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Alterações climáticas

por henrique pereira dos santos, em 30.06.19

Tenho ideia (mas não confio nem um bocadinho na minha memória) de ter lido uma entrevista a Eugénio de Andrade em que, a propósito da musicalidade da sua poesia e do facto de ser um melómano, o entrevistador lhe perguntava por que razão nunca escrevia sobre música. Eugénio de Andrade respondia dizendo que para falar de música era preciso ser muito técnico e que lhe faltavam conhecimentos de música para isso.

Lembrei-me disto a propósito do facto de eu raramente escrever sobre alterações climáticas, apesar do centro da minha actividade profissional e de boa parte das minhas "convicções sociais" andarem à volta de questões ambientais e de sustentabilidade.

Recentemente, vários amigos meus, em várias discussões independentes, referiram-se ao facto de eu não alinhar na ideia da urgência de declarações de emergência climática e coisas afins como sendo uma posição absurda para um ambientalista, e daí retiraram conclusões azedas sobre o que ando por aí a dizer.

O artigo de João Pires da Cruz desta semana, no Observador, traduz o essencial da minha posição sobre alterações climáticas: a ciência não é uma questão de opinião e eu não sei o suficiente do assunto para ter uma posição muito diferente do que me parece ser o razoável consenso científico sobre o assunto.

Questão diferente é o passo seguinte, isto é, o que fazer politicamente a partir deste razoável consenso científico.

Uma boa parte dos meus amigos, frequentemente porque acreditam que a sociedade evolui de acordo com o que as políticas de Estado determinam, concluem que é tudo muito urgente e que tudo o que sirva para obrigar os políticos a tomar decisões que eles acham que são imprescindíveis é bom. E que só se avança com a velocidade necessária com uma espécie de governo mundial com capacidade para responder aos desafios societais globais que as alterações climáticas levantam.

Por isso gostam muito de Greta Thundberg, uma adolescente obsessiva de quem, naturalmente, não se ouve uma proposta concreta e minimamente consistente sobre o que fazer, mas que na opinião deles mobiliza muita gente para o que é preciso fazer (e respondem azedamente à minha observação de que ainda não percebi que acção concreta saiu, até hoje, dessa tal mobilização de rua em que se atiram responsabilidades para terceiros e se lhes exige que resolvam um assunto, sem perder dois segundos a pensar como e com que consequências).

Há muitos anos que defendo o que Miguel Araújo (um dos amigos com quem tive uma troca de argumentos mais ácida nesta matéria) defende nesta entrevista (já com dez anos): "Estamos perante um fenómeno que pode afectar a vida de centenas de milhões de pessoas e a sobrevivência de nações inteiras (o caso de nações insulares). Portanto, há que ser responsável na gestão das incertezas e assegurar que as decisões adoptadas sejam as que minimizem o risco de cometer erros graves. Ora as medidas de mitigação que se propõem são, na grande maioria dos casos, de tipo “win-win”. Ou seja, são políticas que são positivas quer haja alterações climáticas ou não e o custo social que advém de lhes conferir prioridade é bastante inferior ao custo social de não as implementar num cenário provável de alterações climáticas".

Os caminhos que nestes dez anos o Miguel e eu fizemos sobre este assunto são de facto divergentes, não nesta ideia central que transcrevi, mas sim na forma de lidar com o assunto.

Há quem ache que tudo se passa muito lentamente e fique cada vez mais radical na exigência de acção imediata dos Estados (e por isso celebre a intervenção de Greta Thundberg como um empurrão para mobilizar vontade política), e há quem ache, como eu, que talvez seja verdade que as coisas evoluam mais lentamente do que seria desejável, mas está muito longe da verdade a ideia de que nada está a mudar e que só mudará com governos empenhados em mudar a sociedade.

E, no entanto, os carros estão muito mais eficientes (os motores em geral e os equipamentos em geral), a agricultura de precisão faz muito mais por um uso eficiente de recursos que a agricultura biológica, empresas tipicamente no olho do furacão, como as da energia, investem cada vez mais na procura e, sobretudo, na colocação no mercado de soluções mais eficientes (há anos BP deixou de querer dizer British Petroleum para passar a dizer Beyond Petroleum), as empresas de produção florestal são hoje as mais avançadas no teste comercial do uso de animais no fecho de ciclos e de reforço de uma economia circular, etc..

Na verdade, quando escrevi a minha tese de doutoramento (aliás, co-orientada também por Miguel Araújo, que é um bom par de anos mais novo que eu) reforcei (ou mesmo tornaram-se claras para mim) as minhas convicções sobre os estreitos limites dos governos para mudarem a sociedade, ao mesmo tempo que se tornava claro que os grandes movimentos económicos e sociais, como a descoberta da síntese da amónia, tinham muito mais efeito real na transformação das sociedades.

E, no entanto, apesar de ser consensual de que esta descoberta é, de longe, a que mais vidas salvou no mundo, existe a esmagadora convicção de que as suas consequências práticas (a generalização dos adubos azotados de baixo custo) são uma espécie de coisa do diabo, uma conspiração do agronegócio e das empresas químicas.

O mais me distingue dos meus amigos nesta matéria não é pois o diagnóstico (não tenho conhecimento e cultura suficiente sequer para discutir muito o diganóstico), nem mesmo a dimensão do problema, mas o meu cepticismo quanto ao poder do Estado para responder a esses desafios, respeitando a liberdade e mantendo condições para a criação de riqueza (como se vê na inacreditável cruzada contra o uso do glifosato, um fitocida barato, de grande eficácia e implicações ambientais marginais, que a cedência dos eleitos à demagogia do pensamento mágico transformou num problema político de primeira linha, com soluções regulamentares absurdas e contraproducentes).

Hoje, muito mais que declarações de emergência climática por parte de parlamentos (sobre as quais manifesto o mesmo desinteresse que por Greta Thundberg), interessam-me as opções dos consumidores que obrigam as empresas a mudar os seus modelos de negócio, interessam-me as empresas que por opção interna olham seriamente para as melhorias de eficiência do processo produtivo e investem na inovação que responde às necessidades sociais, incluindo as necessidades de mitigação e adaptação climática.

Os Estados, com certeza, têm um papel nesse processo, por exemplo, quando resolvem taxar o trabalho e o capital em detrimento do consumo, ou quando resolvem apoiar a produção em vez de colmatarem falhas de mercado, ou quando confiam ou não confiam nos seus cidadãos.

Na verdade o potencial para os Estados intervirem negativamente na sociedade é muito grande (logo à cabeça, na limitação da liberdade, por terem o monopólio da violência legal, como é bem visível no triste episódio do prédio Coutinho, em que o Estado pretende resolver coercivamente um erro seu, em vez de o resolver por via negocial), mas o potencial para criarem riqueza e soluções novas é muito limitado, muito menor que o potencial da multidão criar riqueza, novidade e soluções, desde que tenha liberdade para empreender e falhar, por sua conta e risco.

A segunda coisa que me distingue de boa parte dos meus amigos é que eu acho normal que pensem de forma diferente da minha e aceito isso, mas muitos deles recusam-se simplesmente a discutir esta divergência essencial, preferindo eliminá-la para não atrasar a transformação social que acham urgente.

E eu acho essa atitude um erro que se pagará caro, se for a atitude dominante sobre o assunto.

