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Precisamos de um milagre

por João Távora, em 31.08.20

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As minhas preocupações mais profundas prendem-se com questões a que a política há muito deixou de acorrer. Duzentos anos passados sobre o início das revoluções liberais, a descristianização de Portugal tornou-se um processo acelerado – como no resto da Europa, o individualismo espalhou-se como um vírus que não olha a fronteiras. Aliás, a epidemia do “distanciamento social” só veio salientar a questão e agora entram-nos com violência pelos olhos adentro as igrejas encerradas e as missas cada vez menos participadas por esse país afora. A ligação à comunidade das paróquias é cada vez mais ténue, em muitos locais subsiste graças ao seu cariz assistencialista – é bom que os cristãos se distingam por cuidar dos mais frágeis. Os padres e cristãos consagrados são “a resistência” dos nossos tempos. Em abono da verdade nem a minha família (que é muito maior que a minha casa), de tradição profundamente católica romana, escapa a esta sanha pagã; o facto é que a maioria dos meus sobrinhos deixou de ir à missa e não se vislumbra que alguns dos meus sobrinhos netos venham a ser baptizados. Sim, há um problema geracional, a mensagem de Jesus Cristo, o drama humano, é pouco compaginável com o Instagram ou mensagens de WhatsApp, e não está a passar para os mais novos. Como não desejo a salvação só para mim, isso angustia-me, tanto mais que para lá do problema existencial a questão é também de identidade. De dia para dia, os portugueses, entretidos nos seus pequenos prazeres e idolatrias, vão-se desligando das suas raízes culturais (e territoriais). Ao final do dia suspeito que este não seja um problema exclusivo dos católicos. E que precisamos todos de um milagre que nos salve desta massificação hedonista e de que, um dia destes, a nossa Pátria não se dilua num mero algoritmo.

Fotografia: Igreja de S. Leonardo Atouguia da Baleia (Séc. XIII)

Aprendizes de feiticeiro

por henrique pereira dos santos, em 31.08.20

"... Eu própria mais ou menos que me conformei com ideia de que existe uma boa probabilidade de apanhar a coisa e não é algo que me ponha em grande nervosismo. Preferia evitar porque é um pesadelo logístico, mas não muito para além de isso. ... No entanto, não me sinto particularmente corajosa - nem sou. Sou mais inconsciente ... Ou seja, não sou grande exemplo de comportamento responsável e agradeço que a sociedade seja composta de pessoas que são mais responsáveis do que eu. ... Depois de uma primeira fase em que andava abismada com o pânico dos meus conterrâneos, percebi que este medo tem uma função positiva. É provavelmente um dos factores que leva a que, neste momento, os infectados não estejam a resultar em mortes. As pessoas que correm mais riscos mudaram o comportamento e protegem-se. É por isso que a brigada anti-medo me enerva. Na dose certa, é bom".

Este comentário, de uma pessoa que não conheço pessoalmente mas que me parece bastante sensata nisto tudo, é uma boa ilustração das razões pelas quais não é preciso teoria de conspiração nenhuma para perceber o caminho que as coisas tomaram.

Filipe Froes, há poucos anos, falava sobre as doenças pulmonares da mesma forma que hoje fala da covid, referindo as 81 pessoas internadas todos os dias, dos quais 16 pessoas (umas quatro vezes mais que as que morrem hoje com covid, em Portugal) que todos os dias morriam, de como isso nos custava um milhão de euros a cada quatro dias, e como isso poderia ser bastante melhorado se as pessoas se se portassem bem.

Não admira, por isso, que olhe para o medo como um auxiliar precioso para salvar vidas: quando as pessoas se assustam, e se sentem pessoal e verdadeiramente ameaçadas, mudam comportamentos ao ponto de fumadores que nunca tinham conseguido deixar de fumar, ou pessoas com excesso de peso, de repente, de um momento para o outro, conseguirem mudar e fazer o que sempre acharam que não eram capazes de fazer.

Perante a convicção de há uma ameaça verdadeiramente relevante, Filipe Froes, seguindo aliás a opção da OMS, facilmente abandona o longo, trabalhoso, caro e incerto caminho de tratar as pessoas racionalmente, esperando que adoptem comportamentos defensivos por sua iniciativa, e cavalga a opção de usar o medo para manipular emocionalmente a sociedade para salvar vidas, tarefa largamente facilitada por uma imprensa que se vê cada vez mais como um instrumento de auto-ajuda, apoiando as causas que não podem ser questionadas, e cada vez menos como um veículo de produção e transmissão de informação neutra.

Suponho que seja por isso que estudos da treta - alguns são mesmo, mesmo da treta, outros parecem não ser da treta mas assentam mais em modelos e raciocínios que em dados empíricos - que falam dos riscos de abertura das escolas tenham bastante mais impacto mediático e, consequentemente, social, que estudos assentes em dados empíricos que contrariam a ideia de que as medidas não farmacológicas tenham uma grande importância na evolução da epidemia, como este.

O resumo é este, mas o artigo todo é bastante interessante e vale a pena seguir a ligação para o PDF:

"We document four facts about the COVID-19 pandemic worldwide relevant for those studying the impact of non-pharmaceutical interventions (NPIs) on COVID-19 transmission. First: across all countries and U.S. states that we study, the growth rates of daily deaths from COVID-19 fell from a wide range of initially high levels to levels close to zero within 20-30 days after each region experienced 25 cumulative deaths. Second: after this initial period, growth rates of daily deaths have hovered around zero or below everywhere in the world. Third: the cross section standard deviation of growth rates of daily deaths across locations fell very rapidly in the first 10 days of the epidemic and has remained at a relatively low level since then. Fourth: when interpreted through a range of epidemiological models, these first three facts about the growth rate of COVID deaths imply that both the effective reproduction numbers and transmission rates of COVID-19 fell from widely dispersed initial levels and the effective reproduction number has hovered around one after the first 30 days of the epidemic virtually everywhere in the world. We argue that failing to account for these four stylized facts may result in overstating the importance of policy mandated NPIs for shaping the progression of this deadly pandemic".

No fundo, a grande linha de fractura ideológica na forma de olhar para uma epidemia é entre os que consideram que a epidemia é muito mais perigosa que o pânico social, considerando o medo como um bom aliado para limitar os seus efeitos negativos - a linha actualmente dominante -, e os que têm mais medo dos efeitos negativos do pânico social e, por isso, são muito cautelosos na forma como olham para a gestão do medo, considerando que a sua obrigação moral é combater racionalmente o medo que ultrapassa o limite a partir do qual deixa de ser um instrumento de defesa e passa a ser uma rede paralisante.

Um bom exemplo de manipulação social com base no medo colectivo é o artigo de hoje do Público, de Maria João Guimarães, sobre a abertura de escolas na Europa.

