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Do racismo III

por João Távora, em 29.01.19

(...) Here is fruit for the crows to pluck,
For the rain to gather, for the wind to suck,
For the sun to rot, for the trees to drop,
Here is a strange and bitter crop.(...)

 

A propósito do tema da segregação racial é importante ouvir esta impressionante interpretação de Billie Holiday de "Strange fruit" de 1939, que fala dos corpos dos negros linchados pendurados nos álamos do sul dos Estados Unidos no século XIX. Muito caminho foi feito desde então. Certo é que, mais eficiente que qualquer activismo marxista para a erradicação do racismo (como é ser negro nos antigos paraísos socialistas?), tem sido o efeito ao longo das ultimas décadas do "Soft Power" que emerge no ocidente liberal judaico-cristão, através da produção literária, da música (em especial do Jazz e da Pop) e do cinema, que tem ensinado gerações a conviver em harmonia com a diferença étnica e (às vezes) cultural. Claro que ainda falta muito caminho e os Mamadous só atrapalham. 

 

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Entre os dois, eu não tenho dúvidas sobre o lado em que estou

por henrique pereira dos santos, em 27.01.19

A propósito da provocação de dirigentes do PNR a Mamadou Ba, confrontando-o de forma hostil e com argumentos idiotas na rua, ouvi mais que uma vez o argumento que da título a este post como se a questão estivesse entre estar do lado do agressor ou da vítima.

Não podia estar mais em desacordo com este reforço de uma visão maniqueísta do mundo, ninguém é obrigado a estar de um lado ou de outro neste caso.

Nunca gostei destas abordagens hostis e não desejadas a adversários políticos como forma de combate político, mas não gostei quando os visados eram Passos Coelho e os seus ministros, dezenas de vezes abordados desta forma e tratados de ladrões e gatunos para baixo, tal como não gostei agora quando o visado é Mamadou Ba.

Não posso é deixar de reconhecer a legítimidade deste tipo de actuação: Mamadou Ba nunca esteve fisicamente em risco, não deixou de poder continuar a andar para onde queria, não foi ameaçado, foi simplesmente abordado de forma hostil e incómoda por gente que, para criticar Mamadou, usa argumentos que são uma bosta, tal como aconteceu, salvo raríssimas excepções, nas vezes em que Passos Coelho e os seus ministros também foram abordados por gente com pouca cabeça e ainda menos argumentos, como estes de agora.

Por isso não existe vítima e agressores, existem adversários políticos que acham que a gentileza e as boas maneiras são dispensáveis, como se não fosse possível manter um mínimo de civilidade na discussão sem que a contestação perca um átomo da dureza que se lhe quiser dar (no fundo, seguindo o que me parece ser o melhor exemplo que conheço de civilidade e dureza no discurso: "“Aonde vos achais sei que dizeis sempre mal de mim; eu, pelo contrário, não perco ocasião de dizer louvores vossos: porém, quem a ambos nos conhecer, a nenhum de nós há-de dar crédito”).

Se o discurso troglodita do PNR é conhecido, talvez não seja pior saber o que defende Mamadou Ba e o SOS Racismo, uma espécie de Partido os Verdes, do BE, uma fraude política que me parece servir essencialmente para canibalizar a militância anti-racistas e canalizar financiamento ilegal para a actividade política do partido (sim, eu sei, não tenho maneira de provar que assim é, mas a opacidade sobre a organização e financiamento do SOS Racismo é da sua responsabilidade, não minha).

"As recentes conquistas desportivas nacionais têm vindo a ser usadas para a reprodução de mitos sobre a multiculturalidade e harmonia inter-racial do Portugal contemporâneo. Como portugueses não-brancos, e imigrantes não-brancos residentes em Portugal, recusamos ser cúmplices desse branqueamento.

...

o recente sucesso desportivo de tantos portugueses não-brancos está a ser posto ao serviço da reprodução de narrativas mitológicas, descrevendo um país multicultural e não-racista, que não existe nem nunca existiu, como as nossas histórias e experiência quotidiana nos fazem questão de recordar permanentemente. Ao mesmo tempo, as celebrações do triunfo recuperam referências culturais exaltando o passado dito glorioso dos “descobrimentos”, que na verdade não corresponde senão a séculos de pilhagem colonial e imperial dos nossos territórios de origem, e de redução dos nossos povos à indignidade da escravidão.

