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A frase que adaptei como título desta crónica é retirada do discurso do Papa Bento XVI a 25 de Abril de 2005 às delegações e peregrinos de língua alemã em Roma por ocasião da sua eleição e ficou a ressoar na minha consciência nas semanas que se seguiram à sua morte. Porque encaixa na percepção que tenho dos caminhos da decadência que nos atraem por estes dias no ocidente niilista. Ao conforto todos nos sentimos atraídos - como diz o povo, disso até os bichos gostam. Mas das pessoas espera-se que exijam algo mais.
É no conforto que investimos grande parte dos nossos recursos: uma casa confortável, decorada com os mais variados objectos que nos devolvam harmonia e identidade, equipada com o necessário para elaborar sofisticadas refeições para a família e os amigos, livros dos nossos autores preferidos à mão de semear, um sistema de som que transforme a sala numa sala de concertos, etc. etc.. O problema é que, ao final do dia, parece-me evidente que não é nada disto que nos realiza, antes amolece-nos como papalvos. Bem sei que nos podemos inscrever no ginásio a massacrar o corpinho ou participar noutros desafios, até solidários, que o "mercado" nos oferece. Pela minha parte, quando me encolho no conforto com demasiado afinco e por demasiado tempo, consome-se-me a longevidade, estagno-me na lassidão, e revolve-se-me a ansiedade, numa urgência de ressurreição. Quando muito o conforto é um ponto de partida que nos desafia a coisas grandes. Amaldiçoado será o príncipe, mesmo suplente, que rejeita o privilégio de serviço vitalício ao seu povo.
Não se julgue que os grandes feitos são só como os do escritor que vê impressa a sua obra prima, do cientista que depois de anos de extenuante investigação descobre a cura para uma doença fatal, da conquista duma medalha olímpica pelo desportista, ou a tomada de posse do político após uma vitória eleitoral – essas são coisas grandes, sim, mas as mais importantes "coisas grandes" a maior parte das vezes ficam anónimas, não brilham na ribalta, são obras de cura e harmonia que obtemos para os outros, ou até conflitos que evitámos pelo silêncio. As coisas grandes são sempre para os outros, salvam alguém ou alguma coisa, é assim que as usufruímos em pleno. Podem ser pequenas na aparência; uma visita a uma pessoa só a partilha de um bem escasso – o saber ouvir. Mas já é do âmbito de "coisa enorme" o filho que cuida disciplinadamente meses a fio do pai enfermo, que já não irá agradecer. É uma coisa enorme oferecer sem pedir de volta. Se isso se tornasse moda, era um pouco de Céu que se replicava na Terra. Desenvolver a capacidade de fazer "coisas grandes" é civilização, é o que devemos ensinar os nossos filhos, desde logo pelo exemplo. É urgente despertar-lhes o bichinho de fazer coisas grandes, um dom democrático ao alcance de todos, porque esse é o sopro divino que nos foi dado e nos distingue da restante criação. Só possível a partir de cada pessoa e na sua medida, eu sei. É construirmos um mundo melhor de dentro para fora sem desfalecer com os tropeções, que as contas se fazem no fim.
Julgo que esta é a matriz da Europa cristã que Bento XVI tanto se preocupava em preservar e que vai capitulando à conquista do conforto tido como um fim e si. Não deveria o conforto ser apenas o ponto de partida para as "coisas grandes" ou estará condenado a ser a causa da distracção e amolecimento das vontades?
Esta é a minha modesta e tardia homenagem a Bento XVI.
Por causa do meu post anterior, um amigo, muito indignado por eu me distrair do essencial, pergunta-me: "desmembrar o ICNF é acessório?".
O ICNF é o Instituto da Conservação da Natureza e Florestas (ou Instituto para a Conservação da Natureza e Florestas, nem sei, nem vou verificar), o sítio onde trabalho, onde fiz grande parte da minha carreira e aprendizagem profissional, e onde fiz de tudo, desde estagiário a vice-presidente, até a recentemente ter ganho um concurso para chefe de departamento de conservação, lugar que acabei por recusar por razões que só a mim dizem respeito.
Mais que isso, sou um dos redactores principais do regime jurídico da conservação da natureza em Portugal, estive na base da transposição da directiva habitats para o direito português, fui responsável pela discussão pública e criação da rede natura em Portugal (na componente que decorre da directiva habitats e não da directiva aves, que é anterior), fui responsável por todas as áreas protegidas em Portugal, ao fim de décadas, passarem a ter um plano de ordenamento (algumas tinham e outras não tinham, tendo eu trabalhado em vários dos planos de ordenamento que existiam), fui responsável operacional (a ideia foi de João Menezes) pelo processo Business and Biodiversity, fui responsável durante uns anos pelos processos de Avaliação de Impacte Ambiental em que o ICN participava e muitas, muitas outras coisas.
Claro que nem uma destas coisas fiz sozinho e em muitas delas nem sequer era o principal responsável do processo, era o segundo ou terceiro.
Tenho pois uma grande afeição ao ICN, nas suas várias configurações, e acho um bom instrumento de intervenção do Estado na gestão de conservação da natureza, na medida em que conseguir cumprir as suas funções com um mínimo de eficácia e decência.
Dito isto, a minha resposta ao meu amigo é absolutamente clara: não, desmembrar, extinguir, rebentar com o ICNF, não faz parte do essencial.
Conheço Carlos Pimenta há anos, tenho imenso respeito e afecto por ele, agradeço-lhe mesmo muito ter-me apoiado quando fiz o meu doutoramento (um doutoramento feito nas horas vagas, sem qualquer bolsa, numa família relativamente grande e endividada, não é uma situação fácil de gerir e agradeço muito a quem me permitiu fazê-lo, Carlos Pimenta é uma dessas pessoas). Um dia contou-me (é público, não é nenhuma inconfidência) que não queria ser secretário de estado e por isso fez exigências que considerava inaceitáveis para o ministro que o convidava, incluindo triplicar o orçamento do então serviço de parques. O minstro aceitou e Carlos Pimenta continua a orgulhar-se de ter conseguido esta lança em África. Não pude deixar de lhe responder que, infelizmente, tinha sido um erro estratégico que ainda hoje é pago pelo ICNF: a súbita afluência de recursos sem as necessárias competências de planeamento, gestão e controlo, acabaram como acabam sempre: numa maldição de recursos.
O ICNF tem recursos a mais para a capacidade estratégica que tem e para os sistemas de comando e controlo que tem, o que o torna numa máquina de torrar dinheiro, umas vezes com bons resultados, outras vezes com maus resultados, mas com a absoluta incapacidade para distinguir uma situação da outra.
Tudo isto é potenciado pelo pudor com que se fala de corrupção a propósito de conservação da natureza e florestas - claro que há corrupção, quer a financeira, quer a corrupção moral que consiste em proteger os amigos, perseguir os inimigos e aplicar a lei aos restantes -, e pelas opções de gestão que resultam no facto de haver um conselho directivo com oito membros e, com a excepção do seu presidente que tem uma breve experiência em conservação, não ter um único membro com curriculum digno desse nome em conservação da natureza.
Não seria grave, se fossem todos grandes gestores e pessoas de excepção, mas desses oito membros, seguramente menos de metade seriam eventualmente escolhidos para os lugares que ocupam, se houvesse um mínimo dos mínimos de exigência (e de vergonha na cara) nessa escolha.
Ainda assim, discutir o ICNF continua a não ser essencial, porque o essencial não é o que Estado decide ou faz no território, o essencial é que cada proprietário e gestor faz.
E é por isso que me interessa pouco discutir os modelos de gestão do ICNF, excepto na reafirmação constante de que sem avaliação de resultados sólida e sem responsabilização pelas decisões tomadas, não apenas pela gestão de topo, mas por cada técnico que emite um parecer não fundamentado (quando não mesmo ilegal), qualquer modelo de gestão falha em criar uma instituição que consiga devolver à sociedade o que os contribuintes investem nela.
