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Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos
Naquele tempo, depois de Jesus ter atravessado de barco para a outra margem do lago, reuniu-se uma grande multidão à sua volta, e Ele deteve-se à beira-mar. Chegou então um dos chefes da sinagoga, chamado Jairo. Ao ver Jesus, caiu a seus pés e suplicou-Lhe com insistência: «A minha filha está a morrer. Vem impor-lhe as mãos, para que se salve e viva». Jesus foi com ele, seguido por grande multidão, que O apertava de todos os lados. Ora, certa mulher que tinha um fluxo de sangue havia doze anos, que sofrera muito nas mãos de vários médicos e gastara todos os seus bens, sem ter obtido qualquer resultado, antes piorava cada vez mais, tendo ouvido falar de Jesus, veio por entre a multidão e tocou-Lhe por detrás no manto, dizendo consigo: «Se eu, ao menos, tocar nas suas vestes, ficarei curada». No mesmo instante estancou o fluxo de sangue e sentiu no seu corpo que estava curada da doença. Jesus notou logo que saíra uma força de Si mesmo. Voltou-Se para a multidão e perguntou: «Quem tocou nas minhas vestes?». Os discípulos responderam-Lhe: «Vês a multidão que Te aperta e perguntas: ‘Quem Me tocou?’». Mas Jesus olhou em volta, para ver quem O tinha tocado. A mulher, assustada e a tremer, por saber o que lhe tinha acontecido, veio prostrar-se diante de Jesus e disse-Lhe a verdade. Jesus respondeu-lhe: «Minha filha, a tua fé te salvou. Vai em paz e fica curada do teu mal». Ainda Ele falava, quando vieram dizer da casa do chefe da sinagoga: «A tua filha morreu. Porque estás ainda a importunar o Mestre?». Mas Jesus, ouvindo estas palavras, disse ao chefe da sinagoga: «Não temas; basta que tenhas fé». E não deixou que ninguém O acompanhasse, a não ser Pedro, Tiago e João, irmão de Tiago. Quando chegaram a casa do chefe da sinagoga, Jesus encontrou grande alvoroço, com gente que chorava e gritava. Ao entrar, perguntou-lhes: «Porquê todo este alarido e tantas lamentações? A menina não morreu; está a dormir». Riram-se d’Ele. Jesus, depois de os ter mandado sair a todos, levando consigo apenas o pai da menina e os que vinham com Ele, entrou no local onde jazia a menina, pegou-lhe na mão e disse: «Talita Kum», que significa: «Menina, Eu te ordeno: Levanta-te». Ela ergueu-se imediatamente e começou a andar, pois já tinha doze anos. Ficaram todos muito maravilhados. Jesus recomendou-lhes insistentemente que ninguém soubesse do caso e mandou dar de comer à menina.
Palavra da salvação.
Não gosto de publicar as minhas opiniões a quente, quando o tema esteja no alvoroço do confronto sectário que alimenta as matilhas das redes sociais, até porque na maioria das vezes a complexidade dos assuntos suscitam-me mais dúvidas que certezas. Vem isto a propósito do caso das gémeas e da discussão gerada à volta da alegada “cunha” bem sucedida, a culminar por estes dias numa comissão de inquérito potestativa subscrita pelo Chega. Desde que o “escândalo” surgiu na imprensa há uns meses, que o alvoroço me vem parecendo exagerado, mesmo percebendo o potencial aproveitamento político e jornalístico que o mesmo suscita.
Acho muito salutar que se discuta a “cunha” e as suas potenciais perversidades numa sociedade que se quer igualitária em direitos e deveres – um mito, como sabemos. Acho fundamental que a opinião pública coloque em sentido as instituições que nos representam a todos e que se pretendem credíveis. Desse modo compreendo e saúdo a insistência da comunicação social para o cabal esclarecimento do caso. Mas aqui chegados, parece-me que já todos entendemos o que aconteceu; que uma mãe desesperada com a sorte das suas filhas com uma doença rara que pode ser curada com um tratamento difícil de aceder, através de uma cunha muito influente, o filho do presidente da República (que ironia), consegue envolver o Palácio de Belém e o Governo no desbloqueio do drama.
Cunha não é crime. Certamente com mais incidência nos países latinos, a “cunha” é um recurso profundamente humano, e na sua maioria das vezes justificada, pela proximidade solidária que potencia a solução de muitos pequenos dramas na vida dos homens e mulheres, das empresas ou das instituições, feitas de pessoas, de casos particulares, dramas humanos, que se resolvem com uma palavra certa ou um recado oportuno à pessoa certa embrenhada numa estrutura impessoal, mecânica. Quem não mexe o céu e a terra para, numa urgência hospitalar de um seu ente querido, a procurar alguma pessoa sua conhecida dentro do hospital, com tanto poder quanto possível, para que tenha em especial atenção o seu caso, nem que seja para permitir uma visita inadiável fora de horas ou informação “privilegiada” sobre o prognóstico clínico?
Tenho muitas dúvidas que a forma como André Ventura está a aproveitar este caso lhe traga dividendos políticos. A certeza que tenho é a de que não haverá nenhum dos participantes da comissão parlamentar que não tenha já pedido ou usufruído de uma cunha. Ou como escrevia há dias o Pedro Picoito no Facebook: “O que mais irrita na comissão parlamentar do "caso das gémeas" é sabermos que os bravos deputados que tão denodadamente pugnam contra a corrupção (a começar pelo Ventura) seriam capacíssimos, em idênticas circunstâncias, de meter todas as cunhas possíveis ao chefe de Estado, ao herdeiro do chefe de Estado, ao Secretário de Estado e à secretária do Secretário de Estado.”
O “Caso das Gémeas”, e por consequência aquela Comissão de Inquérito, já há muito tempo que me causa um profundo enfado, e a insistência moralista e inquisitorial de André Ventura vergonha alheia. Aceitamos que vivemos num mundo de pessoas livres e relações humanas e pessoais com todo o “erro” que isso acarreta ou pretendemos viver sujeitos a um algoritmo, verdadeiramente imparcial e equitativo?
Não, nunca conheci José Forjaz e não conheço nada do seu trabalho, a não ser a partir das muitas horas que passei num dos seus primeiros projectos em nome pessoal, a casa que desenhou para a irmã mais velha e para o cunhado, ligação inútil porque na altura os meus interesses não tinham qualquer relação com os sítios em que estava, porque nem sabia o que era a arquitectura e, last but not least, porque a minha memória é péssima.
Acontece que um dos meus colegas de escola, cujo rasto perdi durante anos, mas cujo contacto retomei há alguns anos, viveu nessa casa e tem um album de fotografias que lhe é dedicado e tive curiosidade em ver quando começaram a chover referências à morte de José Forjaz.
Numa dessas fotografias reparei num que referia o facto de, à porta, estar o carro do pai de José Forjaz, o que me despertou a curiosidade de saber como foi José Forjaz parar a Moçambique (por ter curiosidade sobre esse tipo de coisas é que recomendo, de vez em quando, a leitura de livros como o "Torna-viagem", ou o "Antes que a gente morra", gosto de testemunhos em primeira mão, e a verdade é que vamos morrer todos, levando connosco o que aprendemos, se não o deixarmos escrito).
