Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]
No mural de Carlos Antunes tenho mantido uma troca de pontos de vista civilizada (Carlos Antunes é muitíssimo bem educado, mais que eu, só o vi perto de perder as estribeiras - não foi comigo - uma ou duas vezes, preferindo não responder a entrar em choque) da qual resultou um longo comentário de Carlos Antunes que resolvi usar aqui.
Entre aspas e em itálico, estarão afirmações de Carlos Antunes, e no parágrafo seguinte, comentários meus.
"eu nunca coloquei de parte a influência de vagas de frios ou da sazonalidade na transmissão do SARS-Cov-2, nem nunca vi nenhum espidemiologista fazê-lo".
Não quero discutir se há gente a colocar de parte a influência de vagas de frio e de sazonalidade na evolução da epidemia, o que quero mesmo é realçar este ponto comum de onde podemos partir: a evolução da epidemia é influenciada pela meteorologia e a sazonalidade. Não sei se há epidemiologistas a negar isto ou não, sei é que há muitos leitores das pessoas mais influentes na discussão sobre a gestão da epidemia (incluindo decisores e jornalistas, basta ver a reacção de vários jornalistas ao facto de Marta Temido ter levantado esta hipótese na explicação do que se passou no Natal) que seguramente acham normal desvalorizar estes factores e por isso é bom que seja claramente expresso por Carlos Antunes.
"O que defendo é que pela evidência dos mais variados casos em diferentes países, a sazonalidade e as vagas de frio desempenho um papel menor face ao nível de contactos de proximidade entre infectados e susceptíveis".
Esta é a questão central em discussão: todos concordamos que há vários factores em presença, no que discordamos é no peso relativo que podem ter em cada momento para explicar a evolução da epidemia. Os parágrafos seguintes dizem respeito a esta discussão e penso que deixam claro as diferenças de ponto de vista na interpretação dos mesmos factos.
"Dado que conhecemos que os vírus em geral aumentam a sua longevidade em condições ambientais mais favoráveis (frio e tempo seco), a transmissibilidade entre hospedeiros pode ser potenciada por estas condições. Também sabemos que, em geral, as doenças respiratórias, em particular as infecções concomitantes de origem bacteriana, por diferentes razões, têm maior incidência nos períodos frios. ".
O reconhecimento destes factos por parte de Carlos Antunes deixa-me particulamente satisfeito. As nossas diferenças começam na definição da importância deste facto na interpretação da evolução da epidemia: para mim isto significa que quando estas condições se verificam, com o mesmo nível de contactos, é de esperar um aumento de contágio e, consequentemente, de incidência, mas se os contactos também aumentam, então as duas variáveis têm efeitos sinérgicos que potenciam surtos mais violentos. Aparentemente, como se vê abaixo, esta não é a opinião de Carlos Antunes, por razões que me parecem erradas, como tentarei fundamentar.
"Contudo, à partida não podemos generalizar para todos os quadros de infecção viral a condição ambiental como a condição preponderante de uma vaga epidémica"
Absolutamente de acordo.
"Para o assumirmos, tem que esse pressuposto ser verificado em todas e as situações e todos os locais onde essas condições sejam verificáveis".
Mais uma vez, de acordo, mas com uma importante ressalva: o facto de aceitarmos que as consequências descritas se verificam nas condições descritas não nos obriga a descartar essa relação se, noutras circunstâncias, os motores da evolução da epidemia forem outros. Admitir que o que se passou em Janeiro em Portugal foi potenciado por uma anomalia meteorológica caracterizada por frio intenso, secura e foto-período em mínimos anuais, não diz rigorosamente nada sobre os que se passa com outras condições, é por isso que dizer que os surtos de Manaus, da África do Sul ou da Índia ocorreram noutras condições (não estou a discutir se foi assim ou não, estou a discutir apenas o argumento formal) é um argumento inválido - na verdade, sem pés nem cabeça - para a descartar a hipótese de que o surto de Janeiro, em Portugal, foi fortemente influenciado pela anomalia meteorológica que se verificou.
"Sabemos que a transmissão deste e de outros vírus, como o influenza, entre hospedeiros é feita essencialmente por via aérea, e para que aconteça tem que haver proximidade entre infectado e susceptível durante um determinado período em condições ambientais favoráveis (espaços fechados e espaços pouco arejados, por exemplo), bem como, uma carga viral susceptível de poder infectar, ou seja, que torne viável a infecção".
Mais uma vez, de acordo sobre este ponto.
"... Por mais frio que esteja e por mais que dure a vaga de frio, sem contacto viável não há contágio".
Absolutamente de acordo, com outra importante ressalva: as relações entre contacto e contágio são relações de Pareto, isto é, uma pequena percentagem dos contactos dão origem a uma grande percentagem dos contágios, o que significa que ou conseguimos saber quais são os contactos que dão origem a um maior número de contágios, ou a redução de contactos, mesmo em percentagens muito elevadas, podem ter um efeito residual na diminuição do contágio. É o que se passa nos fogos, em que a diminuição do número de ignições em dois terços não se traduziu em qualquer diminuição relevante da área ardida, porque 1% das ignições dão origem a 90% da área ardida (mais ou menos).
"Mas infecções de origem bacteriana existirão sem que haja contacto entre pessoas (as bactérias residem dentro do nosso organismo, e em condições próprias desencadeiam infecções). Sabemos também, tal como aconteceu em períodos deste último inverno que uma grande parte das infecções respiratórias não Covid-19 foram maioritariamente bacterianas, pois apresentaram-se muitos poucos casos com quadro gripal de origem viral (apenas um pico de 20 casos por 100K habitantes). As condições de restrição e de uso de medidas de protecção individual (máscaras, distanciamento e desinfecção) minimizaram a propagação do vírus da gripe sazonal."
Aqui misturam-se factos com interpretações: que houve uma diminuição brutal das infecções respiratórias virais (que não covid) é um facto, mas que isso se deva às medidas tomadas, é uma interpretação. A outra interpretação possível está descrita na bibliografia clássica sobre o assunto: uma infecção viral deste tipo que se torna dominante tem tendência para deprimir as infecções provocadas por outros agentes (essa é uma das razões pelas quais nunca se sabe qual é a estirpe de influenza que será dominante numa época de gripe e às vezes a protecção dada pela vacina da gripe, que é desenhada todos os anos para o que se pensa que venham a ser as estirpes dominantes, falha em alguns anos).
"Os exemplos que lhe dei e que falo a muitos outros, da Grécia, do centro da Europa, da Índia, da África do Sul e do Brasil, servem como contra-exemplo à hipótese de a vaga de frio prolongada, por si só, seja a força motriz da nossa 3ª vaga".
Este argumento já foi respondido acima: o facto da anomalia meteorológica verificada em Portugal ter desempenhado um importante papel no surto de Janeiro - e isso é facilmente demonstrado pela combinação dos números da incidência e da mortalidade geral - não tira nem põe para o facto de outros factores explicarem outros surtos noutras condições. Ao "por si só" não vale a pena responder porque não é esse o argumento, o que se discute são pesos relativos de diferente factores em momentos concretos.
