na serra da Arada, é possível observar muitos efeitos topográficos, como numa das fotos abaixo [acima] na qual o verde é comum ao eucalipto (direita), pinheiro (centro) e carvalho (esquerda).
No Carvalhal de Reixela, uma bela relíquia de 50 ha, observei a auto-extinção numa secção do perímetro virada a norte/oeste e em terreno côncavo, incluindo linha de água corrente. Na parte virada a este o panorama foi diferente e muito semelhante ao da 1ª foto [aqui a quarta], portanto com dessecação total das copas (e combustão, na presença de giestas) mesmo sendo as árvores bastante mais altas. Uma evidência particularmente forte da importância da posição topográfica."
Quem quiser ter uma visão deste carvalhal antes do fogo pode dar um salto aqui.
Por que razão fiquei com vontade de fazer um post quando vi o video e as fotografias pós fogo?
Porque me pareceu ser uma boa demonstração de uma ideia que tem sido muito difícil de explicar.
Depois de todos os grandes incêndios aparecem dezenas de fotografias de manchas de folhosas não ardidas, como penhor da ideia (errada) de que se o país estivesse coberto de carvalhos, o problema dos fogos seria muito diferente.
Independentemente da discussão sobre a forma como se pretenderia passar dos cerca de 60 mil hectares de carvalho para uns cinco milhões, e do que isso significaria para o dia a dia das pessoas, a verdade é que essa ideia está errada de base porque as razões que estão na base da existência dessas manchas de folhosas são as mesmas pelas quais são, frequentemente, poupadas pelos fogos: são manchas reliquiais que foram ficando (ou regenerando a partir do abandono de terras agrícolas), onde a humidade e o solo são favoráveis ao desenvolvimento das árvores e desfavoráveis à progressão do fogo.
Uma das fotografias, como aliás comenta Paulo Fernandes, documenta como esse efeito topográfico se verifica com qualquer espécie.
O que tem de interessante esta sequência, apoiada pelo comentário, é que com um coberto semelhante - não é igual, a área menos afectada tem carvalhos maiores e o carvalhal parece mais maduro, aparentemente porque é a zona mais húmida e protegida, que favorece o crescimento dos carvalhos e tem piores condições para a progressão do fogo - há diversidade de intensidade e severidade do fogo, de acordo com o previsto na teoria.
O carvalhal ardeu (não de forma especialmente intensa, "copa crestada mas não consumida a não ser na parte inferior nalgumas árvores") e ardeu com mais intensidade nas zonas topográficamente menos favoráveis ao desenvolvimento das árvores e mais favoráveis à progressão do fogo.
Se por um passe de mágica conseguíssemos transformar cinco milhões de hectares em carvalhais maduros, aquilo a que assistiríamos era a variações do fogo em carvalhal semelhantes às que já hoje vemos nos matos e noutras espécies florestais, com as zonas mais sombrias e húmidas a arder menos intensamente (ou a não arder) e as zonas mais secas e expostas a arder mais intensamente, mas haveria muito fogo no país nos dias em que as condições meteorológicas fossem extremas (incluindo com projecções e essas coisas características de fogos intensos com muito material combustível disponível).
A questão continua a ser a mesma: do ponto de vista da gestão do fogo (do ponto de vista de biodiversidade as coisas são diferentes), onde houver acumulação de combustíveis finos, com estrutura adequada, arde intensamente quando as condições meteorológicas são extremas (em particular, com secura severa e ventos fortes) e onde essa acumulação for menor, arderá com menor intensidade.
Claro que o ensombramento é uma boa maneira de controlar o crescimento da vegetação (por outro lado implica rescaldos mais difíceis porque a manta morta fica incandescente mais tempo, mesmo sem chama, sendo mais difícil a detecção dos pontos quentes pós fogo) e isso pode ser obtido em carvalhais maduros de forma mais eficiente que em pinhais ou eucaliptais (mas menos eficiente que em povoamentos de pseudotsuga, por exemplo), o que levanta questões muito interessantes sobre como diminuir o tempo até à formação de um carvalhal suficientemente adulto para que tenha um fecho de copas e um ensombramento relevante.
Essa é, no entanto, uma discussão de terceira ou quarta linha (um dia destes faço um post sobre a forma como a Montis tem lidado com isso, em diferentes propriedades) porque neste momento, não tendo uma varinha mágica, temos uma emergência social clara que implica expandir a área de gestão de materiais finos.
Já agora, das fotografias o que se depreende é que o carvalhal ardeu, em algumas áreas de forma intensa, mas vai recuperar rapidamente em duas ou três primaveras.
Para quem tenha a paciência de me ler, aqui vão os meus cinco tostões para o peditório emergente das eleições presidenciais de 2026:
Não sendo tradição em Portugal o Chefe do Estado ser o responsável pelo governo do País, cabendo-lhe “apenas” um papel de mediação e de representação (sei bem das ambiguidades da constituição semipresidencialista quanto aos limites da sua actuação) é para mim um profundo enfado o ritual quinquenal da luta partidária para o lançamento das putativas candidaturas ao cargo. É como se a Nação fosse obrigada a encarar uma mudança de bandeira ou de hino a cada cinco anos.
Por alguma razão facilmente se intui a tese corrente de que os portugueses reelegeriam continuamente um presidente da república com mediana popularidade e razoável sentido de Estado até que uma doença o incapacitasse ou a morte o levasse, não fosse o limite constitucional dos dois mandatos. Para dar um exemplo ao gosto dos republicanos mais empedernidos, não fosse essa limitação legal, é difícil imaginar Mário Soares, se lhe fosse possível continuar a concorrer, alguma vez derrotado. “O povo português é sábio”, diz por aí a opinião publicada, quando é do seu interesse. O povo português é intrinsecamente monárquico, digo eu…
“O povo português é sábio” quando não é ignorante e volúvel, e é por isso que periodicamente as “elites” têm de se impor à força para o educar, para o curar dos maus vícios e ignorância, como aconteceu no 5 de Outubro de 1910, quando esses generosos revolucionários cuidaram até de mudar os símbolos nacionais. A Nação com 800 anos, há muito consolidada na língua e nas fronteiras, tudo parece aguentar com assinalável bonomia ou conformismo. Até umas eleições para a Chefia de Estado, que no fundo, no fundo, não nos interessa muito. Andamos há oito anos a afeiçoarmo-nos aos modos e idiossincrasias do presidente que nos calhou em sorte e agora os partidos esguedelham-se para lá pôr outro, o seu, quando já tínhamos assimilado o Marcello? Não há direito…
Evidentemente que a agitação política que umas eleições presidenciais proporcionam têm a vantagem de animar o jornalismo e comentariado político, é uma mina para parangonas de jornais e debates televisivos, que gradual e inevitavelmente atrairão algum interesse do português médio conformado, mesmo sabendo que as promessas de “amanhãs que cantam” pelos candidatos, são panaceia, entretenimento, uma democrática “fantasia benigna” a que todos afincadamente nos dedicaremos a tentar levar a sério. Afinal de contas, ao Chefe do Estado Português, mesmo no nosso ambíguo sistema semipresidencial, não cabe governar. Cabe representar o seu povo com dignidade e parcimónia.
Ao contrário do que se pensa, o nosso actual regime semipresidencialista é herança da monarquia liberal, característica que os autores da Constituição de 1976 acharam por bem repescar. A sua ambiguidade durante o “Liberalismo”, permitiu estilos de reinados bastante diferentes: o do Rei Dom Luís, que grosso modo se limitou, mantendo higiénica distância, a deixar os partidos governarem. Já o seu sucessor, o rei Dom Carlos, para mal dos seus (nossos?) pecados, usando-se dos instrumentos constitucionais e da magistratura de influência, teve a veleidade de querer reformar o regime em acelerada degradação. Pagou isso com a vida.
Talvez fosse tempo de olharmos para o nosso regime de Chefia de Estado e conferir-lhe mais dignidade. Vivemos todos bem entretidos, mas verdadeiramente não sabemos se um dia será mesmo necessária.