Eu não tenho paciência para o discurso a preto e branco (sim, há ironia na escolha desta caracterização desse discurso, mas também objectividade) actualmente dominante sobre o colonialismo (uma boa ilustração do que me irrita está bem descrita neste artigo do Senhor João, que o Observador publica hoje, descrevendo o comportamento do rebanho woke) e, para além disso, tenho um grande fascínio pela possibilidade de falar com pessoas que viveram a morte dos mundos que os criaram, quer tenham ou não consciência de que o mundo que os criou morreu.
Comecemos bem atrás.
O colonialismo é uma ideia da segunda metade do século XIX e, no caso das colónias portuguesas, é uma história que verdadeiramente começa no fim do século XIX.
Até lá, o que havia era uns pontos de apoio para o comércio e pouco mais.
Tomemos como ponto de partida a mudança de capital de Moçambique, em 1898, meros 70 anos depois dos primeiros portugueses se estabelecerem permanentente no que é hoje a cidade de Maputo e meros trinta anos depois do reconhecimento de facto da soberania portuguesa sobre a região, que ainda demoraria mais uns anos a que fosse reconhecida de jure pelas potências coloniais da altura.
Durante as primeiras décadas do século XX, e na sequência de algumas acções militares do fim do século XIX que pacificaram a região (Gungunhana é derrotado em Chaimite, a cerca de 200 quilómetros de Maputo, em 1895), a cidade vai crescendo, com base no seu porto e no caminho de ferro que a ligava ao interior de África, nomeadamente à então república do Tansvaal e depois África do Sul, mas o governo português não tem grandes meios e condições para levar a cabo uma verdadeira política colonial, mantendo um regime de prazos e companhias majestáticas em Moçambique, como forma de afirmação da soberania, a par de uma retórica colonialista com pouca relação com a realidade (de que a cedência ao ultimatum inglês, de 1890, era a demonstração clara).
Com o Estado Novo, quer por razões de eficácia da acção do Estado, quer por razões ideológicas de afirmação nacional, quer porque o mundo tinha mudado, a política colonial vai alterar-se no sentido de efectiva ocupação e administração das colónias.
Ao mesmo tempo, com a crise económica dos anos 20, o principal destino da emigração portuguesa, o Novo Mundo, deixa de ser atractivo, o que faz com que mais gente decida ir para África tratar da sua vida, sobretudo porque a emigração pós-guerra só vai passar a ser relevante no fim dos anos 50 e anos 60.
O pai de José Forjaz, pressionado pelas dificuldades em criar sete filhos, decide ir para Moçambique, juntando-se-lhe a mulher uns anos depois, com os três filhos mais novos (houve atrasos nesse reagrupamento familiar, relacionados com concursos para professores, ao contrário do mito dos colonialistas que iam para as colónias explorar terceiros sem dó, grande parte dos que vão para as colónias africanas ou são pessoas desesperadas à procura de um vida melhor e decididas a correr quaisquer riscos para isso ou, como é o caso, são funcionários que não podem correr riscos e só vão com situações relativamente estabilizadas).
José Forjaz terá 16 anos, acaba o liceu na então Lourenço Marques (o liceu que frequentou deveria ter sido inaugurado há muito pouco tempo, é de 1952, e vinte anos mais tarde, quando o frequentei, continuava a ser um belíssimo edifício, bem demonstrativo da alteração da política de investimento do Estado português nas colónias), uma cidade em franco crescimento (em 1955 é aprovado o seu primeiro Plano Geral de Urbanização, que é depois substituído pelo seu Plano Director, em 1969, com fortíssima influência de Álvaro Dentinho, provavelmente o arquitecto paisagista mais criativo da sua geração e um dos de maior influência na prática de ordenamento do território fortemente enraízado na compreensão dos territórios para que planeia) e de grande modernismo no edificado.
E pouco depois vai estudar arquitectura para o Porto, faz um mestrado em Nova Iorque, estabelecendo-se na Swazilândia, não em Moçambique em que continuam os pais e irmãos.
Embora durante os seus anos da Swazilândia vá de vez em quando a Moçambique, é só depois da independência do país que vai para Moçambique, fazendo a carreira pública e de arquitectura conhecida no país, com uma grande proximidade ao regime, que suponho que terá variado com o tempo.
Embora outro dos seus irmãos ainda tenha ficado em Moçambique uns anos (poucos) depois da independência, a verdade é que o regime fez a opção de hostilizar os "colonialistas brancos", confundindo regimes políticos com pessoas com base na cor da pele, e fazer andar para trás a política de acolhimento de quadros que tinha vindo a ocorrer desde meados dos anos 40 (quando também o meu pai foi para Angola, embora numa situação um bocadinho diferente, porque todos os seus dez filhos nasceram em África com a excepção do único que nasceu em férias), desperdiçando um capital humano brutal que, na sua larga maioria, estava disposto a viver num Moçambique independente (não era o caso do meu pai, que estava a preparar a reforma que iria ocorrer em 75 ou 76, mas seria o mais provável no caso de alguns dos meus irmãos mais velhos que entretanto, depois de estudar em Lisboa, tinham voltado para Moçambique).
Não sei se poderia ter sido de outra maneira - a história não admite contra-prova - mas o facto é que os regimes e os governos fazem opções, não tão livremente quanto se poderia pensar, é verdade, mas fazem opções, e a opção dos regimes pós-coloniais tem sido a de preferir a retórica que favorece o seu exercício do poder à responsabilidade de cuidar dos seus cidadãos.
Por muito que isso seja compatível com percursos pessoais e humanos como os de José Forjaz, o facto é que foi feito à custa do desperdício de um capital humano que se reflecte até hoje no dia a dia das pessoas comuns desses países.
Essa responsabilidade é de quem foi tomando essas opções ao longo dos últimos 50 anos e é bom não esquecer isso nas discussões sobre pós-colonialismo e o futuro desses países.
Vi que o governo autorizou a compra de aviões para os fogos, repetindo decisões de outros governos.
Assim sendo, repito também o que disse há uns anos sobre o assunto (publicado originalmente no Público, em 2014, com o título "Antes cabras que aviões", não sei se com algumas diferenças em relação ao texto que agora transcrevo porque não posso ler o que escrevi para o Público sem eu pagar para ter acesso a um texto que dei ao Público sem pedir dinheiro nenhum em troca):
"Exmo. senhor ministro da Administração Interna,
Li que tenciona gastar 27 milhões de euros em cada um dos aviões para os fogos.
Tenho uma proposta para lhe fazer: entregue-me os 27 milhões que custa um Canadair e deixe-me geri-los, absolutamente pro bono.
Explico-lhe o que farei com eles. Faço um concurso para projectos que tenham as seguintes características:
1) Terem uma área geográfica definida; 2) Usarem, de forma integrada, fogo, cabras e sapadores para gerirem o mato; 3) As mesmas pessoas responsáveis por gerir o mato serão responsáveis pelo combate nessa área geográfica (usando ferramentas com cabos de pau e pinga-lume, como alguém dizia um dia destes, judiciosamente).