"Tal como referiu em muitos dos seus comentários, o atraso dos indicadores mais o período de incubação, para demonstrar o pico epidémico de Janeiro, mostra que o inicio do surgimento da 3ª vaga a 26 de Dezembro terá sido desencadeado por volta de 18-19 de Dezembro".
Não me lembro de alguma vez ter dito que o início do surto de Janeiro foi a 18/ 19 de Dezembro. O que tenho dito é que para a subida de casos começar logo a 28, e mais acentuadamente a 29, dificilmente poderia resultar de um aumento de contágios provenientes de reuniões de Natal a 24 e 25. Em qualquer caso, não é a 28 ou 29 que se dá a aceleração no aumento de casos, mas sim um ou dois dias depois (compatível quer com um eventual aumento de contactos a 24 e 25, mas também com um aumento das condições de contágio decorrentes da anomalia que tinha começado a 24). Note-se que as férias de Natal começam a 17 de Dezembro e o surto começa e acelera com as escolas fechadas, não havendo, nos dados da mobilidade, nenhuma variação extraordinária que se possa relacionar com uma alteração brusca da incidência da epidemia (ver boneco abaixo).
"Ora a anomalia de temperatura inicia-se por volta de 30 de Dezembro, com -2ºC abaixo da média, quando já íamos nos 6 mil casos diários, e termina a dia 14 de Janeiro".
Neste caso estamos perante um problema mais difícil que é o facto de não estarmos de acordo nos factos, não divergimos na sua interpretação, divergimos mesmo na informação base. Eu uso o relatório que o IPMA fez sobre essa anomalia, que descreve como começando a 24 de Dezembro e acabando a 20 de Janeiro, embora com mais expressão no período que Carlos Antunes refere e que corresponde ao período de maior crescimento da incidência e contágio, apesar de nessa altura já ter havido restrições de movimentos relevantes no fim do ano e das pessoas se começarem a assustar e, consequentemente, retrair, independentemente das medidas administrativas tomadas (ver o gráfico da mobilidade acima).
"Deste modo, mostra-se que o inicio da 3ª vaga dá-se muito antes do inicio da vaga de frio".
Não só não estou de acordo (com a fundamentação acima) como independentemente do início do surto, é no período de maior expressão da anomalia meteorológico que se dá o maior crescimento de contágios e incidência e é quando a anomalia começa a dar os primeiros sinais de ceder que se verificam os primeiro sinais de abrandamento, ainda ténues e pouco sólidos no tempo, e é quando acaba, a 20 de Janeiro, que os contágios diminuem drasticamente (o pico da epidemia é a 27, mas já antes dá sinais de abrandamento a partir de 20, o que significa que os contágios começam a abrandar por volta de 15 de Janeiro. Pode argumentar-se que esse abrandamento de contágios se deve a uma menor mobilidade e às medidas adoptadas nessa altura, mas não se pode negar que também coincide com a alteração das condições ambientais, que se tornam menos favoráveis ao contágio).
"Depois, o exemplo da Índia com esta 2ª vaga é paradigmático, evidenciando que a hipótese das condições ambientais influenciarem de forma determinante a transmissibilidade deste vírus, dificilmente pode ser aceite. A Índia tem verificado nas últimas semanas temperaturas entre 20 e os 40ºC por todo o território e está com uma transmissibilidade excepcionalmente elevada".
Mais uma vez, o facto de um surto na Índia ocorrer em condições diferentes, e portanto tendo como motores outros factores (e eu não estou a discutir se assim é, não estudei o assunto com atenção e não me passa pela cabeça ter opiniões sobre o que se passa em países tão grandes e variados sem avaliar as diferenças geográficas internas, estou apenas a contestar a lógica formal do argumento), não invalida a hipótese do surto de Janeiro em Portugal estar fortemente relacionado com a anomalia meteorológica verificada e que é coerente com o conhecimento que existe sobre este tipo de infecções.
"Por isso, o que verifico é que a hipótese da sazonalidade e das vagas de frio serem o principal motor da transmissão do vírus e serem responsáveis pelo surgimento de vagas epidémicas não tem confirmação generalizada com todos os casos que se conhecem".
A insistência neste argumento é, para mim, incompreensível. Os factores que comandam a epidemia variam de região para região e de circunstância para circunstância, sendo muito pouco provável que seja possível explicar todos os surtos com base num factor (ou num conjunto de factores). Por exemplo, a sazonalidade da epidemia só pode ser expressiva onde existe sazonalidade climática, é evidente que na ausência de sazonalidade climática, a evolução da epidemia no equador não pode ter um forte padrão sazonal (ou, pelo menos, é altamente improvável, era preciso que existisse um outro factor relevante com forte sazonalidade não climática). O facto de um factor ser muito relevante numa circunstância não pode ser contestado com o facto desse factor não existir noutras circunstâncias, até porque ninguém diz (que eu saiba) que é possível explicar toda a evolução da epidemia com base num único factor. O que não invalida a existência de padrões geográficos evidentes e fortíssimos, independentemente das medidas adoptadas (os Estados Unidos, com a sua variedade entre estados é particularmente rico desse ponto de vista, sendo a evolução no Dakota do Norte e do Sul muito semelhantes entre si apesar das medidas tomadas nos dois estados serem muito diferentes, e é muito diferente da evolução na Florida e Califórnia, que têm evoluções muito mais semelhantes entre si, apesar das medidas adoptadas serem muito mais semelhantes na California e Dakota do Norte e das medidas serem muito mais semelhantes no Dakota do Sul e na Florida).
"E nos casos em que existe uma coincidência temporal, nem sempre se consegue provar taxativamente que é válida. Poderá haver outros factores comportamentais, que derivados do frio, possam levar ao aumento da transmissibilidade. Isso não invalida que casos de infecção Covid-19 possam ter agravamento do quadro clínico por via do aumento de infecções de origem bacteriana, dado a diminuição dos níveis imunológicos do infectado.
Para se provar essa correlação directa ainda há que fazer um longo trabalho, mas à partida existem indícios que invalidam a hipótese".
Este argumento é, em si, inválido, pelas razões já explicadas. Mas ainda que fosse válido, se aplicado às diferentes medidas de controlo de contactos tomadas nos diferentes países e regiões (as variações de evolução da epidemia dentro de países em que são adoptadas estratégias semelhantes de gestão da epidemia são tão grandes como entre diferentes países), invalidaria completamente qualquer pretensão de que a epidemia se gere controlando administrativamente contactos de assintomáticos.
É espantoso que um ano depois do início da epidemia, e com milhares de medidas tomadas em milhares de sítios diferentes, não tenha sido produzida, até hoje, uma evidência empírica sólida sobre o efeito das diferentes medidas não farmacêuticas adoptadas, de tal maneira que seja possível dizer que o fecho de restaurantes ao fim de semana consegue reduzir a incidência em 2% ou 20%, ou, se se quiser discutir medidas mais sérias, verificar o efeito do fecho das escolas para férias na evolução da epidemia.