Publicado no Observador
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo S. Marcos
Naquele tempo, João disse a Jesus: «Mestre, nós vimos um homem a expulsar os demónios em teu nome e procurámos impedir-lho, porque ele não anda connosco». Jesus respondeu: «Não o proibais; porque ninguém pode fazer um milagre em meu nome e depois dizer mal de Mim. Quem não é contra nós é por nós. Quem vos der a beber um copo de água, por serdes de Cristo, em verdade vos digo que não perderá a sua recompensa. Se alguém escandalizar algum destes pequeninos que creem em Mim, melhor seria para ele que lhe atassem ao pescoço uma dessas mós movidas por um jumento e o lançassem ao mar. Se a tua mão é para ti ocasião de escândalo, corta-a; porque é melhor entrar mutilado na vida do que ter as duas mãos e ir para a Geena, para esse fogo que não se apaga. E se o teu pé é para ti ocasião de escândalo, corta-o; porque é melhor entrar coxo na vida do que ter os dois pés e ser lançado na Geena. E se um dos teus olhos é para ti ocasião de escândalo, deita-o fora; porque é melhor entrar no reino de Deus só com um dos olhos do que ter os dois olhos e ser lançado na Geena, onde o verme não morre e o fogo nunca se apaga».
Palavra da salvação.
Um comentário simpático reza assim: "Gostaria de deixar aqui um testemunho que vivi num dos últimos verões quentes ainda antes do desastre do pinhal de Leiria. Paramos com a minha sogra para apanhar umas pinhas numa estrada secundária absolutamente deserta e ao fim de algum tempo verifico o aparecimento de um fogo na caruma a mais ou menos 15 metros de nós, posso assegurar que não havia ninguém e que nenhum de nós fumava ou tivesse algo que pudesse provocar. Até hoje me interrogo como foi possível. Felizmente estava ali e acabei em poucos minutos por evitar um desastre".
O mais provável é que alguém lá tivesse estado antes e tivesse deixado uma pequena brasa para trás, sem dar por isso (uma ponta de cigarro, uma brincadeira de crianças, um motor desafinado, seja o que for).
Isto acontece permanentemente todos os dias do ano, o território está encharcado de ignições, e sempre estará (eu não conheço nenhuma análise à solidez da actividade bancária que se centre na actividade dos ladrões de bancos, toda a gente sabe que existem, com certeza há um enquadramento legal que permite reprimir essa actividade, mas não há um único banqueiro que organize o seu banco no pressuposto de que o essencial é acabar com os ladrões, porque não há assaltos sem ladrões).
Vou então seguir o conselho de Teresa Andresen e falar de tabaco.
Acho que toda a gente sabe que quando se chega uma chama à ponta de um cigarro, não se forma uma labareda instantânea, pelo contrário, a chama tem energia suficiente para fazer uma brasa na ponta do cigarro, mas a disposição do combustível é demasiado densa para que se passe da brasa à chama, falta oxigénio naquela combustão.
Os grandes apreciadores de charutos guardam os seus charutos em caixas climatizadas com o objectivo de manter a humidade perfeita para que a combustão do charuto seja a que se pretende, tal como os fumadores de cachimbo calcam o tabaco e os enroladores de cigarros se esforçam por garantir que o tabaco fica suficientemente aconchegado, o que é o mesmo que dizer que o cigarro tem alguma densidade, para não queimar excessivamente depressa e com demasiada intensidade.
Em nenhum caso se forma uma chama, e um charuto pode demorar tempos infindos a acabar, tal como uma cachimbada, dependendo da humidade do tabaco, e da oxigenação que é proporcionada pelo facto de chupar o ar numa ponta implicar a entrada de mais oxigénio na outra ponta, onde está em curso a combustão.
Um cigarro esquecido num cinzeiro vai destruindo a capacidade da combustão progredir, apagando-se, excepto se o cinzeiro estiver numa zona ventosa que garanta a oxigenação (em qualquer caso, sem produzir chama porque a estrutura do combustível e a sua humidade não o permitem).
Agora destruamos o cigarro e espalhemos o papel e tabaco num caldeirinho que seja possivel arejar e cheguemos-lhe uma chama. A combustão é bastante mais rápida, mas talvez não chegue para incendiar o monte de tabaco e papel que fizemos, porque a humidade do combustível o impede.
Então sequemos primeiro esse material numa estufa ou num forno.
A partir de certo grau de humidade e arejamento, conseguimos incendiar o cigarro que não se incendeia na sua forma original: a quantidade de combustível é a mesma mas a sua estrutura não (permitindo a oxigenação, como quando não se calca o cachimbo) e a sua humidade não (porque secámos o material).
Explicado isto, falemos agora de microclimatologia.
O vento é ar em deslocação, o ar quente sobe, o ar frio desloca-se para ocupar o espaço criado pela subida de ar quente, e forma-se uma brisa.
Todos nós conhecemos isto porque vamos à praia: a água tem bastante inércia térmica, portanto aquece mais lentamente que a areia da praia, durante o dia, e arrefece mais lentamente, durante a noite.
Portanto, durante o dia há tendência para haver uma brisa no sentido do mar para a praia (geralmente fresca e mais húmida), e durante a noite o sentido é inverso (atenção estou a falar de brisas relativamente fracas, que podem ser facilmente anuladas por ventos mais fortes, não relacionados com factores locais mas com a dinâmica geral da atmosfera).
Nos relevos mais acentuados, o processo é semelhante, do vale para os cabeços: os vales arrefecem menos de noite e aquecem mais durante o dia, portanto formam-se brisas de encosta em direcções opostas durante o dia e durante a noite (o que é acentuado pelas "gotas" de ar frio que se formam nos cabeços, a zona de maior irradiação nocturna, o ar arrefece e vai pingando pela encosta abaixo, como qualquer pessoa experimentada em passar a noite ao relento já sentiu, com certeza, o que se explica pelo facto do ar frio se comportar como um líquido viscoso).
Perdoem-me esta longa explicação, que ajuda a perceber como uma brasa se pode manter horas sem formar chama, progredindo lentamente e, ao mesmo tempo, que há variações nocturnas relevantes nos ventos que podem oxigenar a combustão que está a ocorrer sem chama.
Eu sei que há pessoas que acham que só um estúpido imbecilizado põe em dúvida que todos os fogos nocturnos sejam fogos postos, o que sugiro é que pensem que talvez não tenham toda a informação necessária para ter opiniões tão seguras sobre processos naturais complexos e a sua interacção com sociedades igualmente complexas.
E não é a eleição para um cargo autárquico que consegue, magicamente, transformar o conhecimento de uma pessoa sobre o assunto, é preciso mesmo ir à procura de informação.
A prova inelutável de que estamos a convergir com a Europa é que, pela primeira vez, partilhamos os mesmos problemas. Em vez de nos exasperarmos com a nossa pobreza relativa, já nos apoquentamos com os números da imigração. Estamos praticamente a ficar ingleses. Os ingleses também estão a empobrecer. Se isto não é convergência, o que é convergência?
O mundo ocidental tem que fazer escolhas difíceis, mas descobriu a salvação evadindo-se para uma escolha fácil: a extrema-direita. Só a extrema-direita e a extrema-esquerda oferecem um mundo simplificado em dois tons: o preto e o branco, o mal e o bem, o desejável e o indesejável. Não há que hesitar, não se requerem quaisquer trade-offs. Basta alistarmo-nos na cruzada contra os sarracenos do “sistema”, os quais, como uma hidra sabida, têm várias cabeças. Corta-se uma, nasce outra.
Envelhecidos ou monoparentais, os narcisos sem bebés não querem o influxo demográfico do estrangeiro pós-colonial. Cada um na sua casa, queixamo-nos do contributo negativo do Alojamento Local para a crise da habitação. Em breve decrépitos, queremos que o Estado, através dos filhos dos outros, cuide de nós. Pensões serão de miséria sem crescimento económico. E crescimento económico é difícil de conceber com uma pirâmide demográfica invertida.
Com o eleitorado envelhecido e rancoroso (nós), será cada vez mais difícil travar a pressão para o aumento da despesa corrente e dos impostos. Nenhuma reforma será consentida. A corrida para o fundo será acelerada, com a economia a estiolar. Os jovens que podem fugir fugirão. Os jovens que querem entrar não o conseguirão fazer.
(...)