Domingo

por João Távora, em 30.06.19

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas 


Aproximando-se os dias de Jesus ser levado deste mundo, Ele tomou a decisão de Se dirigir a Jerusalém e mandou mensageiros à sua frente. Estes puseram-se a caminho e entraram numa povoação de samaritanos, a fim de Lhe prepararem hospedagem. Mas aquela gente não O quis receber, porque ia a caminho de Jerusalém. Vendo isto, os discípulos Tiago e João disseram a Jesus: «Senhor, queres que mandemos descer fogo do céu que os destrua?». Mas Jesus voltou-Se e repreendeu-os. E seguiram para outra povoação. Pelo caminho, alguém disse a Jesus: «Seguir-Te-ei para onde quer que fores». Jesus respondeu-lhe: «As raposas têm as suas tocas e as aves do céu os seus ninhos; mas o Filho do homem não tem onde reclinar a cabeça». Depois disse a outro: «Segue-Me». Ele respondeu: «Senhor, deixa-me ir primeiro sepultar meu pai». Disse-lhe Jesus: «Deixa que os mortos sepultem os seus mortos; tu, vai anunciar o reino de Deus». Disse-Lhe ainda outro: «Seguir-Te-ei, Senhor; mas deixa-me ir primeiro despedir-me da minha família». Jesus respondeu-lhe: «Quem tiver lançado as mãos ao arado e olhar para trás não serve para o reino de Deus». 


Palavra da salvação. 

O que irá na cabeça de Costa?

por João-Afonso Machado, em 28.06.19

Hoje não valia a pena ir aos tribunais: as secretarias estavam fechadas, os magistrados também, o mundo judicial parara a sua rotação em mais uma greve. Amanhã, ou por um destes dias, seguem-se os enfermeiros. De ponta a ponta do nosso jardim à beira-mar plantado, as pessoas queixam-se e enfurecem-se. O tema da Saúde é o mais controverso: como dizia Manuela Ferreira Leite, em entrevista televisiva esta semana, nada existe para além dos números fantasistas de Centeno: nem pessoal, nem meios, nem vontade política.

E no entanto Costa vai ganhar as próximas Legislativas!

Carlos César, ignoro se com ou sem trela que o segurasse, já foi anunciando o fim da Geringonça. Do que se se vai intuindo, o ambiente à Esquerda está pesado, o clima político não deixa de aquecer.

E no entanto Costa vai ganhar as próximas Legislativas! Não há quem lhe tire essa vitória. Sequer quem descortine a sua estratégia (até porque o sabemos capaz de surpreender tudo e todos - vd. a sua derrota de 2015, que não o impediu de governar até hoje).

Na verdade, não há memória de uma Direita tão destituída. Assim, nem é dificil para Costa. Aguardei meses por um Rio enérgico e de palavras sólidas que não apareceu. E que espero não apareça depois com a mão a aparar o rabo de um governo socialista. É tudo demasiadamente mau.

E o pior está para vir: Costa vai ganhar as eleições, o País não se aguentará assim mais uma Legislatura inteira, mas o poder comunicacional da Esquerda saberá, como sempre, voltar os eleitores contra a Direita. A fazer de conta, Sócrates foi apenas uma ilusão...

Ou então tudo se processará como num País normal e, simplesmente, Costa almeja outros voos, Europa fora. Seria magnífico... mas não acredito os governantes dos nossos parceiros da UE o queiram lá. Àparte nós, meridionais, o medo das víboras é, no Velho Continente, imenso.

Jornais

por João Távora, em 28.06.19

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Um retrato assustador (para quem como eu gosta de jornais) da crescente irrelevância da imprensa escrita nacional, que nem a subida de assinantes do Público online consegue disfarçar. Veja-se por exemplo como as vendas em banca do semanário Diário de Notícias no último ano desceu 36%, para apenas 3981 exemplares...  

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Dentro de três meses vamos ter eleições legislativas e por isso são já muitos os militantes partidários nervosos com a hipótese duma redentora estratégia de comunicação. Desse modo, não se coíbem de dar sentenças, quase nunca sobre as propostas e ideias, mas quase sempre sobre os meios por eles considerados aconselháveis para chamar a atenção do povo para a bondade da sua sigla e do seu líder. Se aceitamos como verdadeiro o adágio popular “de médico e de louco todos temos um pouco”, o que diríamos se a profissão fosse o Marketing e a Comunicação...
Das opiniões que venho escutando, há uma com a qual estou plenamente de acordo: as arruadas e as incursões em feiras, em que o contacto directo dos protagonistas com a população serve para as câmaras e microfones registarem uns sound bites e uns faits divers, já deram o que tinham a dar. Afinal, quase sempre descambam em parangonas propícias a serem parodiadas pelos humoristas de serviço. Outra teoria que circula é a de que se deviam acabar com os outdoors, porque se trata de poluição visual injustificada, facilmente substituíveis pelas plataformas digitais  já massificadas. Neste caso não concordo, pois há que reconhecer que a utilização de cartazes se vem ajustando quantitativamente e qualitativamente aos novos tempos. Quem não se lembra das paredes das cidades repletas de camadas sobrepostas de cartazes semi-rasgados, das árvores e candeeiros cheios de pendões que mais pareciam sacos de plástico que, passados meses das eleições, já degradados pelas intempéries, se eternizavam deprimentes na paisagem urbana. Hoje, a propaganda de rua ou publicidade de exterior, não só vem caindo em desuso de forma natural, como se encontra regulada e delimitada em espaços apropriados, e nesse sentido a sua utilização ainda produz alguma eficácia, nem que seja se considerarmos os estratos da população mais envelhecidos que não acede às plataformas digitais. Tanto mais que é um dado empírico para qualquer profissional de que a comunicação nas redes sociais para ter um alcance massivo, requer mais do que fantasiosos algoritmos induzidos por pretensos “experts”: exige investimento financeiro que propague as mensagens partidárias com eficácia (sendo elas adequadas e bem definidos os públicos-alvo). Acontece que em Portugal uma lei eleitoral anacrónica proíbe a utilização profissional das redes sociais, tida como “publicidade comercial” (porque não se classifica do mesmo modo a utilização de outdoors produzidos e disseminados por empresas especializadas?), fazendo com que seja cada vez mais difícil passar as propostas políticas concorrentes para os seus eleitorados, principalmente às camadas mais jovens, que como é sabido não frequentam os meios de comunicação tradicionais e desse modo vivem cada vez mais divorciadas da realidade à sua volta. Não sendo possível a transição da velha propaganda para o modo digital por via desta lei absurda (repare-se na completa irrelevância em que se tornaram os velhinhos Tempos de Antena nas rádios e televisões generalistas), corre-se o risco de não se obter uma percepção plena do acto eleitoral em perspectiva, como era auto-imposto pelos métodos “poluentes” usados no século passado, muito menos quais as ideias em discussão, com consequências inevitáveis na abstenção, especialmente jovem.
Para finalizar, umas breves palavras sobre a mensagem política. Sem um conteúdo claro, atractivo e coerente, de nada servem as ferramentas e a sofisticação dos meios disponíveis. Para o seu sucesso, as estruturas partidárias deveriam recorrer à colaboração de profissionais experimentados, que com um olhar exterior e desapaixonado estão habilitados a impedir demasiados tiros nos pés e a mitigar as consequências dos inevitáveis disparates que a excitação da contenda favorece.

Publicado originalmente aqui

Os bárbaros sempre eram uma solução

por Pedro Picoito, em 25.06.19

A ideia ficou no ar, desde as eleições europeias: a direita está em crise. Sim, está. Mas não é de agora e não é só cá. Em Portugal, PSD e CDS não chegam à maioria absoluta desde 2011, e coligados. Lá fora, as coisas não estão melhor. Dizer que a direita cresceu em França, Itália, Inglaterra, Polónia ou Hungria é ignorar que as novas direitas, nacionalistas ou liberais, partilham pouco ADN com a direita conservadora ou democrata-cristã. Em Inglaterra, Farage venceu, mas os Tories afundaram-se. Em França, Marine Le Pen suplantou por muito os Republicains. Em Espanha, o PP perde terreno para o Ciudadanos a cada eleição. Para já não falar nos trágicos travestis da DC italiana - Berlusconi, Bossi, Salvini e tutti quanti. Só se salva a CDU, que ligou o seu destino à reunificação alemã graças à teimosia de Kohl, e há anos vive dos rendimentos (resta saber até quando). 