Pessoalmente, o simples facto de Carlos Antunes ser tão taxativo na admissão de que as condições de contexto podem influenciar o curso da epidemia dá-me uma enorme esperança e faz-me pensar que não virá longe o dia em que será consensual a ideia de que explicar o surto de Janeiro com o mau comportamento das pessoas no Natal é uma forte evidência de alienação.
Nessa altura poderemos, finalmente, discutir as medidas de gestão da epidemia sem a ditadura da promessa do apocalipse e a ameaça política de responsabilização dos governos pelos efeitos de fenómenos naturais que não controlamos, o que, seguramente, será um grande contributo para a racionalidade das decisões a tomar sobre o assunto.
Suspeito que ainda acabaremos a rir dos dias em que, pacificamente, aceitámos ter parques infantis fechados por causa de uma epidemia que, durante o seu curso, consegue ter a mortalidade global abaixo do que seria de esperar para esta época do ano.
No mês de Maio do ano passado, George Floyd e a jovem Portuguesa Valentina morreram. Separados por milhares de quilómetros e um oceano de circunstâncias. Quase no mesmo dia, a primeira etapa dos processos judiciais dos suspeitos das suas mortes ficou conhecido.
Fiquei surpreso por, em Portugal, num período de tempo razoável de tempo, como costuma acontecer (e aconteceu) nos Estados Unidos, se chegar ao fim do principio de um processo judicial. Não tenho qualquer opinião sobre a qualidade das sentenças. Apenas que aconteceram com rapidez, um dos mais óbvios pressupostos para que se faça justiça, a inocentes ou culpados.
Porque não é assim em todos os casos?
A minha convicção era de que, em Portugal, quem tivesse dinheiro para advogados, aproveitava a desejável protecção das garantias dos indiciados, em conjugação com um sistema judicial caduco, para nunca ser condenado.
Este exemplo, sugere-me que talvez seja apenas um sistema de protecção de garantias, que apenas funciona para os mais ricos, o que mais nos condena à injustiça.
Nos EUA e em Portugal, réus pobres, são rapidamente julgados. No Portugal socialista, réus ricos, passam décadas antes de serem (normalmente) absolvidos. No paraíso capitalista, mesmo os mais ricos, mas culpados, vão por norma rapidamente para a prisão.
É mesmo altura de rever a injustiça em Portugal.
Lá por Agosto de 2020, fiz um post com o mesmo título do de hoje, onde escrevi:
"A ideia que Filipe Froes pretende passar de que "erradicar a actividade do vírus" é bom para a actividade económica e que uma boa solução é resolver tudo o que diga respeito à epidemia antes de pensar no resto, tem o pequeno problema de não ser exactamente uma ideia, mas sim uma fraude.
E tanto é uma fraude do ponto de vista de saúde pública - erradicar a actividade de um vírus com as características deste é uma impossibilidade - como é uma fraude do ponto de vista da actividade económica e social - a sociedade e a economia têm instrumentos para lidar com a incerteza, por exemplo, quanto à confiança das pessoas para voltarem a viajar, mas não têm instrumentos para lidar com a arbitrariedade do Estado, que abre e fecha o que entende, quando entende, da forma que entende, sem sequer explicar os critérios que estão na base das decisões".
Já tinha decidido fazer este post quando li o que Manuel Pinheiro escreve hoje no Observador:
Voltaremos, como no Estado Novo, a ter a GNR a cavalo pelo monte em busca de quem cruza a fronteira?"
Tenho bem presente a discussão na altura da imposição da obrigatoriedade de máscara na via pública (à António Costa, com a nitidez legal que decorre da expressão "sempre que não for possível manter a distância recomendada") em que algumas pessoas, reconhecendo não haver qualquer fundamento sanitário objectivo para esta imposição, reconhecendo não haver qualquer evidência sólida da sua utilidade e conhecendo a ausência de qualquer recomendação da OMS nesse sentido, ainda assim defendiam a medida, se esse fosse o preço a pagar para não termos de ter medidas de controlo muito mais agressivas, em especial os confinamentos.
O resultado, como seria de esperar, é que a obrigatoriedade das máscaras não travaram confinamentos nem outras medidas absurdas, pelo contrário, são um instrumento para a criação de uma percepção pública de que estamos perante uma catástrofe sanitária, mesmo quando, como acontece há um mês, estamos com uma mortalidade global abaixo do que seria de esperar para esta época do ano.
E a proibição de consumo de alcool na via pública, que era fundamental para travar os ajuntamentos de jovens indentificados como factor crítico da evolução da epidemia, agora serve para um polícia chatear um pai e avô de alto risco que resolveu, a 19 de Março, participar num pic-nic organizado com a filha para celebrar o dia do pai, pedindo que lhe levassem uma cerveja em vez do previsto sumo de laranja.
O fecho do comércio e restaurantes à uma da tarde dos fins de semana continua em vigor, quando a sua imposição foi justificada como fundamental para obrigar as pessoas a ficar em casa. Não se pode aproveitar o bom tempo para almoçar numa esplanada no Sábado, embora se possa ir para a praia em frente com uma lancheira, porque toda a gente reconhece a diferença sanitária das duas actividades, claro.
Sim, há essa coisa do dever geral de recolhimento, mais uma solução à António Costa, que lhe permite dizer que está a ser muito severo, se as coisas correrem mal, até lhe permite lançar mão de uma campanha policial mais forte, se quiser dar a impressão de que está a gerir a epidemia com mão de ferro, mas lhe deixa margem suficiente para fingir que não se passa nada quando as coisas estão como agora.
O resultado passa a ser a interpretação de cada um dos polícias que têm de aplicar uma regra jurídica com uma enorme latitude interpretativa, que alguns usam para chatear pretos da Amadora que decidem ir apanhar Sol para a beira rio lisboeta, porque a restrição à liberdade deixou de ser a que está na lei, interpretada de forma restritiva quando estão em causa liberdades fundamentais, para passar a ser a discricionariedade da vulgata que o polícia que está à minha frente entender.
A simples definição de regras que restringem liberdades fundamentais com base em efeitos indirectos - não se proíbe o alcool ou se fecha o comércio e as escolas porque sejam factores sanitários relevantes, mas porque podem condicionar a mobilidade sem aplicar um recolher obrigatório politicamente insustentável - deveria fazer soar as campaínhas de alerta em qualquer pessoa que preze minimamente o respeito pelas liberdades individuais.
Mas não, não é isso que acontece, o que acontece é que pessoas que se reconhecem a si mesmos como campeões da defesa da liberdade desatam a acusar quem se limita a chamar a atenção para o abuso do poder do Estado a pretexto da epidemia como defensores do direito de cada um não cumprir regras, mesmo quando esse cumprimento é uma ameaça para terceiros.
Não, meus caros, a ameaça não vem de quem diz que é absolutamente injustificado o fecho do comércio, incluindo restaurantes, à uma da tarde, aos fins de semana, sob pretexto de fantasiosos ganhos de gestão da epidemia, a ameaça vem mesmo da erosão institucional que permite ao polícia que está à minha frente perguntar-me o que estou a fazer ao sol, sozinho e sem máscara.