A facilidade com que se omitem os países que não encaixam na "linha justa", mas sobretudo a mais completa ausência de qualquer esforço de racionalização que permita perguntar que raio de fundamentação está na base de medidas completamente díspares em cada país, a inacreditável facilidade com se abusa do exemplo israelita, sem uma verdadeira confrontação com os factos, só é possível porque a ideia de que, na dose certa, o medo é bom, é uma ideia generalizada, profundamente enraízada, sem que seja necessário cada um de nós perguntar-se:

o que é a "dose certa" de medo, neste caso? a que a sociedade estabelece livremente - com base na informação de que dispõe, claro - em todas as epidemias, ou a que as autoridades de saúde determinam em cada momento, com fundamentações obscuras?

Pessoalmente, ao ver a facilidade com que a Direcção Geral de Saúde toma uma decisão completamente ilegal - todos os documentos de um processo que está decidido são públicos, portanto recusar-se a sua divulgação é claramente ilegal, como a Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos e os tribunais têm reiteradamente dito - demonstra bem como é perigosa a ideia de que tudo o que for feito pelas autoridades se justifica e não precisa de ser escrutinado, como deveria acontecer com qualquer exercício do poder, e especialmente com o poder que é exercido em nome de causas consideradas indiscutíveis.

O medo existe sempre numa epidemia, é um factor a ser considerado seriamente por toda a gente, mas é bom que não se entregue todo o poder de manipulação desse medo ao fascismo sanitário: há poucas coisas mais mortíferas que as ideias piedosas aplicadas sem ponderação de todos os factores e eliminando a dissidência.

Como me lembravam um dia destes numa destas discussões, será bom não nos esquecermos como há tão pouco tempo havia quem considerasse a dissidência uma doença psiquiátrica a ser combatida para garantir o bem de todos e, em especial, o bem do dissidente.

De volta aos tempos da cassete

por João-Afonso Machado, em 31.08.20

A festa do Avante! diz muito, muitíssimo. Desde logo, diz que para um bom comunista não há argumentos, há cassetes encerebradas.

Mas diz mais e mais picaresco:

- A DGS (organismo sob a tutela do Ministério de Saúde) faz um relatório que recusa revelar aos cidadãos. Di-lo um apelo à consciência do PCP. Da tal agremiação de cassetes.

- O PCP queixa-se que a DGS é tendenciosa e o desfavorece. Só por aqui poderemos intuir o teor do documento, mas de imediato nos lembramos que Costa persiste na "Geringonça" e a discussão e votação do Orçamento estão aí à porta... Para bom entendedor...

- Uma invasão de 33.000 pessoas numa localidade como o Seixal é um semáforo vermelho imenso em qualquer praia, ou uma carga policial em qualquer rua de bares nocturnos.

- Independentemente das opiniões, eleva-se o facto: cerca de 40 comerciantes do Seixal (que não é propriamente a Baixa lisboeta ou portuense) vão fechar as portas nesse dia, por medo e precaução da pandemia.

- Esta, está bem visto, não impedirá a propaganda e o encher dos cofres comunistas. Avante camarada!

 

O que é de mais, é moléstia

por henrique pereira dos santos, em 30.08.20

Já não tenho pachorra para a conversa do aumento de casos de covid (uma evidente mentira, não há aumento de casos de covid coisa nenhuma, o que há é um aumento, em alguns sítios, de testes positivos para o vírus).

Vamos por partes, começando pelos malandros nos Estados Unidos.

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Ui, ui, chamem o chui para pôr ordem nesta gente toda, não vêem uma segunda onda muito maior que a primeira?

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Quer dizer, se em vez de testes positivos usarmos mortes, parece que a tal segunda onda é bem mais pequena que a primeira.

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Afinal parece que aquela curva global dos Estados Unidos é formada pela soma de várias curvas: Nova Iorque comportou-se como a Europa temperada, no tempo e na dimensão da mortalidade, e o Texas comportou-se como os estados do Sul (à mesma latitude, perto da Europa, o que existe mais é mar e deserto, portanto...).

Mas vamos então olhar para o drama francês, que escolhi, entre muitas outras possibilidades, por estar agora com números de casos semelhantes ao da primeira vaga, de Março e Abril.

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Fecha tudo, fecha tudo outra vez, como na Nova Zelândia, já estamos na mesma situação de Março e Abril.

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Bom, em mortos a história parece outra, mas enfim, não se fala nisso, concentremo-nos no que é importante, os testes de laboratório e deixemos a realidade da vida das pessoas para outra altura, que não interessa nada discutir se uma morte é mais ou menos importante que o resultado de um teste de laboratório.

Serviço gratuito

por João Távora, em 30.08.20

Quando os meus amigos quiserem promover o vosso negócio, tipo "hair dresser", "stayaway covid", "barber shop" (abriu agora um aqui ao pé de casa) ou de "fast food", e precisarem de um tradutor eu ofereço os meus serviços gratuitos. Não têm de quê.

Domingo

por João Távora, em 30.08.20

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus


Naquele tempo, Jesus começou a explicar aos seus discípulos que tinha de ir a Jerusalém e sofrer muito da parte dos anciãos, dos príncipes dos sacerdotes e dos escribas; que tinha de ser morto e ressuscitar ao terceiro dia. Pedro, tomando-O à parte, começou a contestá-l’O, dizendo: «Deus Te livre de tal, Senhor! Isso não há-de acontecer!». Jesus voltou-Se para Pedro e disse-lhe: «Vai-te daqui, Satanás. Tu és para mim uma ocasião de escândalo, pois não tens em vista as coisas de Deus, mas dos homens». Jesus disse então aos seus discípulos: «Se alguém quiser seguir-Me, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e siga-Me. Pois quem quiser salvar a sua vida há-de perdê-la; mas quem perder a sua vida por minha causa, há-de encontrá-la. Na verdade, que aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro, se perder a sua vida? Que poderá dar o homem em troca da sua vida? O Filho do homem há-de vir na glória de seu Pai, com os seus Anjos, e então dará a cada um segundo as suas obras».


Palavra da salvação.

A estatística do futuro

por henrique pereira dos santos, em 27.08.20

Salvo qualquer percalço, compro o Público todos os dias (por exclusão de partes).

Antigamente até o lia on-line, ao fim de semana comprava em papel, comecei a perceber que os meus filhos iam lendo os jornais que ficavam por ali, e para fomentar a leitura de jornais (não me interessava se só liam o desporto, a moda, os mexericos, é irrelevante), que acho uma coisa boa em si mesma, passei a comprar todos os dias.

Mas nem sempre o leio, e vou acumulando para ler um dia.

Ontem li vários do princípio de Julho e lá estava uma notícia com o título garrafal: "No Sul dos EUA, teme-se um horror igual ao dos hospitais italianos".

Para além do habitual viés anti-Trump e, consequentemente, anti estados governados por republicanos (a Califórnea aparece referida, mas enfim, sempre com uma nuance), o artigo lá acabava com "grand finale":

"Ontem, o homem que chefiou o Departamento de Saúde do Arizona durante seis anos sob a liderança da ex-governadora Jan Brewer, disse que teme o pior nas próximas semanas. "Olhem para o que aconteceu na Lombardia, em Itália, e em Nova Iorque. É isso que está prestes a acontecer aqui", disse Will Humble ao The Washington Post. "As pessoas vão morrer porque o nosso sistema está sobrecarregado e é importante que outros estados aprendam com os nossos erros. Somos um exemplo daquilo que não deve ser feito".