Quais são as causas do desastre? Três, pelo menos, e estão relacionadas. (Há muitas mais, mas nem vocês têm paciência para as ler nem eu tempo para as escrever.)

Primeira: a Queda do Muro de Berlim. Sim, 1989 foi um triunfo da democracia liberal, da economia de mercado e da sociedade aberta, defendidas pela direita do pós-guerra na sua batalha contra o comunismo, dentro e fora de portas. Houve até quem falasse no fim da História. Mas a História voltou, e mais depressa  do que se esperava. Em Tiananmen, nas Torres Gémeas, em Bagdad, no Kremlin, no Mediterrâneo, na Síria, em Wall Street. Entretanto, a direita, que fizera do anticomunismo um seguro de vida, adormeceu sob os louros da vitória. Perdeu, com o fim do inimigo, a razão de ser. Como diz aquele poema do Kavafis, os bárbaros sempre eram uma solução.

Segunda: a direita não soube criar um pensamento que respondesse às mudanças pós-89. Durante a Guerra Fria, as suas ideias eram uma clara alternativa ao socialismo democrático, e ainda mais ao comunismo, mas hoje não tem nada de substancial a dizer sobre migrações, ecologia, multiculturalismo, desemprego, a Europa, a crise financeira de 2008 ou operações para mudar de sexo no SNS. Não é coisa que se improvise. E já vai tarde. Entretanto, o espaço vazio foi ocupado por populistas, eurocépticos, xenófobos, demagogos que fazem política de terço na mão e o Boris Johnson. De quem é a culpa? 

Terceira: em consequência, a direita tradicional tem dificuldade em distinguir-se do centrão socialista. Ou são os eleitores que têm dificuldade em distingui-los, o que vai dar ao mesmo. No governo ou na oposição,  a direita tende a optar por políticas pragmáticas e consensuais. Daqui não vem mal ao mundo, pelo contrário, desde que sejam claras as diferenças de fundo e, portanto, a possibilidade de escolha. Mas não é isso o que tem acontecido. Os resultados estão à vista. PSD e CDS que o digam.  

Há que por fim a isto

por João Távora, em 25.06.19

Cheguei a meio da manhã à ADSE em Alvalade e confirmo que há imensa gente que vem para cá logo de manhãzinha só para atrasar o atendimento. Estou tramado. 

O jornalismo de qualidade merece ser apoiado

por henrique pereira dos santos, em 24.06.19

Várias pessoas mandaram-me mensagens sobre uma notícia do Público, penso que de hoje (isto de andar em fusos horários diferentes baralha-me).

O lead (acho que é assim que se chama) da notícia diz ""Vários proprietários têm-se queixado de estragos feitos em pomares e terrenos por “cabras sapadoras”. O Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas, responsável pelo projecto-piloto, diz não ter “conhecimento de prejuízos causados”."

E o leitor, que quer apoiar o jornalismo de qualidade, pergunta-se a si próprio: e as jornalistas, o que pensam? Vários proprietários (cinco, pelas notícias) e o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas, dizem o que sabem sobre o assunto, e as jornalistas (Carla Nunes, que escreve, Rita Ferreira, que edita), o que viram?

É que o comentário de Luis Fontinha (por sinal a tentar contactar o Público, sem sucesso, para pedir que corrijam o que escreveram porque acha que isso o prejudica, na medida em que tem interesse directo no desenvolvimento do uso de cabras para a gestão de combustíveis) fala de outras realidades: "nao foram cabras porque elas nao existem neste local!! Nao ha la rebanho nenhum e muito menos de sapadoras do icnf, os locais chamam cabras do mato aos corços e tem tido problemas ai longo dos anos com eles, esta noticia e falsa e infundada e prejudicial as cabras sapadoras".

De facto, mal li uma das descrições, na sítio em que eram, pensei imediatamente nos veados e corços que por ali existem, mas não fui lá, não verifiquei os factos, não pedi a fontes crediveis que me sustentassem o que dizem, não foi perguntar a várias outras fontes para cruzar informações, não perguntei aos cinco proprietários de quem eram as cabras para poder falar com o dono, enfim, minudências e manias que tenho há muito tempo, de maneira que não tinha intenção de escrever nada sobre o assunto.

Eu acho que é inevitável haver conflitos entre pastorícia e agricultura, tal como é inevitável haver acidentes quando existem carros e estradas, tal como é inevitável haver erros médicos quando há médicos, de maneira que nem sei bem onde está a notícia, tal como é apresentada.

O que acho evitável é o Público apresentar uma janela a dizer-me que o jornalismo de qualidade merece ser apoiado, e depois servir-me uma notícia destas para me explicar por que razão o Público tem dificuldade em vender jornais e não merece ser apoiado, se for este o seu padrão de produção de notícias.

Utilizador/ pagador

por henrique pereira dos santos, em 23.06.19

Existe abundante literatura sobre o princípio do utilizador/ pagador.

E existe lixo produzido por quem tinha a obrigação de ter um mínimo de decoro no que diz:

"A direita que acha que as pessoas devem pagar taxas moderadoras é a direita que não sabe o que é viver com 650 euros e ter de pagar taxa moderadora pelos cuidados médicos que já se pagou com os impostos. E o PS que agora quer adiar o fim das taxas moderadoras por causa do impacto no orçamento é o mesmo que há seis meses dizia que as taxas moderadoras tinham um impacto simbólico no orçamento e que há uma semana votou uma proposta do Bloco que entrava em vigor em 2020. Insustentável é ter 2 milhões de cuidados de saúde por prestar porque há quem não consiga pagar as taxas moderadoras."

Catarina Martins diz o que entende e, aparentemente, ninguém a confronta com o que diz.

 Em primeiro lugar, ao que parece, Catarina Martins engloba Mário Centeno e o governo que apoia na "direita que não sabe o que é viver com 650" visto que o governo resolveu que afinal não há dinheiro para isto (pelo menos para já).

Em segundo lugar, quem não sabe o que é viver nessas condições é Catarina Martins, doutra forma saberia que essas pessoas estão isentas de taxas moderadoras (DL 113/ 2011 de 29 de Novembro. As pessoas que vivem nestas condições até podem nem conhecer a lei, mas têm perfeita consciência do que pagam ou não porque cada cêntimo conta, Catarina Martins é que, pelos vistos, não tem muitos amigos que vivam nestas condições).

Em terceiro lugar Catarina Martins, pelos vistos, sabe mal os impostos que estas pessoas pagam. Impostos directos não pagam, pagam os impostos indirectos, em especial o IVA em cada transação, mas naturalmente o valor de impostos que pagam acaba por ser reduzido por más razões: as limitações ao consumo, em especial ao consumo que produtos não básicos, são enormes. Logo dizer que já pagaram os cuidados de saúde nos impostos, não sendo tecnicamente uma mentira, é um bom exemplo do que dizia António Aleixo: ”Para a mentira ser segura e atingir profundidade tem de trazer à mistura qualquer coisa de verdade.”

Aparentemente Catarina Martins fala pouco com o PS (em campanha eleitoral, depois das eleições é tudo mais simples) e por isso deve desconhecer o que escrevia Sérgio Vasques em 2004, exactamente sobre o princípio do utilizador/ pagador: "A "gratuitidade" das prestações públicas oculta muitas vezes uma fiscalidade parasitária, pela qual a classe média obriga as franjas mais desfavorecidas da sociedade a suportar-lhe as preferências.".