Os projectos poderiam ser de proprietários, associações de proprietários, ONG, associações de bombeiros, qualquer pessoa ou instituição, excluindo o Estado e qualquer associação em que o Estado tivesse mais de 15% do capital.
Da experiência que tenho por gerir um projecto que tem algumas semelhanças com o descrito (financiado, veja lá, com o Fundo EDP de Biodiversidade, porque o Fundo Florestal Permanente é gerido como sabe), eu diria que tipicamente um financiamento de 500 mil euros seria suficiente para financiar cinco anos a gestão de qualquer coisa como 2500 a cerca de 5000 hectares, incluindo um rebanho de 200 cabras e apoio técnico, em especial para o uso do fogo, quer na prevenção, quer no combate.
O seu Canadair financiaria cerca de 50 projectos, ou seja, a gestão e combate em 100 a 200 mil hectares. Não ficaria o problema dos fogos resolvido, isso é certo, mas também não fica com o Canadair.
E repare na diferença. O Canadair é importado, as cabras são de fabrico nacional. O Canadair usa combustíveis fósseis, as cabras são recursos renováveis. O Canadair cria custos de manutenção, as cabras criam cabritos. O Canadair não altera os dados do problema, as cabras estrumam o solo e aumentam a produtividade. E, last but not the least, no fim do seu tempo de vida útil o Canadair dá ainda despesa para o seu desmantelamento e tratamento dos resíduos e as cabras dão chanfanas.
Não falo sequer na diferença de criação de emprego, não falo da presença de gente no território, não falo da diferença no equilíbrio territorial, não falo da transferência de recursos entre o litoral e o interior.
E não falo da sustentabilidade futura: o Canadair não cria riqueza e vai ser preciso de novo gastar mais 27 milhões qualquer dia, as cabras reproduzem-se e criam oportunidades de negócio incríveis, como pode imaginar, por exemplo, pensando na grande distribuição a fazer promoções de cabrito como forma de apoiar o esforço colectivo de gestão do fogo.
Pense nisto, senhor ministro, porque talvez estejamos de acordo num ponto essencial: inteligente, inteligente é sermos capazes de gerir o fogo e não precisar dos melhores meios possíveis para o tentar combater.
Até porque o fogo teima em se rir dos Canadair e outras sofisticações tecnológicas, continuando só a obedecer a quem o combate com os pés no chão, com as mãos em cabos de madeira e com uma cabeça fria que saiba usar o fogo contra o fogo."
"Qualquer que seja o caminho, uma coisa parece clara: a Madeira já está a pagar a factura de Albuquerque ter querido usar uma vitória eleitoral para provar a sua inocência. Como se a justiça se fizesse nas urnas em vez de se fazer nos tribunais". (Sónia Sapage, no editorial do Público de hoje).
Há, neste parágrafo, um processo de intenções inaceitável para uma jornalista, e um equívoco frequente na sociedade.
Sónia Sapage atribui a Miguel Albuquerque a intenção de provar a sua inocência ganhando eleições, processo de intenções que nada permite aceitar.
Miguel Albuquerque diz que está inocente - isso, evidentemente, não quer dizer nada, faz-me sempre lembrar a célebre cena de um filme numa cadeia em que o veterano explica ao novato que protesta pela sua inocência que todos ali são inocentes, se lhes perguntar - muito antes de qualquer processo eleitoral.
Quando o processo se tornou público, Miguel Albuquerque recusou demitir-se, tendo depois pedido a demissão, não por ser objecto de um processo judicial, mas porque perdeu o apoio parlamentar do PAN.
Sempre disse, e bem (eu sei que é impopular dizer isto), que a sua inocência se provaria no processo judicial e que isso não tinha qualquer relação com as suas opções políticas.
Quando Miguel Albuquerque se recusa a pedir a demissão, o que está a fazer, e bem (repito-me) é recusar que o Ministério Público tenha o poder ilegítimo de abater políticos com base em investigações que têm processos de decisão próprios e longos, envolvendo várias pessoas de forma independente, permitindo recursos e a defesa dos acusados.
Aliás, Carmo Afonso, ontem, fazia o seu habitual número de contorcionismo lógico para atribuir ao Ministério Público a responsabilidade por uma decisão política de Duarte Cordeiro: "Duarte Cordeiro rejeita ser candidato a qualquer cargo público enquanto não ficar ilibado de quaisquer suspeitas nas operações Tutti-frutti e Influencer. ... Ninguém pode criticá-lo por esta posição. Mas fica aqui, uma vez mais, explícito o nível de condicionamento que o Ministério Público está a impor à vida política portuguesa".
Uma boa ilustração do absurdo lógico em que assenta o tal equívoco frequente: Duarte Cordeiro toma uma decisão política, por sua inteira e livre vontade, e o responsável é o Ministério Público.
Se dúvidas houvesse de como isto não passa de conversa para embalar meninos, repare-se como António Costa achou inultrapassável um parágrafo de um comunicado que não o implicava em coisa nenhuma, de tal forma que se demitiu de primeiro-ministro e mandou às urtigas a maioria absoluta do PS, para pouco tempo depois, com o mesmo parágrafo no mesmo sítio, não tendo havido qualquer desenvolvimento relevante da sua situação jurídica, estar a mover mundos e fundos para ir para Presidente do Conselho Europeu (com o meu total apoio, quanto maior for a distância a pessoas tóxicas, melhor), sem que as anteriormente poderosíssimas razões éticas pesem, quando lhe dá jeito, absolutamente nada.
Miguel Albuquerque fez o que deveria ser feito sempre pelos políticos que se vêem envolvidos em processos judiciais: avaliar politicamente a sua situação e tomar as decisões políticas que entenderem, impedindo que a confusão entre ética e lei, entre exercício de cargos políticos e investigações judiciais, acabem a dar ao sistema de justiça um poder ilegítimo, e aos políticos desculpas para se desresponsabilizarem pelas suas decisões políticas.
Miguel Albuquerque, com as suas opções, tem feito mais pela higiene dos processos de tomada de decisões públicas que os editoriais moralistas do Público que, em muitos aspectos, se limitam a reproduzir a argumentação do Chega e do Bloco de Esquerda neste tipo de matérias.
A Montis fez uma campanha de financiamento colaborativo para criar um fundo para compra de terrenos.
A campanha não correu especialmente bem, mas deu origem ao fundo para compra de terrenos, que tem, neste momento, dez mil, trezentos e setenta e seis euros e nove cêntimos (10 376,09 euros).
Com essa base, a Montis criou o fundo e desenvolveu uma página específica que permite a qualquer pessoa acompanhar a sua utilização.
Por mim, seria bom que esta página, o mais rapidamente possível, tivesse as regras de gestão do fundo, mas no essencial estou muito satisfeito com a criação deste fundo.
Bem sei que entre as boas intenções e as boas obras pode haver um abismo (aliás, é esse o tema do meu artigo que o Observador publica hoje) mas, para já, é uma boa notícia que uma associação de conservação da natureza tenha a coragem de criar um fundo para compra de terrenos que potencialmente fragiliza a sua capacidade para angariar donativos para a sua actividade diária.