Como o jornal é de 4 de Julho, e hoje estamos a 27 de Agosto, é perfeitamente possível ver o que aconteceu.

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Sem surpresa, com as diferenças que existem de situação para situação e de padrão entre as zonas temperadas e as subtropicais, o que aconteceu no Arizona não foi nada de especial e tem o padrão que tem sido verificado mais ou menos em todo lado (a análise deve ser feita sítio a sítio, e não por país): uma subida rápida de casos de mais ou menos três semanas, um planalto e uma descida, o mesmo se verificando no padrão de mortalidade, com algum desfasamento e com o arrastamento da perna direita na descida.

E tanto foi assim no Arizona, como nos restantes estados do Sul dos Estados Unidos, independentemente das medidas tomadas (a discrepância da Californea para o Arizona, nas medidas de gestão, é abissal, as curvas da epidemia são quase as mesmas, com diferenças de amplitude e de pormenor).

Nem mesmo com toda esta evidência, se consegue que a hipótese de que a epidemia tem andado um passo à frente de nós, e que a sua dinâmica seja mais interna que resultante das medidas que tomamos, ganhe foros de cidade, mesmo como mera hipótese de trabalho.

Em grande parte pelo enorme contingente de estatísticos do futuro: pessoas que nunca conseguem explicações consistentes para as diferentes situações do passado, mas que acreditam piamente que os dados do futuro vão confirmar as suas convicções.

Quando não confirmam, têm sempre uma nova explicação e mais uma afirmação sobre o facto dos dados do futuro ir confirmar os cenários aterradores que traçam e que, por acaso, até não se verificam posteriormente.

P.S. O governo voltou a decretar um estado de contingência, a partir de 15 de Setembro, para poder limitar arbitrariamente direitos constitucionais dos indivíduos, sem qualquer fundamentação lógica relacionada com o andamento da epidemia. Para além da gravidade desta decisão em si, há um risco maior que todos: são precedentes que vão banalizando a restrição das liberdades individuais com base numa mão cheia de nada em matéria de fundamentação e justificação. Quando estes precedentes forem usados mais tarde por governos de quem gostem menos, não se esqueçam da nossa passividade perante esta barbaridade.

Um dia depois

por João-Afonso Machado, em 26.08.20

Já algum orgão da Comunicação Social referiu, António Costa e Miguel Guimarães, na célebre cimeira de ontem, tinham fumado o "cachimbo da paz". A isso estamos condenados.

No fim do tremendo conclave, ao que o cidadão médio consegue aperceber, Costa lavou as mãos como Pilatos. Guimarães disse mais, sobretudo defendeu os médicos envolvidos no "caso Reguengos". Não podia agir de modo contrário. Mas... palavras vãs. E cada um foi à sua vida.

Ouvimos agora os sindicatos médicos clamando contra o Governo. Na televisão. Serão fascistas? Fascistas de longo curso, como tal protestando desde as cativações de Centeno?

A resposta a estas interrogações será sempre a falácia de Costa. O abismo português também.

O "On" e o "Off"

por João-Afonso Machado, em 25.08.20

Finalmente! - vai uma diferença grande entre o que um político diz e o que ele pensa. Algo não desconhecido pela generalidade dos portugueses, como agora se confirma, e com as consequências eleitorais bem medidas pela abstenção.

Desta feita, a entrevista de Costa tem, à devida escala, a dimensão de um Watergate português.

Primeiramente, as palavras de circuntância. Já o episódio de Reguengos estava sob investigação, já a Ordem dos Médicos expusera as suas críticas, e Costa repudiava-as com o argumento jurídico da falta de competência para se pronunciar, via parecer, sob o assunto. E tudo - embora de evidente modo irritado - dentro do formalismo adequado aos trâmites legalistas.

Contudo, voluntária ou involuntariamente, já em privado, o seu pensamento veio à tona e foi divulgado - «gajos cobardes, os médicos».

No instante segundo, a Ordem reagiu. Diplomaticamente. Pediu uma reunião, que aconteceu. No fim da qual, Costa saiu dizendo esperava os mal-entendidos fossem ultrapassados.

O costume!

Desse cavalheiro, por natureza negociante, não havia a esperar mais. Aguarda-se é a resposta da Ordem dos Médicos (o Bastonário, Miguel Guimarães, parece dono de toda a confiança), em nome da nossa segurança e saúde.

Espera-se essa resposta - sem "On" nem "Off", apenas ditada pela verdade no nosso País.

Engano

por henrique pereira dos santos, em 24.08.20

Recentemente têm aparecido referências sugerindo, ou mesmo afirmando, que a história falará desta epidemia como um monumental engano que nos levou a adoptar uma cura bem mais prejudicial que a doença.

É muito cedo para ter certezas sobre isso.

Em qualquer caso, uma coisa é clara: há um conjunto de pessoas, muito minoritário, que desde o princípio defendeu que a epidemiologia clássica deveria ser a base da gestão da epidemia e que acrescentar à incerteza associada a qualquer epidemia de uma doença nova a incerteza de aplicação de medidas novas, nunca testadas, era uma opção ultra-arriscada.

Esta posição, perfeitamente legítima, foi completamente cilindrada, pela coligação em que se misturavam os que defendiam medidas inovadoras, uma comunicação social em pânico e que desistiu de cumprir a sua função de informar e políticos com medo de serem acusados de não terem feito tudo o que seria possível para salvar vidas.

Não é grave que aquela posição tenha sido contestada, o que é grave é que, acreditando piamente na necessidade de medidas radicais e tão rápidas quanto possível, a coligação maioritária tenha optado por não discutir diferentes pontos de vista, contendando-se em esmagar eventuais divergências.

Agora estamos todos a pensar como sair da armadilha em que nos metemos, com o grupo maioritário a propôr actuações que, no essencial, são aquilo que a epidemiologia clássica desde o início, sugeria.

Que se pretenda passar a ideia de que não é nada disto, a questão é que ninguém sabia nada de início e agora é que sabemos o que fazer, o que nos permite evitar novas medidas radicais e generalizadas, eu compreendo, mas que não é bonito, lá isso não é.

Se com isto aprendermos que na próxima epidemia (e haverá sempre epidemias) talvez não seja boa ideia irmos atrás de quem pretenda potenciar a incerteza da epidema com inovação de políticas nunca testadas, já não seria mau.

24 de Agosto de 1820

por João Távora, em 24.08.20

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A propósito da efeméride de hoje em que se completam 200 anos da Revolução Liberal do Porto, Lourenço Pereira Coutinho na revista do Expresso faz uma curiosa referência a um jurisconsulto de seu nome António Ribeiro dos Santos, que no reinado de D. Maria I representava uma corrente não revolucionária partidária do estabelecimento de um código constitucional escrito para o reino, projecto que obteve forte oposição dos defensores do iluminismo pombalino. Infelizmente em Portugal é quase sempre a via revolucionária que vinga, e é no mínimo irónico que o Marquês de Pombal se tenha tornado o grande ícone do republicanismo português. Afinal, déspotas são sempre déspotas.
A não perder é o ensaio sobre o tema escrito por Carlos Bobone, aqui.