É certo que nesse texto, Sérgio Vasques exclui a prestação de serviços de saúde e educação da aplicação deste princípio, ao arrepio de toda a sua própria argumentação e sem explicar muito bem as razões.

É também certo que uma aplicação cega do princípio do utilizador/ pagador tem um efeito regressivo que não pode ser esquecido em serviços básicos (por isso o diploma acima referido exclui do pagamento de taxas moderadoras as pessoas com insuficiência económica) e é também certo que a sua aplicação generalizada, associada a uma condição de recursos (como é o caso nos serviços de saúde) pode implicar externalidades negativas que devem ser avaliadas, sendo o melhor exemplo o dos transportes públicos.

Mas nada disso autoriza os jornalistas que todos os dias convivem com Catarina Martins a esquecerem-se da evidente mentira do que é dito (sim, é uma mentira, com todas as letras, e seria bom que alguma vez alguém diga isso com essa clareza quando se fazem afirmações destas) e da discussão que vale a pena fazer nestas matérias: quem paga o que tem de ser pago?

É que não há serviços públicos gratuitos, o que há é serviços públicos pagos por quem os utiliza ou pagos por todos, quer os utilizem ou não, para além das combinações todas intermédias entre estes dois extremos.

Dizer que "Insustentável é ter 2 milhões de cuidados de saúde por prestar porque há quem não consiga pagar as taxas moderadoras" é apenas fingir que a restrição está no acesso dos mais pobres (uma mentira evidente) e não na falta de dinheiro do Estado para os prestar, apesar do nível de taxação que existe em Portugal.

E Catarina Martins sabe perfeitamente que está a fingir, que está a mentir e que o que diz não passa de banha da cobra para aguentar os 10% de eleitores que também sabem que estão a votar em banha da cobra, mas acham isso uma mentira piedosa que é dita em nome de um bem maior (que se esquecem de explicar qual é e como se obtém).

Domingo

por João Távora, em 23.06.19

Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Gálatas

 
Irmãos: Todos vós sois filhos de Deus pela fé em Jesus Cristo, porque todos vós, que fostes baptizados em Cristo, fostes revestidos de Cristo. Não há judeu nem grego, não há escravo nem livre, não há homem nem mulher; todos vós sois um só em Cristo Jesus. Mas, se pertenceis a Cristo, sois então descendência de Abraão, herdeiros segundo a promessa. 


Palavra do Senhor. 

Lentamente, mas muito lentamente, o petroleiro vai corrigindo o rumo

por henrique pereira dos santos, em 22.06.19

Vi hoje esta notícia, sobre o facto do Fundo Florestal Permanente ir apoiar a Resipinus, a associação que junta os principais agentes ligados à resinagem.

Antes, o governo já tinha decidido, e depois alargado, algum apoio ao pastoreio que presta serviços de gestão de combustível.

Antes, o governo já tinha lançado um programa de fogo controlado, excessivamente ambicioso e com regras que eu acharia melhor redefinir, mas que reconhecem a utilidade social do fogo controlado.

Antes, o governo já tinha dado alguns passos tímidos para ter uma estrutura mais profissional de combate aos fogos.

Tudo isto me parecem boas medidas, tenho-as defendido anos seguidos, mas não será por as ter defendido que elas acabaram por ir entrando, pé ante pé, nas opções do governo, é mesmo porque a realidade tenderá a impôr-se.

Claro que tudo isto me parece escasso, por vezes mal desenhado, mas não tenho a certeza de que se tivesse de ser eu a tomar as decisões as coisas seriam muito diferentes: a política é a arte do possível, e pode ser que não se consiga ir mais longe, como defendo.

Mas é tão raro ter oportunidade para dizer bem de medidas neste sector que, mesmo correndo o risco de estar a apoiar medidas que no concreto são asneiras (não conheço os pormenores, e é nos pormenores que estas coisas se costumam complicar), não gostaria de deixar de passar em branco o essencial: o governo, em especial o que está mais ligado à gestão florestal, está claramente a tentar mudar de agulha em matéria de fogos e gestão florestal, aleluia.

É pena a parte do governo que tem a protecção civil e o combate estar aparentemente, sempre a atrapalhar, mas enfim, é uma questão de tempo até um dia se renderem às evidências.

Confesso que me incomodam mais as parvoíces do movimento ambientalista, de que faço parte (uma parte minoritária, é certo, mas uma parte) que repete o mesmo discurso sobre o assunto desde o anos 80 e a cobertura que a imprensa continua a dar ao reaccionarismo dominante quer no movimento ambientalista, quer no extenso movimento social associado à protecção civil, quer ainda aos autênticos delírios dos dirigentes duns e doutros.

Mas o essencial mantém-se: a água mole, em pedra dura, lá vai dando os seus resultados.

Um sentido para a vida

por João Távora, em 22.06.19

Era uma vez uma pessoa que, para não se maçar muito, passava a vida a matar o tempo embrenhada em toda a sorte de jogos e paciências. Foi já no fim da vida, não sem um leve sentimento de frustração, que percebeu que fora bem sucedido: já lhe faltava pouco tempo para matar.

A família cristã - uma urgência

por João Távora, em 18.06.19

Festa da Familia.jpg

No passado Domingo na Quinta das Conchas ao Lumiar decorreu durante o dia a "Festa da Família", uma jornada com actividades diversas organizada pelo Patriarcado de Lisboa que contou com a participação de vários movimentos católicos e culminou numa missa campal presidida pelo Cardeal Patriarca que reuniu centenas famílias e onde se abençoou cerca de 200 casais que celebravam este ano 10, 25, 50 e 60 anos de casamento.

Estranha é a invisibilidade mediática deste acontecimento, pela sua relevância e grandiosidade, tanto mais numa conjuntura em que tanta falta faz evidenciar a fecundidade do perene modelo de família cristã que todos sabemos vai rareando e cedendo à hegemonia da cultura individualista e hedonista. Desconfio que estamos (alegremente) a cavar a sepultura da nossa civilização.

 

Fotografia daqui

Surpresa?

por henrique pereira dos santos, em 17.06.19

Faz amanhã dois anos que o Público publicou um artigo meu, feito rapidamente para responder aos prazos que me deram, e que deve ser a coisa que escrevi que foi mais citada e elogiada (o amigo meu, mais dado às ironias, concluía num dos dias seguintes, que eu era o novo consenso nacional).

É ao título desse artigo "Imprevisível?" (a ligação não é livre, mas estamos todos no mesmo barco, de acordo com o Público, eu também tenho de pagar para ler os artigos que escrevi de borla para o jornal vender) que fui buscar a base para o título deste post.

Na verdade o êxito do artigo não se deve ao artigo em si (mediano e repetindo o que já escrevi de dezenas de maneiras diferentes, em diferentes sítios) mas à circunstância ter sido publicado logo depois de ter morrido tanta gente em Pedrógão e à barragem de comunicação do governo e presidente da república com uma única preocupação: sacudir a água do capote.

Nos meses precedentes o governo tinha-se entretido a propagandear a maior reforma florestal desde D. Diniz (que não consta que tenha feito nenhuma reforma florestal, mas isso é o menos), cavalgando a propaganda anti-eucalipto como cortina de fumo para o que verdadeiramente estava em causa: mudar alguma coisa para manter tudo como sempre.

Durante esse tempo, a generalidade da imprensa e dos jornalistas ouviram as maiores barbaridades sobre o assunto (os problemas eram o eucalipto, o regime de propriedade, a irresponsabilidade dos proprietários, os terrenos com donos desconhecido, os incendiários, etc.), como se na verdade estivessem a ouvir pessoas sérias, tomando o que lhes é dito como verdades inquestionáveis que dispensam escrutínio.