O facto é que há um monte de regras criadas com base em circunstâncias conjunturais, que têm perdurado muito para lá do desaparecimento dessas circunstâncias conjunturais, regras essas completamente injustificáveis do ponto de vista da gestão da epidemia e do respeito por liberdades fundamentais.
A verdadeira ameaça é mesmo a rampa deslizante em que vamos alegremente justificando a erosão das liberdades individuais com abstracções mal fundamentadas e ideias que desaguam na história da carochinha sobre o Natal à sueca que matou milhares de pessoas.
Como é habitual nestes processos, o problema central não são os fanáticos da covid zero, o problema central somos nós, os que nos calamos sobre isto, apesar de sabermos perfeitamente o que está acontecer.
... que proíba aos clubes da Superliga Europeia a contratação de jogadores não oriundos dos clubes da Superliga Europeia.
Nesta República que tanto me ofende as ideias - e mantem viva a chama monárquica - existe um Código Civil (o normativo-mor do Direito Civil), aliás elaborado na II série da dita malandragem, mas inquestionavelmente conhecedor e abrangente da nossa realidade.
Tanto é assim que o CC só foi alterado em 1977, na sequência do princípio da igualdade entre os sexos, plasmado na Constituição de 1976. E, quase só também, nos anos sequentes, na legislação dos casamentos entre pessoas do mesmo sexo e das concomitantes anomalias na adopção de menores.
Em termos muitos simplificados, estou a dizer, meio século volvido, o CC foi "mexido" sobretudo nos Livros referentes aos Direitos de Família e de Adopção. Quem sabe legislar legisla, e o resto é eleitoralismo e parlamentarice. O mais ainda vai estando actualizado.
É por isso que ocorre o art. 473º, 1 do dito Diploma, acerca do "enriquecimento sem causa". A definição do mesmo: «Aquele que, sem causa justificativa, enriquecer à custa de outrem é obrigado a restituir aquilo com que injustamente se locupletou».
Nesse longínquo ano de 1966, estávamos ainda no berço das grandes malandragens dos nossos dias. Em suma, quem se enchesse à custa de quem quer - a criminosalidade alheada da questão - havia de repor o fruto desse abuso. Ponto final.
Eram os ditâmes da legislação civil, à margem daqueloutros da Penal. E esta alicerça-se em comportamentos que fazem perigar o regramento, o convívio, e, em geral, a paz social.
O próximo capítulo de algo que me apetecesse escrever teria de incidir sobre a velha questão do ónus da prova. Somente - eu já destesto escrever sobre temas jurídicos. E, por isso, fico-me por cá: ónus da prova? Isso são os partidos a falarem sozinhos.
Haja indícios e um suspeito de cambalacho. Investigue-se e recolham-se dados de que alguém ganhou dinheiros com favores, influências, tráficos e almoçaradas. Perante esses dados, qualquer - então - indiciado que se defenda, conteste, venha dizer que não. Como qualquer acusado de homícido que nega ou alega legítima defesa
A vida das pessoas é um espelho que dispensa a compra de um apartamento na Rua Braancamp em Lisboa. Ou, a escalas menores, outras coisinhas quaisquer.
Numa jogada de antecipação, 12 dos maiores potentados futebolísticos do Continente, anunciam a criação de uma Superliga Europeia, à margem da UEFA.
O que pretendem é bem simples: mais receitas e eternizar um estatuto de elite no mundo do Futebol. Quem não deseja mais segurança e mais receitas?
Num sistema de mercado, as companhias comerciais não podem, ao abrigo da legislação e do interesse dos consumidores, assumir publicamente um cartel. Apenas porque não é do interesse social distorcer a concorrência.
Uma defesa da Superliga é a de que está a criar um novo produto que, em ultima analise vai beneficiar os consumidores, oferecendo mais futebol de primeira linha. Tal como já acontece, ao existirem diferentes escalões nacionais e provas Europeias destinadas apenas aos melhores clubes que, tal como a superliga, aprofunda a diferença de meios financeiros entre os milhares de clubes existentes. Competindo ao mercado, aos consumidores, escolher o que deseja. Mais equilíbrio e diversidade , ou menos diversidade, mais qualidade e equilíbrio no topo da pirâmide. Deixando ao consumidor a liberdade de escolha do que pretende, inclusivamente continuar a seguir o seu pequeno clube de coração.
Não é pois uma questão simples, mas o modelo proposto enferma de um vício insanável: alguns fornecedores decidirem em causa própria, podendo impedir, apenas pelo seu interesse, a entrada no mercado de quem assim o mereça ou seja pretendido. E neste sentido, esta iniciativa não parece ser aceitável. Em nome da concorrência, que deve ser sempre protegida a todo o custo.
Estranho que os imensos convertidos aos encantos do Príncipe Filipe (ou Isabel II) não entendam que tal fenómeno só é possível com uma Chefia de Estado monárquica, instituição metapolítica fundada na continuidade. Somos mesmo uns bimbos deslumbrados. Amanhem-se com o Marcelo.
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
Naquele tempo, os discípulos de Emaús contaram o que tinha acontecido no caminho e como tinham reconhecido Jesus ao partir do pão. Enquanto diziam isto, Jesus apresentou-Se no meio deles e disse-lhes: «A paz esteja convosco». Espantados e cheios de medo, julgavam ver um espírito. Disse-lhes Jesus: «Porque estais perturbados e porque se levantam esses pensamentos nos vossos corações? Vede as minhas mãos e os meus pés: sou Eu mesmo; tocai-Me e vede: um espírito não tem carne nem ossos, como vedes que Eu tenho». Dito isto, mostrou-lhes as mãos e os pés. E como eles, na sua alegria e admiração, não queriam ainda acreditar, perguntou-lhes: «Tendes aí alguma coisa para comer?». Deram-Lhe uma posta de peixe assado, que Ele tomou e começou a comer diante deles. Depois disse-lhes: «Foram estas as palavras que vos dirigi, quando ainda estava convosco: ‘Tem de se cumprir tudo o que está escrito a meu respeito na Lei de Moisés, nos Profetas e nos Salmos’». Abriu-lhes então o entendimento para compreenderem as Escrituras e disse-lhes: «Assim está escrito que o Messias havia de sofrer e de ressuscitar dos mortos ao terceiro dia, e que havia de ser pregado em seu nome o arrependimento e o perdão dos pecados a todas as nações, começando por Jerusalém. Vós sois as testemunhas de todas estas coisas».
Palavra da salvação.
Comentário: Jesus aparece, visivelmente, aos Apóstolos e convida-os a tocarem o Seu corpo glorificado, a fim de que não subsistam dúvidas acerca da realidade corporal da Sua Ressurreição. Ele não é apenas um espírito imortalizado. Ele ressuscitou também no Seu corpo, como o provam as cicatrizes da Paixão e a refeição tomada diante deles.
A salvação alcançada por Jesus é, na verdade, total. Não abrange apenas a alma. Também o nosso corpo será glorificado. O que é necessário é que o cristão saiba sempre respeitar o seu corpo. Só assim a renovação iniciada com os Sacramentos se tornará, no futuro, «glória incorruptível».
O mapa acima é um dos muitos que se podem fazer sobre o assunto, seja por regiões climáticas, eco regiões, biomas (como é o caso), o que se quiser.