Pirataria

por João Távora, em 24.08.20

A história da gravação pirateada ao Expresso está muito mal contada e o assunto carece de urgente esclarecimento - é o que se depreende do comunicado do jornal. Sobre a substância, eu diria que a nenhum dirigente de direita passaria pela cabeça desabafar algo daquele calibre à frente de jornalistas. As liberdades a que António Costa se permite naquelas circunstâncias são também uma denúncia.

O ano lectivo

por henrique pereira dos santos, em 23.08.20

Luis Aguiar-Conraria tem sido incansável na desmontagem dos argumentos dos que querem evitar a normalidade presencial do ano lectivo.

Na Sexta-feira, 21, na RTP3, por volta das 22 e 20, e sobretudo no fim do seu segundo comentário, diz claramente que os senhores jornalistas, em vez de perguntarem que medidas deve o governo tomar para responder à crise económica que se instala perante os nossos olhos e a nossa indiferença, devem parar de assustar as pessoas com informação falsa sobre a epidemia que, isso sim, seria um bom contributo para retoma económica.

Dá dois exemplos claros e recentes, o da forma como foi tratada a morte de um bebé de quatro meses que é registado como uma morte covid, mas que tem uma patologia grave desde o nascimento e, sobretudo - ele diz acaloradamente que é inadmissível e eu só posso concordar - a forma como toda a imprensa repetiu títulos sobre um estudo que demonstraria que as crianças são tão ou mais infecciosas que os adultos e, lendo o estudo, é claríssimo que que os autores dizem que não estudaram a transmissibilidade mas apenas cargas virais.

Por coincidência, uma pessoa que não conheço, e que pela conversa me pareceu professor, veio argumentar comigo que "se há várias dezenas de milhares de professores com mais de 60 anos é de esperar que para alguns a doença ataque mais fortemente e que alguns morram".

Este tipo de terrorismo argumentativo, que felizmente muitos professores não usam, mas que caucionam com o seu silêncio e com a passividade com que deixam o espaço público aos que não querem normalizar o ensino presencial, tem excessiva expressão no jornalismo, que raramente perde tempo a demonstrar que isto não são argumentos para manter escolas fechadas, isto é puro terrorismo argumentativo.

Vamos aos factos.

Não sabemos quantos professores existem em grupos de risco.

Os estudos sobre o envelhecimento da classe debruçam-se sobre os professores com mais de 50 anos, não tendo muita informação sobre a estrutura etária (ou melhor, na rápida pesquisa que fiz não encontrei a estrutura etária, deve haver com certeza, eu é que não tenho tempo agora para procurar mais) que permita saber quantos professores existem entre os 60 e os 70 anos.

Dito isto, as pessoas entre 60 e 70 não estão, por essa razão, nos grupos de risco que, do ponto de vista etário, são definidas a partir dos 70 anos.

É verdade que dentro dos grupos de risco estão muitas pessoas que têm mais de sessenta anos e que têm outras patologias que as tornam parte desses grupos de risco.

Algumas dessas patologias não dependem de comportamentos individuais, mas duas das mais espalhadas, o excesso de peso e a tensão alta, são, em grande medida, controláveis por comportamentos individuais, isto é, quem se sinta em risco porque tem mais de sessenta anos e a tensão alta ou excesso de peso pode, na maior parte dos casos (não em todos, é certo) reduzir esse risco adoptando comportamentos individuais que diminuam o seu peso ou a sua tensão arterial.

Exigir o fecho das escolas para que estas pessoas possam manter comportamentos individuais de risco não diminui o risco de morte destas pessoas, que continuam com mais de sessenta anos, peso a mais ou tensão arterial alta, mas a alteração dos seus comportamentos individuais ajuda a protegê-las da doença, com ou sem escolas abertas.

Acresce que os professores em grupos de risco podem adoptar comportamentos de defesa perfeitamente praticáveis, o principal dos quais é o distanciamento físico das outras pessoas. A OMS recomenda um metro, se quiserem podem duplicar para dois metros, e dar aulas mantendo uma distância permanente de dois metros em relação a terceiros é perfeitamente viável. Podem reforçar essa defesa própria com uma máscara adequada para esse efeito (não estas coisas que usamos por serem obrigatórias em alguns sítios, mas as que protegem mesmo a pessoa em causa) e lavar as mãos frequentemente.

Tudo isso cumpre perfeitamente a necessidade de defesa de grupos de risco, sem pôr em causa o direito dos alunos, em especial dos mais pobres e frágeis, a ter uma educação que atenue a diferença de oportunidades para quem nasceu em berços mais dourados.

Um professor que se recusa a contribuir para fazer funcionar o elevador social através da educação porque se recusa a adoptar comportamentos individuais que podem reduzir o seu risco face à covid não é um professor que eu respeite.

Acresce que toda a informação que existe sobre escolas - sim, há países em que as escolas ou sempre funcionaram, ou rapidamente foram postas a funcionar, mesmo durante a epidemia - não demonstra problemas de maior de gestão da epidemia, ou de crescimento de risco para os professores, decorrentes do contexto escolar presencial.

Claro que com os jornalistas a insistir em falar nas escolas que fecham imediatamente depois de recomeçar o ensino presencial será sempre difícil combater a paranóia dos contágios.

Lembro-me de uma notícia que dizia que já havia sete escolas fechadas, se não me engano, na Alemanha, e depois percebia-se que em apenas numa havia uma ligação a um surto ligado à comunidade, nem sequer ao contexto escolar, o resto eram medidas precaucionistas da paranóia dos contágios e, ainda assim, a notícia omitia que sete escolas é um número residual, sem qualquer expressão.

Lembro-me de se focar a atenção, por exemplo, nas dez escolas que fecharam em Portugal (existem cinco mil escolas em Portugal, se não em engano), omitindo que algumas nem sequer tinham caso nenhum, declara-se um surto no lar de terceira idade e a câmara decide fechar as escolas, o que torna difícil combater a paranóia dos contágios.

Se há um teste positivo (e já nem discuto a questão de nos concentrarmos nos doentes, e não em resultados de laboratório) numa escola, o que há a fazer é isolar esse caso, testar os contactos mais próximos, isolar quem deva ser isolado, e continuar a vida da escola normalmente.

Mesmo que assim não seja, eu não entendo os professores que não dizem, alto e bom som, que mais vale ter cem escolas a abrir e fechar ao ritmo da paranóia dos contágios e testes, e as outras 4 900 abertas e a funcionar normalmente, a ter tudo fechado, com medo de que algum professor seja contagiado na escola.