Durante o tempo do fogo, e no imediato pós-fogo, seguiram caninamente atrás das comitivas oficiais, fotografando os abraços do presidente, o ar compungido do primeiro-ministro, o olhar esgaseado do desgraçado do secretário de estado da protecção civil, como  se nunca ninguém tivesse previsto, explicado, estudado, acumulado informação, difundido conhecimento, sobre o caldeirão que estava ao lume e os barris de pólvora que estavam guardados ao lado da lareira.

E por isso mesmo escrevi, manifestamente irritado (na verdade, ainda mais irritado quando dei esta entrevista) com a voluntária cegueira de uma imprensa que passa o tempo inteiro a pôr o microfone à frente de gente que não tem nada a dizer sobre o assunto, embora influencie as decisões que sobre ele se tomam em nome do povo (exemplo de hoje: "Segundo Catarina Martins, “boa parte do problema está no território”, isto é, nas “manchas contínuas de eucalipto e de pinheiro” e na “cultura intensiva de eucalipto”" sem que algum jornalista lhe pergunte quais são as fontes de informação que tem para dizer isto, para além do genro de Louçã, visto que os estudos mais recentes e completos sobre o assunto a desmentem inequivocamente).

Quando há dias comecei a receber convites para ir aqui ou acolá, não percebi logo que se tratava, de novo, do previsível comportamento da imprensa de efemérides: passam dois anos sobre o incêndio de Pedrógão, vamos lá ouvir umas quantas pessoas sobre o assunto.

Até aqui, tudo normal e agradeço os convites (tive de os recusar todos por não estar em Portugal, mas na verdade acaba por ser indiferente, como me disse uma das poucas pessoas que tentei esforçadamente que aceitasse os convites para reduzir o espaço dos ignorantes, demagogos ou simplesmente sectários que forçosamente ocupam o espaço mediático se os que dizem menos asneiras não estiverem disponiveis, "também não posso mas não faz diferença, acho que se lá fosse era só para dizer que o melhor é entregar tudo aos espanhóis").

De repente comecei a perceber que desde os que habitualmente me insultam sempre que têm oportunidade por, na opinião deles, eu ser um vendido aos eucaliptos, até aos jornalistas mais experimentados, todos desatarem a publicar fotografias e videos dos locais ardidos há dois anos, manifestando a sua censura moral por estar tudo igual ou pior (em princípio pior, menos gestão, mais homogeneidade, e por aí).

Mas meus amigos jornalistas: não são vocês (as minhas desculpas pela generalização, como todas as generalizações é injusta, claro, há excepções que não consigo enquadrar aqui convenientemente) que atiram foguetes porque o governo anunciou o agravamento do IMI para os terrenos abandonados (bela mentira, é para os terrenos de matos, mas adiante) para incentivar a gestão do território? Não são vocês que embandeiram em arco de cada vez que o governo anuncia novas equipas de sapadores, sem que até hoje, numa dessas vernissges, um único jornalista tenha alguma ver perguntado se não era melhor gastar o mesmo dinheiro a apoiar pastores, resineiros, caçadores, criadores de touros de lide e outros gestores do território? Não são vocês que repetem acriticamente os milhões anunciados do Fundo Florestal Permanente e do Fundo Ambiental, sem perguntar a que propósito são esses fundos autónomos que financiam obrigações básicas do Estado nesses domínios, em vez do Orçamento de Estado? Não são vocês que repetem acriticamente os periódicos anúncios de novos milhões para apoiar as espécies autóctones sem que perguntem por que razão se insiste em medidas que não tiveram êxito antes, sem avaliar as razões desses fracassos? Não são vocês que vão às festas de anúncio dos milhões para pagamento dos serviços de ecossistema, sem que questionem o ministro do ambiente por que razão isso é apenas uma experiência piloto para pagar o apoio político de algumas autarquias ao novo modelo de gestão das áreas protegidas?

É que as pessoas que estudam a porcaria dos fogos, há anos que dizem, e repetem, que há um problema central de gestão (para o qual tem havido algumas medidas positivas, como o programa nacional de fogo controlado, ou o programa da apoio ao pastoreio como instrumento de gestão de combustíveis, mas infelizmente são meros pormenores, flores na lapela, ainda por cima desenhados com regras absurdas porque o Estado não confia nas pessoas e prefere investir em regras complicadas, em vez de cumprir eficazmente o seu papel fiscalizador), problema esse que decorre da ausência de competitividade dos sectores que podem contribuir para a gestão do território, e que isso apenas se resolve (parcialmente) com o pagamento, justo, dos benefícios sociais criados pelos gestores do território.

Por isso, estas mesmas pessoas que estudam o assunto, logo nos dias imediatos ao fogo, perante as anunciadas medidas do governo (a começar pela absurda conversa e centragem nas limpezas à volta das casas, a expensas do vizinho), disseram o que ainda hoje dizem e, pasme-se, vossas excelências descobrem agora que é o que está a acontecer no terreno: com as medidas de política que existem, a evolução que se pode esperar da paisagem é exactamente a que está a ocorrer: menos gestão, mais abandono, mais homogeneidade, mais continuidade de combustíveis e um grandioso espectáculo pirotécnico em 2030 (mais anos menos ano).

Nessa altura não se esqueçam da vossa responsabilidade, como agora se esqueceram da responsabilidade, vossa e dos senadores da república ("Ao contrário do que acontece no Norte, os concelhos do Pinhal Interior têm hoje a percepção do valor económico da floresta e criaram mecanismos de prevenção". A Região Centro tornou-se "a mais apetecível" para novos valores florestais, como por exemplo a biomassa, ao passo que o Norte enfrenta uma situação de "abandono [da floresta] gravíssima". Por exemplo, disse, a Lousã e Oliveira do Hospital têm zonas de intervenção florestal "bem instaladas e activas", uma análise de 2010 cuja lucidez o tempo veio esclarecer), quando depois de 2003 e 2005 repetiram acriticamente a propaganda dos governos, e as tiradas brilhantes como a citada, que foram repetindo, incluindo de um senhor que comprou Kamovs, contratou SIRESPs para resolver o assunto, hoje não se lembra de nada e que toda a imprensa carrega ao colo por ser muito habilidoso.

E não se esqueçam de pôr já na agenda os habituais passeios anuais às zonas ardidas em 2017, para os programas do ano que vem.

Domingo

por João Távora, em 16.06.19

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São João


Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: «Tenho ainda muitas coisas para vos dizer, mas não as podeis compreender agora. Quando vier o Espírito da verdade, Ele vos guiará para a verdade plena; porque não falará de Si mesmo, mas dirá tudo o que tiver ouvido e vos anunciará o que está para vir. Ele Me glorificará, porque receberá do que é meu e vo-lo anunciará. Tudo o que o Pai tem é meu. Por isso vos disse que Ele receberá do que é meu e vo-lo anunciará». 

Palavra da salvação. 

O Expresso em revista

por João Távora, em 15.06.19

(...) Os climatólogos sabem que, se o mundo parasse hoje de ser como é, os efeitos prolongar-se-iam por centenas de anos (além da perigosa turbulência geopolítica de tal opção). No entanto, contrariar a agenda climática transformou-se hoje numa heresia a que políticos e académicos arrogantes respondem com a sobranceria de dogmas, tal como na Idade Média. E as propostas climáticas que avançam são baseadas nas premissas falsas do pensamento mágico. Não se pode refazer o passado nem parar um comboio a 300km/h no espaço de um metro.