Talvez os ativistas credenciados nas sociologias patrocinadas pelos impostos cobrados à imunda economia ingressem na vida produtiva, dando do mesmo passo descanso ao padre António Vieira, ao Camões e à língua portuguesa, serva e perpetuadora do patriarcado pós-neocolonial. Quem sabe?
Não se discute nada de jeito. Esmolas maiores ou menores são atiradas dos parapeitos do Estado. São as gémeas. São os eucaliptos. São as comissões de inquérito. É o grande capital. É a falta de capital. Deus nos acuda.
Sérgio Sousa Pinto a ler na integra aqui no Expresso
"Uma vez que o valor que propõe não cobre nem de perto nem de longe os custos para limpar 1 hectare, não acha que se corre o risco com essa proposta de apenas remunerar os hectares que já são atualmente limpos e de não contribuir para a limpeza de novos hectares?"
Esta pergunta que é feita num comentário ao meu post anterior é muito boa e, por isso, resolvi fazer este post.
Em primeiro lugar, deixem-me começar por esclarecer esta frase: "o valor que propõe não cobre nem de perto nem de longe os custos para limpar 1 hectare".
O valor que proponho, 100 euros por hectare, de três em três anos, é uma mera base de trabalho, se não houver interessados em receber este dinheiro é porque o valor é baixo e deve ser aumentado, se houver muitos, é porque o valor é alto e deve diminuir.
Sendo um valor razoavelmente arbitrário, deve ser testado na realidade, ele não é absurdo, parte do princípio de que as operações de gestão devem ser feitas com uma periodicidade de três a cinco anos (depende da produtividade primária) e se é um valor absurdamente baixo em relação ao custo das limpezas moto-manuais (devem andar facilmente pelos 900 a mil euros por hectare), não é um valor excessivamente baixo em relação a outras operações de gestão, deve andar pelo custo de uma operação mecanizada com grade de discos, e não anda longe dos valores de custo do fogo controlado (dependem muito da área a tratar e do contexto).
Como a proposta não pretende que se faça gestão de matos sem objectivos definidos, e como não se pretende criar rendas, parece-me razoável estabelecer este valor.
Vamos então ao fundo da questão: mas isso não vai apenas remunerar quem já faz gestão de combustíveis?
O objectivo primário da proposta é esse, o de remunerar quem já faz gestão de combustíveis. Por mim, para não ter já os anti eucaliptistas aos gritos, podemos excluir do apoio as operações feitas de forma mecanizada em plantações comerciais com mais de cinco hectares. Para não ter os ambientalistas com dois dedos de testa aos gritos (os outros gritam sempre, portanto é irrelevante), podemos excluir do apoio quaisquer operações de degradam a camada superficial do solo.
Admitamos então que a proposta tem como único efeito pagar o serviço de gestão de combustíveis a quem já o faz.
O resultado que se pode esperar não é apenas o do aumento da riqueza de quem faz essas actividades (e isso seria socialmente relevante, estamos a falar de pastores, resineiros, trabalhadores florestais, pequenos empresários, com rendimentos frequentemente baixos), que depois se transmite, pelo menos parcialmente, às suas comunidades (as tais que se queixam de ninguém lhes liga, aquilo a que se chama interior, mesmo que seja em Albergaria a Velha, que está a poucas dezenas de quilómetros do mar).
O que se pode esperar é que, sendo essas actividades mais compensadoras, os agentes económicos existentes expandam as suas actividades e apareçam novos agentes económicos interessados, porque a actividade é mais compensadora.
O que esta proposta pretende é isto, injectar economia na actividade de gestão florestal, com o mínimo de interferência nas opções das pessoas e empresários.
Os impactos, positivos e negativos (os negativos prendem-se essencialmente com a potencial criação de rendas geradoras de ineficiência) dependem da magnitude dos valores que se definam, ou seja, do preço que se defina para o pagamento do serviço de gestão de combustíveis, razão pela qual eu defendo um mecanismo de adaptação permanente que se aproxime de um mercado financiado pelos contribuintes.
Por volta 2030, mais ano, menos ano, o país terá um problema muito sério de fogos, se entretanto não mudar de vida.
A questão central é a acumulação de materiais finos, em quantidade e estrutura favorável à progressão do fogo.
Esquecendo a questão das ignições, que não interessa grandemente (sobre as famosas ignições nocturnas vale a pena transcrever que o Paulo Fernandes escreveu um dia destes: "O grave problema dos incendiários noctívagos - % dos fogos nocturnos causados por incendiarismo imputável = 23% (16% durante o dia) - % da área ardida total correspondente aos fogos com início nocturno (todas as causas) = 9,7% - % da área ardida nocturna total que tem origem em incendiarismo (incluindo inimputável) = 3,8%"), sobra a questão chave que é a acumulação de combustíveis finos.
Antes de começar, duas fotografias recentes (penso que de Rui Ventura), destes fogos em São Macário, onde são visíveis duas parcelas, uma em cada fotografia, que tinham sido tratadas com fogo prescrito, para deixar bem claro que o fogo não é todo igual, nem todo o mesmo efeito.
Uma abordagem acredita que a actividade económica pode garantir a gestão de combustíveis. É uma abordagem que tem a seu favor o exemplo da produção comercial de eucalipto, em que as propriedades das celuloses terão uma prevalência de fogo de cerca de um quarto da média nacional, e a seu desfavor meio milhão de hectares de sucata florestal de eucalipto que arde como o resto.
O que isto indicia é que o limiar de sustentabilidade económica, mesmo na fileira florestal mais adaptada ao regime de fogo existente e ao contexto social e económico prevalecente, é tão baixo que não consegue, sequer, ter metade da sua área gerida com propósito e resultados.
Noutras fileiras a situação é pior (o montado é um sistema agro-silvo-pastoril e, consequentemente, ocupa um lugar particular na discussão da gestão florestal porque não é produzido pela gestão florestal, mas pela produção pecuária e, eventualmente, agrícola), com o pinheiro a garantir áreas muito menos significativas de gestão, nas zonas que lhe são especialmente favoráveis.
Os usos alternativos à produção de pau ou resina, têm alguma expressão local em algumas regiões (como o castanheiro no Nordeste, e o pastoreio em algumas áreas do país), mas estão longe de ter a expressão que seria necessária para que consigamos ganhar controlo sobre o fogo.
Muitas das propostas que têm virtudes, sobre alteração da estrutura de propriedade, fiscalidade e coisas que tais (excluindo aldrabices como a biomassa), mesmo que fossem facilmente aplicáveis, nunca teriam qualquer efeito de diminuição da carga de combustível até ao próximo episódio meteorológico que seja especialmente favorável à progressão do fogo (simplificando, tempo extremamente seco com ventos fortes, durante mais de dois dias).
Um plano de emergência para o fogo, que não deve ser confundido com um plano para acudir às emergências resultantes do último fogo, deveria ter um, e apenas um, objectivo: aumentar a área de gestão de materiais finos.
Tudo o resto até pode ser muito importante (eu não acho, mas é uma mera opinião de um gajo de Alfama), mas não é urgente.
E é aqui que entra a proposta de pagar directamente a gestão, sem complicações, em função de um resultado a atingir: ter menos de 50cm de altura de materiais finos no terreno.
Não paga o corte ou queima de todos os materiais em todos os terrenos?
Não, não paga, nem é esse o objectivo, é apenas reduzir de forma extensiva a carga de combustível, criando pirodiversidade e aumentando as oportunidades de combate, alavancando as actividades que já existem.
Com esta proposta tornamos as actividades que gerem combustíveis mais competitivas - pagando-lhes um serviço de interesse geral, não é nenhum subsídio, é o pagamento de um serviço - e ganhamos controlo sobre o fogo.
O resto é só o resto, no sentido que lhe deu aqui Reinaldo Ferreira: "Mínimo sou, Mas quando ao Nada empresto. A minha elementar realidade, O Nada é só o resto".
Episódios de fogos dramáticos - insisto que desta vez foram só dois ou três dias de condições desfavoráveis e os ventos não estavam muito fortes - geram muita confusão depois, como demonstra Tiago Oliveira na sua tese, num gráfico muito interessante que liga a quantidade de produção legislativa e a ocorrência de anos maus de incêndios.