Que me perdoem os professores que não o merecem, mas o silêncio de tantos professores perante as campanhas absurdas contra a abertura de escolas, é imperdoável.

Os professores têm a obrigação moral de estar na primeira fila da defesa da importância social da escola presencial - e, já agora, da importância social da sua profissão - e, mesmo que tenham medo, compreender que ali ao leme são mais eles próprios, são uma das principais garantias e alavancas de uma sociedade mais rica e mais justa.

Que os jornalistas não ajudem os professores de boa vontade a sair do armário, é deprimente.

"Abandonai toda a esperança"

por henrique pereira dos santos, em 22.08.20

Mas então, qual é a tua solução?

Na verdade, nenhuma. Não tenho soluções a propor, só haverá soluções quando o peso da pobreza atingir a classe média de forma mais dura que o medo da epidemia.

Até lá, vamos estar nisto, com os jornais a contar histórias terríveis todos os dias e os governantes a perguntar-se,  todos os dias, que medidas podem anunciar que os protejam da acusação de serem responsáveis pela morte de inocentes.

Proibir de fumar em público, ou de vender bebidas alcoólicas, ou de passear sem máscara é estúpido e inútil para a gestão da epidemia? Talvez, mas se eu decidir cada uma dessas estupidezes, o mais que me acontece é haver uma minoria que diz que é uma estupidez, se decidir em sentido contrário, qualquer pessoa pode dizer que morre gente por não se usar máscara na rua, ou por se vender uma cerveja às oito e um quarto, ou por fumar um cigarro no jardim e haverá jornais a publicar as acusações e pessoas a concluir que não se fez tudo o que era possível para parar a hecatombe.

Vejamos o que aconteceu na Nova Zelândia, o exemplo dos exemplos de tudo o que defendem os que acham razoável tudo o que possa diminuir, por pouco que seja, a actividade viral.

Depois de comemorar 100 dias sem casos na comunidade, com as fronteiras fechadas, com um controlo absoluto de tudo - achavam eles, claro - aparecem, sem que ninguém saiba por que razão e como, quatro infectados no dia 12 de Agosto (se não me engano).

Dez dias depois, a situação é como se descreve: 

There are nine people with Covid-19 in hospital, including three in intensive care. "There are two cases in Auckland City Hospital, four people in Middlemore - which includes the three in ICU - two people in North Shore Hospital and one person in Waikato Hospital. ... In a statement, the Health Ministry said all those in hospital were isolated and managed separately from other patients. "The public can be confident that our DHBs are managing this effectively, as they did in the first outbreak of Covid-19 in New Zealand. "We have heard reports of people who are reluctant to get an ambulance or go to hospital - hospitals continue to be safe places to receive medical care, and people should feel confident going to hospital to receive treatment." The ministry said four of the new cases are epidemiologically linked to the Auckland cluster - two are household contacts and two are church contacts, while the other two cases remain under investigation. It said 145 people linked to the cluster have been moved into the Auckland quarantine facility, which includes 75 people who have tested positive for the coronavirus".

Ou seja, aparecem quatro novos casos sem explicação e apesar de todas as restrições existentes, e dez dias depois andam a correr atrás da cadeia de contágio, sem fazer a menor ideia de como vai evoluir. Para garantir que não evolui desfavoravelmente, fecham as escolas numa altura crucial do ano lectivo, prendem 145 pessoas que não cometeram crime nenhum, adiaram as eleições um mês e fecharam uma parte do país onde se concentra um terço da população e o grosso da actividade económica.

O que nos venderam permanentemente é que teríamos de agir rápida e brutalmente como na Nova Zelândia para mais rapidamente retornar tudo à normalidade, mas esqueceram-se de explicar que, com essa doutrina, a normalidade é esta: quatro casos positivos e volta tudo ao princípio, sem apelo nem agravo, e sem a menor garantia que depois de passado este surto não recomece tudo outra vez porque apareceu de novo um pequeno surto sem que ninguém saiba porquê.

Por acaso, hoje, quando andava a tentar perceber a evolução geográfica da epidemia (já explico abaixo porquê), dei com este mapa.

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E, de repente, apercebo-me que os países de que se fala permanentemente como sendo casos perdidos de estupidez na gestão da epidemia, não aparecem neste mapa de forma que confirme essa "narrativa", como agora se diz.

A razão pela qual estava à procura de mapas que me permitissem ver a evolução geográfica da epidemia é simples: o que me parece (puro achismo, sem bases concretas, e por isso procurava os mapas) é que se em Março/ Abril a actividade viral estava firmemente instalada nas regiões temperadas do hemisfério Norte, em Junho/ Julho e Agosto parece ter descido em latitude e actualmente acompanha as latitudes de que os estados sub-tropicais americanos (aqueles em que actualmente há todos os dias milhares de casos e uma a duas centenas de mortes) são o limite Norte. Acontece que a as mesmas latitudes, no Sul da Europa e Norte de África, têm relativamente pouca população, ou porque são água ou são deserto, sem prejuízo do crescimento de casos na Grécia, Croácia (há sempre quem diga que é por causa dos corredores aéreos turísticos dos ingleses, claro) ou Israel, mas nada que se compare ao México, América Central ou Índia.

mapamundo.jpg

Claro que esta minha impressão é só isso, uma mera impressão, não tenho os instrumentos para verificar se é totalmente contrariada pelos dados (nem mesmo fui verificar onde estão a ocorrer os casos de Espanha), e na verdade tem muito pouca importância o que penso sobre o assunto, o extraordinário é a quantidade de pessoas que recusam por completo a hipótese de haver uma boa parte da dinâmica da epidemia que é determinada pelo vírus e não pelas nossas opções, embora estejam sempre a explicar evoluções passadas com hipóteses que, aplicadas ao futuro, falham sempre.

É por isso que gosto do trabalho de Gabriela Gomes.

Uma parte será, por mais que eu tente limitar isso racionalmente, porque diz o que eu quero ouvir: haja alguém que não fala em dramatismos e apresenta uma leitura da evolução da epidemia que é serena (a leitura, não a epidemia).

Outra parte substancial é porque os números que vão sendo coligidos se aproximam do que ele tem vindo a propôr como a evolução possível da epidemia, ao contrário dos modelos que dão origem aos 60 a 70% de população infectada como limite a partir do qual a epidemia pára.

Salvo casos muito pontuais, os sítios que foram mais profundamente atingidos - Lombardia, Madrid, Nova Yorque, por exemplo - ou em que não havia grandes condições de confinamento interno mas em que havia estanquicidade com o exterior, como os barcos, têm visto a infecção parar com taxas de infectados que andam bastante mais próximos do que diz Gabriela Gomes do que dos outros modelos que se esquecem que somos todos diferentes uns dos outros, quer biologicamente, quer em comportamentos.

Continuo a ficar maravilhado com a capacidade da teoria evolucionista ajudar a explicar a realidade biológica de que fazemos parte.

O que não me impede de reconhecer as suas limitações para me ajudar a compreender as comunidades e os comportamentos de grupo, aquilo que parcialmente faz de nós humanos que exigem aos governos o impossível, o que naturalmente eles se apressam a prometer ser possível.