Só que este não é um problema do ICNF, este é um problema da sociedade portuguesa e do Estado que sustenta, quer financeiramente, quer na falta de exigência que lhe dedica.
Daniel Veríssimo é um rapaz novo (suponho que andará pelos 25 anos) e que tem visto vários artigos seus sobre conservação da natureza e o Instituto da Conservação da Natureza e Florestas (onde trabalho, fica feita a declaração de interesses) publicados e republicados.
Como tenho muitos amigos que sabem que me interesso por gestão da paisagem e do património natural, frequentemente fazem-me chegar esses artigos achando-os muito relevantes.
O último dos artigos que me fizeram chegar é publicado pelo Público (P3), numa coisa chamada Azul, que é um suplemento de militância ambiental que há quem confunda com jornalismo ambiental (não é de agora, o jornalismo ambiental sempre foi militante, embora sempre com diferenças notórias entre os militantes ambientais, que por acaso escreviam em jornais, e os jornalistas que, sendo militantes ambientais, nunca confundiram a sua militância pessoal com o seu trabalho profissional, de que são exemplo Carla Castelo ou Ricardo Garcia).
O artigo “O fim do ICNF — mal-amado, agora quase acabado” tem as características que decorrem do seu autor ser um “Conservation Finance Expert”, com um curso de economia do ISCTE e que, nas suas palavras, “Desde muito novo que é interessado pela natureza e cresceu a ver documentários da BBC Vida Selvagem”, tendo um curriculum de trabalho em conservação da natureza que se resume a trabalhar para a “Rewilding”, primeiro como técnico de empreendedorismo, durante quase três anos mudando-se em Setembro do ano passado para a casa-mãe, nos Países Baixos, com a tal missão de ser “Conservation Finance Expert” (para além dos anos a ver televisão, claro).
O artigo começa com afirmações fortes e de cátedra, como é habitual nos artigos de Daniel Veríssimo:
“O ICNF (Instituto para a Conservação da Natureza e Florestas), apesar de ser pouco conhecido, desempenha um papel importante, é a entidade responsável pela preservação e restauro do mundo natural no país”.
Não sei o que Daniel Veríssimo entende por “pouco conhecido”, pela parte que me toca, não conheço ninguém que não conheça o Instituto para a Conservação da Natureza e Florestas, e não é a entidade responsável por isto ou aquilo, isso somos todos nós, é a entidade de tutela deste sector, o Estado não é responsável pela sociedade.
Depois deste primeiro parágrafo introdutório, com um equívoco sobre o papel do Estado na conservação do património natural, Daniel Veríssimo entra a matar:
“Se fosse uma entidade ao nível das melhores da Europa, seria motivo de orgulho nacional, o seu nome reconhecido pelo público e os sucessos seriam abertura de noticiários e capas de jornais. Mas o ICNF não é uma das melhores, talvez seja uma das piores entidades governamentais responsáveis pela conservação e restauro da natureza no continente europeu, é mal estruturada, tem pouca ou nenhuma visão estratégica e tem fracos resultados no terreno.”
Eu não sei de que países fala Daniel Veríssimo em que os sucessos em Conservação da Natureza abrem noticiários e capas de jornais, embora conheça muitos países em que a conservação da natureza aparece a abrir noticiários e a fazer capas de jornais quando alguma coisa corre mal ou, pelo menos, existe a percepção de que correu mal.
De resto, essa é uma opinião generalizada sobre a importância atribuída à biodiversidade mundialmente, sendo frequentemente comparadas coberturas noticiosas das cimeiras do clima e da biodiversidade, bem como o nível de representação dos estados nas duas cimeiras, não sendo habitual ver chefes de Estado nas COP da Convenção da Biodiversidade, ao contrário do que acontece nas COP do clima.
Também não sei quais os critérios de Daniel Veríssimo para avaliar o desempenho das diferentes entidades do Estado que tutelam o sector em todo o lado, tal como estranho as certezas de Daniel Veríssimo sobre os fracos resultados do ICNF no terreno, visto que uma das principais deficiências das políticas públicas de conservação é a avaliação de resultados da gestão, razão pela qual não existe qualquer maneira de alguém conseguir distinguir o que tem corrido bem e o que corre mal nas políticas públicas de conservação da natureza (nisso não existe originalidade deste sector, é o padrão na administração pública portuguesa, embora potenciado pela dificuldade intrínseca em avaliar resultados em matéria de conservação da natureza).
O que é inegável é que Portugal é um hotspot de biodiversidade na Europa e concentra em si muito mais património natural que a generalidade dos outros países europeus, apesar da ladainha da desgraça que há anos é habitual sobre o assunto, como no caso deste artigo de jornal.
“Um olhar atento revela nos últimos anos mais escândalos que resultados. O restauro das populações de lince ibérico (um grande sucesso) contrasta com incêndios nas áreas protegidas (ardeu a serra da Estrela e o parque da Arrábida no Verão passado). A condenação pelo tribunal europeu certifica a fraca qualidade do trabalho do ICNF na preservação de espécies e habitats.”
Um olhar atento revela que apesar da frase forte sobre mais escândalos que sucessos, o autor não identifica um único escândalo e de resto limita-se a fazer uma escolha cuidada de assuntos aleatórios que servem as suas frases definitivas, sem fazer o menor esforço de avaliação do que quer que seja e, mais grave, sugerindo uma enorme ignorância sobre os assuntos sobre os quais escreve.
Comecemos pelo exemplo de sucesso que refere – a recuperação das populações de lince – que omite as enormes variações nessas populações em função da disponibilidade de coelho, questão que até pode ter alguma relação com acções de conservação, mas é essencialmente o resultado das epidemias periódicas que assolam as populações de coelho.
O autor esquece que 90 a 95% da população de coelho morre nos anos 50 por causa da mixomatose, levando a uma fortíssimo redução das populações de lince, que volta a haver uma razia brutal, por causa da pneumonia hemorrágica viral, nos anos 80 (que escolhe, não apenas o autor, mas a generalidade dos conservacionistas que se entretêem a atribuir ao que fazem as fases ascendentes das populações de lince, e às epidemias nos coelhos as fases descendentes) como linha base para avaliação da população de lince, esquecendo igualmente que trinta anos depois voltou a haver uma depressão na população de lince, por via de outra epidemia (esta menos desastrosa).
O autor atribui este sucesso ao ICNF – não se sabe porquê – e prefere não o discutir com informação objectiva da dinâmica das espécies selvagens que, felizmente, depende muito menos das políticas do Estado que das evoluções sócio-económicas que condicionam a evolução das paisagens.
Este erro de análise é ainda mais evidente quando atribui ao ICNF o papel de Deus que faz haver ou não haver incêndios, omitindo que os fogos são um elemento natural, sempre presente nos sistemas naturais, cujo padrão de frequência, continuidade e severidade depende, essencialmente, da gestão de combustíveis finos.
Por esta razão, Daniel Veríssimo considera que arder em áreas protegidas é um falhanço do ICNF, sem sequer curar de saber que muitos valores naturais dependem destes fenómenos de perturbação para serem viáveis (sendo novo, como é, ainda vai a tempo de estudar o grande incêndio do Parque Nacional de Yellowstone, que na opinião do autor demonstraria a incompetência do serviço de parques americano, bem como as avaliações dos seus efeitos ao longo do tempo. Talvez nessa altura perceba que o problema do ICNF e da política pública de conservação não é o facto de existirem fogos nas áreas protegidas, mas não existir avaliação consistente e estendida no tempo que permita produzir relatórios sólidos sobre os efeitos dos fogos na biodiversidade. O que abre espaço para que a ignorância de Daniel Veríssimo sobre o papel dos fogos nos ecossistemas que temos, e na conservação do património natural, possa ser lida como uma opinião que vale a pena ponderar, e não apenas como aquilo que é: o atrevimento da ignorância).