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos
Naquele dia, ao cair da tarde, Jesus disse aos seus discípulos: «Passemos à outra margem do lago». Eles deixaram a multidão e levaram Jesus consigo na barca em que estava sentado. Iam com Ele outras embarcações. Levantou-se então uma grande tormenta e as ondas eram tão altas que enchiam a barca de água. Jesus, à popa, dormia com a cabeça numa almofada. Eles acordaram-n’O e disseram: «Mestre, não Te importas que pereçamos?». Jesus levantou-Se, falou ao vento imperiosamente e disse ao mar: «Cala-te e está quieto». O vento cessou e fez-se grande bonança. Depois disse aos discípulos: «Porque estais tão assustados? Ainda não tendes fé?». Eles ficaram cheios de temor e diziam uns para os outros: «Quem é este homem, que até o vento e o mar Lhe obedecem?».
Palavra da salvação.
Os transcendentais dias da República meditam agora nos mistérios do Europeu de futebol (louvavelmente) e, sob influências eu diria satânicas, no famigerado «caso das gémeas». É isto, em essência, a República e oxalá a nossa participação na competição desportiva, encadeada nos Jogos Olímpicos de Paris, contribuam para deixar em paz as criancinhas, a sua família e o pendor dos políticos para a futilidade.
Soube ontem, na CPI criada para o efeito (do incrível «caso das gémeas») ainda faltam ouvir 40 pessoas!!!
E porquê, para quê? Já tudo foi dito! Os pais procederam como procederiam outros pais quaisquer, em desespero de causa. Terão havido almas mais sensiveis que se prestaram à ajuda. A salvação das pequenas custou ao Estado 4 milhões de euros?; e então? - eram, são, duas vidas com tudo pela frente. Alguêm foi preterido, ultrapassado na lista de espera? - consta que não, o problema nem foi levantado. Houve "cunhas"? - cumpriu-se então a tradição nacional, somos ainda Portugal.
A corrupção e o favorecimento não são isso. Implicam um interesse económico, político sempre pessoal e com contrapartidas. Negócios... Arrume isto, Sr. André Ventura. O seu partido não é, nunca foi, nem sabe ser da extrema-direita. É apenas um partido (cada vez mais) fala-baratista, arte além da qual são as trevas ideológicas totais. A onda de simpatia que logrou alcançar vai já em decrescendo notório e brevemente lerá esses resultados. Entretanto não seja maçador.
E se quiser ser útil à Nação não se ponha com habilidades na discussão parlamentar das propostas de lei que a Ministra da Justiça tem em mão.
"“Ainda ontem três casas foram danificadas e uma rua inteira ficou queimada”, contou a uma rádio local, fazendo as contas a “40% de prédios residenciais” danificados e “quase 200 casas queimadas” nos últimos meses".
Sobre Gaza?
Não, sobre uma terrinha no Norte de Israel.
A informação é fidedigna?
Nem por isso, é de um autarca local e estou convencido de que foi parar ao jornal porque o senhor critica o governo israelita, dizendo que está desaparecido e preocupado com outras coisas.
Sobre a informação que vem de Gaza tem, no entanto, uma grande diferença: qualquer jornalista que queira pode lá ir verificar se é verdade ou não.
Durante anos o Hamas andou a desviar recursos que eram das populações de Gaza, muitos deles provenientes da ajuda internacional carreada pela ONU, para fazer túneis, acumular armamento, combustíveis e tudo o mais que lhe tem permitido aguentar uma guerrilha urbana de meses.
Durante anos, grupos vários atacaram o território de Israel com rockets e outras coisas que tais, a partir de Gaza, sem que as autoridades de Gaza, o Hamas, jamais levantasse um dedo para o impedir.
O Hamas preparou-se e criou uma oportunidade para deitar gasolina para uma fogueira de relativamente baixa intensidade, com o objectivo de mobilizar uma larga frente de ataque que permitisse liquidar Israel, ou pelo menos limitar a sua força.
Durante todo esse tempo, a generalidade das pessoas que não têm pedras no coração estiveram-se nas tintas para as vítimas dessas opções do Hamas, as principais das quais eram, já nessa altura, os palestinianos, obrigados a viver em condições muito piores das que seria possível criar se os recursos canalizados para a guerra tivessem sido usados para a melhoria da qualidade de vida dessas pessoas e para a sua defesa.
Desde há anos que o Hezbollah não cumpre as resoluções da ONU sobre os limites em que se deveria conter, sem que daí resulte qualquer consequência real para as autoridades no Líbano.
Desde há meses, o Norte de Israel é atacado, quase todos os dias (5 mil projécteis desde 7 de Outubro?) e há hoje algumas probabilidades de Israel fazer no Líbano o que está a fazer em Gaza: ir à fonte das ameaças à sua existência limitar o seu poder (em rigor, a fonte primária está no Irão, mas esqueçamos isso agora).
Se, como é possível (não faço ideia se é provável), o exército israelita entrar pelo Sul do Líbano, o que não vão faltar são apelos lancinantes das pessoas que não têm pedras no coração, como a senhora deputada que chora as crianças da palestina sem nunca ter chorado as crianças judias, tanto quanto me apercebi, contra a barbárie israelita.
"Dizem do rio que é violento, mas que dizer das margens que o oprimem?".
Eu sei que uns chamarão margem ao que outros chamarão rio, e vice-versa, mas o que manifestamente não é sério é pretender fazer a equivalência moral entre os métodos do Irão e de Israel no conflito que ali existe.
Isaltino Morais fazia umas almoçaradas de trabalho. É uma forma datada de trabalhar e de fazer política, é bom que evoluamos para práticas mais modernas e profissionais. No entanto, não me parece que se trate de um crime.
António Costa tinha o "melhor amigo" a "vender" os seus serviços de acesso directo ao PM. Tal é politicamente criticável, mas não me parece que tal implique que Costa tenha cometido qualquer crime.
Mesmo no caso das gêmeas, parece-me politicamente criticável toda a "agilização do processo" baseada em conhecimentos e favores pessoais, mas, ainda assim não vejo que se ganhe muito que o tratamento do caso saia do campo político para o judicial.
A tentação de uma excessiva judicialização da política, que aliás não acontece só em Portugal, não me parece ser um bom caminho. A turba ululante por certo aplaudirá, mas, repito, não me parece ser um bom caminho.
Um dia destes, João Miguel Tavares (que prezo e que leio com atenção), afirmava a pés juntos que Miguel Albuquerque devia ter-se afastado por ser arguido num caso de corrupção e o facto de não o fazer era um exemplo de degradação das instituições.
Não estou nada de acordo.
A decisão de Miguel Albuquerque se demitir diz-lhe respeito apenas a ele e a mais ninguém (tal como a de António Costa).
O sistema de justiça deve funcionar nos seus próprios termos, dentro dos limites que a sociedade define, portanto não tem de ter em atenção as implicações políticas do que faz. E isso só é possível na medida em que fazer buscas, investigar alguém, constituir alguém como arguido, etc., for exactamente isso, nada mais que isso, sem constituir uma sanção sem julgamento prévio, como efectivamente constituirá se a qualquer destes passos de um processo judicial corresponder uma decisão política imperativa.