...

um país que pratica o terrorismo de Estado nos bairros periféricos de Lisboa, essas autênticas colónias internas onde se concentram as populações não-brancas, nas quais vigora um estado de exceção permanente, e onde uma polícia militarizada se comporta como um exército ocupante levando a cabo, com total impunidade, execuções extrajudiciais

...

Para lá de palavras, o combate ao racismo branco da sociedade portuguesa exige medidas concretas. Nesse sentido, exigimos:

1. Medidas que garantam o acesso efectivo às esferas da sociedade que nos permanecem vedadas. Não aceitamos que, das unidades de saúde à função pública, passando pelos órgãos de comunicação social, escolas e universidades, todos estes espaços permaneçam exclusivos a portugueses brancos;

2. A desmilitarização imediata da polícia, e o fim imediato das operações do CIR (Corpo de Intervenção Rápida) nos nossos bairros, como primeiro passo rumo à abolição total da PSP e GNR, e sua substituição por mecanismos de garantia da segurança colectiva, baseados nas comunidades;

3. Uma comissão de inquérito independente aos assassinatos perpetrados pela policia;

..."

Chega de citações de uma petição assinada por Mamadou Ba e mais 160 pessoas (numa demonstração de representatividade desta visão radical da luta anti-racista) para deixar claro que entre o PNR e Mamadou Ba eu não tenho de fazer, nem faço, escolhas, são excrescências simbióticas que se alimentam mutuamente.

Que o racismo existe na nossa sociedade, isso é uma evidência que não pode ser negada, que esse racismo tem expressão excessiva na cultura das nossas polícias é menos evidente, mas ainda assim não me parece que isso possa ser negado, que discursos de ódio e incendiários como o que citei contribuam minimamente para resolver o problema é que francamente não me parece sequer que mereça grande discussão.

Soluções lineares, maniqueístas, para problemas sociais complexos não ajudam a fazer sociedades melhores, apenas servem para dar visibilidade e proveito político (os outros não discuto) a quem se alimenta desse maniqueísmo e das fracturas sociais.

Eu não tenho de estar de um lado ou de outro, eu estou firmemente contra esses dois lados.

Domingo

por João Távora, em 27.01.19

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas

 

Já que muitos empreenderam narrar os factos que se realizaram entre nós, como no-los transmitiram os que, desde o início, foram testemunhas oculares e ministros da palavra, também eu resolvi, depois de ter investigado cuidadosamente tudo desde as origens, escrevê-las para ti, ilustre Teófilo, para que tenhas conhecimento seguro do que te foi ensinado. Naquele tempo, Jesus voltou da Galileia, com a força do Espírito, e a sua fama propagou-se por toda a região. Ensinava nas sinagogas e era elogiado por todos. Foi então a Nazaré, onde Se tinha criado. Segundo o seu costume, entrou na sinagoga a um sábado e levantou-Se para fazer a leitura. Entregaram-Lhe o livro do profeta Isaías e, ao abrir o livro, encontrou a passagem em que estava escrito: «O Espírito do Senhor está sobre mim, porque Ele me ungiu para anunciar a boa nova aos pobres. Ele me enviou a proclamar a redenção aos cativos e a vista aos cegos, a restituir a liberdade aos oprimidos e a proclamar o ano da graça do Senhor». Depois enrolou o livro, entregou-o ao ajudante e sentou-Se. Estavam fixos em Jesus os olhos de toda a sinagoga. Começou então a dizer-lhes: «Cumpriu-se hoje mesmo esta passagem da Escritura que acabais de ouvir».

 

Palavra da salvação.

SOS Racismo, os outros e nós

por henrique pereira dos santos, em 23.01.19

Quando Mamadou Ba se insurgiu com um jornal por dizer que era Presidente do SOS Racismo, quando o SOS Racismo não tem presidente, fiquei com a pulga atrás da orelha.

Quando alguém disse que a linguagem excessiva de um dirigente do SOS Racismo era lá com os membros do SOS Racismo, acabei mesmo por ir dar um salto ao seu site.