“A aposta em floresta biodiversa é traduzida em mais licenças para plantar eucaliptos, gestões florestais danosas (mata dos Medos, Lousã ou pinhal de Ovar) e gestão do “abandono”.”
Sem surpresa, dada a expressa ignorância sobre os processos de evolução da paisagem, lá vem o papão dos eucaliptos, com o truque retórico de atribuir ao ICNF o poder de determinar a área de uma espécie com políticas administrativas, ou o poder de contrariar o abandono que resulta da falta de competitividade das actividades que gerem território.
Até aqui, é o normal, mais grave é a ligação a licenças para plantar eucaliptos e a Mata dos Medos, Lousã ou pinhal de Ovar, porque saltamos do nível da ignorância para a pura desonestidade, não havendo nenhum dado objectivo que autorize a acusação implícita de que o ICNF está a promover o licenciamento de novas áreas de eucaliptal onde se refere.
É verdade que a área de eucalipto aumenta (pouco, mas aumenta), só que isso não corresponde a qualquer política pública, e muito menos à acção do ICNF, pelo contrário, é a resposta social que contraria essas políticas públicas irrealistas e mal formuladas.
A quimera da aposta na floresta biodiversa (quantos hectares de floresta biodiversa foram instalados, com sucesso, pela Rewilding, nos terrenos que gere, a que preço e com que financiamento?) infelizmente é um erro estratégico do ICNF, dando suporte a uma política demagógica e populista que assenta numa asneira técnica: a de que a alteração das espécies dos povoamentos florestais altera o padrão de fogo que ocorre, erro estratégico que é responsável pela tibieza das políticas de gestão de combustíveis finos, essas sim, úteis para gerir sensatamente o fogo e para cujo sucesso seria possível contar com os produtores de eucaliptos, se o ICNF não cedesse à demagogia a que o parágrafo citado dá voz.
“Uma gestão de “proximidade”, fundamental para prevenir conflitos e garantir benefícios para as comunidades perto de zonas naturais, significa para o ICNF reuniões em palácios na capital e inexistência de diretores para as áreas protegidas”.
A já citada desonestidade do texto tem aqui mais uma evidência, ao omitir que a tal reunião em palácios na capital foi apenas a primeira de outras que foram sendo feitas noutros locais.
Discordando eu do modelo que o ICNF adoptou para o processo a que se refere a tal reunião, defendendo eu um modelo bem mais atento a quem faz conservação e menos a quem diz que sabe fazer conservação, acho insuportável este tipo de demagogia sem qualquer utilidade para a conservação na natureza.
Quanto à existência de directores de áreas protegidas, uma conversa absurda que é permanentemente invocada por quem desconhece a história da conservação da natureza em Portugal, gostaria de dizer que fui eu quem fez a primeira proposta para liquidar o sistema feudal de gestão de áreas protegidas em que os directores se consideravam imbuídos dos direitos dos marqueses do antigo regime sobre os territórios sob sua tutela.
O autor do texto é demasiado novo para ter consciência do que era a gestão de áreas protegidas até ter sido tomada a decisão de reorganizar a sua gestão de topo com base em áreas mais vastas (aproveito para negar, veementemente, que em todo o mundo as áreas protegidas têm directores, em muitos lados não é assim, e foi exactamente a demonstração de que havia muitos sítios no mundo que tinham adoptados outros modelos, que fez com que a minha proposta de acabar com os directores que havia acabou por ter sucesso).
Para o que aqui interessa, as críticas ao ICNF e seus antecessores, eram, já nessa altura, do mesmo tipo e usando os mesmos argumentos, isto é, a existência de directores de áreas protegidas que na prática não respondiam a ninguém, não eram responsáveis pelos resultados que entregavam e não tinham de responder em Bruxelas por eventuais incumprimentos da legislação comunitária em matéria de conservação, não correspondeu a nenhum período áureo da gestão de áreas protegidas em Portugal.
O que se compreende: todos os modelos de gestão são igualmente maus quando não existe avaliação e responsabilização.
As poucas, pouquíssimas, direcções do ICNF e seus antecessores, que adoptaram políticas sérias de avaliação e responsabilização, o que é especialmente difícil numa organização de conservação dentro do Estado português, foram rapidamente removidas por uma coligação de interesses internos e necessidade de evitar a contestação política e mediática, com o forte aplauso das ONGAs e destes militantes que nunca geriram nada, mas insistem que sabem muito mais do assunto que os que têm de resolver problemas todos os dias.
O resto do artigo é tão deprimente na sua ignorância sobre as obrigações internacionais do Estado português, sobre a natureza da administração pública em Portugal, sobre os processos de evolução da paisagem que condicionam a dinâmica das espécies selvagens, que seria ainda mais fastidioso estar a contestar, ponto por ponto, cada uma das afirmações tontas e não fundamentadas a que o Público acha que deve dar publicidade.
“Quando outros países reintroduzem espécies localmente extintas ou pouco abundantes, Portugal ainda faz “monitorização”. Quando outros países centralizam funções numa entidade para dar mais força à conservação da natureza, Portugal espalha e dilui responsabilidades”.
Continuar a explicar que contrapor a reintrodução de espécies (o principal negócio da Rewilding, uma operação cara, frequentemente inútil e ineficaz se comparada com a gestão da dinâmica natural, como demonstra a história da reentrada do lobo nos Países Baixos, onde a Rewilding nunca conseguiu apoio para fazer essa reintrodução) com monitorização, raia a demência e é um exercício inútil, tão inútil como explicar que o Reino Unido, reconhecido pela sua longa e eficiente história de conservação do património natural, nunca teve sequer um serviço central de conservação, nunca lá existiu, nem existe, um ICNF.
“Quando outros países aproveitam a diminuição da atividade agrícola em terras marginais para criar novas áreas protegidas e expandir existentes, Portugal aposta em “paisagens humanizadas”.”
Continuar a explicar que haver ou não haver paisagens humanizadas não é uma opção do Estado, mas o resultado de dinâmicas naturais, sociais e económicas complexas e assentes nas decisões concretas de milhões de indivíduos que respondem a estímulos que consideram melhorar a sua vida, é igualmente inútil.
“O restauro das populações de animais que deviam e podiam existir em terras lusitanas acontece à boleia de Espanha, ao longo da raia (a cabra-montês no Gerês, o urso em Montesinho, o abutre-preto na Malcata, o veado-vermelho ao longo da fronteira, a águia-imperial no Tejo internacional). Não é por acaso que o último livro encomendado pelo ICNF tem o título Fronteira Viva, a fronteira é dos poucos sítios com melhoria dos valores naturais (mas não é graças à mão do ICNF, é graças à falta dela)”.
A ignorância deste tipo de parágrafos, incapazes de reconhecer as dinâmicas de paisagem associadas ao retorno de muitas espécies, e ao declínio de muitas outras, ultrapassa qualquer boa vontade que se tenha em instruir garotos.
Não porque a ignorância seja homérica, como é, porque isso é sempre resolúvel, mas porque o essencial deste parágrafo não é a dimensão da ignorância expressa, é a desonestidade de escolher argumentos que se sabem falsos e omitir informação que se sabem verdadeiras, só porque ter isso em consideração diminuiria a eficácia do papel de lobbying para o financiamento das actividades da Rewilding, que é o que me parece que justifica que alguém exponha, voluntariamente, a sua ignorância desta maneira e nesta dimensão (veado-vermelho? Francamente, eu sei que há umas publicações que admitem este nome, mas ninguém o usa em Portugal, a menos que seja para fingir que se passa alguma coisa diferente na fronteira de Montesinho em relação à forte expansão do veado na Lousã, na sequência da reintrodução, conhecida há anos, e que desmonta os argumentos usados).
Um amigo chamou-me a atenção para uma sessão que a Ordem dos Biólogos ia fazer sobre áreas protegidas, na Assembleia da República.