O sistema político deve funcionar dentro da lei, e nos seus próprios termos, recusando, mas recusando mesmo, qualquer contaminação do processo de decisão política que não decorra da lei e do voto.
Se alguém é acusado, seja pelo sistema de justiça, seja por um cidadão qualquer que diz que é objecto de assédio, seja por um jornalista que resolve dizer a Isaltino Morais que pode almoçar fora todos os dias, o que não pode é pedir à Câmara que lhe pague esses almoços porque recebe todos os meses uns 30% da sua remuneração base como despesas de representação, que servem exactamente para pagar almoços de trabalho e afins, cabe a esse agente politico avaliar politicamente a sua situação, e decidir o que fazer, mas a avaliação do político sobre o que tem a fazer, é uma avaliação política.
A seu tempo caberá aos eleitores avaliar as opções feitas pelo político, opções essas que, dentro dos limites da lei, são livres, não podem ser impostas pelo sistema de justiça.
Miguel Albuquerque resolveu candidatar-se dentro do seu partido e ganhou as eleições internas, resolveu candidatar-se a eleições regionais e ganhou as eleições, para o exercício do cargo é completamente irrelevante que seja, num determinado momento, arguido num caso de corrupção que não se se sabe se dará origem a uma acusação (e, mesmo aí, é preciso esperar pelo julgamento e a minha posição nessa matéria é tão radical que, a menos que a lei preveja, como prevê em algumas circunstâncias, a destituição do cargo, entendo que mesmo condenado um político é livre de exercer o seu cargo, enquanto os eleitores quiserem).
Isto é igualmente válido para António Costa que, tanto quanto me parece, agiu politicamente: pediu a demissão porque o governo se tinha tornado um fardo para as suas ambições pessoais futuras, o processo judicial foi um mero pretexto que o populismo lhe ofereceu de bandeja.
Infelizmente tem aumentado muito o populismo justicialista, de que o editorial do Público de Quarta-feira, 19 de Junho, é um exemplo ainda mais poderoso que a crónica de João Miguel Tavares com que comecei este post.
Mariana Oliveira, jornalista do Público, explica: o anterior presidente do supremo tinha tomado uma decisão sobre umas escutas, o ministério público recorreu da decisão, e há dois juízes do supremo que dão razão ao ministério público e um quarto, o novo presidente do supremo, que valida a decisão de manter as escutas.
Pois bem, esta discussão jurídica (já agora, que é uma discussão que também diz respeito aos direitos de defesa das pessoas envolvidas no processo) é retratada no editorial do Público da seguinte maneira: "há um MP [ministério público] que acha que não deve ser assim e um juiz que assina de cruz tudo o que é escutado".
Populismo do mais puro é mais difícil.
O que está em causa são umas escutas que dizem respeito a membros do governo.
Se eu acho que uma pessoa deve ser escutada durante quatro anos? Em princípio, não me parece razoável, mas não sei o contexto, portanto não tenho opinião definitiva.
Sobre o que tenho opinião clara - pode estar errada, claro, mas é clara - é que, embora "por ínvios caminhos, quais se diz que são ínvios os de Deus", as escutas acabaram nos jornais e o grau de informalidade e desprezo pelas regras de gestão da coisa pública, começando pelo registo claro dos factos e decisões dos representantes do povo (convém ir recordando que ministros e deputados são meros representantes e servidores do povo, não são uma casta superior, têm mais obrigações, não menos), é completamente inaceitável numa democracia madura.
Isso sim, funcionar desta forma, é degradar as instituições profundamente, muito mais profundamente que a falta de respeito pelo segredo de justiça, matéria sobre a qual partilho a opinião ácida expressa por Ferro Rodrigues quando pensava que quase ninguém o estava a ouvir.
"Israel ataca campo de refugiados em Gaza e faz dois mortos e 12 feridos" este título é do Observador mas podia ser de milhares de jornais em todo o mundo.
É um título rigorosamente equivalente, na substância, a este, que não vi em lado nenhum "Hamas usa campo de refugiados, provocando dois mortos e 12 feridos".
Escolher um ou outro título é uma opção de boa parte do jornalismo: no primeiro caso, opta-se por considerar indigno o ataque a um grupo terrorista se ele se esconder no meio de pessoas comuns, no segundo caso, opta-se por considerar indigno de que um grupo terrorista use as pessoas comuns como cobertura para as suas actividades.
As convoluções do linguajar desportivo atingem dimensões inauditas. Leio numa crónica que
«com apenas dois médios que se transformavam em três com os movimentos de Cancelo para dentro numa réplica com nuances daquilo que o lateral fazia no Manchester City de Pep Guardiola, Palhinha acabou por ser sacrificado em detrimento de Vitinha e Bruno Fernandes. Assumidamente, a ideia de Portugal no corredor central do setor intermédio passava mais por aquilo que podia fazer em posse do que com aquilo que tinha de fazer sem bola, o que fazia com que a linha ofensiva fosse a primeira a pressionar mais alto para obrigar a um jogo direto que dava vantagem aos centrais nacionais.»
E que, no entanto,
«o tridente ofensivo habitual voltou a ser aposta de Roberto Martínez, com Bernardo Silva a ter de forma mais frequente movimentos para dentro para deixar o flanco para as subidas de Diogo Dalot e Rafael Leão mais por fora a dar largura ao ataque de Portugal a olhar também para as transições, deixando Ronaldo em posição mais central na área mas com liberdade para sair do seu raio de ação para trazer consigo também defesas na marcação.»
O que me deixou entretido com cinco interrogações:
- Em que língua estará escrito o texto?
- Que quererá dizer?
- De que modalidade se tratará?
- A que evento dirá respeito?
- Terá acontecido realmente?
Uma das coisas interessantes no debate político é o comportamento diferenciado das claques.
No PS e Chega (acho que não vale a pena falar do BE e do PC), o que o partido diz ou faz está, por definição, certo, portanto é relativamente raro haver contestação a sério ao poder exercido por esses partidos, vindo de dentro dos grupos sociais que apoiam estes partidos.
Já no caso da direita (mas também do Livre e do PAN) há aquilo que a esquerda tem optado por chamar, depreciativamente, como confusão, que na verdade é uma visão crítica do exercício do poder por aqueles a quem se reconhece proximidade política. Ao contrário da tal apreciação depreciativa que os seguidistas fazem da divergência, eu acho muito útil que a divergência seja expressa e acho que os governos de partidos que não podem esperar fidelidade canina por parte dos seus apoiantes têm mais probabilidades de ser governos melhores.
Por exemplo, no meu caso, é vulgar eu dizer que prefiro este governo ao anterior, que em geral me parece melhor ter Montenegro como primeiro-ministro que António Costa (ou Pedro Nuno Santos), mas isso não me impede de dizer que fico horrorizado com declarações como as que aqui são atribuídas a Margarida Balseiro Lopes, que estão muito para lá do que acho normais divergências de pontos de vista políticos, considerando-as um completo disparate e um erro grave (se se materializarem em decisões, o que os políticos dizem interessa-me relativamente pouco, interessa-me bastante o que fazem).