Com o PS, de maneira geral dominam grandes proclamações de reforma da floresta que acabam por traduzir-se em reforço do combate, proibições várias, medidas estruturais, no papel, e projectos delirantes assentes no dinheiro dos contribuintes, no que diz respeito à gestão da paisagem (até se produzem coisas interessantes, como este relatório em que se empenhou fortemente o meu amigo Pedro Bingre do Amaral. Quem conheça as nossas relações pessoais um bocado agitadas pode pensar que aquele "amigo" é irónico, mas não é, temos fortíssimas divergências, mas o Pedro é, de entre as pessoas que acho que têm uma perspectiva errada do problema, das que produzem informação mais interessante).
Com o PSD vem a conversa autárquica e bombeiral dos incendiários, das ajudas, dos apoios, da necessidade de dar poder aos autarcas para fazer o que está certo (que já têm, mas como custa dinheiro, o que na verdade estão a dizer é que querem que o Estado central lhes entregue dinheiro para se substituírem aos proprietários, em vez de o Estado central pagar directamente aos proprietários o que pretende que seja feito), queiram ou não os proprietários, a conversa dos fundos, de apoiar quem está no terreno, da criação de emprego no interior, e etc.
Independentemente de algumas diferenças há grandes coincidências que se mantêm, em especial a desvalorização do conhecimento científico produzido (a forma como tanto responsável político tem estado a ignorar o trabalho de Cristina Soeiro sobre o perfil do incendiário é extraordinária, mas mais extraordinária é a forma como a generalidade dos jornalistas enfiam a treta pela goela abaixo sem pestanejar e confrontar os responsáveis políticos com a informação objectiva produzida) e o endeusamento do conhecimento de inspiração divina, que de estudo não é, que autarcas e responsáveis de bombeiros têm sobre como gerir o fogo, compreendendo o seu comportamento e a sua ecologia.
Por tudo isto, um dos assuntos que recorrentemente aparece na discussão são as centrais de biomassa (por exemplo, veja-se a última missa dominical do grande especialista de economia rural e fogos, Marques Mendes).
Face à evidência avassaladora de que temos um problema sério de ausência de gestão, ou sub-gestão, dos materiais finos que alimentam o fogo, há duas grandes linhas de pensamento, e uma pequena, pequeníssima comunidade que vai defendendo o pagamento público de um serviço público, directamente aos que o prestam.
As duas linhas de pensamento dominantes, reconhecendo que estamos perante um problema de ausência de criação de valor associada à gestão de matos, querem criar valor para essa actividade, mas sem pôr os contribuintes a pagar essa gestão.
Uns acham que as terras marginais são rentáveis, é só o seu contexto administrativo e de propriedade que impede os amanhãs que cantam, portanto empenham-se em discussões intermináveis sobre fiscalidade e direito sucessório com o objectivo de criar um proprietário novo, o proprietário que ganha dinheiro a gerir mato, uma vez liberto dos constrangimentos que o tolhem.
Outros acham que é preciso valorizar a biomassa, portanto, encontrar-lhes um destino economicamente radioso, os mais sofisticados torram dinheiro num laboratório ali para os lados de Coimbra, para conseguir produzir combustíveis a partir do mato, os mais básicos pedem centrais de biomassa.
Judiciosamente, Paulo Fernandes costuma lembrar que o fogo florestal e a central de biomassa têm dietas diferentes, o que o incêndio quer é combustível fácil e rapidamente inflamável para que a chama seja transmitida a partir de quantidades de energia libertadas relativamente baixas, a central de biomassa quer material denso, com elevado potencial energético, para maximizar a produção de energia aumentando o tempo de residência da chama.
Ou seja, a optimização económica de uma central implica ter materiais grossos o mais perto possível da central, a optimização do incêndio florestal acontece quando existem materiais finos onde Judas perdeu as botas.
Sobre isto, convém ter em atenção que os tais materiais finos que alimentam o fogo florestal, e dificilmente alimentam uma central de biomassa (nos seus tempos áureos, a central de biomassa de Mortágua tinha uns 2% de matos no mix de combustíveis que a alimentavam), são sobretudo ar e água e têm baixo potencial energético, o que significa que os custos de transporte disparam para uma criação de valor em energia muito baixo.
Cortar mato é caro, transportar mato para o transformar em energia é ainda mais caro, razão pela qual as centrais de biomassa que podem ser competitivas não se alimentam de combustíveis finos trazidos do fim do mundo, mas estão associadas à valorização de resíduos de actividades que concentram biomassa a partir de outra actividade que tira partido do produto principal (por exemplo, serrações, fábricas de processamento de madeira, seja para que fim industrial for, etc.).
As únicas centrais de biomassa que podem ter interesse para ganharmos controlo sobre o fogo são centrais que se deslocam ao sítio onde estão esses materiais finos e os consomem sem necessidade de operações caras de corte.
Felizmente existem, têm quatro patas e chamam-se cabras.
Paguemos esse serviço a quem as pastoreia e conseguimos muito mais resultados, de forma muito mais barata.
Estou em que o calado armazém na berma da estrada fechara já. Ou, por qualquer razão, não apresentava sinais de vida, deixando os portões ao serviço dos mais atrevidos. Nada era de realce senão o seu imenso canteiro cheio de cor e originalidade. Quase uma miragem nos pragmáticos povoados do Centro. Por ali, um nada além de alguns utilitários estacionados, o grande Volvo abatido ao efectivo. Sepultado e florescendo assolapadamente.
Não houve como não atentar no jarrão. Adivinhavam-se muitos quilómetros de andamento, uns tantos toques de escultura pós-neo-realista na carroçaria... O resultado, a carcaça de uma viatura produto fino da alta burguesia encobrindo-se na imparável trepadeira de glórias-de-amanhã.
É um sinal. O sinal de que a revolução verde está em marcha encobrindo, batalhando, esverdeando. Como outra revolução qualquer. Se o filme findasse aqui, gozaria de toda a simpatia do caricato. Até talvez fosse inspirador. Mas, creio bem, a película acabará em pneus e estofos podres e metal ferrugento somente disfarçados; ou então numa bonita trepadeira amarfanhada pelo reboque serôdio que veio buscar a sucata.
Isto é, em Portugal, ou melhor, na República Portuguesa, os meios artísticos e a Natureza pisam caminhos díspares. Andam nos extremos, não se conciliam, destroem-se mutuamente, não há quem lhes segure o freio. Um automóvel pode ser um vaso florido ou uma chocadeira de ratazanas. Dependendo tudo sempre do ponto de vista de quem vai a votos contra quem antes os ganhou.
Por mim, os restos mortais do Volvo já agora ficavam, com as devidas cautelas sanitárias e uma certeza: todos os "Bordalos" que nos infestam teriam de rever o seu portfólio.
Um dia destes fui entrevistado durante quase uma hora por Vítor Gonçalves sobre fogos.
Para além de muitos comentários simpáticos (por exemplo, um dos meus irmãos disse-me que o entrevistador era tão bom que eu até parecia inteligente, sensato e sabedor) e palmadinhas nas costas, houve bastantes comentários contestando a entrevista, como é normal numa matéria controversa.
Frequentemente não se contestam os argumentos que usei, e uma hora dá para bastante por onde pegar, eu próprio sou capaz de identificar meia dúzia de erros (alguns lapsos evidentes) e imprecisões, o que se contesta são as falhas de carácter que me fazem dizer o que digo, de que é exemplo este artigo, no Expresso, escrito por uma especialista em fogos que desconheço mas sei que é "residente em Lisboa, 50 anos [esta informação não deve estar actualizada], licenciada em Relações Internacionais pelo ISCSP e pós-graduada em Comunicação, Cultura e Tecnologias de Informação pelo ISCTE. Foi professora, jornalista, assessora de imprensa e atualmente exerce funções de representação internacional no setor das telecomunicações (ANACOM)".