Pode ser vista aqui.
A sessão é o que é (um conjunto de intervenções mais ou menos de prever, conhecendo os autores, repetindo os clichés sobre a matéria que alimentam discussões eternas sobre áreas protegidas, com uma ou outra excepção, nomeadamente por parte de Miguel Araújo), mais um conjunto de intervenções de deputados (e assessores) deprimentes (as intervenções, não os deputados), como seria de esperar num país em que quase não existe pensamento estratégico sobre gestão da conservação da natureza e da paisagem, com respostas de uma assistência que essencialmente dava voz à vitimização em que se viciou a tecnoestrutura do ICNF.
O que é verdadeiramente relevante na sessão?
Os ausentes.
Para mim, pessoalmente, desgosta-me profundamente que a Iniciativa Liberal não tenha tido tempo, disponibilidade ou interesse em encontrar alguém, dentro ou fora do partido, para lá estar. Mas enfim, isto é o que é.
O mais relevante não é essa ausência, essa é apenas um incómodo pessoal.
O mais relevante é que sendo uma sessão da elite da conservação em Portugal, a Ordem dos Biólogos (em que se misturam cargos corporativos com funções passadas de direcção no ICNF e afins), com a participação de deputados, autarcas, dirigentes antigos e actuais do ICNF, técnicos do ICNF, ONGs do ambiente, não tenha havido espaço para quem realmente faz gestão do território: agricultores, pastores, produtores florestais, gestores de baldios, propietários, caçadores, empresas de retalho e ligadas ao consumo de produtos provenientes do sector primário, produtores de azeite, de vinho, de abacate, de amêndoa, etc., etc., etc..
Não me espanta pois a minha sensação de que, de um lado e de outro dos intervenientes, me ficasse quase sempre a sensação de que estavam a discutir o sexo dos anjos, porque os que realmente tomam decisões sobre a gestão do território, aos olhos destas elites, são inúteis na discussão das políticas que lhes dizem respeito.
As elites, em Portugal, não precisam de pôr os pés na terra para tratarem das suas vidinhas, e isso nota-se nestas alturas.
Já aqui deixei escrito, muitas vezes, quanto não gosto de greves orquestradas, tresandando a CGTP e com finalidades meramente políticas de arruaça. Mas esta, a greve dos professores e pessoal auxiliar, apresenta uma sintomatologia completamente diferente que cativa simpatias. Além de corresponder a um tema já de longas e alvíssimas barbas.
Tudo vai muito além do arcano Nogueira e da sua Fenprof, aliás, como sempre, postados em frente da AR. Não, a greve de que falo estende-se ordeiramente pelo País todo, distrito por distrito, sem barulho que nos perturbe e arrebanhando a totalidade dos docentes. Os próprios pais, naturalmente aflitos com a vida dos filhos, a compreendem e apontam as suas criticas não para os professores - mas para o Governo.
E porque o conjunto é vasto - docentes, auxiliares escolares, pais - e o problema quase pré-histórico, não pertencerá a razão ao Estado com certeza.
Costa destruiu os contratos de associação com o ensino particular. O que ofereceu em troca aos portugueses? E, mais precisamente, à Educação?
Ao formular estas perguntas, ocorre-me sempre - já também aqui o escrevi - a monumental manifestação contra o Governo de Sócrates em Março de 2011, Av. da Liberdade abaixo. É, enfim, para onde estamos indo. (Por muito que Costa se tente sentar com uma nalga de fora na cadeira do Poder em capas de revista).
Com o foco colocado nos clientes o ensino privado destacou-se durante a pandemia pelo meticuloso acompanhamento proporcionado às crianças e aos encarregados de educação. Mas também é por causa das insistentes greves que os mais privilegiados fazem todos os sacrifícios possíveis para não abandonarem os filhos à sorte do ensino público, acelerando um inevitável processo estratificação social entre privilegiados e desfavorecidos. Os resultados serão evidentemente trágicos e não há interesses corporativos que o justifiquem.
Sim, claro que reconheço uma responsabilidade dos governos no estado a que chegou a administração pública portuguesa - não, o problema maior não é a corrupção ou a partidarização, o problema maior é a erosão da lei e das regras -, mas a história que vou contar é mesmo sobre a responsabilidade da administração ela mesma.
Volta, não volta, escrevo sobre o Porgrama de Transformação da Paisagem (há vários posts por aí, este serve de exemplo) e mais uma vez volto ao assunto depois de ler o Público de ontem (ou melhor, esta parte do Público, o resto lerei a seu tempo, não faço questão nenhuma de ler os jornais no dia em que são publicados).
Estranhei a chamada de primeira página: "Há uma revolução silenciosa em curso na floresta portuguesa com novas áreas integradas de gestão florestal".
Esta frase está tão fora da realidade, que fiz o que faço habitualmente: fui ver quem assinava esta peça.
A minha estranheza aumentou. Não conheço pessoalmente Teresa Silveira, mas conheço o seu trabalho e, independentemente de diferenças de pontos de vista, está longe de ser o trabalho de uma câmara de eco da propaganda de terceiros, a única justificação possível para se publicar uma frase como a que citei, a propósito dos planos de transformação da paisagem.
Fui ler, como o Augusto Gil foi ver.
Afinal o trabalho de Teresa Silveira correspondia à ideia que tinha dela, a chamada de primeira página é que era completamente abusiva, colocando certezas onde a peça em causa só tinha dúvidas, incerteza e um saudável cepticismo por parte dos potenciais interessados.
Fé, só mesmo do lado da administração: "Acredita-se que os beneficiários dos territórios (entidades gestoras, proprietários, produtores e outros intervenientes) não quererão desperdiçar a oportunidade de ter um financiamento que está alocado a estes territórios e que é comparticipado a 100%".
Recapitulemos.
Os governos (vários) são ciclicamente confrontados com fogos com um grande potencial de desgaste político.
Estes fogos resultam de um processo económico e social profundo, associado ao abandonono que resulta da falta de viabilidade económica da gestão do território.
Como ter propostas políticas eficazes para lidar com esse abandono é difícil em si, politicamente pouco compensador e exige constância das políticas públicas ao longo do tempo, os governos preferem usar os recursos em coisas politicamente menos arriscadas e mais compensadoras, reagindo ao tais grandes fogos cíclicos escolhendo um moinho de vento contra o qual investem de forma politicamente rentável, isto é, tomam decisões históricas cujos resultados se verão daqui a muitos anos, como é próprio das políticas de gestão do território.
Como quando o falhanço dessas opções for de tal maneira evidente que não possa ser negado o governo já é outro, culpa-se os governos anteriores pelas péssimas opções feitas, escolhe-se um novo espantalho, e agora é que vai ser.
O actual primeiro-ministro escolheu o eucalipto e a falta de ordenamento do território como espantalhos (da outra vez que estava no governo quando houve problemas sérios tinha escolhido a melhoria do combate, com a criação da autoridade nacional de protecção civil, mas isso agora não interessa nada).
Uma administração pública que cumprisse a sua missão teria a obrigação de deixar claro que o eucalipto não é tido nem achado para o assunto, no essencial (a investigação científica que existe sobre o assunto tem resultados esmagadores neste sentido) e que o problema não seria de ordenamento do território mas de economia das actividades que gerem o território (a investigação sobre o assunto tem resultados esmagadores sobre o assunto).
Não, esta administração pública que temos assume que a sua missão é dar cumprimento às orientações políticas do governo, não compreendendo que uma coisa é a legítima opção política do governo, a que a administração tem de dar seguimento, outra coisa são fantasias sem relação com a realidade, que a administração tem obrigação caracterizar como tal (se, depois disso, o governo insiste em governar contra a lei da gravidade, isso é com ele, o que a administração não pode é aceitar que o governo negue a lei da gravidade e a administração actue como se a lei da gravidade dependesse da vontade do governo).