Henrique Monteiro

 

(...) A casa, essa, permanece com a arrumação socialista dada pelas esquerdas, ou seja, a direita não pode mudar os móveis, só pode limpá-los. Se repararem, tem sido essa a função da direita pós-95: a esquerda faz as festas, desarruma a casa, toca a campainha, a criada cabisbaixa (a direita) arregaça as mangas da bata e começa a limpar; quando a casa está de novo limpa, a esquerda regressa. Este arranjo é injusto e até insultuoso para os dois milhões de eleitores que deram a vitória à direita em 2015, mas essa injustiça não começa no poder hegemónico que a esquerda soube construir. Começa, isso sim, na preguiça da direita que, passados 30 anos, ainda não foi capaz de recuperar o único projeto conservador e liberal pensado em Portugal após Camarate. Estou a falar de Francisco Lucas Pires e do Grupo de Ofir, os verdadeiros herdeiros de Sá Carneiro. Está lá tudo: leiam, estudem, preparem-se. E, acima de tudo, tenham coragem. Sim, sou de direita, e então?

Henrique Raposo 

E ainda na revista, uma entrevista de Pedro Mexia ao escritor Julian Barnes, a não perder.

Expresso de 15 de Junho de 2019

Uma ideia inteligente

por henrique pereira dos santos, em 14.06.19

Segundo leio por aí, o Governo quer incentivar o uso dos terrenos sem uso, agravando o IMI (na prática, uma transposição para o mundo rural do IMI as casas devolutas, uma coisa que toda a gente percebe porque toda a gente sabe que as casas, tal como os terrenos marginais, dão dinheiro em barda e só o facto dos donos não gostarem de dinheiro é que os leva a deixar tudo isso ao abandono).

Para quem conhece mal os problemas de gestão do mundo rural, talvez seja útil usar uma analogia:

Uma pessoa está doente porque não tem dinheiro para se alimentar convenientemente. Em consequência, dá um enorme prejuízo ao Estado por passar a vida no hospital.
Solução do governo para resolver o problema?
Aumentar-lhe os impostos sobre as horas sem comer para o incentivar a alimentar-se convenientemente.
Parece-me inteligente.

A asfixia do socialismo

por João Távora, em 13.06.19

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Os jesuítas comunicaram hoje o encerramento do seu prestigiado Colégio da Imaculada Conceição. Inaugurado em 1955, este estabelecimento de ensino localizado em Cernache, no Concelho de Coimbra, encerrará a sua actividade no final deste ano lectivo devido à “grave situação financeira” que a instituição atravessa. A insanável crise é justificada pelos seus responsáveis com a conjuntura “desencadeada em 2016 com final dos contratos de associação com o Estado português, em vigor há 40 anos".
Assim se desbarata a já precária liberdade no ensino, no coração da democracia. Alegremente vamos percorrendo este plano inclinado a comprometermos as gerações vindouras.
Agradeçamo-lo ao socialismo que nos asfixia.

Corrupção

por henrique pereira dos santos, em 12.06.19

Raramente escrevo sobre a corrupção em abstracto porque a ideia do combate à corrupção, em abstracto, é como um discurso de Miss Mundo, serve para falar sem dizer nada.

Ser contra os corruptos, os ladrões do governo (ou dos tribunais, ou das universidades, ou dos bancos, do que na altura nos der jeito) é o maior favor que podemos fazer aos corruptos: ao lançar-se uma suspeita indistinta sobre grupos suficientemente alargados para haver, forçosamente, corruptos e não corruptos, estamos na verdade a dizer que são todos iguais, farinha do mesmo saco, etc., o caldo de cultura ideal para os verdadeiros corruptos se defenderem, de consciência tranquila, das campanhas negras, das cabalas e essas coisas más de que são vítimas.

Hoje resolvi falar de corrupção à conta desta notícia do Observador.

O post de hoje é apenas para vincar a diferença entre a corrupção que existe nas empresas e no Estado, que no essencial se traduz em dois aspectos:

1) Os prejuízos que resultam da corrupção nas empresas são pagos pelos seus accionistas, os prejuízos causados ao Estado pela corrupção são pagos pelos contribuintes.

2) Quem decide nas empresas tem interesse real em combatê-la (excepto quando é praticada pelos próprios accionistas, claro), mas quem decide no Estado, até pode genuinamente querer combater a corrupção, mas a verdade é que não lhe sente na pele os efeitos (em rigor até pode haver nesses decisores quem seja o promotor dessa corrupção, visto que as vantagens são para quem decide e os custos sobram para os contribuintes).

Destes dois aspectos, que me parecem inquestionáveis, resulta um corolário desarmantemente simples: a fórmula mais simples para reduzir a corrupção no Estado consiste em retirar do Estado todas as oportunidades para que uns poucos criem esquemas de enriquecimento ilícito, externalizando para os privados esse risco.

Claro que essa opção não elimina a corrupção, isso nunca acontecerá em qualquer caso, quer porque também existe corrupção nas empresas privadas, quer porque há funções do Estado que não podem ser alienadas para os privados, mas seguramente limitaria muito os seus efeitos no bolso do contribuinte e na percepção pública do problema.

Imaginemos que a Caixa Geral de Depósitos era privada e não havia nenhum banco comercial do Estado. O assalto ao BCP e a manutenção artificial do BES teria chegado tão longe e tido efeitos tão profundos no bolso dos contribuintes?

Eu tenho as minhas dúvidas e não vejo o que se ganhou em troca.

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"Chegou tarde. Nós estamos a tratar disto desde maio", disse Berardo em dezembro de 2007 em resposta à notícia de que Miguel Cadilhe que se preparava para concorrer pelo BCP com uma lista rival à de Carlos Santos Ferreira. O episódio foi chamado por Filipe Pinhal na Comissão Parlamentar de Inquérito (à CGD). O "nós", segundo Filipe Pinhal, seriam os acionistas - Sonangol, EDP, CGD, o BPP de João Rendeiro, o Grupo dos Sete (Joe Berardo, Bernardo Moniz da Maia, Manuel Fino, Filipe Botton, Diogo Vaz Guedes, João Pereira Coutinho e Vasco Pessanha) - alinhados com Paulo Teixeira Pinto, com António Castro Henriques, Francisco Lacerda e Boguslaw Kott (polaco) - e apadrinhado pelo Ministro das Finanças da época, o socialista Fernando Teixeira dos Santos; por Vítor Constâncio (Governador do BdP), por José Sócrates (primeiro-ministro), e por três administradores da CGD, que Filipe Pinhal cita. Seria o presidente, Carlos Santos Ferreira; o vice-presidente Armando Vara; e o administrador com pelouro do crédito Vítor Fernandes.

A História do que aconteceu ao BCP em 2007 é uma história que começou por uma aliança entre amigos, onde a palavra de ordem era, recorrer a todos os meios para tirar o BCP das garras do fundador e dos seus administradores (os mais velhos). A sociedade portuguesa facilmente se rendeu aos encantos dos meninos bonitos de 50 anos (mais coisa menos coisa) que iam tomar conta do banco (ou que iam advogar essa demárche). Sobretudo a imprensa. 

A propósito, não é verdade que fosse um exclusivo do Diário Económico, em 2007, a campanha pró-Teixeira Pinto e anti-Jardim Gonçalves, nem que o jornal, à data liderado por Martim Avillez Figueiredo, tivesse a Ongoing por trás. Ao contrário do que disse Filipe Pinhal, a Ongoing só compra o Grupo Económico em 2008 e é António Costa o diretor escolhido pela Ongoing e não Martim Avillez Figueiredo. 

Na altura só o Semanário Económico (eu) não sucumbiu a defender o grupo de aliados de Paulo Teixeira Pinto e a endeusar Berardo. Os outros jornais estavam todos na mesma linha. Não era um exclusivo do Diário Económico. 