Temo que na gestão do fogo, se a situação não era brilhante antes, com este governo seja ainda pior.
Não há ainda nada de muito concreto, mas os sinais de um excesso de atenção ao que dizem os bombeiros, a protecção civil e os autarcas, face à aparente desvalorização do que é hoje o razoável consenso na produção de conhecimento, se vá traduzir na estupidez do reforço das políticas de supressão do fogo e desvalorização das políticas de gestão de combustíveis, incluindo o uso do fogo, do pastoreio e da gestão dos poucos nichos de competitividade que subsistem na gestão de áreas marginais.
Por isso me pareceu muito oportuna a chamada de atenção de João Adrião para o problema, o que deu origem a um post meu, no qual Gonçalo Elias faz um comentário, a que depois João Adrião responde noutro lado, resposta essa a que Paulo Fernandes dá a sua benção no sentido de confirmar o essencial do que é dito por João Adrião quanto à questão da pirodiversidade.
E como essa é uma questão relevante e muito contra-intuitiva, resolvi fazer de caixa de ressonância do que foi dito.
Começemos pelo boneco base.
O boneco não tem uma leitura fácil nem imediata, mas no essencial "mostra as áreas ardidas com alguma dimensão nas últimas 5 décadas em Arganil, Góis e Pampilhosa" (1975 a 1985, 1985 a 1995, 1995 a 2005 e depois o que aconteceu em 2017, porque entre 2005 e 2017 não há grande história).
O que é relevante é que à medida que somos mais eficientes a combater o fogo - convém ter a noção de que isso não é apenas por uma questão de melhoria do desempenho do dispositivo de combate em 98% dos casos, mas também porque o abandono da gestão concorre para o mesmo resultado - vamos passando de fogos relativamente frequentes, mas de dimensão contida, para fogos menos frequentes (conseguimos adiar o fogo por uns anos através do melhor combate aos fogos nascentes), mas mais contínuos (já agora, isso não se consegue ver nos bonecos, mas para além de maior continuidade, também há maior intensidade destes fogos porque há maior acumulação de combustível, é verdade, mas também porque os 2% das intervenções em que o combate não é eficaz ocorrem em condições meteorológicas mais extremas, é por isso que o combate não consegue fazer nada. Já agora, esses 2% de situações em que o combate que temos não serve para grande coisa são responsáveis por mais de 90% da área ardida).
Esta progressiva alteração de padrão de fogo auto-alimenta-se, na medida em que passamos a ter áreas de combustível mais homogéneo, porque arde todo na mesma altura, da mesma maneira, de forma que a vegetação responde também com maior uniformidade, o que acentua as tendências de fogos mais espaçados, mais intensos e mais contínuos.
Resumindo, a política de supressão do fogo, sem uma concomitante política de gestão de combustíveis finos (por favor, não confundir com a absurda e infundamentada legislação de limpeza da vegetação junto às infraestruturas e casas), acentua os problemas causados pelos fogos e aumenta a dimensão da tragédia futura (não necessariamente em mortes, que é um aspecto muito contingente, mas em área ardida e em efeitos negativos no solo e na economia das terras marginais).
Infelizmente, a sensação que tenho é a de que este governo não sabe, nem quer saber disto, o que representa um custo futuro muito elevado, quer pelos efeitos reais dos grandes fogos de 2030 (mais ano, menos ano), quer pelo efeito que esse fogo terá nas políticas públicas, que tenderão a ser, como aconteceu em 2017, mal formuladas para salvar a carreira política dos decisores que tiverem o azar de levar com estes fogos em cima.
Em 2003 e 2005, foi o reforço da protecção civil a escapatória encontrada para responder à pressão política dos grandes fogos de 2003 e 2005, em 2017 foi a perseguição ao que funciona (a produção de eucalipto) em detrimento do ataque ao problema real, a imensa sucata florestal sem gestão que por aí anda, em 2030 se inventará outra bode expiatório qualquer, porque estudar, gerir, fazer o trabalho de formiguinha, é caro, custa dinheiro, exige esforço e não dá votos.
Aparentemente, o governo, os partidos, os jornais, confiam muito mais na Virgem que na corrida, apesar de todas as evidências sobre a insanidade dessa opção.
Sou confrontado com este print dum poste da Rita Matias do Chega na rede X e confesso que me surpreende, até pensei que era montagem. Cheguei a supor que a deputada se distinguia por algum excepcional (no sentido de excepção) bom senso e moderação naquele partido, qualidades essenciais para a discussão de um assunto tão complexo e delicado quanto o fenómeno da imigração massiva para a Europa, mas enganei-me. Exigir-se-ia alguma elevação e honestidade intelectual a alguém que se queira destacar dentro da comunidade a liderar os seus destinos, e não ser um vulgar incontinente verbal a alimentar as redes sociais com disparates – um perigo para as ambições de políticos incautos. Ou então, o objectivo de Rita Matias não é a promoção de soluções para os grandes desafios dos portugueses, mas apenas criar estardalhaço e acicatar as hostes nas suas trincheiras a apedrejarem-se mutuamente – coisa pouco cristã.
Mas vamos aos factos: o genial Kylian Mbappé, nasceu em França em 1998, mais concretamente em Paris, filho de um camaronês cristão e de uma argelina. Para a extrema-direita francesa a Argélia é França. Até Éric Zeemour, expoente máximo da direita nativista francesa é retornado da Argélia, um autêntico “Pied-noir”. Insinuar que o Mbappé não é francês, ou é ignorância ou má-fé da deputada do Chega. É assim como dizer que o Eusébio ou o Matateu não são portugueses, ou que Tito Paris ou Nelson Évora não sejam bem-vindos em Portugal.
De resto, por falar em generalizações e clichés, a França só se tornou numa potência do futebol (desporto que os “nativos” sempre desdenharam) com a imigração, onde se incluíam os portugueses. Quer-me parecer que os franceses idealizados sempre foram mais apreciadores de bons queijos, bons vinhos e motins violentos, tendo-se políticamente destacado mais a cortar cabeças que pela devoção cristã, qualidade esta última que suspeito Rita Matias valoriza. O mundo é mesmo complicado...
Desde há anos, com destaque para os últimos dias em que foi aprovada, anda pelas bocas da Europa uma lei do restauro da natureza (acho graça quando lhe chamam lei da restauração da natureza, em rigor, é admissível, mas na verdade restauro e restauração, embora tenham uma sobreposição de significado, são palavras suficientemente diferentes para tornar cómica a ideia de restauração da natureza).
No tempo em que estava mais envolvido nas discussões sobre conservação da natureza, a posição dominante, a Sul, era a de que restaurar era sempre mais caro que conservar, o que acabava por resultar numa clivagem entre os conservacionistas dos países do Norte e Centro da Europa, que não tendo já grande coisa para conservar insistiam no restauro, e os conservacionistas do Sul da Europa que entendiam que os dinheiros europeus da conservação deviam ser canalizados para conservar o que ainda estava em estado razoável no Sul da Europa, em vez de dissipar recursos em políticas que beneficiavam o infractor, isto é, os que tinham destruído os seus valores naturais.