Percepção pública

por henrique pereira dos santos, em 21.08.20

Hoje dei com um post com um mapa em que a Europa aparecia dividida entre aquela em que chove mais que Londres e a que chove menos.

O mapa era grosseiro, isto é, sem pormenor, mas está genericamente certo.

Algumas das pessoas que comentavam estranhavam que mais de metade de Portugal estivesse na parte em que chove mais que Londres (incluindo Lisboa, com certeza) e um dos comentadores dizia que estavam a brincar, era evidente que o Nordeste de Portugal tinha menos chuva (já agora, precipitação média anual) que Londres e alguém de Mirandela corroborava que por lá chovia pouco.

Fui buscar os números para explicar que o mapa não tinha pormenor para distinguir a terra quente da terra fria, mas que mesmo em Mirandela, a diferença para a chuva anual em Londres não era assim tão grande: cerca de 60 mm de precipitação, ou seja, em Mirandela, anualmente, chove 90% do que chove em Londres.

Este tipo de dissociações cognitivas são muito frequentes e prendem-se com a forma como pensamos: todos nós temos facilmente a percepção de que choveu ontem, mas se se perguntar de choveu 0,1 mm, 1 mm ou 10 mm, temos uma enorme dificuldade em responder, isto é, temos uma razoavelmente apurada sensibilidade para ter uma ideia de quantos dias de chuva temos por ano, e em que alturas ocorrem, mas temos muito pouca sensibilidade para avaliar quantidades de chuva.

Por curiosidade, Suzanne Daveau tem um livrinho muito interessante sobre a precipitação em Portugal que, na altura, correspondeu a uma contestação fortíssima aos números dos serviços meteorológicos. Não nos valores medidos - mesmo aí os serviços meteorológicos descartavam muitos dados por serem discrepantes e consideravam-nos erros - mas na interpretação das variações entre pontos de medição, em que os serviços meteorológicos privilegiavam interpolações matemáticas simples (ainda não havia modelos digitais de terreno, aliás, em rigor, ainda não havia mundo digital) e Suzanne Daveau privilegiava interpretações geográficas, com uma sólida base no território. Foi aí que, por exemplo, tanto quanto sei, se demonstrou que precipitações anuais de 3 mil mm no Gerês (cinco vezes mais que em Londres) não eram um erro de registo, mas um facto verificável.

Vem isto a propósito dos vários amigos que tenho visto defender que, por eles, nem discutem a utilidade das máscaras, acham que é um preço razoável a pagar, independentemente da sua utilidade para o controlo da epidemia (Filipe Frois admite que têm uma importância pequena no exterior, mas que é preciso juntar todos os bocadinhos pequenos que seja possível, uma ideia muito sensata, claro, típica de quem tem uma visão global dos problemas associados às políticas públicas), se for o preço para abrir tudo o resto.

Em tese, também estaria disposto a trocar toda a irracionalidade associada às medidas que pretendem controlar totalmente - e totalitariamente - os contágios por um uso generalizado de máscaras, mesmo que não exista qualquer evidência sólida sobre o seu uso na generalidade dos casos não hospitalares e as poucas evidências que existem fora desse contexto dizerem respeito a espaços fechados, cheios de gente, mal ventilados e em que as pessoas estão muito próximas por períodos de tempo relativamente longos (acima de um quarto de hora).

Mas é aí que entra esta nossa maneira de pensar sobre a qual fazemos percepções, um mecanismo muito interessante de defesa porque se tivéssemos de pensar cartesianamente, sem atalhos, perante todas as ameaças, a espécie já se teria extinguido.

O uso generalizado das máscaras no exterior, que cada vez mais tem vindo a ser adoptado por governos fracos e desesperados por abrir a economia e a sociedade sem incorrer no risco político de serem responsabilizados pelas mortes registadas como covid, reforça o problema principal da epidemia: o pânico social.

Para a generalidade das pessoas, se as autoridades obrigam toda a gente a andar de máscara, isto só pode ser porque é mesmo muito perigoso, tão perigoso, pelo menos, como andar a aplicar fito-fármacos no pomar, e como não podem estar todos enganados, temos mesmo de ficar em casa e mexer-nos o menos possível.

Mais uma vez, é uma opção que desvaloriza o risco do medo generalizado que, sendo inevitável, é obrigação dos governos combater, e não fomentar.

Como diz Rui Tavares hoje na sua crónica no Público, em que faz a defesa do reaccionarismo como instrumento de eleição de Joe Biden (que ironia), "a vontade de que o mundo pare de dar solavancos é uma força poderosa", ou seja, a esperança de que as pessoas comuns e a comunicação social pressionem os seus governos para que façam o que têm a fazer e não o que responde à minha percepção imperfeita da realidade, é praticamente nula.

Esta epidemia tem sido uma demonstração poderosa de como os estados democráticos continuam, como sempre estiveram, ao serviço das classes dominantes, o que neste caso quer dizer a classe média que se está nas tintas para os 12 mil desgraçados que engrossaram a bicha do RSI em Portugal nas últimas semanas, ou os 100 milhões que o Banco Mundial estima que estejam a ser empurrados para a miséria extrema pela cobardia dos governos que amplia os efeitos sociais e económicos inevitáveis de uma epidemia.

Da bondade

por henrique pereira dos santos, em 20.08.20

"Eu fico feliz que os velhotes, que talvez até estejam habituados a ter horas para regar e não regam fora delas, se sintam mais seguros porque não precisam de ir fazer compras, alguns até têm quem vá dar de comer aos animais, outros vão regar sem terem de se cruzar com vizinhos que não sabem se lhes pegam alguma coisa se não. É que os morense até podem ser velhos mas imagino que têm amor à vida e não lhes apetece ir parar aos cuidados intensivos como alguns dos vizinhos e devem estar-se nas tintas para quem defende as suas mais amplas liberdades no FB".

Este é um comentário de ontem à minha diatribe contra os excessos regulamentares e a prepotência dos pequenos poderes em roda livre à conta da epidemia.

É um comentário bondoso e cheio de preocupação, aliás legítima, com o medo que os velhotes de Mora têm de ir fazer companhia às cinco ou seis pessoas da vila doentes com covid. Não tenho nada a dizer sobre o comentário, que me parece nobre e bem informado.

Agora vejamos as consequências da sua aplicação, porque há poucas coisas mais mortíferas que ideias piedosas aplicadas sem consideração pelas suas consequências não pretendidas.

As medidas tomadas em Mora, que levaram, de resto, a GNR a identificar uma mulher de 68 anos a que a autoridade de saúde aplicou uma pena de prisão domiciliária (em lado nenhum se diz, sequer, que a senhora está infectada, e muito menos doente, não se sabendo, por isso, qual é a probabilidade de ser infecciosa) que a senhora resolveu não respeitar, salvando-a do suicídio potencial que é sair de casa, quando aplicadas à escala global, como estão a ser aplicadas - não são muito diferentes das medidas tomadas actualmente pelo governo neozelandês, por exemplo, com base na mesma lógica bondosa de salvar vidas - têm um efeito também global.