Deixem-me chamar a atenção para aquelas manchas roxas no lado ocidental dos continentes, um pouco a Sul do 40º de latitude, no hemisfério Norte, um pouco a Norte da latitude equivalente, no hemisfério Sul.
Estas manchas roxas são um bom referencial para olhar para o mapa porque corresponde ao clima que conhecemos melhor, o mediterrânico, e que apenas aqui onde estamos entra mais profundamente num continente, porque o Mediterrâneo o permite. Na América, seja a do Norte, onde encontramos este clima num bocado da Califórnia, seja a do Sul, onde encontramos este clima no Chile (já agora, zonas conhecidas pela presença frequente do fogo, o que não é difícil de entender por ser o único clima do mundo em que a estação quente e a estação seca coincidem no tempo), há apenas estreitas faixas litorais deste clima. Na Austrália também se desenvolve mais longitudinalmente porque acompanha a limite Sul da ilha.
Note-se também que na América do Norte e na Eurásia há muita terra entre este clima e o Pólo Norte, mas a Sul o equivalente geográfico é ocupado essencialmente por água.
No hemisfério Norte há desertos a Sul deste clima, no hemisfério Sul os mesmos desertos estão a Norte, a latitudes equivalentes (por isso estes agricultores new age que pretendem semear chuva não me convencem grandemente).
Tudo isto se relacionada com a circulação da atmosfera, que está relacionada com centros de altas e baixas pressões e com a rotação da Terra (esquema abaixo).
Como me dizia um dia destes quem percebe muito mais de biogeografia que eu "É evidente que os efeitos da sazonalidade apenas são visíveis onde essa sazonalidade existe. ... o padrão global de sazonalidade é marcado pelas regiões temperadas, onde a maior parte da população mundial se concentra".
Nas regiões tropicais - isso está abundamentemente estudado, seja para doenças deste tipo, seja para muitos outros fenómenos naturais - o padrão depende menos de uma sazonalidade ligada às estações do ano pela simples razão de que essas estações do ano não existem: a temperatura varia relativamente pouco ao longo do ano, o foto-período varia muito menos ao longo do ano, a humidade varia entre a estação seca e a estação das chuvas, mas a relação dessa variação com muitos fenómenos naturais, como por exemplo as doenças infecciosas respiratórias, é muito menos conhecida e, provavelmente, tem muito menos peso na actividade viral que tem a marcada variação sazonal das regiões temperadas.
De resto, existem poucas regiões temperadas e densamente povoadas no hemisfério Sul, portanto pretender negar ou desvalorizar a evidente sazonalidade das regiões temperadas do hemisfério Norte, onde estamos, contrapondo exemplos como o Brasil, a Índia e a África do Sul (onde apenas existe uma pontinha de clima mediterrânico na província do Cabo, e daí para Sul, nas latitudes que correspondem às zonas temperadas do hemisfério Norte, é só água) não tem pés nem cabeça.
De resto, não existe, nos dados de mobilidade e densidade de contactos, absolutamente nada de tão excepcional no Natal, e de tão diferente do que se passou na Páscoa que possa justificar a manutenção da história da carochinha que nos têm contado sobre as razões para o que se passou em Janeiro e, mais importante, para justificar as constantes ameaças sobre o que aí vem, que os mais sofisticados já nem tentam justificar com os números de evolução da epidemia, mas apenas com conceitos abstractos como o princípio da precaução.
Há um mês que estamos com uma mortalidade global abaixo do que seria de esperar para esta época do ano, há um ror de tempo que a mortalidade covid está abaixo dos 5% da mortalidade global (provavelmente correspondendo, em grande parte, a mortalidade global de pessoas que testam positivo para a covid, mas esqueçamos isso), o ano passado demonstrou que quem disse que a mortalidade excessiva acabaria por volta da semana 19 do ano (estamos a entrar na semana 16 deste ano) teve razão, e continuamos a falar da necessidade de cautelas no desconfinamento, com base em opiniões não sustentadas de pessoas que não se entende por que razão têm tanta influência nos jornais.
Acresce que há um conjunto de estados nos Estados Unidos que se deixaram de parvoíces e eliminaram a generalidade das regras coercivas (o que é diferente de eliminar as recomendações para que as pessoas saibam que há uma epidemia em curso e de que forma se podem defender dos seus efeitos negativos, sem com isso criar outros efeitos negativos ainda maiores), sem que se tenham verificado os tais efeitos previstos pelos profetas do apocalipse se não estivermos todos em casa.
São os mesmos que no princípio de Março avisaram, com ar muito sério, para o preço que iríamos pagar quinze dias depois do movimento generalizado das pessoas no último fim de semana de Fevereiro, depois avisaram que os efeitos do primeiro desconfinamento (a 15 de Março) iam sentir-se antes da Páscoa, depois avisaram que os dados da mobilidade na Páscoa eram muito preocupantes e as pessoas não estavam a cumprir as regras, o que iria ser pago quinze dias depois como tinha acontecido no Natal, depois avisaram que era evidente que ter toda a gente nas esplanadas a 5 de Abril ia dar origem a uma grande quarta vaga daí a 12 a 15 dias (é hoje!, é hoje!).
E a imprensa em vez de lhes perguntar para que raio servem modelos que erram permanentemente, mesmo no curto prazo e de forma grosseira, e que não conseguem ser calibrados para a realidade do que aconteceu (algum desses senhores já desenhou um modelo, com os dados de mobilidade do Natal que explique o que sucedeu depois e consiga, ao mesmo tempo, manter a consistência entre dados de mobilidade e o que se está a passar desde o fim de Janeiro?), continua a servir de caixa de ressonância de paranóicos que escolhem ignorar tudo o que se sabe sobre sazonalidade.
Nem sei por que razão me admiro, suspeito que a maioria dos jornalistas que escrevem sobre a epidemia não sabe olhar para um mapa, quanto mais interpretá-lo, e portanto acha normal interpretar os dados de evolução de uma epidemia como se o mundo fosse um tabuleiro uniforme em que apenas os contactos podem explicar as variações da evolução geográfica de uma epidemia.
E, também por isso, acham normal que se impeça as esplanadas de estarem abertas num fim de semana de Sol como este, porque é mesmo fundamental manter as pessoas em casa, apesar das pessoas sairem na mesma e os hospitais estarem vazios.
É triste nascer entre brutos, viver entre brutos e morrer entre brutos, como parece que terá dito o outro.
Ao que parece Lisboa vai ter um museu judaico. Nada contra, antes pelo contrário, os judeus têm um papel importante na História do nosso país e o édito da sua expulsão, assinado por D. Manuel, é uma mancha no nosso percurso. Embora já haja um museu judaico em Belmonte, a existência de um em Lisboa faz sentido. Não vejo tanto sentido para um museu do Holocausto no Porto, já que foi uma barbárie à qual Portugal não teve ligação directa mas, mais uma vez, nada contra atendendo que o museu pode servir para enquadrar pedagogicamente o assunto.