Orgãos sociais? Zero informação. Estatutos? Zero informação. Relatórios e contas? Zero informação.

Posso ter visto mal, darei a mão à palmatória se tal me for demonstrado.

O máximo que consegui ver foi este separador, sobre nós, que não diz nada de essencial mas diz o que eu já calculava: uma associação de interesse público, que se está nas tintas para a informação do público.

O que me interessa não é bem o SOS Racismo porque isto que acabei de descrever passa-se em muitas associações, muitas delas com reconhecimento de utilidade pública e com financiamentos, eventualmente justos e razoáveis, vindos dos contribuintes.

O que me interessa é a forma como nós, sociedade, escrutinamos estas associações que estão do lado do bem, por definição (assunto sobre o qual, aliás, já tenho escrito várias vezes), sem que ninguém pergunte quem são os membros da associação, quando foi o último processo eleitoral, que democraticidade existe nos estatutos, etc..

Ainda no princípio do mês estive na Assembleia da República e um dos deputados disse que no dia anterior tinham recebido uma associação (a Acréscimo) a propósito de umas questões florestais, só que esta associação, que tem dignidade suficiente para ser ouvida pela Assembleia da República sobre políticas públicas, não tem eleições, não tem sócios que se conheçam e tem uma escritura de constituição feita por três sócios: o seu eterno presidente, a sua então mulher e a sua empresa.

Em dezenas e centenas de associações (grande parte das associações de bombeiros, tanto quanto sei) não existe o princípio de um homem/ um voto, e não é porque as mulheres também tenham direito de voto, é mesmo porque alguns sócios são mais iguais que outros e têm vários votos (por exemplo, a associação ambientalista Zero tem pouco mais de cem fundadores, se não me engano, que representam por volta de novecentos votos), permitindo a formação de sindicatos de voto por antiguidade que bloqueiam qualquer alternativa fora do núcleo central que forma a associação, mesmo quando recebem regularmente milhares de euros do contribuinte, como acontece com os bombeiros.

Que as pessoas se associem da forma que quiserem, nada contra, evidentemente, que escolham estatutos não democráticos ou mitigadamente democráticos, é lá com eles, mas quando mete reconhecimento de utilidade pública ou financiamento público, parece-me evidente que pelo menos a transparência deveria ser radicalmente assegurada pelo Estado.

Mas não, nem os directamente interessados querem saber da confiança dos sócios (para quê, se o financiamento vem de outro lado), nem o Estado quer saber da transparência, nem a imprensa quer saber quem representa o quê e o resultado é este, é o combate ao racismo ser confundido com o SOS Racismo, uma organização que ninguém sabe como funciona, que representatividade tem e quem a paga.

Faz falta Fernanda Câncio exigindo ao SOS Racismo o mesmo que exigiu à Iniciativa Liberal: quem vos paga os cartazes?

Tenho a certeza que foi apenas falta de tempo, com as provas dadas de interesse em saber de onde vem o dinheiro dos outros, Fernanda Câncio nunca deixará de perguntar de onde vem e como é gasto do dinheiro do SOS Racismo, mas também de todas as outras associações reconhecidas como de interesse público ou com financiamento público.

Do racismo II

por João Távora, em 23.01.19

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A pobreza extrema desumaniza. O pior mesmo nos guetos suburbanos é a violência e a miséria moral da lei do mais forte que medra na clandestinidade - isto nada tem a ver com etnias ou cor de pele. O pior nem é o facto da polícia não ter lá lugar: é a total ausência do padre, do professor ou do médico. Acabar com estes antros replicadores de pobreza e potenciadores de revolta devia ser a prioridade da acção política em vez do "não assunto" do racismo que tanto agrada aos extremistas dos dois lados.

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Ponto de ordem

por Pedro Picoito, em 23.01.19

O que os incidentes no Bairro Jamaica mostram é que continua a haver às portas da Lisboa trendy , melhor-destino-turístico-do-universo-e-arredores, bolsas de pobreza onde as pessoas vivem como bichos. E quando as pessoas vivem como bichos, comportam-se como bichos. Antes de fazer discursos inflamados sobre o "racismo" ou a "subsidiodependência", devemos garantir a todos os cidadãos portugueses condições mínimas de dignidade. É certo que não basta acabar com o ghetto para mudar a cultura de exclusão, mas seria um primeiro passo. E seria um melhor uso dos nossos impostos do que salvar bancos arruinados por mafiosos de botões de punho. Quanto a figuras menores como Mamadou Ba e José Pinto Coelho, que se alimentam um do outro e precisam um do outro para ter os seus quinze minutos de fama, não vale a pena dar-lhes muita atenção.