Onde eu cito Paulo Fernandes (um dos cinquenta cientistas mais influentes do mundo em ecologia do fogo), José Miguel Cardoso Pereira, Tiago Oliveira, António Salgueiro, Nuno Gracinhas Guiomar e outros, com sólido e incontestado curriculum relacionado com o estudo e a gestão do fogo, Marta Leandro cita Jorge Paiva (que não tem uma linha de investigação científica relacionada com ecologia do fogo), Helena Freitas (que desconheço que alguma vez tenha publicado uma linha de trabalho científico ou técnico sobre fogo, a sua gestão e o seu papel ecológico) e a minha colega Manuela Raposo Magalhães que, essa sim, foi coordenadora de um projecto relacionado com fogo (Scapefire), que se distingue por uma grande originalidade: envolve dezenas de investigadores e técnicos, mas nenhum deles tem qualquer curriculum, trabalho e investigação sobre ecologia do fogo.
Os comentários mais divertidos são os dos "corações muito grandes cheios de fúria e amor" (parafraseando Jorge de Sena), que escrevem inflamadas acusações e teorias de conspiração sobre a simultaneadade das ignições detectadas por satélite, sem fazerem a mínima ideia de que essas ignições são registadas pelo satélite em simultâneo, não porque ocorram ao mesmo tempo, mas porque é a hora que o satélite passa.
Tudo visto e ponderado, as grandes críticas não são ao que eu digo mas, por falha de carácter que me leva a ser um vendido aos interesses, ao facto de eu não alinhar com teorias de conspiração sobre ignições (leiam Cristina Soeiro, caramba) e dizer que muito mais importante que a composição do coberto florestal, é a quantidade e estrutura dos combustíveis finos (argumento que é simplificado, por quem se empenha na demonstração pública das suas virtudes, na afirmação falsa de que eu digo que arde tudo por igual).
Sobre este último assunto, durante esta entrevista, mandaram-me as fotografias abaixo que ilustram o que qualquer pessoa que estude o assunto diz, mais assim ou mais assado.
O que temos então nestas fotografias?
Na primeira, eucaliptal gerido, com pouca afectação de fogo, numa matriz de vegetação autóctone , e provavelmente não autóctone, (incluindo as áreas de vegetação natural mantidas na plantação ao longo das linhas de drenagem natural), sobreiral mediana a severamente afectado na segunda e sobreiral com combustíveis finos completamente incinerados na terceira, mantendo a biomassa de maior diâmetro, todas as fotografias provenientes do mesmo fogo, o fogo de Alferce/ Monchique de 2018.
Resumindo a sequência de imagem, não é por falha de carácter que passo o tempo a contestar ideias românticas sobre o efeito do fogo na vegetação, é porque tenho amigos que sabem muito mais que eu e passam o tempo a mostrar-me que o que eu pensava, e tinha aprendido na escola, não se verifica na realidade.
Seja em coisas mais complexas, como este artigo fundamental do Paulo Fernandes, já com uns valentes aninhos, seja em fotografias que me mandam durante um programa de televisão, para me ajudar a ilustrar as teses que vou repetindo a partir da investigação e criação de conhecimento de quem realmente estuda o assunto.
Dou de barato que eu seja um pulha vendido aos interesses, discutir isso não interessa a ninguém (se nem a mim me interessa, imaginem aos outros), mas não é seguramente a negar infantilmente que a terra anda à volta do Sol, porque é óbvio que qualquer pessoa pode verificar que é o Sol que anda à volta da terra, que se consegue demonstrar que os cálculos de Kepler não têm validade.
Leitura da Epístola de São Tiago
Caríssimos: Onde há inveja e rivalidade, também há desordem e toda a espécie de más ações. Mas a sabedoria que vem do alto é pura, pacífica, compreensiva e generosa, cheia de misericórdia e de boas obras, imparcial e sem hipocrisia. O fruto da justiça semeia-se na paz para aqueles que praticam a paz. De onde vêm as guerras? De onde procedem os conflitos entre vós? Não é precisamente das paixões que lutam nos vossos membros? Cobiçais e nada conseguis: então assassinais. Sois invejosos e não podeis obter nada: então entrais em conflitos e guerras. Nada tendes, porque nada pedis. Pedis e não recebeis, porque pedis mal, pois o que pedis é para satisfazer as vossas paixões.
Palavra do Senhor.
Teresa Andresen ligou-me um dia destes a chamar-me a atenção para o facto da forma como eu falo sobre ignições e a sua relação com a gestão do fogo poder beneficiar da utilização de exemplos mais próximos da experiência pessoal da maioria das pessoas que me estarão ouvir, sugerindo que eu falasse antes de cigarros em vez de ervas.
Brevemente farei uso desse conselho inteligente, mas antes gostaria de fazer dois ou três comentários sobre a forma como a minha escola, a escola de arquitectura paisagista portuguesa, se tem relacionado com o fogo e a sua gestão, afastando-se daquilo que era uma prática muito comum na primeira geração de arquitectos paisagistas, a discussão e conversa inter-pares de que é exemplo a inconfidênca com que comecei o post.
Parte do pensamento da minha escola está bloqueado pelo peso do que foi a intervenção social dessa primeira geração de arquitectos paisagistas, em especial por uma reverência a Ribeiro Telles que se compreende - mas a que o própio nunca obedeceria - impedindo a saudável evolução intelectual das bases fundamentais da profissão.
Aos argumentos preferem-se, frequentemente, as citações, lembrando-me sempre da epígrafe da minha tese de licenciatura, dos diários de Camus (ainda fui dar uma vista de olhos na estante onde sei que está esse livro, mas entre livros em segunda fila, fotografias várias e outra quinquilharia, iria perder muito tempo à procura dessa citação) sobre o facto de aos historiadores que se debruçavam sobre realidades concretas se sucederem os professores de história que se debruçam sobre os historiadores, ou qualquer coisa do género.
Uma das mais frequentes citações de Ribeiro Telles nas discussões sobre fogos é esta:
""A limpeza da floresta é um mito.
O que se limpa na floresta, a matéria orgânica?
E o que se faz à matéria orgânica, deita-se fora, queima-se?
Dantes era com essa matéria que se ia mantendo a agricultura em boas condições e melhorando a qualidade dos solos. E, ao mesmo tempo, era mantida a quantidade suficiente na mata para que houvesse uma maior capacidade de retenção da água.
Com a limpeza exaustiva transformámos a mata num espelho e a água corre mais velozmente e menos se retém na mata, portanto mais seco fica o ambiente. A limpeza tem de ser entendida como uma operação agrícola. Mas esta floresta monocultural de resinosas e eucaliptos, limpa ou não limpa, não serve para mais nada senão para arder. Aquela floresta vive para não ter gente."
Haveria vários comentários a fazer sobre a evolução do conhecimento entre a altura em que estas declarações são feitas e o dia de hoje (as declarações são de uma entrevista a Ribeiro Telles na sequência dos fogos de 2003), mas o que me interessa é concentrar-me no que se sabia nessa altura (e nessa altura já Ribeiro Telles lia pouca pouca investigação sobre o assunto, há muitos anos) sobre o papel ecológico do fogo e o que hoje é ponto mais ou menos assente entre quem se dedica a estudar a ecologia do fogo.
É claríssimo que Ribeiro Telles olha para o fogo como um elemento de destruição no ecossistema, "deita-se fora, queima-se?", pergunta a propósito do que fazer à matéria orgânica que se acumula.
Esta concepção do papel ecológico do fogo já estava desactualizada em 2003, mas era ainda matéria de alguma controvérsia de base científica, hoje é uma concepção que se considera totalmente obsoleta (amanhã não sabemos, Egas Moniz, o médido português que ganhou o Nobel da Medicina, ganhou-o pelos avanços numa técnica da medicina cuja aplicação "em grande escala é hoje considerada como um dos episódios mais bárbaros da história da psiquiatria". Já agora, Egas Moniz nunca defendeu essa aplicação em larga escala).
O que hoje é do mais chão consenso é que o fogo é um processo ecológico fundamental de renovação dos sistemas, diferindo da mais amada decomposição orgânica na velocidade e libertação de energia, mas não no essencial: os dois processos consistem na quebra de cadeias químicas complexas que permitem alimentar o solo e as plantas com nutrientes em formas químicas elementares mobilizáveis pelas raízes das plantas.