O museu vai ocupar um lugar especialmente nobre da cidade, ficando perto da Torre de Belém. Até acho piada a ironia de o colocarem junto de um monumento mandado edificar por quem os expulsou. A antiga localização prevista, no Largo de São Miguel, quanto a mim estragava a harmonia da praça e a imensa atractividade que esta tem para os turistas.
Dispersei-me um pouco, a ver se chego ao ponto onde queria chegar. Museus judaicos há muitos por essa Europa fora, museus, ou memoriais, do Holocausto também há, fundamentalmente nos locais ligados ao hediondo massacre. Um museu judaico, ainda que desejável, não fará, de nenhum modo, parte da oferta distintiva de Lisboa nem da sua “uniqueness”. Aquilo que, em termos da História Mundial, marca Lisboa são os Descobrimentos. É por causa destes que é impossível escrever uma História da Humanidade sem que Portugal tenha um papel de destaque.
Ninguém, ou muito pouca gente, virá a Lisboa tendo como principal foco o judaísmo. Os Descobrimentos, o mar e os desafios náuticos podem, ao contrário de outras temáticas, ser uma marca distintiva de Lisboa. Uma marca com imenso potencial cultural, turístico e económico.
Não negando a oportunidade da criação de outros museus, a grande prioridade nacional na museologia deveria ser a criação de um grande museu dos Descobrimentos. Esse sim, poderia ser um grande marco emblemático e identitário para Lisboa.
Como tem sido noticiado, a Rússia tem concentrado forças junto à fronteira da Ucrânia. Quer seja uma mera prova de vida, ( como provavelmente é), quer um real teste à possibilidade de anexação da Ucrânia, o que fica completamente claro é a incapacidade de defesa autónoma da Europa.
Não acreditar na possibilidade de a Rússia empreender uma expansão das suas fronteiras, é uma clara negação dos seus instintos históricos, sobejamente demonstrados ao longo de séculos. O fim das fronteiras da guerra fria, não foram digeridas pacificamente. A recente anexação da Crimeia, retira qualquer duvida sobre a real possibilidade da Rússia explorar novas possibilidades de expansão territorial. Só não o fará, se o seu misterioso calculo de custos e benefícios não lhe for favorável.
Invadir a Ucrânia e restabelecer a fronteira da Rússia mais a Ocidente, tem a Ucrânia e a Europa da NATO como os grandes perdedores. Em termos militares, num eventual conflito entre a Rússia e a Europa, por natureza limitado, dada a improbabilidade de alguém querer provocar uma resposta nuclear, o menor tempo de reacção, a violência do primeiro embate e a menor dificuldade logística da Rússia, significará mais custos para a Europa da Nato, do que os inconvenientes infligidos aos EUA.
Os EUA estacionaram tropas na Polónia, como penhor da sua determinação na sua defesa e do compromisso transatlântico. O que sublinha de forma mais evidente ter dois pesos e duas medidas, quando se trata das fronteiras actuais ou de uma nova fronteira que incluísse a Ucrânia.
Porque não alargar a NATO à Ucrânia e deslocar as mesmas tropas mais para oriente, como seria desejo e interesse evidente dos países da Europa NATO?
Para a Rússia, a evidencia da falta de empenho Ocidental na defesa militar da Ucrânia só pode ser o que é para todos: evidente.
A Europa, não tem força para impor o que quer que seja. Não tem moral para o fazer, meios para o afirmar, nem determinação colectiva e individual para se expor e assumir custos. A humilhação publica a que foi sujeita por Trump, não parece ter produzido efeitos.
Uma das possíveis explicações da inércia dos EUA, poderá ser querer provocar uma reacção Europeia. Evidenciando os seus limites de continuar a suportar quase sozinho o peso de defesa do Continente. Na esperança de que mais um avanço Russo, que “apenas” sacrifique a Ucrânia, finalmente desperte a Europa para a realidade de ter que assumir, nem que parcialmente a sua defesa. Exactamente um dos receios que poderá refrear as acções da Rússia.
Claro que estes cálculos são ousados. Já que pressupõe que alguém acredite que a Europa assuma directamente a sua defesa ou esteja disponível para pagar para que outros o façam por ela. A tese de morte cerebral do continente não é completamente ridícula.
Certo é a Ucrânia continuar a estar à mercê da Rússia.
O Público de ontem, a propósito do 8º congresso do Partido Comunista de Cuba, dedica várias páginas ao branqueamento da ditadura cubana.
Não satisfeito com isso, volta à carga hoje, em duas páginas de entrevista com um americano estudioso da revolução cubana, muito idealista, diz ele, ingénuo, diria eu para evitar chamar-lhe o que penso que mereceria.
"Também foi Raúl Castro que trouxe de novo a discussão sobre a separação entre Partido e Governo, e as funções de cada um na gestão do país. O partido deverá ser o guia ideológico, mas não controlar o Governo nem interferir na governação. O Governo é eleito pela Assembleia de Poder Popular, por sua vez eleita pelos dez mil delegados representantes de organizações populares de massas, eleitos por cidadãos maiores de 16 anos por voto secreto e directo".
Este é só um exemplo de como o Público descreve uma ditadura e apresenta um dos seus dirigentes mais importantes, que há 62 anos está na cúpula dessa ditadura, como sendo um renovador democrático.
Amanhã parece que vão fazer uma reportagem sobre o sistema eleitoral corporativo do Estado Novo, com a mesma benevolência, segundo ouvi dizer.
Os EUA decidiram abdicar do seu papel de policias do mundo. Fartaram-se de gastar dinheiro, vidas e prestigio, sobretudo quando o petróleo deixou de ser um interesse vital. Apenas a Àsia está a salvo deste desinteresse. Ou me engano muito, ou os protestos contra o imperialismo americano serão substituídos por protestos de falta de policiamento mundial.
Ninguém gosta da Policia. A não ser quando se precisa dela.
Num mundo sem policia, vamos continuar a ver o aumento do que há uma década era impensável.
Golpes de Estado de quem não receia verdadeiras sanções. Como acontece, por exemplo, em Myanmar.
A afirmação de potências militares regionais, que usam a sua força com impunidade. Só no Médio Oriente temos agora a Turquia, a Arábia Saudita e o Irão a fazer das suas.
Invasões de países periféricos, como a Ucrânia, por potências militares de primeira grandeza, como a Rússia, porque não vale a pena o risco de conflitos nucleares.
Nada como experimentar a alternativa para reapreciar o que tanto se criticou anteriormente.
Poderá ser, também o que acontecerá nas sociedades Ocidentais, se a luta justa e necessária contra a brutalidade policial, tornar ineficaz o mínimo de capacidade de repressão e defesa dos policias.
A poucas semanas de poder sagrar-se campeão ao fim de dezanove anos de jejum, a coisa mais natural do mundo é que reine grande ansiedade não só entre os adeptos, mas principalmente entre os jogadores e a equipa técnica do Sporting. Na verdade se estivéssemos a seis pontos do primeiro não havia grande ansiedade a jogar contra o Farense.
Acontece que a ansiedade quando bem direccionada é um estado psicológico com grande potencial criativo. Não vale a pena negar a realidade, mas sim aproveitar o potencial que ela oferece aos protagonistas. A oportunidade de ficarem na história, nada menos.