Depois de a Ongoing comprar o Diário e Semanário Económico, pode sim questionar-se a independência do jornal, até lá, não.

Uma história desenhada por um grupo de amigos

Esta foi uma história que nasceu de uma cumplicidade de amigos (foi um grupo de amigos que desenhou a estratégia e contribuiu  com os vários passos para ela, incluindo seduzir Sócrates para apoiar o plano). Foi vendida como um conflito geracional e um desígnio nacional e culminou como um jogo de poder perigosíssimo. O "desígnio nacional" revelou-se na prática um jogo de poder, porque muitos aqueles amigos queriam ser administradores do BCP, ou ter relações privilegiadas com o maior banco privado, mas acabou num jogo de interesses para retribuir favores, nomeadamente o favor de reestruturar dívidas bancárias de forma amigável, quando as ações já estavam em queda. Porque, azar dos Távoras, tudo isto acontece quando nos Estados Unidos começava a estoirar a bomba do subprime. Mas os portugueses, entretidos com as suas guerras de gangs, e inebriados com a possibilidade de "colonizar" o BCP, nem se aperceberam que vinha aí uma hecatombe. Por acaso, Carlos Santos Ferreira apercebeu-se, pois lembro-me de me ter alertado para o que se aproximava. E era grande o tufão, já que acabou com a intervenção da troika e o resgate ao país. Tudo começara nos bancos.

Voltemos atrás. Na altura alguém do BCP disse-me, "querem matar a mosca e vão acabar por partir a lâmpada". Foi exactamente o que aconteceu, só que partiram duas ou mesmo três lâmpadas, o BCP, a CGD e o BES (este também já estava prestes a partir, de qualquer maneira, só que ninguém ainda sabia).

Hoje, quase todos aqueles "nós", de que falava Berardo, estão falidos ou afastados da gestão de empresas mediática. Há dois protagonistas que estiveram (Sócrates) ou estão (Vara) presos. Não podia ser mais irónico o desfecho do assalto ao BCP. O próprio Berardo está numa situação muito difícil e em risco de perder a sua coleção de arte para o Estado, para poder pagar à banca. Quem o manda ser o vilão com a vara na mão de 2007? 

Na altura Berardo era o cão de fila daqueles amigos, o que não tinha regras de civismo para cumprir, nem parentes ou amigos para dar explicações. O que podia insultar Jardim Gonçalves com todas as palavras, podia insinuar crimes, podia entregar documentos que outros, em violação de sigilo bancário e da lealdade institucional a que estavam obrigados por lei, lhe davam para os entregar ao Banco de Portugal. Como foi útil Berardo!

Foi assim o xeque-mate à equipa de Jardim Gonçalves e de Filipe Pinhal. 

Filipe Pinhal insinuou ainda na CPI que os documentos internos que estavam no arquivo morto do banco pudessem ter sido resgatados pela Ongoing, que estava a trabalhar no BCP desde 2005 através da Heidrick & Struggles, a fazer a avaliação dos quadros do banco e a montar o modelo de governo que viria a ser implementado. Eu discordo, e continuo a pensar que os documentos foram compilados por alguém de dentro que sabia onde estavam.

 Vamos lá a ver o relato de Filipe Pinhal sobre o que se passou: 

O ex-presidente do BCP, Filipe Pinhal, almoçou com Berardo em Maio de 2007 (antes da famosa AG que tenta mudar os estatutos do BCP para pôr o modelo de governo do banco de acordo com a lei, o que não estava, e continua a não estar até hoje na EDP). Nesse almoço tentou convence-lo a vender os 4% do BCP a Pedro Teixeira Duarte, com o argumento de que uma guerra provoca distribuição de ambos os lados, e as mais-valias de Berardo já deviam estar à volta dos 100 e 150 milhões. Berardo respondeu Upa, Upa. Filipe Pinhal contou que o lembrou que as mais-valias só o são quando as ações são vendidas. Deixe o BCP em paz! Disse Filipe Pinhal a Berardo. E o prémio? Perguntou Berardo. Pinhal disse-lhe que não deverá haver lugar a prémio, porque as ações estavam muito inflacionadas com a guerra do poder nos 2,80 euros e 2,90 euros e iam ajustar.

Nesse dia, Francisco Marques Pereira da Lisbon Brokers, em nome de Berardo, foi ao banco falar com Pinhal para anunciar que ia emitir uma recomendação de compra das ações do BCP a 3,53 euros. Pedro Teixeira Duarte disse então que comprava as ações de Berardo  no máximo por 3,30 euros, mas Berardo queria 3,50 euros, e por isso não se fez a venda. 

Depois Berardo contou esta história de forma destorcida. Disse que alguém do BCP lhe propôs a venda, mas que ele descobriu "que era dinheiro sujo", o que "é uma perfeita indecência", disse Pinhal. 

O ex-banqueiro contou ainda que Berardo disse que falou com o filho e que este lhe disse que acima das mais-valias estava a honra. "Honra na boca de Berardo vale o que vale", disse Pinhal, e bem.

Berardo tinha 7,01% do BCP em dezembro de 2007 (3,88% em maio de 2007). Filipe Pinhal mais tarde perguntou-lhe porque subiu de 3,88% para 7% no BCP, se não ia mandar mais, e teve um custo 400 milhões, financiado com dívida claro, e Berardo disse "eu ainda estou para saber como é que aquele homem me enfeitiçou, eu que toda vida fui objetivo, quando tinha mais-valias vendia, como é que eu me meti nesta de comprar mais ações com financiamento a crédito". Quem seria este homem?

O homem para Filipe Pinhal só podia ser um de dois: Paulo Teixeira Pinto, ou José Sócrates, com quem andava a tratar na altura do espaço para a sua coleção de arte. Filipe Pinhal acha que foi José Sócrates (Eu, entre os dois, acho que foi do lado de Paulo Teixeira Pinto).

Filipe Pinhal confirmou que o BCP antes, algures entre 2003 e 2004, tinha sido interpelado pelo Banco de Portugal, por o banco estar demasiado exposto a ações do próprio banco (chegou a contar com as ações detidas pela gestão discricionária de carteiras, para chegar ao total de 12% que superava o limite de ações próprias de 10%), a recomendar que fosse reduzido crédito a acionistas do BCP com garantia das próprias ações. Por isso a CGD, que estava abaixo do BCP em quota de mercado de crédito, aceitou dar crédito a esses acionistas que faziam parte do Conselho Superior do BCP, e receberem as tais ações do BCP como garantia. Mas isso em 2005 estava resolvido, garantiu Pinhal.

Mais tarde o BCP, de Paulo Teixeira Pinto, financiou, através do banco de investimento do BCP, os acionistas que estavam propostos para integrar a lista de administradores para o triénio 2007-2009 que iria a votos no dia 6 de agosto. A Ongoing está na lista, com o nome de Nuno Vasconcellos para secretário da Mesa da Assembleia Geral (o que importava é que houvesse tachos para todos) e com Rafael Mora (o arquitecto do modelo de governo dualista à tuga que foi implementado no BCP e EDP) como administrador. Daniel Proença de Carvalho, António de Sousa, Alexandre Relvas, José Manuel Fino, Luís Pereira Coutinho, João Lopes Raimundo, Bernardo Moniz da Maia, João Talone e Esmeralda Dourado (que era administradora da SAG de João Pereira Coutinho), estão entre essa vasta lista de nomes, que mais parecia uma lista de anos de amigos. 
Para o Conselho de Administração, a proposta considerava que este órgão fosse representado por 20 administradores e que sempre que fosse constituída uma Comissão Executiva, «a maioria dos administradores não executivos deveria ser formada por membros independentes». 
No Conselho de Administração (executivo) poucos ficavam, claro. Paulo Teixeira Pinto é proposto para presidente, Alberto de Castro, para vice-presidente e para vogais António Henriques, Francisco Lacerda e ainda Boguslaw Kott, Luís Pereira Coutinho, João  Lopes Raimundo, Fernando Ribeiro, Banco Sabadell, que nomeia Josep Oliu Creus, Marc Bellis, Bernardo Moniz da Maia (da Sogema), Manuel Vicente (da Sonangol), Luis Champalimaud e Alexandre Relvas. 