Por isso escolhe uns académicos que sirvam para dizer que a lei da gravidade é uma construção social, monta uns processos de decisão que partem do princípio de que as pedras caem para cima e, no fim, argumenta: isto vai funcionar porque ninguém quer perder 220 milhões a fundo perdido.
Ninguém vai deixar esses 220 milhões perdidos por aí, esses vão com certeza ser usados, o problema de base é que vai ficar exactamente na mesma, até que o próximo governo tenha margem de manobra para dizer que os anteriores eram todos uma bestas, tomaram decisões erradas, inventar um novo espantalho e ... agora é que vai ser.
Com o beneplácito e o apoio de todos os rolhas que hoje povoam esta administração sonâmbula com que temos de conviver.
Um dia destes, na minha página do facebook, a propósito de se ir iniciar brevemente o período da declaração do IRS, falei do facto de este ano já ser possível consignar 0,5% do IRS à Montis, dizendo "finalmente, ao fim de anos de esforços, já é possível consignar 0,5% do IRS à Montis".
Um amigo, simpático e conhecedor dos meandros teóricos desta coisa, comentou: "Porquê anos de esforços? Após o período legal de 3 anos de funcionamento a atribuição é direta, desde que a ONGA faça o seu registo na AT.... Mas ainda bem, mais vale tarde".
O meu amigo está certo, a lei das Organizações Não Governamentais do Ambiente diz que ao fim de três anos, há uma atribuição automática do estatuto de utilidade pública (o que tem sido utilizado, sem qualquer problema, pela Montis, para aceder ao mecenato, tratando as doações à associação como tal, o que proporciona benefícios fiscais aos doadores).
Só que, como muito bem diz este meu amigo, para se ter acesso aos tais 0,5% do IRS que as pessoas têm o direito de consignar, é preciso fazer um registo na Autoridade Tributária, a mesma que aceita os benefícios fiscais associados ao mecenato, com base na tal norma legal que atribui utilidade pública às ONG de ambiente ao fim de três anos (eu discordo de todo este edifício legal, mas isso é irrelevante).
A Autoridade Tributária não aceita como boa a norma legal que atribui automaticamente esse estatuto, e exige uma declaração da Presidência do Conselho de Ministros (que é a entidade que reconhece, mais ou menos discricionariamente, esse estatuto a quaisquer organizações que o requeiram e que a Presidência do Conselho de Ministros entenda que reúnem condições para que lhes seja atribuída a utilidade pública) reconhecendo essa utilidade pública que a lei atribui automaticamente.
Sem problema, visto que a lei atribui automaticamente esse estatuto, basta pedir à Presidência do Conselho de Ministros que ateste que a organização está inscrita como ONG de Ambiente e que há uma norma legal que atribui esse estatuto (um passo estúpido e desnecessário, mas qualquer pessoa normal considera que se resolve numa semana).
Errado, a Presidência do Conselho de Ministros entrega o assunto a uns juristas com quem não se consegue falar, a quem não se podem pedir responsabildiades, de quem não se pode fazer queixa pelos atrasos, e os juristas entretêem-se a escrutinar as normas estatutárias que o Estado já aceitou através da Agência Portuguesa do Ambiente, quando aceitou o registo como ONG de Ambiente, há uns anos atrás.
A própria Presidência do Conselho de Ministros não atende o telefone, nem responde a mails, nem sequer para dizer qual é o ponto de situação do processo, e leva meses nisto. Além disso, resolve que o prazo de funcionamento da associação para atribuição do interesse público não é o que está na lei das ONG de Ambiente (três anos) mas na lei que regula a atribuição do estatuto de utilidade pública (cinco anos)
A certa altura, lá aparece uma resposta ao pedido (ultrapassados todos os prazos e mais alguns do Código do Procedimento Administrativo) que exige umas alterações de lana caprina nos estatutos (do género, a sede da associação não pode dizer que é no concelho tal, tem de ter uma morada, que pode ser fictícia, claro).
Era o que mais faltava que a Presidência do Conselho de Ministros emitisse uma declaração de interesse público que a lei reconheceu automaticamente, pensarão eles.
Como não vale a pena discutir com Estados disfuncionais (a alternativa eficaz é conhecer as pessoas certas que resolvem estas coisas em três tempos), lá se faz uma Assembleia Geral e aprovam-se todas as alterações estatutárias explicitamente referidas no tal parecer, submetendo de novo o processo, com a indicação de ter sido dado cumprimento ao exigido, portanto uma semana deverá chegar para verificar se as duas ou três alterações estatutárias respondem ao parecer emitido.
Errado mais uma vez, depois de mais uns meses, lá vem novo parecer exigindo novas alterações estatutárias com a mesma importância das anteriores.
Lá se fazem as alterações, com nova Assembleia Geral, lá se manda tudo outra vez, e finalmente lá se obtém a dita declaração, mesmo a tempo de inscrever a Montis na Autoridade Tributária antes do período de declaração do IRS do ano seguinte.
Errado, mais uma vez, a Autoridade Tributária aceita a inscrição no fim de 2021, mas não para os rendimentos do ano em que é feita, apenas com efeitos nos rendimentos do ano seguinte (sem qualquer base legal que tenha sido invocada, é assim que a Autoridade Tributária decidiu e está decidido), 2022, cujo período de declaração de rendimentos começa agora.
E é isto o Estado português, a lei reconhece que ao fim de três anos as ONG de Ambiente têm estatuto de utilidade pública, que lhes confere o direito a receber 0,5% do IRS que os contribuintes queiram atribuir-lhe, mas os serviços do Estado conseguem transformar esse prazo quase no triplo, sem que ninguém seja responsabilizado pela evidente ilegalidade de toda a actuação dos serviços do Estado.
No caso, prejudicando a transferência directa, por decisão do contribuinte, de impostos do Estado para organizações da sociedade civil, reconhecidas pelo Estado, durante uns quatro ou cinco anos.
Sociedade civil essa que se está nas tintas para isto porque são trocos nos seus orçamentos, quando comparados com os recursos que se conseguem obter directamente do Estado conhecendo as pessoas certas, usando os canais de comunicação adequados e entregando moedas de troca úteis a quem tem o poder de decidir.
No Estado Novo havia o condicionamento industrial.
A lógica desse condicionamento industrial era anti-liberal, no sentido em que se entendia que a actividade económica deveria estar subordinada aos interesses da comunidade, mediados pelo Estado, através de uma autorização prévia à instalação ou ampliação de estabelecimentos industriais (não vale a pena espantar-se com a semelhança entre a política do Estado Novo e os programas políticos do Partido Comunista e do Bloco de Esquerda, tirando a divergência relevante sobre a apropiação colectiva dos meios de produção, que já nem o PC e o BE defendem explicitamente, muito do que defendem estes partidos é semelhante à ideia salazarista da prevalência dos interesses colectivos sobre os interesses individuais, materializada pela intervenção do Estado no condicionamento da actividade individual).
O próprio Estado Novo acabou com este regime em 1973, e a sua aplicação concreta, ao longo dos muitos anos que vigorou, esteve longe de ser rigorosa, permitindo muito mais liberdade económica real que a prevista na lei (note-se, no primeiro gráfico desta publicação, a quantidade irrisória de despachos ministeriais desfavoráveis aos pedidos de instalação, no caso das agroindústrias, mesmo esquecendo a quantidade de instalações industriais ilegais ou em situação irregular, que laboravam no país).
Desde antes desse condicionamento industrial, existe um forte condicionamento habitacional - ao contrário do condicionamento industrial, não acabou em 1973 - quer por via do condicionamento administrativo dos mecanismos de formação do preço das rendas, quer por via do condicionamento na produção: cada nova casa tem de ter uma autorização antes de ser construída.
Neste contexto, atribuir ao liberalismo ou ao neoliberalismo os problemas da habitação em Portugal é uma tolice.