Sendo assim, amanhã é cerrar os dentes, cair-lhes em cima e vencer o jogo.
* "Não contrariar a psicologia da natureza" era uma expressão sabiamente usada pela minha avó que Deus tem.
Publicado originalmente aqui
Este gráfico começa a 24 de Dezembro, naqueles dias que, na opinião dominante, nos portámos tão mal, mas tão mal, que a epidemia disparou para um nível impensável.
Felizmente fomos salvos por um grupo de matemáticos que, pelo menos desde antes de Setembro, vinha a prevenir para o desastre que estava para vir. A pressão que fizeram, com largo apoio da opinião pública e publicada, obrigou o governo a fechar as escolas a 22 de Janeiro.
Dizem eles que sem esse fecho seria impossível fazer descer os números de forma relevante e, mais ainda, acrescentaram, na altura, que mesmo com esse fecho, porque era tardio, a descida ia demorar meses.
De repente passaram a dizer que esse fecho a 22 de Janeiro tinha dado resultados tão fantásticos, que a 28 de Janeiro a queda se acentuou tão bruscamente que afinal os números desceram em poucas semanas.
Mas atenção, nem pensar em abrir nada, disseram, logo no princípio de Março, que o facto de no último fim de semana de Fevereiro ter estado bom tempo e as pessoas terem ido todas para a rua, nos ia sair muito caro, com uma inevitável subida de casos aí por 15 de Março, que iria impedir a abertura de escolas.
15 de Março passou, abriram muito mais escolas do que eles pretendiam, a ameaçaram-nos com os efeitos evidentes desse erro, que iria impedir uma maior abertura de escolas a 5 de Abril, se o governo insistisse nessa teimosia, íamos pagar caro, sofrendo uma quarta vaga, talvez com a dimensão do que se viu depois do Natal.
5 de Abril passou, abriram mais escolas, e as esplanadas (meu Deus, as esplanadas, como é possível?) e ameaçaram-nos com uma subida estonteante do R(t), que seria imparável e avisaram-nos para a loucura de abrirmos mais a sociedade em cima desse crescimento do R(t), que iríamos pagar quinze dias mais tarde.
Agora, que estamos a 15 de Abril, avisam que é preciso esperar mais uma semana para ter mais informação sobre o impacto de medidas que, em Março, demoraram apenas uma semana a ter um efeito brutal, na opinião deles.
Caramba, desde o tal fim de semana de Fevereiro, cujos efeitos se iam ver em quinze dias, passou um mês e meio e raio da quarta onda não dá sinais visíveis para os leigos (para os especialistas os sinais não só existem, como são evidentes desde Agosto e vamos pagar muito caro o facto de não lhes darmos ouvidos).
Meus caros, eu sei que não foi assim que me ensinaram em casa, mas se ao fim deste tempo todo, com toda a informação que já existe, continuam a manifestar o mais completo desprezo pela vida de todos e pelos efeitos dos vossos conselhos na vida de terceiros (estou como o Johnn Lennon, "How can you sleep at night?" sabendo como os vossos fantasmas têm mantido presos e longe de todos milhares de velhinhos cuja principal alegria é exactamente estar perto de quem gostam?), é mesmo a altura de pedir desculpa aos meus pais e dizer-vos para irem à merda mais ao mau uso que fazem da vossa influência.
Amanhã, se se começar a formar uma onda brutal, cá estarei para assumir responsabilidades intelectuais pelo que escrevo (outras não tenho) mas, infelizmente, nenhum de vocês manifestou, até agora, qualquer intenção de assumir qualquer responsabilidade nas imensas perdas e sofrimento que os erros das vossas previsões (compreensíveis, só não erra com previsões quem não faz previsões, não é esse o problema, o problema é insistirem em apresentar previsões que sabem ter uma enorme incerteza como certezas que obrigam a opções únicas e inevitáveis), dizia, que os erros das vossas previsões induzem.
Ontem à noite fui surpreendido no carro por uma alocução do Presidente da República em directo e até pensei que era por causa de alguma coisa de grave acontecida recentemente. Mas não, era ele a dizer que nos portámos muito bem, que somos os maiores e que por isso merecemos desconfinar.
Não percebo a relutância de Marcelo abordar aquilo que verdadeiramente aflige os portugueses por estes dias. A desculpa da não interferência entre órgãos de soberania soa-me a falso, tanto mais que todos estão envolvidos no edifício da nossa Justiça: Marcelo Rebelo de Sousa, preocupado com a sua inoperância, teve como bandeira até há pouco tempo o célebre “Pacto para a Justiça” para uma reforma do sistema, e na realidade são os partidos políticos que, no parlamento, aprovam com as leis que o aparelho judicial vai ter de lidar.
Como é previsível vai tudo ficar na mesma, o assunto esquecido, Sócrates a banhos na Ericeira e o povo conformado à cata das migalhas que lhe são destinadas e não são garantidas. Os principais actores políticos e as elites estão enterradas até ao pescoço no lodaçal em que sobrevive o nosso regime irreformável, tolerante para com a corrupção e o clientelismo.
Ontem à noite não ouvi a entrevista a José Sócrates porque tenho pudor e sinto uma enorme vergonha alheia - limitei-me a ouvir hoje os comentários na telefonia. Mas percebo a curiosidade mórbida daqueles que tiveram estômago para aquilo. É como o mirone que não resiste a espreitar os escombros de um desastre sangrento.
Recentemente, numa conversa sobre o controlo de háqueas (uma invasora cujo controlo é muito complicado e que pode estar no mesmo sítio anos a fio sem problema, tendo uma expansão explosiva após fogo), lá apareceu alguém, como de costume, a falar na necessidade de arrancar eucaliptos também (a ideia absurda de gastar recursos a controlar o que pode ser facilmente controlado, renunciando a alocar recursos para o controlo de invasoras agressivas que estão presentes no mesmo local, é uma ideia muito difundida e aceite, mesmo entre elites que têm a obrigação de estar bem informadas).
No movimento ambientalista a ideia de custo de oportunidade é muito mal conhecida, com efeitos reais na vida de todos nós. Um bom exemplo é exactamente a legislação sobre espécies invasoras, uma péssima regulamentação que resulta da péssima qualidade das nossas instituições, muito permeáveis aos poderes fácticos e muito pouco ancoradas na produção de informação socialmente validada, de forma aberta e racional.
Não tive qualquer envolvimento na elaboração ou discussão deste diploma legal, mas há anos estive envolvido na revisão da legislação então existente e o processo era todo ele absurdo: de um lado um movimento ambientalista - e uma academia - fortemente radicalizado, que sem grande enraizamento social tenta sistematicamente usar a legislação para ter ganho de causa, do outro processos de decisão obscuros, pouco transparentes e, sobretudo, conduzidos de forma timorata, que procuravam garantir que se evitavam muitas ondas políticas e sociais (ao dizer isto, não posso deixar de dizer que, nessa altura, eu era vice-presidente do ICN e a proposta dessa legislação passava directamente por mim, portanto a descrição do processo de decisão que faço é com conhecimento de causa e não pretendo omitir as minhas responsabilidades nesses processos de decisão, sejam elas quais forem, o que não estou a discutir agora).