Mas esta lista não vai avante e a estratégia dos amigos dá lugar a uma estratégia política.

O crédito concedido a Joe Berardo, a Manuel Fino, a João Pereira Coutinho, à Teixeira Duarte, a Goes Ferreira, colaterizado por ações BCP, evidenciava um nível de risco elevado para o banco. Então a autorização dada pelo Banco de Portugal a Berardo para passar de 5% para quase 10% foi concedida tendo por pano de fundo o financiamento a 100% da CGD colaterizado pelas ações do BCP.

Filipe Pinhal diz que não interessa apenas ver quem e como fez estas operações de crédito. É preciso ver qual foi o desenvolvimento das operações. O colateral foi-se desvalorizando e houve reestruturação de crédito em inícios de 2008, no BCP, e na CGD em 2009. Em 2011 há uma reestruturação combinada entre os três principais credores: BCP, CGD e BES.

Filipe Pinhal chama mesmo a atenção dos deputados para irem ver a reestruturação do crédito do Grupo Berardo, quando já o banco tinha uma nova administração e Berardo liderava a comissão de remunerações.

O antigo gestor do BCP recomendou aos deputados para pedirem informação sobre as reestruturações das dívidas de Berardo feitas por Carlos Santos Ferreira e Armando Vara. “Não tenho cópia, só sei por ouvir dizer. Mas ao que parece é uma reestruturação que permitiu a Berardo respirar alegremente sem amortizar capital e juros até à reestruturação de 2011”, disse. E questionou “como é que Carlos Santos Ferreira e Armando Vara que foram colocados por Berardo iriam reestruturar a dívida da Fundação e da Metalgest?”

O ex-banqueiro defendeu também a tese que "houve uma teia urdida em vários pontos que teve um diretório claro constituído por José Sócrates, Teixeira dos Santos e Vítor Constâncio e teve vários operacionais”, como a Ongoing. Filipe Pinhal acredita, apesar de não ter forma de o provar, de que o “assalto ao BCP” se iniciou com um pedido de Paulo Teixeira Pinto a Sócrates para afastar Jardim Gonçalves do banco. “A partir do momento em que Teixeira Pinto terá aparecido no gabinete de Sócrates a dizer que precisava de apoio a nível político para afastar equipa que lá está desde 1985, Sócrates terá pensado que existia uma oportunidade de ouro para ter uma equipa de gestão mais favorável aos interesses do primeiro-ministro, pelo menos”, disse aos deputados Filipe Pinhal. 

Havia uma proposta de destituição, assinada por Berardo e Bernardo Moniz da Maia,  dos cinco administradores do BCP da velha geração (Filipe Pinhal, Christopher de Beck, Alexandre Gomes, Alípio Dias e António Rodrigues). Os cinco administradores que  iam destituir eram os mesmos que se recusaram a ratificar o acordo que se preparavam para assinar em Angola, de venda de 49% do Millennium Angola. Foi esse episódio que desvenda a guerra fria que existia na administração do BCP naquela altura.

A proposta de destituição de Filipe Pinhal e outros administradores data de 6 de agosto de 2007 e falha.

A 27 de agosto, Paulo Teixeira Pinto, que tinha sido eleito em março de 2005, renunciou e Filipe Pinhal assumiu a presidência do BCP.

Muita água correu debaixo da ponte entre o fracasso da AG de 6 de agosto e o momento em que Filipe Pinhal assume a presidência do BCP, por proposta da Teixeira Duarte. Mas nem por isso a guerra parou, é que a estratégia de tomar de assalto o BCP estava em andamento e já muita coisa estava em jogo, incluindo o elevado endividamento dos protagonistas, e por isso a gestão do banco tinha de ir parar a alguém de confiança. Berardo foi o moço de recados desse desígnio.

O ex-presidente do BCP, disse ontem na CPI à CGD, que no dia 3 de dezembro, dia em que ia haver a reunião do Conselho de Administração que oficializaria a sua lista (que incluía nomes como Paulo Macedo e Miguel Maya), Manuel Fino vai ao banco dizer que Berardo vai fazer uma denúncia ao BdP (a primeira tinha sido feita no dia 28 de novembro), e avisa-o que a sua lista só passará se integrar Carlos Santos Ferreira. Nesse dia, conta Filipe Pinhal, Paulo Macedo, diz que a lista não passará se não integrar Carlos Santos Ferreira ou Armando Vara e voluntariza-se para sair da lista para acomodar essa exigência (não se sabe de quem). Nesse mesmo dia Miguel Maya, segundo Filipe Pinhal, diz que a sua lista só passará se integrar Carlos Santos Ferreira e Armando Vara, Miguel Maya voluntariza-se para não integrar a lista para eles entrarem. Há divergências aqui. Há quem conte que Miguel Maya se voluntariou, mas que teria sido avisado por Filipe Pinhal e não o contrário. A memória depois de 12 anos pode atraiçoar qualquer um.

Filipe Pinhal sobre a exigência de integração desses nomes  diz que “há quem diga, e não excluo, que eles foram lá colocados para reestruturar créditos que não tinham cura. Há quem diga que a motivação de Berardo e Fino era colocar pessoas mais dóceis”.

Sócrates alinha no jogo e dá-lhe jeito

Quem chama Sócrates, Paulo Teixeira Pinto, ou António Mexia, ou ambos? Não se sabe ao certo. Mas Filipe Pinhal conta que a Sonangol entra no BCP com 2% em junho de 2007, depois de se aconselhar com José Socrates. Isto citando palavras de Manuel Vicente e de Carlos Silva a Filipe Pinhal, com outras pessoas presentes. 

Tiveram depois uma reunião com Vítor Constâncio para reforçar de 2% para 5% no BCP.

Filipe Pinhal contou que defendeu a fusão do BCP com o BPI e que tentou convencer a Sonangol dos benefícios dessa fusão, mas Carlos Silva respondeu-lhe que tinham falado com José Sócrates e que este tinha dito que Carlos Santos Ferreira era o seu conselheiro para os assuntos financeiros e que este tinha dito que a operação era prejudicial para o sistema financeiro português.

O ex-presidente do BCP diz que Angola estava muito interessada em ter bancos em Portugal porque precisavam de ter vários bancos para a exportação de capital da elite angolana (Banif, BPN, BIC; BPI, BiG, Banco Privado Atlântico Europa).

Foi uma conjugação de interesses.

Depois de sair do Banco de Portugal Vítor Constâncio foi para vice-presidente do BCE, lugar que implicou uma promoção prévia do governo português junto das instâncias europeias.

P.S. Não subscrevo a tese de que Vítor Constâncio "correu" com Filipe Pinhal por causa de este ter recusado um crédito a Berardo.

Não subscrevo também a tese de que Carlos Santos Ferreira se comportava como "empregado" de Luís Champalimaud. Eu conheço ambos, e dificilmente alguém "mandaria" em Carlos Santos Ferreira (nem Sócrates), mais depressa seria o contrário. E Luís Champalimaud tem uma relação de camaradagem com Carlos Santos Ferreira e não de superioridade, como sugeriu Filipe Pinhal.

 

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