Por toda a Europa os delicados problemas dos conflitos de interesses na gestão urbana foram orientando as políticas de edificação e habitação para soluções pouco liberais, umas vezes por intervenção do Estado como promotor, outras vezes pelo condicionamento administrativo dos promotores privados.
O primeiro tipo de medidas, as que colocam o Estado como promotor, são, apesar de tudo, as que menos influência negativa têm no mercado: o Estado compra ou expropria terrenos, constroi e vende ou aluga pelo preço que entende.
Frequentemente o resultado é pavoroso, quer do ponto de vista da qualidade do espaço público, quer do ponto de vista da qualidade da habitação de cada um, gerando problemas sociais relevantes quando este tipo de intervenções concentram agregados familiares de baixo rendimento, sobretudo se os sistemas de gestão pública, como acontece em Portugal, são ineficientes, opacos e venais.
Aqui e ali dão bons resultados que tendem a evoluir para a segregação social urbana, com exclusão dos mais pobres, como tem acontecido, pelo menos em Lisboa, nos antigos bairros sociais do Estado Novo.
Muitas vezes a exclusão dos mais pobres deu origem a imensos problemas relacionados com a construção ilegal, incluindo os bairros de barracas, porque as sociedades tendem a encontrar soluções fora do enquadramento legal, quando o enquadramento legal as exclui de bens sociais essenciais.
Quando os Estados optam pelo condicionamento habitacional puro e duro, como tem sido dominante em Portugal, geram-se facilmente problemas de segregação social - ao contrário do que pensa a actual Ministra da Habitação, mesmo que todos tenhamos direito a viver nas zonas mais caras de Lisboa, não conseguimos viver todos no mesmo sítio sem degração das condições desse sítio - escassez de habitação, inadequação espacial com segregação das áreas de emprego e residência, com o que isso implica de ineficiência ligada à necessidade de mobilidade, etc..
Claro que se eu não posso construir a minha casa quando entendo, no sítio que entendo - desde que seja meu -, da forma como entendo, toda a ineficiência do processo de licenciamento e aprovação se vai reflectir em preços mais altos de habitação, visto que tempo é dinheiro e atrasos implicam custos.
Também é certo que a ausência de regulação do mercado tenderá a potenciar conflitos entre diferentes interesses, no sentido em que o meu vizinho tenderá a irritar-se com o facto de eu lhe erguer uma parede a cinco centímetros da sua janela.
O equilíbrio entre os diferentes interesses é difícil e delicado, mas em vez de se optar pelo licenciamento prévio para evitar conflitos (que nunca evitará totalmente, como toda a gente sabe), pode sempre optar-se pela definição da regra genérica de cada nova acção não poder prejudicar o que existente, deixando aos seguros e aos tribunais a resolução dos conflitos, com pesadas consequências financeiras para quem, grosseiramente, viole os direitos de terceiros.
Se o Estado não licencia o suficiente, isso gera problemas de escassez, o que conduz a aumento de preço, se existir procura em crescimento.
Se o Estado mantém a opacidade quer sobre o processo de produção, quer sobre a economia relacionada com a habitação (nos EUA, no momento em que uma venda de uma casa se faz, a informação do preço a que foi vendida é imediatamente pública, tanto quanto sei), e se todo o processo de produção e disponibilização de habitação depende do Estado, talvez fosse a altura para deixar de pedir sempre mais intervenção do Estado num mercado cujas principais distorções decorrem da excessiva e irracional intervenção do Estado.
Talvez seja a altura de acabar com o condicionamento habitacional e trazer um bocado de liberdade ao sector.
Imaginem que o senhor Meyersollen, um investidor estrangeiro privado, assumiu um negócio de sapataria no município de Socialal, uma empresa em sérias dificuldades, a Sapattap EA (Sapatos para Todos os Tamanhos e Pés, Empresa Autárquica), e, sendo um conhecido industrial do ramo, conseguiu equilibrar a situação e aumentar as vendas, passando a exportar para Europa e América. Perante o sucesso, os autarcas de Socialal decidiram que a companhia era muito importante em termos de vendas e empregos, e decidiram re-autarcizá-la dizendo que era «estratégica». Passaram a chefiá-la o autarca-mor, dr. António Peito, e o seu braço direito, sr. Pedro Nulo Diabos, com o apoio entusiasta e vocal da menina Tacarina Patins e do senhor Cochise de Sousa -- todos por interposta pessoa, ou primo, ou compadre ou grande amigo; e tantos que, ao fim de um ano, a Sapattap tinha 39 administradores, em vez de 5, e 28 chefes de secção em vez de 3.
Todavia, não tendo os novos donos conhecimentos de gestão, vida empresarial, actividade fabril, comercialização, equipamento, salários, sendo ignorantes de qualquer coisa estranha a juventudes, secções e federações partidárias, e, mais especificamente, carecendo do menor treino ou know-how em sapatos, depressa a Sapattap entrou em desorganização, desordem e ruína. Então, Peito, Diabos, Patins e Cochise pediram um empréstimo ao gerente amigo de uma dependência bancária local, que lhes emprestou 3 mil milhões de euros para a reestruturação da Sapattap. Os novos donos da Sapattap cortaram 15 das 10 linhas de produto, despediram 125 dos 175 trabalhadores, contrataram mais 2 administradores e 5 diretores, venderam a maquinaria excedentária, e passaram a fabricar apenas chinelos e tamancas em outsourcing.
Os 3 mil milhões vinham de um fundo de investimento cujos participantes eram -- segundo garantia jovialmente o gerente -- iletrados financeiros e, aliás, praticamente iletrados tout court. Foi por isso mesmo que, pouco tempo depois, e ao fim de insistentes súplicas autárquicas, o gerente informou os gestores da empresa autárquica que o empréstimo, afinal, era a fundo perdido. E disse que não havia problema, porque os investidores do fundo eram tansos e pouco percebiam fosse do que fosse, que ele depois contava-lhes uma história qualquer e eles engoliam.
E assim se safou por uns tempos a Sapattap, sempre em alvoroço e desordem, de tal forma que a autarquia já pensava chamar de volta o senhor Meyersollen ou algum amigo dele. Todavia, nesse mesmo ano a Sapattap anunciou, pela voz grossa de Peito (Diabos já fugira, Patins jurava que nunca defendera a ideia, e Cochise passara à reforma) um lucro de 2,5 euros. Os três jornais concelhios -- um, do irmão de Peito; os outros dois, subsidiados pela Câmara -- deram primeira página à notícia, e festejaram entusiasticamente o feito.
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Pois sim, está bem... Mas o que é que a gente tem a ver com essa história?
Ora, nada, evidentemente. Pensei só que talvez fosse boa ideia lembrá-la quando nos vierem dizer que a TAP teve lucro no último ano.
É um assunto recorrente, à falta de melhor, alguma personalidade pública vir à praça pôr em causa os símbolos nacionais. Desta vez foi o cantor luso-cabo-verdiano Dino D’Santiago que, numa certamente bem frequentada conferência por causa dos 50 anos do Expresso, contestou o hino nacional português que reclama ser demasiado bélico. O tema, que em tempos tinha sido levantado com a mesma sofisticação teórica pelo maestro Vitorino de Almeida, pegou como fogo em palha seca nas redes sociais, donde nos últimos dias emerge um irresistível debate que venho seguindo com interesse. No Facebook alguém reclamava que o nosso hino não era grande coisa, que os mais bonitos eram o americano e a Marselhesa. Eu confesso que, mesmo gostando muito de música, os hinos não me atraem grandemente. Detentor duma relativamente numerosa discoteca, só sou feliz possuidor de dois hinos: o brasileiro, inserido numas Variações de Louis Moreau Gottschal (Grande Fantasia Triunfal) e uma impressão de 1906 ou 1907 em ebonite 78 rpm de "A Portuguesa", uma “canção de intervenção” adoptada pelos republicanos em 1891 como na sequência do ultimato britânico, quando eles se pretendiam fazer ao mar para heroicamente enfrentarem a armada britânica. Pena que não o tenham feito, todos juntos dentro cruzador Adamastor, adquirido pelos próprios através da “grande subscrição” patriótica. Não se tinha perdido grande coisa.