Queimar e deitar fora não são, de modo algum, a mesma coisa, queimar é renovar o sistema fertilizando o solo, desde que a intensidade da queima seja controlada, sobretudo através da humidade disponível.
Persistir em citar Ribeiro Telles, desistindo de compreender melhor a realidade, para melhor a transformar, não é nenhuma fidelidade ao legado de Ribeiro Telles, é uma forma insidiosa de o trair, porque o legado de Ribeiro Telles é um legado de curiosidade permanente, de vontade de mudança, de aprendizagem sistemática, de compreensão do mundo que permita separar o que é permanente do que é contingente, condição sine qua non para uma gestão sustentável da paisagem e das comunidades que a moldam e transformam.
O respeito pelos "mayores", como diriam os espanhóis, ou os "mais velhos", como diriam os moçambicanos, não consiste em procurar cristalizar o produto do seu trabalho, consiste em respeitar os fundamentos sobre que trabalharam, sem medo do escrutínio permanente da sua validade.
Para grande tristeza minha, a minha escola não se tem distinguido particularmente pela capacidade de inovação, nomeadamente na produção de pensamento sobre o fogo enquanto elemento estruturante da evolução e gestão da paisagem, repetindo acriticamente mantras sobre ordenamento do território, da paisagem, da floresta, sem se dar conta de que onde outros entendiam o ordenamento como "a arte de ordenar o espaço exterior em relação ao homem" (sublinho bem, em relação ao homem, e ao homem concreto, e não com base no amor incomensurável pela humanidade em geral e o mais profundo desprezo por cada pessoa em concreto), hoje é dominante a prática de um ordenamento que é um processo administrativo de imposição coerciva, aos seus gestores, de uma paisagem idealizada por terceiros.
Tudo isto tem uma história. Nos meados do século XIX, fora das áreas de cultivo, Portugal tinha uma paisagem de areais, charnecas e cumeadas nuas, muito adequada para impressionar os estrangeiros pela poeira que era capaz de produzir. Foi essa desolação que o Estado decidiu alcatifar de árvores. Para não demorar, escolheu espécies de crescimento rápido, como o pinheiro e mais tarde o eucalipto. Os primeiros incêndios foram atribuídos à má vontade dos pastores, que não gostaram de ver os serviços florestais vedarem as serras e os baldios para onde levavam os rebanhos. No fim do século XX, a revolução florestal cruzou-se com o êxodo rural: às árvores do Estado, juntou-se o matagal sempre em expansão dos campos abandonados. Num país de Verões quentes e ventosos, com um relevo de acesso difícil, o resultado foi os fogos tornarem-se tão recorrentes no Verão como a gripe no Outono. (...)
A demagogia adora planos tonitruantes – prisões em massa, novas revoluções florestais. Não recomendo que se deixe tudo na mesma. Mas não seria preferível começar por apurar estratégias com o objectivo mais realista de, em caso de incêndio, proteger povoações, garantir vias de comunicação, e salvaguardar o património natural valioso? Para isso, porém, teremos talvez de desaprender a lição do velho Marx, e compenetrar-nos de que convém compreender o mundo antes de tentar transformá-lo.
Rui Ramos no Observador
Uma interessante análise de Eça de Queiroz sobre o pensamento político do seu amigo Ramalho Ortigão. Intelectual céptico e crítico, Ramalho jamais aderiu ao republicanismo, aliás, um sentido convergente ao pensamento de Oliveira Martins e de Antero de Quental. Mesmo Eça, cuja apologia do positivismo dominou nas primeiras obras, evoluiria para uma igual descerença nas revoluções. Nestas linhas, o autor ainda está longe de conhecer a evolução política no século XX, pois que seria importante acrescer o amadurecimento intelectual de Ramalho que testemunha a crise da Primeira República e o nascimento do Integralismo Lusitano que subscreve em "Carta de um Velho a um Novo", em resposta ao jovem amigo João do Amaral, então convertido à monarquia. Igualmente monárquica despontará a geração desencantada com a república como António Sardinha, Homem Cristo Filho e Alfredo Pimenta.
"Em Política, tem-se dito que Ramalho Ortigão é republicano. Nada menos exacto. Ramalho, creio, teme a república, tal qual é tramada nos Clubes amadores de Lisboa e Porto. A república, em verdade, feita primeiro pelos partidos constitucionais dissidentes, e refeita depois pelos partidos jacobinos, que tendo vivido fora do poder e do seu maquinismo, a tomam como carreira, seria em Portugal uma balbúrdia sanguinolenta. (...) O que Ramalho mais tem odiado e invectivado na política é a retórica: é o que o exaspera no Constitucionalismo: e a prodigiosa caricatura que tem feito da retórica parlamentar, da retórica ministerial, da retórica régia, da retórica burocrática, é que lhe tem dado a fama republicana. Não penso porém que ele fosse hostil ao sistema, se o sistema não tivesse um tão desordenado fluxo labial. Se o sistema trabalhasse praticamente, em lugar de perorar com furor, estou convencido que Ramalho não o importunaria (...). Se Ramalho tem guerreado a retórica conservadora, não tem poupado a retórica democrática, que não é em Portugal menos nociva: é a sua vaga fraseológica idealista, que mantém tanto moço estimável num humanitarismo enevoado e sentimental, em que aspiram a ver toda a Europa livre, sem pauperismo, sem guerra e sem prostituição, sentando-se em banquetes fraternais, presidido pelos génios (...) É ainda a remota influência deste lirismo democrático que faz dizer aos conservadores de cinquenta anos, com o sorriso melancólico de quem fala em amores defuntos: - Ah a República é uma bem formosa quimera!"
(in, Eça de Queiroz, "Notas Contemporâneas" , 'Ramalho Ortigão (Carta a Joaquim de Araújo)', 3º Edição, 1920, Porto, Livraria Chardron de Lelo e Irmão, Lda.)
Há anos, quando escrevia só sobre questões de ambiente, dediquei umas horas largas a discutir ignições e a sua relevância para a política de gestão do fogo (deixem-me insistir mais uma vez, as políticas de combate ao fogo florestal não me interessam muito, o que me interessa é a política de gestão do fogo, um instrumento de modelação da paisagem de primeira grandeza) e, para não me repetir, ponho aqui a pesquisa desse blog para "ignições" e quem tiver interesse que dê por lá uma volta, que eu já me cansei dessa discussão que voltou e entrar em força no debate público sobre fogos.
Se for mesmo obrigado a dizer qualquer coisa, eu diria que é útil haver menos ignições que mais ignições, do ponto de vista operacional, que isso até pode ser trabalhado nos dias de maior risco (os dias de maior risco em Portugal são 12 a 15 dias em que arde 80% da área anual, não vale a pena andar a fazer avisos mais ou menos para os outros 350 dias no ano), mas não é uma questão central no desenho de políticas para a convivência tranquila com o fogo.
Entretanto percebi que o mito das ignições nocturnas, para além de persistente, é muito generalizado (um dia destes um dos meus irmãos, na sequência desta conversa com José Gomes Ferreira, fez um comentário lateral a dizer que nunca tinha percebido isso das ignições nocturnas) e, apesar de na busca para que liguei acima haver posts com discussão de ignições nocturnas, resolvi fazer uma coisa um bocadinho mais estruturada depois de ouvir uma intervenção delirante de Filipe Duarte Santos, na rádio Observador, em que o mito das ignições nocturnas estava muito presente.
A persistência do mito que leva a considerar todas as ignições nocturnas como fogo posto tem uma base sólida de ignorância.
O primeiro ponto é que nocturno, para o sistema de detecção e registo de fogos, é das oito da noite às oito da manhã, portanto, incluindo muito tempo que não cabe na definição comum de noite.
O segundo ponto é que muita gente desconhece que o toque de uma copa numa linha de elctricidade, o choque de uma ave e muitas outras coisas pequeninas como essas, geram faíscas (muitos dias no ano, simplesmente se as condições não forem favoráveis à progressão do fogo, o assunto morre).
O terceiro ponto é a ideia de que não existem actividades humanas durante a noite, como se não houvesse circulação de carros e motas durante muitas horas à noite, nas zonas mais estranhas, apoiando as mais estranhas actividades humanas.