Pelos vistos, o Sul da Europa (e, em parte, os novos membros de Leste), os grandes hotspots de biodiversidade europeus, perderam essa guerra e passaram a estar do lado dos que defendem políticas de restauro como sendo centrais para a conservação da natureza europeia (estou convencido de que o que fez a balança inclinar-se para a ideia de restauro foi a retórica da emergência, da antecâmara do apocalipse, que tornou credível a ideia de que temos de fazer tudo o que é necessário para parar a perda de biodiversidade, não sendo já possível pensar em conservar, é mesmo necessário obrigar os governos, as empresas e as pessoas a pagar o estrago que está feito, através de políticas de restauro, independentemente do que isso possa significar em afectação de recursos).
Claro que, como acontece quando se acha que legislar é a forma mais eficiente de chegar aos amanhãs que cantam, a lei andou em bolandas e foi sendo burilada em função das pressões e da realidade, pelo que o resultado final parece ser um típico produto da burocracia europeia: grandes proclamações, grandes objectivos, grandes responsabilidades atribuídas aos estados membro da União, e zero de consequências se nada acontecer.
Há um conjunto de objectivos exigentes para 2030, cuja concretização exige a mobilização de toda a sociedade - a gestão do património natural não é uma tarefa do Estado, é o resultado de milhões de decisões individuais das pessoas comuns - e a lei, para conseguir cumprir estes objectivos, acha que o passo mais relevante é que os Estados membro façam um plano nacional de restauro.
Para não cair no ridículo de propôr prazos evidentemente delirantes, a lei diz que esse plano deve estar feito em dois anos, a que se seguem seis meses de apreciação pela burocracia comunitária, as adaptações decorrentes dessa apreciação, de maneira que lá por 2027 Portugal, e os outros estados membros, terão um plano que em três anos, de 2027 a 2030, vai levar o país a atingir objectivos que não conseguiu atingir nos últimos 50 anos de políticas de conservação.
Acontece que esse prazo de dois anos é completamente irrealista para o que a lei exige que o plano tenha, digo eu, no estado catatónico em que está a administração pública na área da conservação e no estado de alienação social que caracteriza hoje o pensamento sobre gestão dos recursos naturais em Portugal (e em grande parte do mundo).
Eu sei que se dirá que está muita coisa feita para trás, e isso é verdade, mas o que está feito para trás é exactamente o que nos levou ao ponto em que estamos, portanto usar o que deu maus resultados como base para ter melhores resultados parece-me um bocado ingénuo.
Mesmo esquecendo esse aspecto de substância, a questão de fundo é que um plano, para ser eficaz, tem de ter clareza estratégica e uma noção muito clara do que é informação que discrimina e do que é palha, coisa para a qual falta pensamento crítico no país.
Quando eu trabalhava em ordenamento do território, o normal era os planos arrastarem-se por meses e meses (quando não anos) de análise de informação, sem que se conseguisse chegar a algum lado, "como o rio de S. Pedro de Moel/ Que se some nas areias em plena praia/ Ali a 10 metros do mar em maré cheia e nunca consegue desaguar de maneira que se possa dizer: porra, finalmente o rio desaguou!".
Não se pense que estou a escrever de cor.
Durante muitos anos, muitas áreas protegidas em Portugal continuavam sem plano de ordenamento, cuja conclusão era prometida amiúde para daí a pouco tempo, "porque já havia muito trabalho feito que agora era só organizar".
Numa dessas vezes, um ministro, Nobre Guedes (foi um excelente ministro do ambiente, apesar da má fama que tem, quer Nobre Guedes como ministro, quer o governo de que fez parte, para o que não terá sido indiferente ter um excelente chefe de gabinete, Adolfo Mesquita Nunes e um excelente secretário de estado, Jorge Moreira da Silva), resolveu prometer que seis meses depois de tomar posse, todas as áreas protegidas teriam plano de ordenamento.
Nessa altura eu fiquei responsável pelo assunto e, com as mesmas pessoas que durante anos não conseguiam acabar planos nenhuns, os planos que faltavam foram todos acabados, o que implicou uma liderança clara e métodos de trabalho orientados para o objectivo pretendido, isto é, tomar decisões com base na informação existente, em vez de passar o tempo à procura da informação necessária para tomar decisões (também ajudou o facto de eu repetir todos os dias que não há pior coisa para rebentar orçamentos e prazos que o "já agora", o principal problema da cultura portuguesa de planeamento, que pretende aproveitar a oportunidade criada por cada novo processo para resolver os problemas do mundo, em vez de se limitar a resolver o problema para o qual foi criado o processo).
Acontece que, na actual conjuntura da administração pública, a probabilidade de ter chefias capazes de fazer isto é baixíssima, pelo que a probabilidade de, dentro de dois anos, ou mesmo até 2030, haver um plano nacional de restauro, é ainda mais baixa.
E esta é apenas a parte mais fácil de aplicação da lei de restauro da natureza agora aprovada.
A velhice, o cinismo e outras coisas que tais concorrem para o meu encolher de ombros perante a "histórica" (não tem conta o número de decisões "históricas" que vi serem tomadas e assim classificadas pelos seus decisores, sem que hoje alguém se lembre delas) decisão de aprovar de lei de restauro da natureza.
Felizmente há luar.
Sugiro a leitura deste artigo de João Adrião, uma carta aberta a Montenegro sobre fogos.
Conheço João Adrião, concordamos em muita coisa na substância da gestão da paisagem, discordamos em muita coisa na forma, mas não tenho grandes dúvidas em subscrever esta carta aberta.
Uma das coisas que me fazem subscrever esta carta é que ela é dirigida a Montenegro, e não aos responsáveis directos pela tutela da gestão da paisagem, no que diz respeito à gestão do fogo.
Não sei as razões de João Adrião para essa opção, mas sei as minhas: não vejo nem no ministro da agricultura, nem na ministra do ambiente, qualquer sinal de pensamento estratégico sobre gestão do fogo, tal como já não se via no programa eleitoral em que assenta este governo (aliás a dupla tutela sobre o assunto e a reposição da AGIF na orgânica do governo são boas demonstrações disso mesmo).
Conheço o secretário de estado das florestas, não tenho dúvidas sobre as suas boas intenções, mas não me parece muito útil esperar que esteja aí o motor para uma gestão estratégica do problema do fogo.
Sobra o primeiro-ministro, mesmo que, infelizmente, não pareça ter qualquer sucesso esta tentativa de trazer o debate sobre a gestão do fogo para onde ele deve estar, na gestão de combustíveis com o que isso implica de remuneração da gestão da paisagem pelas pessoas comuns.
Montenegro tem problemas para resolver em 2024, procurando chegar em boa posição às próximas eleições, e os grandes problemas relacionados com os fogos só devem acontecer lá para 2030.
Sete anos passados sobre 2017 quer dizer que o risco está em forte crescimento desde o quinto ano, para estar próximo do máximo a partir dos doze anos, estamos, portanto, num nível de risco relevante mas não extremo.