Na empolgante discussão sobre os deméritos de “A Portuguesa”, não foram poucos os que assumiram preferir o hino da Maria da Fonte, que os republicamos terão certamente ligado aos miguelistas. O facto é que hinos e marchas não entusiasmam a minha veia melómana, mas evidentemente prefiro qualquer um à Marselhesa, um descarado exemplo de xenofobia e belicismo. Os hinos soviético e americano são musicalmente interessantes, mas essa afeição talvez esteja relacionada com o número de vezes que os ouvi na infância e juventude a ver os Jogos Olímpicos na TV. Na verdade, os “símbolos nacionais” são uma invenção da sanguinária Revolução Francesa, na ânsia da consolidação do Estado Moderno como religião laica. Mesmo havendo quem afiance que “A Portuguesa” teria sido inicialmente dedicado por Alfredo Keil ao Príncipe Dom Miguel exilado na Austria, a verdade é que foram os republicanos de 1910 que o aproveitaram para primeiro hino nacional, na forma como entendemos actualmente o conceito. O Himno da Carta, era apenas o Hino da Carta, como o Hino da Restauração ou o Hino da Maria da Fonte. O pior a moda dos “símbolos nacionais” foi a bandeira verde-rubra com que nos castigaram os revolucionários numa exibição de extremo mau gosto, e em cuja genealogia encontramos os símbolos da bandeira dos terroristas carbonários. A ela se referiu assim Fernando Pessoa: “contrária à heráldica e à estética, porque duas cores se justapõem sem intervenção de um metal e porque é a mais feia coisa que se pode inventar em cor. Está ali contudo a alma do republicanismo português – o encarnado do sangue que derramaram e fizeram derramar, o verde da erva de que, por direito mental, devem alimentar-se”. Valham-nos as armas reais, mesmo decapitadas lá no meio, que se foram impondo pelos nossos reis ao longo dos séculos, e cuja versão actual procede das armas de Dom João II com a Esfera Armilar de D. Manuel I.
Não me incomoda grandemente que se discutam os "símbolos nacionais”, pois não foi com “símbolos nacionais” que se construiu a nossa pátria. Portugal foi-se constituindo como Estado Nação ao longo da história numa adesão espontânea, de dentro para fora - aqui e ali com a ajuda dos ingleses, é certo. Para isso não foi preciso o rei aparecer periodicamente na televisão, nem bandeiras às janelas, ou hinos antes dos eventos internacionais. A nossa unidade política foi sendo construída desde o início à volta do rei, da cruz de Cristo, e duma língua, como um milagre espantoso; uma "improbabilidade" histórica como escreveu D. Manuel Clemente. Na verdade, estou convencido de que Portugal, ainda hoje é dos países do mundo que menos necessita da sacralização dos "símbolos nacionais", exacerbados sempre por países em formação ou nacionalidades pouco consolidadas. Aqui chegados, nós os portugueses há muito que nos habituámos a viver como habitualmente, e, de revolução em revolução, a aceitar um medíocre destino. O hino de Portugal decididamente não é o pior que nos impingiram e até homenageia os nossos egrégios avós. Agora aquela bandeira...
Ignoro se já não têm mais para trocar. Mas conforme o jornal i não quiseram trocar. De ministra na pasta da Agricultura e pela singela razão de que, um nadica antes, Pedro Nuno Santos tinha ido borda fora.
Percebe-se agora, chutar um secretário de Estado é uma coisa; rasteirar um ministro outra, bastante mais sonora. E não convinha, o Governo ainda quase saído do ovo despovoa-se aceleradamente. Talvez ao ritmo das greves que nos antolham o andar: as dos funcionários judiciais, dos comboios, dos professores, na (e da) Saúde. À boa maneira socialista, Portugal vai caminhando para tempos similares aos de Março de 2011, em que na iminência da bancarrota Sócrates caiu - não é exagero - na rua, berrando que o País estava em boa ordem.
Podemos (e devemos) ir ponderando estes sinais de semelhança. Mesmo - oh Costa! - porque a prometida bazuca entupiu algures, a gente por cá não há meio de vislumbrar os dinheiros europeus. Todavia, que fique ao menos esta imagem torpe de um Governo sem quaisquer escrúpulos; a ministra não serve; mas o momento não convinha, não aconselhava: e a ministra foi ficando, ainda se mantém, à frente das hortas, do gado, das vinhas e - Santo Deus! - do azeite nacionais. A escorregadela está para breve, Costa, forreta, não quis abrir mão do cromo.
Todos sabemos que a democracia, apesar de todas os seus méritos é um instrumento débil que acomoda muitas insuficiências: prevenir revoluções sempre foi apontado como uma das suas maiores virtudes. Os episódios, com vitimas mortais, no assalto ao Capitólio, um acontecimento inédito na bem estruturada democracia americana e, agora, num mais moderado vandalismo à sede do menos eficiente poder democrático brasileiro, vêm destapar um segredo mal guardado: as regras democráticas clássicas já não são suficientes para garantir uma sociedade funcional.
A premissa de que a democracia permitia seguir o desígnio da maioria, enquanto conciliava e salvaguardava os interesses das minorias, parece estar a falhar rotundamente, um pouco por toda a parte, embora com diferentes circunstâncias, aspirações e desígnios. Pelo contrario, observa-se uma redução da tradicional vasta maioria moderada, mesmo que com ideias diferentes, capaz de acomodar minimamente os interesses e valores das franjas da sociedade.
Nos EUA e no Brasil, o centro praticamente implodiu, sendo sexy o radicalismo de uns que provoca o radicalismo dos outros. Questões sociais fraturantes juntam-se a minorias esquecidas no turbilhão das mudanças da matriz económica provocadas pela globalização e a um conjunto de causas, menos dignas, mais capazes de aglutinar o odio do que a resolver problemas substantivos, provocando a intolerância, em que cada lado não parece minimamente capaz de perceber o ponto de vista dos outros e procurar um compromisso. Todos querem exatamente o que querem, logo. O resultado, um indisfarçável cheiro a enxofre, faz prometer revolução ao invés de evolução.
Nos EUA e no Brasil, desapareceu o centro, e passamos a ter apenas dois lados, mesmo que muitos escolham apenas o menor dos males. Na Europa ainda é um pouco diferente, mas a prazo, provavelmente lá chegaremos. No velho continente, , os profundamente insatisfeitos, podem dividir-se em 3 famílias:
Os comunistas ( leninistas, como o PCP, ou trotskistas , como o BE) que querem mais Estado, menos liberdades e menos democracia, que usam os costumes como ferramenta de subversão;
Os liberais, menos Estado e mais liberdades individuais, que nunca foram fortemente populares numa Europa povoada com as ideias de um Estado forte e protector;
Os partidos populistas sem ideologia consistente ( como o Chega em Portugal) aglutinam conservadores respeitáveis (ofendidos nos costumes), Nacionalistas Estatistas ( ofendidos com a falta de ordem, corrupção e globalização) .
Sempre houve comunistas, liberais, conservadores e outros insatisfeitos. O que hoje é diferente é o desempenho do centro moderado que sempre esteve no poder na Europa Ocidental.
Os centros (esquerda e direita), perderam a capacidade de garantir a prosperidade, ao namorarem com a economia de mercado ao mesmo tempo que a atraiçoam ferozmente, aparentemente uma condição de sucesso eleitoral, ao mesmo tempo que parece terem perdido as cautelas no tempo das necessárias alterações sociais e os cuidados a ter com a salvaguarda das liberdades individuais, na sua busca por uma estatização e normalização, cada vez mais ofensiva para quem, mesmo não sendo liberal, encontrava conforto na sua relativa liberdade.