O quarto ponto é que muita gente desconhece o facto de 80% das ignições (incluindo as nocturnas), ocorrem num raio de 2 Km de distância a um aglomerado populacional, portanto, para além de um conjunto vasto, distribuído e especialista em meteorologia de maluquinhos do fogo, temos de concluir que temos muitos maluquinhos do fogo burros porque desencadeiam ignições mesmo ao lado de casa, em vez de as ir fazer onde ninguém as detectasse até ser tarde.
O quinto ponto é que com a repressão ao uso do fogo e a paranóia securitária associada, há mais que suficientes registos, quer de queima de sobrantes, quer de queimadas de pastores, feitas de noite como defesa contra o longo braço repressivo do Estado.
E, sobretudo, há uma incredulidade geral sobre a existência de ignições retardadas, isto é, o que o sistema de detecção e registo de fogos detecta e regista são ocorrências com dimensão suficiente para ser detectadas, não é o momento físico e químico da primeira ignição.
Há muito quem não acredite que uma faísca produzida ao meio dia, e caída sobre combustível disponível mas escasso ou com uma estrutura pouco favorável à progressão, possa estar por ali a pastar lentamente até ao momento em que, progredindo lentamente, provavelmente mais sob a forma de brasas que de chamas, chega a combustível mais favorável ou que as alterações meteorológicas (sobretudo, direcção e intensidade do vento) acelerem o processo de combustão ao ponto de incandescer o material e provocar um fogo suficientemente grande para ser detectável, por exemplo, às três da manhã.
Esta incredulidade é estranha porque o que não faltam são registos de incêndios em edifícios resultantes de fogos mal apagados, mas o facto é que existe.
Há quem estude o assunto e, de memória, o registo mais longo de que tenho ideia, num artigo científico sobre fogos provocados por raios, era o de um incêndio que eclodiu um mês depois do raio que lhe deu origem, sendo evidente que, durante esse intervalo a combustão nunca se extinguiu, mas foi sendo de muito baixa intensidade até encontrar, um mês depois, condições favoráveis à progressão.
De resto, para quem clama pela necessidade de ter estudos que se debrucem sobre as motivações dos incendiários, talvez seja útil saber que esses estudos existem e resumo aqui as conclusões (de memória, via José Miguel Cardoso Pereira) de um desses estudos, feito em Portugal, com base na entrevista por uma psicóloga forense, a mais de 400 condenados por fogo posto.
Dos mais de 400 entrevistados, 2 eram verdadeiros pirómanos, uns 12 eram pessoas que sabiam o que faziam e tinham motivação económica, e dos restantes noventa e muitos por cento, um bocadinho mais de metade eram pessoas com défices cognitivos, problemas de dependências (alcool, drogas), desestruturação social, etc., actuando sob o efeito desses factores externos, e a outra quase metade era conflitualidade social como problemas de águas, de vizinhança e coisas que tais.
Boa sorte com essa coisa de resolverem a gestão do fogo tendo como questão central as ignições, nocturnas ou outras.
Na sentença imorredoira de um benfiquista mais letrado: «Isto é tudo piscicológico!» Logo o Sporting recebe os homens do Lilleput. Preparemo-nos «piscicologicamente», pois!
... passaram 25 minutos e o jogo decorre com a intensidade que Freitas Lobo não se cansa de anunciar, mas há uma certa preocupação na bancada presidencial. Não é por causa do jogo, nem da fase «de estudo» das equipas em que os nossos se mostram seguros. É por causa dos olheiros. São muitos, e quanto mais atentos mais o incómodo cresce «na estrutura»... mas GOOOOOOLO É GOOOOOOLO aos 29 minutos, é GOOOOOLO de Pote, um toque artístico de calcanhar a curto passe venenoso de Gyökeres. Martinez ajeita os ombros e contorce-se discretamente. Alguém atrás de si disse em surdina, alto bastante para que não deixasse de ouvir: «Olha ainda bem que não o usaram na selecção, ainda se cansava a marcar golos destes lá!»
Começa o carrossel no meio campo francês, de onde virá? de onde virá? HilmanImp impera no meio campo e vai servindo seguro o rodopio de matadores. Gyökeres pára a bola, roda, arranca para o lado direito, dribla um, aproxima-se da área, baliza à mercê, mas aaahhhhhh empurrado e trambolhão. As bancadas irrompem num trovão. «True, the guy`s a danger!», comenta o olheiro do United. Varandas ouviu e pensa: «Devia ser 120 milhões». Amorim põe os olhos no chão. Gyökeers corre para a bola, vai ser outro golo certo... é agora.... vaaaaaiiii.... iiiiiiiiiiiiiih falhou. «Mais vale», pensa Varandas. «Eu que não olho para não azarar, e sai-me isto», pensa Amorim.
Correu meia hora da segunda parte, os Lilliputs ameaçaram duas vezes, mas Debast, primeiro, e Israel, depois (UUi!) estava lá. Freitas Lobo já não vê equipas subidas nem descidas, elogia ainda o magnífico jogo sem bola que iludiu os franceses e abriu caminho para o golo de Pote, e está a determinar exactamente que o Sporting está em contenção quando Nuno Santos controla um passe longo e milimétrico de Diomande, avança junto à linha, flecte para dentro, e envia uma bola em arco para a molhada que se juntou na área, e há empurrões legais, e todos de olhos no ar, e reposicionamentos, e nervos e é GOOOOOLO de Pote. GOOOOOOOOOOOOOLO. Golo de pé direito, um tiro à queima-roupa, a bola nem tocou no chão. GOOOOOOOOLOOOOOOO. Sporting dóóóís - Lilliput Zéééééro. Pote dóóóís - Lilliput Zééééro.
«Mas este é que é o tal Jokers?», pergunta o jovem e inexperiente olheiro do Southampton, a quem o homem do City calara há bastante tempo com um comentário sarcástico ao ouvi-lo perguntar se ali é que era a tal «Luz cathedral».
Agora o Lillyput esmorece, e o ataque sportinguista entra naquele frenesim alimentar de quando lhe cheira a goleada. Tiro de Catamo por cima. Trincão em ziguezage, tiro, aahh o guarda-redes estava lá. Gyökeres à barra, Gyökeres à trave («Antes assim», pensa Varandas outra vez). Freitas Lobo discorre sobre jogo com e sem bola, corredores, subidas e descidas, transições de toda a ordem, e demora-se nas costas dos adversários.
«This guy... Trincau...», diz às tantas um dos ingleses. E o espanhol: «Estaba en`el equipo portugués...», e depois, esforçado:«I wóz in da nachonal tim»
«Ah...», continua o inglês, «just got to see a few minutes. Never saw him play»
«Porque no jugó... i didnot plai», remata o espanhol.
O inglês: «I wonder...»
Minuto 85. Nova substituição. Sai Gyökeres. Entra Hauer. Freitas Lobo assegura que «a formação de Alvalade está apenas a controlar, que é compreensível...» Descontos... Minuto 92... «que é compreensível que Amorim quisesse consolar Hauer com a presença numa vitória». Minuto 93. Mas eis que Santos corre pela esquerda, centra para Bragança que toca leve para espaço aberto à direira e é Hauer que vem em corrida desenfreada de trás e é GOOOOOOOOOOLO Que golaço de Hauer! GOOOOOOOOOOOLO um golo dos 35 metros, espectáculo, golo da jornada! GOOOOOOOOOOLO. É GOOOOOOOOLO. É Gooolo. Golo de Hauer. «Como dizíamos, magnífico golo do estreante Hauer», diz Lobo.
«Ora a cláusula deste para quanto há-de passar?», medita Varandas. «Que entrenador!», diz o olheiro do Real. «Got that right», diz um inglês, «What a coach!» Varandas vitrifica. «Where do theses guys get these assault cars?!», exclama o olheiro do Liverpool. Mas um membro da direcção, sentado um pouco acima para ouvir e olhar os olheiros, sente um arrepio ao ouvir o homem do Chelsea, um português emigrado, responder com uma pergunta: «O director desportivo destes gajos quem é?»