Os incentivos que existem, na ausência de pensamento estratégico por parte de quem o deveria ter, é que Montenegro deixe correr o marfim, satisfaça bombeiros e autarcas tanto quando possível, refira que o que for acontecendo de aceitável é a demonstração de que a política do seu governo está a funcionar e vá falando de ignições e fiscalização da GNR em relação ao cumprimento de legislação absurda sobre o assunto.
Como ainda por cima, do lado da administração, a fonte mais consistente de pensamento sobre o assunto é a AGIF, cujo presidente tem uma forte conotação com o PS e o governo anterior, tudo se alinha para que continuemos, passo a passo, a caminhar para o desastre anunciado.
Que chegará um dia, não sabemos quando - as probabilidades andam ali por 2030, mais ano, menos ano, mas esse é o padrão geral, que pode ser subvertido por um ano meteorológico excepcional, dado que os combustíveis começam a estar em ponto de rebuçado -, mas chegará.
Não leio o Expresso, de maneira geral, por nenhuma razão em especial.
Mas tendo reparado numa diatribe sobre o facto do Expresso ter publicado um artigo de opinião de Moedas respondendo a Miguel Sousa Tavares, li os dois artigos.
Pela enésima vez, confirmei que Miguel Sousa Tavares (como muitos outros cronistas, eu sei que existem diferenças relevantes em muitos aspectos, é fácil verificar que pondo lado a lado Carmo Afonso e Miguel Sousa Tavares se verifica que Miguel Sousa Tavares escreve bem, mas os dois têm em comum coisas essenciais que se repetem em muitos outros cronistas) pertence ao grupo dos cronistas que jamais deixarão que os factos influenciem as suas opiniões.
Respondem-me frequentemente que as coisas são assim, chama-se liberdade de expressão e opinião.
Eu sou radicalmente a favor da liberdade de expressão, não me passando pela cabeça impedir que alguém diga, defenda, escreva, que a terra é plana.
Questão diferente, que é a que me interessa, é saber se os jornais devem contratar e dar destaque a cronistas que, de forma reiterada, dizem que a terra é plana, isto é, confundindo o direito à sua opinião com o direito aos seus factos, passam o tempo a escrever coisas que são falsidades.
Não vou dizer que são mentiras, a mentira pressupõe a vontade de enganar os outros, mas parece-me evidente que quem, no mesmo artigo, critica Moedas por achar que não lhe servem "as esplanadas se não consigo abstrair-me da poluição visual dos horriveis guarda-sóis e cadeiras de plástico da Super Bock ou da Sagres" e elogia Medina porque "licenciou centenas de esplanadas" não tem, evidentemente, vontade de enganar ninguém, diz o que lhe apetece, desde que sirva para contrabandear a sua opinião.
Dizer que os turistas expulsaram os lisboetas (atribuir isso a Moedas penso que fará parte daquela mania americana de estar sempre a dizer piadas no meio de qualquer discurso) é simplesmente falso, não é uma opinião, no mesmo sentido em que dizer que a terra é plana é simplesmente falso, não é uma opinião.
Dizer que os arrendamentos em Lisboa são os segundos mais caros da Europa é simplesmente falso, não é uma opinião.
Dizer que não se consegue chegar ao Terreiro do Paço ou à Ribeira das Naus a não ser de tuk-tuk é simplesmente falso, não é uma opinião (é uma típica afirmação de gente bon chic bon genre, que desconhece como funcionam os transportes públicos, porque não põe lá os pés, e portanto desconhece a concentração de transportes públicos que existe nessa zona da cidade, Metro, autocarros, barcos, comboios, etc.).
E poderia continuar só neste artigo, mas este é o registo habitual deste cronista, verifico-o sempre que escreve sobre algum assunto de que eu perceba minimamente.
Como digo, não é, de maneira nenhuma, o único.
E a pergunta, para a qual não tenho resposta, é sempre a mesma: o jornal que contrata, mantém e dá destaque a pessoas que publicam sistematicamente falsidades, desde que sirvam os seus argumentos, que demonstram, crónica após crónica, que jamais deixarão que os factos influenciem as suas opiniões, apresentando-se como iluministas racionais apesar de demonstrarem que a sua cabeça funciona exactamente como a dos terraplanistas, não tem responsabilidade na degradação da qualidade do debate público que decorre de ter terraplanistas a ocupar boa parte do espaço mediático mais destacado?
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos
Naquele tempo, disse Jesus à multidão: «O reino de Deus é como um homem que lançou a semente à terra. Dorme e levanta-se, noite e dia, enquanto a semente germina e cresce, sem ele saber como. A terra produz por si, primeiro a planta, depois a espiga, por fim o trigo maduro na espiga. E quando o trigo o permite, logo se mete a foice, porque já chegou o tempo da colheita». Jesus dizia ainda: «A que havemos de comparar o reino de Deus? Em que parábola o havemos de apresentar? É como um grão de mostarda, que, ao ser semeado na terra, é a menor de todas as sementes que há sobre a terra; mas, depois de semeado, começa a crescer e torna-se a maior de todas as plantas da horta, estendendo de tal forma os seus ramos que as aves do céu podem abrigar-se à sua sombra». Jesus pregava-lhes a palavra de Deus com muitas parábolas como estas, conforme eram capazes de entender. E não lhes falava senão em parábolas; mas, em particular, tudo explicava aos seus discípulos.
Palavra da salvação.
Não é a primeira vez que digo isto: pessoalmente, sou absolutamente contra o gasto de dinheiro dos contribuintes neste tipo de coisas.
Não quer dizer que se fosse eu o presidente da junta, não acabasse yambém a decidir fazer isto, porque a tomada de decisão em políticas públicas é, de maneira geral, colectiva, e o resultado é muitas vezes diferente daquele que quem está no topo do processo decisão acharia melhor mas, pessoalmente, não vejo por que razão o dinheiro dos mais pobres deva servir para oferecer festas aos remediados, classe média e ricos.
Não vejo qualquer interesse cultural no esbanjamento de dinheiro com a contratação de artistas cujos critérios de selecção são obscuros, não vejo razão para gastar recursos a fazer barracas de comidas e bebidas (de maneira geral, acabando em preços mais altos para os consumidores que os que seriam gerados por processos liberais de celebração colectiva) e mais um conjunto de coisas, e muito menos vejo o interesse social em celebrar um dia, o 13 de Junho, com uma festa, paga pelos contribuintes, quase contínua entre 31 de Maio e 15 de Junho.
Uma coisa é a intervenção pública em património em risco (seja ele cultural ou natural), outra coisa é a intervenção pública no financiamento do ensino ou acesso a bens culturais, outra coisa é a formação de públicos para acções culturais diferenciadas, mas nenhuma destas três coisas está em causa nos rios de dinheiro que são gastos pelo país todo em festas e festarolas.
Eu compreendo que as comunidades precisem de rituais celebratórios, mas o que está neste cartaz, que está longe de ser caso isolado, duvido que consiga passar qualquer teste minimamente sério de avaliação do custo/ benefício social dos recursos aplicados nisto.
Não entendo, não entendo, não entendo.
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.
A ignorância dos seus comentários só tem paralelo ...
E argumentos, tem?
o cinismo dos seus posts é abissal. se acha que nã...
os dois milhões de reféns do hamas não existiriam ...
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