Do racismo

por João Távora, em 22.01.19

O facto é que Mamadou Ba, que usa e abusa duma linguagem de ódio, como ontem ao apelidar “bosta da bófia” à Polícia que é garante da paz pública constitucionalmente consagrada, é ele próprio um exemplo de racismo e intolerância, com estreita ligação politica e laboral ao Bloco de Esquerda… que suporta o Governo da república. 
De resto, a exaltação ou vitimização de uma determinada etnia ou cor de pele são igualmente formas racismo, que podem resultar em discriminação e ódio. Irónico é constatar que hoje quem deve estar a esfregar as mãos de contente é o idiota do Ventura. 

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Que coisa mais infantil

por henrique pereira dos santos, em 21.01.19

O Observador tem vindo a alterar a peça que fez a que me referi neste post, assinalando duas dessas alterações numa nota final, mas não assinalando várias outras alterações, incluindo o título.

É claro que o que lá está agora é muito mais equilibrado que o que estava originalmente, mas a forma como o Observador tem gerido este assunto é completamente infantil, reconhecendo implicitamente o seu erro original, mas em momento algum fazendo que qualquer adulto bem formado faria num caso como este, isto é, admitir o erro, pedir desculpa aos leitores, corrigir o erro e, mais importante para reganhar a confiança dos seus leitores, explicar o que aconteceu (não é preciso crucificar ninguém, essa é uma questão interna) e que regras vai o Observador adoptar para evitar situações como esta.

Agora o que andam a fazer não lembra ao careca.

Santana à espreita, com o populismo em fundo

por Pedro Picoito, em 21.01.19

A entrevista de Santana Lopes à TSF e ao DN de ontem, em que defende uma grande coligação de direita para derrotar o PS, ajuda a esclarecer a sua estratégia e a razão por que saiu do PSD. Não há muita ideologia, aparentemente. Santana percebeu que, se continuasse no partido, o seu destino seria o da restante oposição interna: ficar fora das listas de deputados nas próximas legislativas, quanto mais não fosse por um mínimo de coerência. Vai daí, quer voltar ao poder correndo por fora. Se o PS não tiver maioria absoluta, como todas as sondagens sugerem, a Aliança oferece-se para fiel da balança de uma geringonça de direita. Os jornalistas podiam ter-lhe perguntado, preto no branco, se também está disposto a coligar-se com o PS, o que esclareceria ainda mais os eleitores, mas estavam mais preocupados em arrancar-lhe um soundbite (o que obviamente não conseguiram) sobre a guerra civil na São Caetano à Lapa.

Interessante, mesmo muito interessante, é que a Aliança se presta a cavalgar a onda anti-europeísta, embora lhe chame outra coisa. Diz Santana que "é preciso uma nova atitude em Bruxelas". Que atitude? "É chegar a Bruxelas e a primeira preocupação não ser beijar a mão à senhora Merkel. É levar as nossas preocupações e não desistir delas." Pobre senhora Merkel, culpada dos males da Lusitânia. Claro que Santana, sendo Santana, não promete fazer tremer as pernas dos banqueiros alemães. Mas se este discurso tiver algum sucesso nas próximas europeias, ficaremos a saber que a Lusitânia, afinal, não é assim tão imune ao populismo.

O Observador troça dos seus leitores e clientes

por henrique pereira dos santos, em 21.01.19

De maneira geral nem ligo muito às constantes parvoíces que não são notícia a não ser pela vontade de jornalistas fazerem avançar as suas agendas pessoais ou políticas (hoje o Público tem um bom exemplo, com chamada de primeira página, sendo bastante ridícula esta coisa de passar o tempo a copiar peças dos jornais dos Estados Unidos como se tivessem o mínimo interesse para os leitores portugueses).

Mas desta vez o Observador foi longe de mais.