Em vez de se procurar, de forma aberta, uma legislação aceite por todos (o que é diferente de ter uma legislação com que todos estão de acordo, todos nós aceitamos no nosso dia a dia milhares de coisas com que não estamos de acordo), em que se procurasse atender à realidade de haver espécies invasoras muito agressivas e de elevado risco, espécies comprovadamente invasoras mas de baixo risco, espécies potencialmente invasoras, mas cuja presença entre nós não demonstra, até agora, qualquer evidência de comportamento invasor e espécies não presentes ainda, potencialmente invasoras, tratando cada um destes grupos de forma diferenciada, o que se procura é bem mais complicado.
De um lado, um grupo muito pequeno de pessoas, muito conhecedoras e conscientes dos riscos associados às espécies invasoras, que pretendem aproximar-se, tanto quanto possível, do risco zero associado ao uso de espécies exóticas, sabendo como o problema é relativamente fácil de controlar inicialmente (mas com o problema, inevitável, de nos faltar quase sempre a informação necessária para termos a visão correcta e atempada do problema antes dele se tornar grande), mas virtualmente impossível de resolver uma vez atingida uma certa dimensão (como acontece com um fogo ou uma epidemia).
Do outro uma administração pública incapaz de tomar decisões e correr riscos, pressionada por regulamentos e disposições europeias ou globais, expressas em convenções ou outros tratados internacionais a que Portugal se obrigou, sem capacidade nem recursos para ter instituições suficientemente crediveis e fortes na produção de informação de gestão consistente nos domínios nos quais se detem competências, dependendo, portanto, do primeiro grupo para a produção da informação de gestão de que necessita.
Em consequência, o que está na legislação a que fiz ligação acima, é que uma albizia julibrissin, há décadas nos nossos jardins, sem dar sinais de comportamento invasor (o que não quer dizer que não seja potencialmente invasora), é tratada com o mesmo rigor das háqueas, sendo proibida a sua detenção, comercialização, utilização, etc..
E o resultado dessa legislação é que a espécie continua a ser usada, incluindo pelo Estado, que ignora a sua própria legislação e, evidentemente, a ninguém passa pela cabeça andar a arrancar todas as albizia julibrissin que existem por aí, ao mesmo tempo que são muito raras e inconsistentes a maioria das acções necessárias de controlo de verdadeiras invasoras de alto risco.
Um bom exemplo são as milionárias intervenções do Estado (sim, há muito dinheiro alocado a isso) de emergência e recuperação pós fogo, que brotam como cogumelos depois de grandes incêndios, que tratam os riscos de expansão de invasoras - sobretudo acácias e, em especial nos xistos, háqueas - como uma questão menor, em vez de ser o principal problema em que investir recursos, quer porque é depois do fogo que há uma maior expansão destes dois grupos de invasoras, quer porque é nessa altura que é mais fácil o seu controlo, nomeadamente o controlo da germinação dos milhões de sementes de háquea que o fogo liberta da prisão em que a planta as segura até que o corte, a secura ou o fogo consigam abrir as cápsulas que as protegem.
O problema destas invasoras muito agressivas no pós fogo é um problema social e de gestão de recursos naturais incomparavelmente maior que o eventual comportamento invasor do eucalipto, que o problema da erosão pós fogo, que o problema da reposição do potencial produtivo, que o problema da transformação da paisagem e todos essas coisas em que gastamos os recursos disponíveis.
O custo de oportunidade associado aos recursos gastos a fazer plantações pós fogo - é tão mais giro e reconfortante plantar carvalhos, quando comparado com o arranque das jovens háqueas antes que comecem a dar semente outra vez, em dois anos -, ou a fazer controlo da erosão e da torrencialidade, apesar de brutal, é totalmente invisível para a generalidade das pessoas comuns, para a generalidade dos decisores (públicos e privados, a quantidade de voluntariado corporativo que insiste em fazer plantações, em vez de controlar invasoras, é inacreditável) e para a generalidade dos poucos para quem a gestão de invasoras é um problema realmente sério (incluindo o grupo, ainda mais pequeno, mas em crescimento, dos que acham a guerra das invasoras uma guerra perdida, não valendo a pena gastar recursos num problema sério, sim, mas insolúvel).
Precisaríamos de um grupo de economistas com boas capacidades pedagógicas para fazer umas acções de formação em "custos de oportunidade" ao movimento ambientalista.
E, já agora, talvez fosse boa ideia reservar alguns dos lugares disponíveis nesses cursos para epidemiologistas, suspeito que também aí os custos de oportunidade sejam invisiveis.
Sabiamente, o Ministério da magia proibiu uma personagem que, de tão má, não devia ser chamada pelo nome. Passou a ser , "aquele que não se pode nomear".
Por aqui, ao contrario, dão-lhes palco e importância. Tudo aquilo que não se deve fazer. Ignorar o personagem e impedir o seu regresso, é um balsamo para as vitimas e o seu verdadeiro castigo.
Toda a nossa estratégia de acompanhamento da pandemia continua a incidir em dois indicadores, os infectados e o RT, que podem ser substituídos por indicadores bem mais potentes: os internados e as mortes. Nada sei de epidemiologia, mas tenho esperança de perceber alguma coisa de lógica, que por vezes não substitui o conhecimento.
A suposta utilidade da monitorização das infecções é elas nos darem o quadro do que possa acontecer . São uma "proxy" do que pretendemos verdadeiramente controlar, os efeitos negativos da infecção. Mas nada disto faz sentido, quando ocorrem mudanças na virulência da doença ( impedindo de comparar o incomparável). Sobretudo, como é o caso, quando temos dados directos do que realmente importa.
Estar infectado mas assintomático (ou quase), não é um problema em si mesmo, apenas é relevante pela possibilidade de induzir novos contágios. Imagine-se que mais nenhum infectado fosse internado ou morresse, mas houvesse um enorme surto de infecções. Pelas regras actuais estaríamos todos confinados. Para quê?
Em vez de traçarmos limites para infecções, deveríamos traçar limites para o que efectivamente pretendemos evitar: internamentos e óbitos. O RT, deveria ser calculado em termos de internados e mortes e não de infecções .
Com a vacinação dos mais velhos ( que infelizmente ainda não aconteceu completamente) a mortalidade da doença vai necessariamente diminuir, tal como está a acontecer em países com um processo mais avançado. Fará sentido mantermos métricas que se alteram em termos de consequências? Fará sentido medir o potencial dano em vez de danos reais?
Ao contrário, se a mortalidade ou os casos graves dispararem, para um mesmo numero de infectados, faz sentido continuar a usar as mesmas métricas desactualizadas ?
A mim parece-me que não. Mas estou curioso com os comentários a este post.
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.
Haverá eleitores e cidadãos que pouco se importam ...
É claro que responder a quem não faz ideia de que ...
"Here’s a True Believer insisting it’s *no big dea...
Primeiro: O Governo de Passos, foi mau. Como todos...
a CS é toda ela social-fascista e tem vergonha de ...