Seja como for: SPOOOOOOOOORTING TRRRRRRRRRRÉÉÉÉÉÉS - LILLYPUT ZÁÁÁÁÁÁÁÁÁRUUUUUUUUUU
"Não percebi o tom de aposta. Não percebi porque alguém haveria de duvidar da probabilidade de haver mais incêndios estes dias.", comenta alguém, no Domingo, o facto de eu, na Quarta-feira anterior, ter começado a dizer que a partir da Sexta-feira passada, mas especialmente hoje e amanhã, os noticiários passarem a ser dominados por notícias sobre fogos.
Depois dessa Quarta-feira (em que os comentários iam mais no sentido da esperança de se demonstrar que a previsão falhasse e com isso eu me calasse), já expliquei que uso estas previsões relativamente temporãs, mesmo sendo um risco fazê-las, como forma de validação da minha interpretação do fenómeno do fogo rural em Portugal.
O que faço é contrapor uma tese - a presença de um determinado padrão de fogo depende essencialmente da disponibilidade de combustível e das condições meteorológicas - a todas as outras teses variadas que existem no espaço público e que influenciam a política profundamente errada de gestão do fogo que, transversalmente a todos os partidos, é esmagadoramente dominante.
Os erros fundamentais dessa política assentam em duas ideias, qualquer delas falsa.
1) o padrão de fogo decorre de problemas estruturais como a composição do coberto florestal, a estrutura fundiária, o número de ignições, o ordenamento do território, etc.;
2) a resposta adequada ao contexto rural e de fogo que existe em Portugal é ter um dispositivo que responda rapidamente à detecção através de um ataque inicial ultra-eficaz, justificando sistematicamente o desfasamento entre a realidade e os objectivos pretendidos com a imprevisibilidade de evolução do fogo, com a dificuldade de acessos, com o meteorologia, com o número elevado de ignições, com os reacendimentos (tenho um amigo que defende que qualquer reacendimento de um fogo deveria dar origem a um inquérito para perceber como era possível um incêndio controlado dar origem a um reacendimento), as projecções, as diculdades operacionais dos meios aéreos, os conflitos institucoinais relacionados com o comando e mais cem mil justificações para evitar dizer uma coisa simples: a partir de uma energia libertada de 5000 kW/ m, que corresponde aproximadamente a uma chama de altura de três metros e meio (tudo isto são aproximações), o combate directo à cabeça do incêndio é impossível.
Como com disponibilidade de combustíveis e condições meteorológicas extremas estas condições se atingem rapidamente, até porque a progressão inicial do fogo é muito rápida em condições extremas, e 30% a 40% das ignições são nocturnas, impedindo o uso de meios aéreos no ataque inicial, é claro que essa doutrina vai falhar, mais tarde ou mais cedo.
Não se trata de uma aposta, isto não são jogos de azar, trata-se do uso de circunstâncias que se podem prever e que eu não posso controlar, para demonstrar que seja o dispositivo o que for (pode ser melhor ou pior), ou gerimos combustíveis de forma extensa, o que implica discutir a economia da operação (e não a sua regulamentação), ou estamos à mercê do fogo, como o dia de hoje parece demonstrar (durante o tempo em que escrevia o post, telefonaram-me a falar de autoestradas cortadas por causa dos fogos e ainda agora está a manhã a começar).
A situação apenas não vai descontrolar-se ao ponto de se tornar um problema político relevante porque estas condições durarão um dia ou dois, e não quatro ou cinco.
Num ano em que condições deste tipo se prolonguem por mais de três dias, veremos uma quantidade enorme de pessoas espantadas com o que sucederá, como se não fosse tão previsível como, na Quarta-feira passada saber que hoje e amanhã os noticiários serão dominados por notícias sobre fogos.
As previsões de risco de incêndio para amanhã é excepcional, em especial para Viseu (e também Aveiro), mas também para um conjunto grande de distritos do Norte e Centro.
Já recebi no meu telefone avisos da protecção civil, tenho visto um esforço grande de comunicação por parte da protecção civil no sentido de chamar a atenção para esta situação excepcional, mas a sensação que tenho, por mim e por outras pessoas, é a de que esse esforço é razoavelmente ineficaz.
Pode ser que eu esteja enganado, acredito que quem trata profissionalmente disto sabe bem mais que eu, mas também se pode dar o caso de estar metido numa bolha mental que a impeça de ver coisas que outras pessoas, menos ligadas ao assunto, conseguem ver.
A sensação que tenho é a de que a escala de alertas usada, ou a forma como são comunicados os alertas, por levar a alertas muito cedo para situações que são mais ou menos corriqueiras, provoca um sentimento de entorpecimento nas pessoas comuns que as levam a desligar dos alertas.
Dizer que há um alerta vermelho para amanhã não leva quase ninguém a dar a atenção devida à situação excepcional prevista para amanhã.
Claro que previsões são previsões, há uma grande incerteza, mas a acumulação de dados sobre a situação excepcional prevista para Viseu parece-me suficientemente relevante para que se chame a atenção para essa excepcionalidade (mesmo que, ao mesmo tempo, se reforce a ideia de que previsões são previsões, lembrando, se quiserem o erro das previsões do Ofélia que deram origem a muitas ignições indesejadas, por se ter previsto uma chuva que não veio).
Tudo pesado e revisto, parece-me que nos falta um mecanismo excepcional de identificação e comunicação de situações excepcionais, que nos levem a tomar precauções excepcionais, tanto mais que a ideia de que o que é preciso é que o ataque inicial aos fogos nascentes não falhe é uma ideia que não tem base estatística: nas condições previstas, provavelmente metade das intervenções em ataque inicial vão falhar, pelo que uma em cada duas ignições tem toda a probabilidade de resultar num incêndio de progressão rápida e elevada intensidade.
Por causa da audição a Lucília Gago, li e ouvi muitas opiniões sobre o estilo de gestão do Ministério Público que Lucília Gago tem vindo a aplicar.
Não sei o suficiente do assunto para ter uma opinião minimamente sólida que me permita avaliar o seu desempenho.
Ainda assim, no meio de tantas opiniões e comentários, chamou-me a atenção o que disse Paula Teixeira da Cruz sobre Lucília Gago.
Em especial o que o Observador também destaca: ""Se o perfil de Lucília Gago tivesse sido avaliado ela nunca teria sido nomeada Procuradora-Geral".
A mim, que tenho deste assunto a opinião de um ignorante na matéria, parece-me que Paula Teixeira da Cruz está redondamente enganada, a julgar pela forma como Lucília Gago foi parar a Procuradora-Geral.
O PS, e António Costa, por convicção ou conveniência política, coisa sempre difícil de distinguir em António Costa, não queriam que a Procuradora-Geral fosse Joana Marques Vidal porque o PS, e António Costa, não estão interessados em procuradores gerais que tenham peso próprio e sejam imunes ao poder de facto que se exerce por ínvios caminhos, aquilo em que o PS se especializou e em que António Costa é considerado uma pessoa imbatível.
Joana Marques Vidal tinha de sair, mas não para ser substituída por outra pessoa com características semelhantes, o que se pretendia era exactamente um procurador geral que se encaixasse melhor no regime de bastidores em que Costa e Marcelo são muito competentes.
A impressão que me dá, apesar de agora vermos grande parte da elite do PS (e do jornalismo companheiro) a dizer cobras e lagartos da audição de Lucília Gago, da forma como não responde nem deixa de responder e da forma habitual como se comporta, segundo o modelo dominante nos altos dirigentes da administração pública (são dirigentes, mas nunca responsáveis), é que é exactamente porque se avaliou cuidadosamente o perfil de Lucília Gago que foi nomeada, o PS, Costa e Marcelo queriam exactamente o que se diz que se conseguiu com a nomeação de Lucília Gago.
Lucília Gago não parece ser nenhum erro de casting, Lucília Gago é o que "a casta" (sim, eu sei que este é um termo populista de esquerda e direita para falar da classe política e é mesmo por isso que o usei, pondo umas aspas que sinalizam o facto de não ser esta a opinião que tenho dos políticos, onde há bons e maus, como em todo o lado) verdadeiramente quer a dirigir o Ministério Público: alguém que não complica a forma manhosa como grande parte do regime se vai mantendo sem grandes rupturas e, ao mesmo tempo, "é feita para apanhar", como diria o Chico Buarque.
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