O Insurgente já fez a demonstração da evidente tolice do que escreveu o Observador e ainda que os factos fossem verdadeiros, que não são, nem assim haveria notícia nenhuma no que publicaram.

Comecei por ver várias referências a esta história, associadas às indignações do costume sobre Trump, os seus apoiantes e a Igreja Católica.

Quando o Observador publicou a primeira versão da notícia, limitei-me a ficar espantado por não perceber afinal qual era a notícia, estranhando que o que eu via nos videos que o jornal escolhera publicar não me parecesse confirmar o texto (assinado por uma entidade mais ou menos abstracta, o Observador) que o jornal publicava.

Rapidamente nos comentários à notícia (quer no site do jornal, quer no facebook do jornal), se demonstrava que os factos que o jornal relatava eram tão evidentemente falsos, que fui tendo curiosidade em ver quanto tempo o jornal demorava a alterar a notícia.

Várias e longas horas depois, o jornal altera a notícia (de acordo com a nota sobre essa actualização, para acrescentar a posição da dioceses católica a que pertence a escola, mas na verdade aproveitando para amenizar um bocadinho os disparates, citando os meios próximos de Trump que levantavam dúvidas sobre a versão apresentada pelo Observador), mas sem que assumisse qualquer erro e mantendo o essencial da notícia e o seu título claramente mentiroso.

Meus caros amigos do Observador, eu sei que se os conselhos valessem de alguma coisa eram vendidos, não dados, mas ainda assim, aqui vai, dado, um conselho de um não jornalista: tal como em qualquer outra actividade, o que torna as organizações fortes não é o corporativismo em que todos se defendem uns aos outros, o que torna as organizações fortes é a capacidade para reconhecer erros, assumir responsabilidades e, quando se verifica que alguma coisa correu mal, a coragem para avaliar duramente todo o processo que produziu o erro, para ver o que se pode fazer para diminuir a probabilidade do mesmo erro ocorrer outra vez.

No caso do jornalismo, é o mínimo de respeito pelos leitores que vos exige esse esforço, não o façam se não quiserem, mas não se queixem da concorrência para explicar as vossas próprias responsabilidades e dificuldades de sobrevivência.

Três filósofos à boleia de um artigo

por Pedro Picoito, em 20.01.19

Recomendo vivamente a entrevista de Teresa de Sousa ao cientista político Jacques Rupnik, no Público de hoje. É um belo exemplo de como se pode e deve pensar o populismo, exercício muito recomendável porque, na pressa de condenar o fenómeno, muitos decidem ignorar as suas causas. A esquerda, geneticamente moldada pela abstracção das utopias, revela, como sempre, especiais problemas em olhar para a realidade. A célebre crítica de Marx (os filósofos têm tentado compreender o mundo em vez de o mudar) esquece que o primeiro passo para mudar o mundo é compreendê-lo. Mas até Max Weber, um pensador usualmente contraposto a Marx, concorda com ele, em certo sentido, quando distingue a ética de convicção, que procura o bem absoluto, da ética de responsabilidade, que aceita um certo compromisso com o mal para "mudar o mundo". A primeira pertenceria à ciência e à religião, a segunda à política. Sucede, porém, como diz Ralf Dahrendorf num comentário à dicotomia weberiana, que a ética da responsabilidade deixa de ter sentido e eficácia quando se torna neutralidade perante o mal. O que nos leva à relação da direita com o populismo. Despida dos últimos escrúpulos da democracia cristã e do conservadorismo liberal, a direita corre hoje o sério risco de ficar refém de palavras antigas como povo, nação e comunidade, que têm um sentido perverso na boca dos novos paladinos do Ocidente branco e cristão. Talvez a condição básica para combater o populismo seja encontrar uma "ciência" comum a todos os seus adversários, de esquerda, de direita ou de centro. Faz-nos mesmo muita falta "compreender o mundo". 