Este tipo de estimativas têm de ser vistas com muita cautela, mas são bastantes as fontes, e sólidas, que falam em cem milhões de pessoas empurradas para a pobreza, não tanto em Mora, claro, mas em sítios esquisitos como Dhaka, por exemplo.

Uma parte substancial desses cem milhões seriam sempre empurrados para a pobreza porque faz parte das consequências de uma epidemia a retracção económica decorrente das alterações de comportamento das pessoas, isso é absolutamente certo.

É verdade que os governos têm muito pouco poder para travar o pânico social associado a ameaças sentidas como reais, próximas e pessoais.

Mas não é indiferente usar o pouco poder que têm para potenciar esse medo, como está neste momento a acontecer em Portugal à medida que se aproxima a abertura do ano escolar e vai crescendo a campanha sobre os riscos de contágio associados à abertura de escolas, ou usar esse poder para racionalizar, na medida do possível, esse medo.

O comentário acima é um bom exemplo de bondade selectiva: toda a empatia para os riscos que a epidemia cria para os grupos vulneráveis à doença e aos seus efeitos mais graves, zero de empatia em relação aos riscos que as medidas tomadas para gerir a epidemia criam para os grupos vulneráveis às flutações económicas e à fragilidade social.

As medidas de saúde pública não são globalmente neutras e são demasiado importantes para serem deixadas ao livre arbítrio dos que decidem sobre a gestão dos sistemas de saúde pública, em especial em situações excepcionais em que esta bondade selectiva está à flor da pele de tanta gente que se recusa a olhar para o lado e, sequer, ponderar os efeitos negativos de cada opção.

A questão não é a defesa da liberdade dos velhinhos de Mora - o que em si não seria irrelevante - a questão é mesmo a de saber qual é a preparação do delegado de saúde para compreender os efeitos globais das medidas que toma sem qualquer controlo ou escrutínio.

Pessoalmente acho que seria muito mais útil ter os delegados de saúde a passar a pente fino as condições de cada um dos milhares de lares que existem, olhando para eles partindo do princípio que a entrada da epidemia é uma inevitabilidade, em vez de os ter a analisar que velhotes podem ir regar ou não a sua horta, perseguindo a vã esperança de que se todos estivermos quietos a epidemia morre à fome e, assim, não entra nos lares.

Entra sim, é melhor partir do princípio de que isso é uma inevitabilidade, tal como é uma guerra perdida pretender apagar todos os fogos nascentes antes que sejam grandes, como forma de diminuir a área ardida.

Olhando para os anos que demorou até que os gestores do fogo, em especial os da linha da frente - é assim que agora fica bonito, não é? - percebessem que andar a correr atrás de todos os fogos era inútil, e que seria melhor começar a olhar seriamente para as condições que provocam perdas sociais, temo que só à décima epidemia seguida "os da linha da frente" da saúde comecem a perceber que as condições em que funcionam os lares é um problema bem mais grave que o do número de contágios.

As medidas para liquidar todos os fogos o mais rapidamente possível são puro desperdício económico, ao contrário das medidas de gestão das condições do território para integrar o fogo, que têm grandes benefícios no emprego, na riqueza, na qualidade da paisagem, só que custam muito mais em tempo, conhecimento, organização e geram menos visibilidade política.

Medidas brutas e espetaculares para diminuir o mais possível a actividade do vírus geram ineficiência económica, ao contrário de medidas de apoio à melhoria dos lares e da velhice em geral, que teriam incontáveis benefícios na qualidade do fim de vida de todos nós mas têm o problema de dar resultados lentamente e serem como o trabalho da dona de casa: não brilha.

No fundo, é de facto uma questão de bondade, porque fazer o que está certo não dá grande retorno a quem fizer essa opção: ou se faz por convicção, ou se é para fazer por cálculo político, não vamos sair tão cedo do atoleiro em que estamos, com o beneplácito da bondade selectiva que escolhe desconhecer a miséria em Dhaka.

A codificação da morte covid

por henrique pereira dos santos, em 19.08.20

Evito escrever sobre questões muito técnicas relacionadas com a epidemia porque a probabilidade de dizer asneiras é ainda maior que o habitual.

Hoje, ao ler a notícia de que uma das duas mortes covid de hoje era uma criança de quatro meses resolvi ir tentar perceber melhor como se faz a codificação, tanto mais que a questão da codificação dessa morte foi explicitamente referida na conferência de imprensa da DGS.

No caso, a criança nasceu com um problema cardíaco complicado e a covid terá sido a gota de água de que resultou a morte da criança ontem.

Com a condição base da criança, esse desenlace era sempre o mais provável no curto prazo, com covid ou com outro detonador qualquer do processo final que acabou na sua morte.

A racionalidade da codificação por parte da DGS é a seguinte: "Sobre a forma como a contagem dos óbitos é feita, a Diretora-Geral da Saúde esclareceu que a mortalidade por COVID-19 é considerada como evento terminal. Ou seja, qualquer pessoa que morra com a infeção é considerada morto por COVID-19, independentemente da causa básica da morte".

Independentemente da opacidade do que está escrito, com a falta de definição do que é causa básica e do que é causa terminal, parece-me legítimo admitir-se que a codificação da morte se centra na gota de água que faz o copo deixar de conter a água, e desvaloriza o nível de água no copo.

Isto é racional e normal.

Seria bom ter estas ideias clarinhas, clarinhas quando dizemos que há 787 mil mortes por covid desde o início da epidemia: sendo isso verdade - não vou discutir a qualidade dos números, vou dá-los como bons - isso não significa que essas 787 mil mortes tivessem sido evitadas se não existisse covid, bem pelo contrário, os dados que existem apontam para que apenas cerca de 15% dessas mortes se devam realmente à covid como causa básica, para usar a terminologia da DGS.

Na esmagadora maioria dos outros casos, essas mortes ocorreriam igualmente em prazos relativamente curtos, a maior parte durante 2020.

Claro que é melhor morrer em Novembro de um ano em vez de morrer em Fevereiro do mesmo ano, mas quando temos de pôr no prato da balanço os custos e os benefícios das medidas que queremos adoptar para gerir melhor a epidemia, é bom que tenhamos bem a noção do que significam os números da mortalidade.

Olhar para os números desta forma não é nenhuma falta de consideração pela vida dos mais velhos, que temos a obrigação de preservar (e, para isso, mais que proibir venda de bebidas alcoólicas depois das vinte, é muito mais importante saber como podemos melhorar a forma como tratamos os mais velhos e doentes, com certeza conseguimos fazer melhor que o que temos feito), é apenas procurar ter a mesma consideração pela vida de milhares de pessoas, destruída por medidas absurdas que vão sendo tomadas ao sabor da gestão política das percepções públicas.

Em grande parte alimentadas pela incapacidade de entender os números que todos os dias aparecem em todo o lado.