A maior responsabilidade não é, por isso, dos diferentes, daqueles, como eu, que não se reveem no centro moderado (em Portugal o PS e o PSD) é da (ainda) maioria de centro moderada, que detém o poder, mas que tem que perceber que ao tornar-se despótica (mesmo que apenas aparentemente), vai enfrentar a revolução, que já esteve mais longe.
À falta de uma evolução liberal, não posso honestamente dizer que ficaria infeliz com uma revolução liberal mas, como é uma impossibilidade nas próximas décadas e não me parece que o país ficasse feliz, já agora gostava que o Centrão acordasse, começasse a funcionar, nos desse pão e liberdade, em vez de casos e casinhos e prevenisse uma revolução que só pode ser muito desagradável para quase todos.
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus
Tinha Jesus nascido em Belém da Judeia, nos dias do rei Herodes, quando chegaram a Jerusalém uns Magos vindos do Oriente. «Onde está – perguntaram eles – o rei dos judeus que acaba de nascer? Nós vimos a sua estrela no Oriente e viemos adorá-l’O». Ao ouvir tal notícia, o rei Herodes ficou perturbado e, com ele, toda a cidade de Jerusalém. Reuniu todos os príncipes dos sacerdotes e escribas do povo e perguntou-lhes onde devia nascer o Messias. Eles responderam: «Em Belém da Judeia, porque assim está escrito pelo Profeta: ‘Tu, Belém, terra de Judá, não és de modo nenhum a menor entre as principais cidades de Judá, pois de ti sairá um chefe, que será o Pastor de Israel, meu povo’». Então Herodes mandou chamar secretamente os Magos e pediu-lhes informações precisas sobre o tempo em que lhes tinha aparecido a estrela. Depois enviou-os a Belém e disse-lhes: «Ide informar-vos cuidadosamente acerca do Menino; e, quando O encontrardes, avisai-me, para que também eu vá adorá-l’O». Ouvido o rei, puseram-se a caminho. E eis que a estrela que tinham visto no Oriente seguia à sua frente e parou sobre o lugar onde estava o Menino. Ao ver a estrela, sentiram grande alegria. Entraram na casa, viram o Menino com Maria, sua Mãe, e, prostrando-se diante d’Ele, adoraram-n’O. Depois, abrindo os seus tesouros, ofereceram-Lhe presentes: ouro, incenso e mirra. E, avisados em sonhos para não voltarem à presença de Herodes, regressaram à sua terra por outro caminho.
Palavra da salvação.
Imagem: Adoração dos Magos, de Bartolomé Esteban Murillo
Aqui partilho o primeiro single de Peter Gabriel em vinte anos, a primeira peça do álbum que aí vem, cujos temas serão divulgados a cada Lua Cheia, segundo anunciou o músico. O tema "Panopticom" foi publicado há poucas horas nas plataformas de streaming. Acompanhado pelos seus músicos de sempre, Tony Levin, David Rhodes e Manu Katché e a assombrosa sonoridade electrónica de Bran Eno, Peter Gabriel parece-me em forma. Aconselho que se ouça mais do que uma vez, e a descoberta deste aperitivo será certamente deliciosa enquanto esperamos por mais novidades na próxima Lua Cheia.
Quando Costa fez o seu "assalto ao poder" o país estava em condições de dar um enorme salto qualitativo. Tinha aguentado estoicamente uma dura crise, e tinha saído de "forma limpa" de um duro programa de assistência internacional. Ao perder eleições e alcandorar-se ao poder através de uma coligação contranatura com a extrema-esquerda que não aceita a União Europeia nem a Nato, deitou borda fora toda a confiança duramente conquistada.
Subitamente, os países que nos estavam a olhar com muito interesse, perderam o entusiasmo. Era certo que não iriamos adotar uma agenda de competitividade e crescimento. Era óbvio que, amarrados aos parceiros contranatura, iriamos ceder ao imediatismo, à inércia, ao populismo e à demagogia.
Nestes sete anos, a hipótese de virmos a ser um "darling" da comunidade de investidores esfumou-se. A possibilidade objetiva que tínhamos de dar um "salto quântico" esfumou-se. A não ser que se seja completamente ignorante, ou sofredor de miopia clubista, penso que ninguém poderá dizer, de boa-fé, que estes sete anos e tal, que ameaçam ser onze, venham a ser bons para o país.
... confesso que me fica uma vil curiosidade sobre que subsídios, de que valor e a quem subscreveu a demitida secretária, quando era directora-geral das agriculturas (em Vinhais, suponho).
Os orgãos de comunicação social que de «orgãos de referência» se transformaram -- por subsídio ou vocação -- em «orgãos de reverência» (ORs) detestam as «redes sociais», onde se faz diariamente mais escrutínio do poder do que os ditos ORs fazem ao longo de todo o ano. Foi desse nojo que nasceram os Polígrafos, onde, como na Sic, se desmentem algumas mensagens patetas publicadas em Twitters e Facebooks, para que assim melhor passem e sejam digeridas a imagem e o discurso, supostamente nobres e verdadeiros, que os ORs passam sobre os poderes e os governos.
Além de detestarem as «redes sociais», os ORs detestam o jornal Correio da Manhã e a CMtv sua fillha. Desagrada-lhes, e à bolha lisboeta, o retrato amoral, violento, desvalido e pobre do país socialista.
Eu gosto das «redes sociais». Sei de mais notícias nos blogs Impertinências, Delito de Opinião, Blasfémias, Corta-Fitas (declaração de interesses: onde escrevo) ou Herdeiro de Aécio do que no Público ou DN do dia, ou no Expresso da semana; e fico mais informado e com os pés mais assentes na terra ao ler ou ver os orgãos do grupo CM (declaração de interesses: em cujo jornal trabalhei por duas vezes) do que em todos os ORs.
Hoje, por exemplo, pensei comprar o semanário Expresso, supondo que, por fazer 50 anos, talvez me proporcionasse uma edição decente. Depois, consultei as «redes sociais», li os títulos, e vi que era o mesmo do costume. E assim poupei dinheiro e tédio. Mas divirto-me à mesma com esta ideia: de que o reverente Expresso sopra 50 velas, mas o CM é que despediu dois membros do governo em sete dias.
T.S.Eliot morreu a 4 de Janeiro de 1965. Como os nomes cimeiros do primeiro modernismo soube aliar a modernidade à tradição. Contrariando os cânones ideológicos e os miasmas de muitos dos seus contemporâneos fascinados pelas novas religiões (as ideologias destrutivas do século XX) preferiu recolher-se às verdades eternas e ao saber dos antigos e por isso definia-se como um monárquico, um anglo-católico e um classicista. Mas também nele descobrimos o exilado, que novamente partiu à descoberta do velho mundo. A poesia de Eliot entrecruzava o mitológico e o sagrado numa contemporaneidade despida de alma, e, ao novamente procurar os mitos antigos dava um sentido ao mundo presente. Nos versos não sofre o "eu" poético - não se trata da apoteose do sentimento nem da hipertrofia individual -, o poeta não mergulha nas profundezas da alma para se autoexaminar, mas procura contextualizar o drama da existência colectiva. "The Waste Land" tem aqui um entendimento. É o drama de uma civilização na encruzilhada da história, num mundo que perdeu os fundamentos espirituais. Foi um outro modernismo que soube inovar dentro da tradição. E foi sobretudo uma arte que serviu de farol num mundo que atravessava as trevas.
... o papel do PSD no debate da moção de censura da IL. A começar na insistência na Guerra dos tronos, a passar pelo desvio do debate para as divergências com a IL, a terminar na debilidade das críticas. (O voto? Não, já nem falo do voto!)
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.
na sua centena de heterónimos desdobrou-se em ser ...
inventa o direito de toda a gente a ir à praia à b...
> os donos não conseguem perceberPonha-se a hip...
Excelente texto.
A conclusão a tirar é que o valor de que o autor f...