Delírios dum defeso atípico

por João Távora, em 19.08.20

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Mesmo na perspectiva de estádios sem público por causa da pandemia do medo, o defeso da bola com as promessas de reforços milagrosos para as equipas é sempre emocionante para os adeptos mais entusiastas. As temperaturas do estio conjugadas com a indolência das férias contribuem para um ambiente de expectativa eufórica que os jogos a doer tratarão de acalmar. A julgar pelas notícias e pelos comentários dos especialistas, o Benfica este ano surgirá com uma equipa para disputar o pódio das competições europeias e o campeonato doméstico uma mera formalidade, um monótono passeio com o vencedor já vaticinado. O fenómeno mediático proporcionado pela promessa de chegada do messiânico Jesus repete-se agora com o alvoroço da possibilidade da contratação de Cavani. Tudo em prol da salvação de Luís Filipe Vieira, a quem, com a justiça à perna não convém perder o lugar onde se protege.

Dito isto, as coisas até podem não ser assim lineares, não digam nada a ninguém. Tenho ideia de que retornos normalmente não funcionam bem e que as estrelas em fim de carreira são mesmo cadentes. Já o Sporting com um bom treinador e estilo de jogo definido parece-me no bom caminho, a contratar valores seguros, jogadores emergentes com provas dadas e necessidade de afirmação noutros patamares. A construção de uma equipa sem desespero ou euforias.

E como eu tenho saudades de ir à bola…

Publicado originalmente aqui

Um minhoto na Capital

por João-Afonso Machado, em 19.08.20

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Com Lisboa repelindo já o invasor normando, ela aventurou-se cá fora, embuçada e cautelosa. Encontrei-a, por mero acaso, deambulando no Terreiro do Paço, quando cogitava se havia de atravessar o rio e dar um adianto no meu estudo sobre churrasqueiras nacionais.

Foi a festa do costume! Lamentavelmente, sem abraço nem beijinhos, conforme a nova moda do distanciamento social. Mas sempre tilintando das suas pulseiras, nada bronzeada, praias com semáforos e fitas métricas - não! E, cintilando, a ideia sua:

- Vamos a Cascais?

Eu acho, ninguém vai a Cascais depois que mataram o Rei e o Príncipe Real. Porém, como recusar? Fomos.

A vila estava animada. O mar chão, a Praia dos Pescadores muito colorida das traineiras. De súbito, um sulco cavado nas águas e a minha amiga gritando de excitação:

- Olhe o nosso Presidente! Lá vai ele salvar mais um afogado!

Sem óculos, cegueta e ofuscado pelo sol, ainda alvitrei:

- Não será um golfinho brincalhão?

(Gosto muito mais de golfinhos do que de presidentes da república...)

- Qual golfinho! É o nosso Marcelo. Aposto que está no mar alguém aflito e aí vai ele!

Imperava o silêncio. Àquela velocidade o presidente, com toda a certeza, ia chegar atrasado ao salvamento. E a vítima devia ter submergido já, atacada por um tubarão. (Negando-me os golfinhos, eu replico com carnívoros letais...)

Servisse o tilintar das suas pulseiras para incutir ao moribundo uma réstea de esperança, surgiam os bombeiros de Cascais, chocalhando a sineta do seu "meio terrestre".

E conclui: a nadar assim, tivesse eu trazido o maillot e o salvamento seria obra minha. Obviamente cederia, então, os meus créditos à Casa Real portuguesa.

A epidemia e a lei

por henrique pereira dos santos, em 19.08.20

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Vi esta imagem na página de facebook de um amigo que procurava advogados que o ajudassem a fazer uma queixa a sério contra Luis Newton, presidente da junta de freguesia que parecer ser o responsável pela papeleta da direita.

A mesma polícia que faz relatórios dando conta das centenas de autos que já levantou por desrespeito pelas normas anti covid, a maior parte dos quais porque há umas pessoas a beber umas cervejas, um vinho ou seja o que for alcoolico na via pública - se estiverem todos a beber água pelo mesmo caneco a infecção não se transmite, como sabemos, aliás os problemas dos lares é porque andam todos no tinto -, só não se pode dizer que é cega em relação à ilegalidade da papeleta da direita porque, provavelmente, incomodará pessoas para que cumpram o que lá está escrito.

Ora a verdade é que nada do que lá está escrito tem base legal e a afixação desta papeleta, com timbre da Câmara Municipal e não assinada nem datada (não consigo ler as letras pequenas, portanto posso estar a ser impreciso neste ponto em concreto), parece-me, a mim que não sou jurista, um evidente abuso de poder.

A epidemia permite isto, o livre curso da exercício da autoridade sem controlo, nem da lei, nem da polícia, desde que se invoque uma qualquer ideia pessoal sobre o que é melhor os outros fazerem para controlar as infecções.

E ao ver a polícia empenhada em perseguir cidadãos que estão a fazer actividades tão perigosas como beber umas minis, ao mesmo tempo que relaxamos o controlo da legalidade da actuação do poder instituído, não consigo deixar de ver nisso uma metáfora do país e dos efeitos corrosivos da histeria normativa que se fundamenta no controlo obsessivo de infecções.

É impressionante a quantidade de demonstrações práticas da "Síndrome do pequeno poder, segundo a psicologia, é uma atitude de autoritarismo por parte de um indivíduo que, ao receber um poder, usa de forma absoluta e imperativa sem se preocupar com as consequências e problemas periféricos que possa vir a ocasionar. Segundo Saffioti, trata-se de um problema social e não individual, característica da nossa sociedade. Surge quando a pessoa não se contenta com sua pequena parcela de poder e se assume como superior ou detentora de responsabilidade sobre a liberdade de outrém, exorbitando sua autoridade" (a wikipedia tem boas sínteses).

Para mim parecer-me-ia óbvio que qualquer pessoa de bem, ao ver a sanha contra atitudes comuns de pessoas comuns andar de mão dada com a complacência perante o abuso do poder instituído, e ao ver que essa atitude domina largamente as polícias e a imprensa, ficaria seriamente preocupada.

O problema é que o óbvio é muito subjectivo e, aparentemente, são muito poucas as pessoas que acham óbvio que um abuso de poder como o que se exprime pela papeleta da direita deveria implicar uma evidente responsabilização política e legal de quem é responsável por a papeleta estar onde está.

Post scriptum: pensam que é um caso isolado e a brincar? Pensem outra vez de pois de ler esta descrição aterrorizadora que se esquece de dizer uma coisa básica: mas afinal quantos doentes existem em Mora?
"Entretanto, as pessoas que estão em confinamento pediram autorização à Autoridade Regional de Saúde (ARS) do Alentejo para poderem sair de casa para irem à horta ou tratar dos animais. Mais: foram estipulados horários para cada uma delas. “Há mapas onde reportam que uma pessoa pode sair das 20h00 às 21h00 para tratar dos animais ou das 6h00 às 7h00 para regar a horta, por exemplo”, explica ao Observador o Major Vieira, do Comando Territorial da GNR de Évora".

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