Domingo

por João Távora, em 20.01.19

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São João 


Naquele tempo, realizou-se um casamento em Caná da Galileia e estava lá a Mãe de Jesus. Jesus e os seus discípulos foram também convidados para o casamento. A certa altura faltou o vinho. Então a Mãe de Jesus disse-Lhe: «Não têm vinho». Jesus respondeu-Lhe: «Mulher, que temos nós com isso? Ainda não chegou a minha hora». Sua Mãe disse aos serventes: «Fazei tudo o que Ele vos disser». Havia ali seis talhas de pedra, destinadas à purificação dos judeus, levando cada uma de duas a três medidas. Disse-lhes Jesus: «Enchei essas talhas de água». Eles encheram-nas até acima. Depois disse-lhes: «Tirai agora e levai ao chefe de mesa». E eles levaram. Quando o chefe de mesa provou a água transformada em vinho, – ele não sabia de onde viera, pois só os serventes, que tinham tirado a água, sabiam – chamou o noivo e disse-lhe: «Toda a gente serve primeiro o vinho bom e, depois de os convidados terem bebido bem, serve o inferior. Mas tu guardaste o vinho bom até agora». Foi assim que, em Caná da Galileia, Jesus deu início aos seus milagres. Manifestou a sua glória e os discípulos acreditaram n’Ele. 


Palavra da salvação

Deixem o Titanic navegar!

por José Mendonça da Cruz, em 18.01.19

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Há a seguinte tese sobre o Titanic:

- que mesmo que a meteorologia tivesse avisado sobre a existência de icebergs e sua localização;

- que mesmo que o imediato, e o contramestre, e o patrão nas máquinas, e os marujos todos soubessem da existência de um iceberg, e da localização dele na rota exacta do navio;

- e que mesmo que todos os passageiros, ou metade, ou um terço soubessem de fonte segura que havia icebergs e os icebergs estavam na rota exacta do navio;

...que ainda que tudo isso acontecesse, o comandante do navio devia ser deixado em paz, para continuar a comandar serenamente o navio até ao iceberg que o esperava na rota exacta que seguia.

Mais de 50% da tripulação e passageiros do PSD votaram para deixar o comandante seguir a rota que vem seguindo. O Titanic sulca os mares na sua rota, serenamente.

Atenção pessoal do Norte!

por João Távora, em 16.01.19

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No próximo Sábado dia 19, quando se celebram 100 anos da proclamação da chamada Monarquia do Norte, estarei no Ateneu Comercial do Porto para numa pareceria da Real Associação de Lisboa com a Real Associação do Porto promover uma conferência sobre o tema, que terá como oradores os historiadores Carlos Bobone e Nuno Resende. A "Monarquia do Norte" foi um movimento de resistência dos monárquicos na tirânica 1ª república, surgido na sequência do assassinato de Sidónio Pais, cujo sucesso foi ingratamente comprometido uns dias depois, quando a indecisão dos regimentos de Lisboa levou ao isolamento e cerco de um grupo de comandantes monárquicos entrincheirados em Monsanto, que se renderam ao fim de dois dias já sem munições e com pesadas baixas. Sem Lisboa a heróica insurreição do Norte foi derrotada e Paiva Couceiro capitulou a 13 de Fevereiro. A conferência promete ser cativante.

Desorientação

por henrique pereira dos santos, em 14.01.19

"Negou desde o primeiro minuto estar envolvido no crime mas a justiça italiana acreditava ter as provas do seu lado e condenou-o a uma pena de prisão de 12 anos e 10 meses." Provavelmente não serão muitas as pessoas que se chocam com esta forma de dar notícias: um jornal acha que a negação em benefício próprio de um acusado ou o resultado de um julgamento feito com todas as regras do Estado de Direito se equivalem, o que quer dizer que cada um acredita no que quer. Mas não, não é assim, é claro que os tribunais podem cometer erros e o acusado ter razão, mas na falta de argumentos sólidos que justifiquem as dúvidas, o princípio geral não é do que a justiça "acredita ter provas" mas sim o de que a sociedade, através de uma justiça que tem mecanismos que garantem a defesa dos acusados, considera que o acusado cometeu um crime.

Um país esquizofrénico

por henrique pereira dos santos, em 13.01.19

Desde a semana passada (até uns dias antes), tem estado muito bom para queimar.

Por essa razão há muita gente a queimar nesta altura, quer sejam técnicos de fogo controlado, quer sejam pastores.

Em qualquer caso, desde que se vá acompanhando para evitar perdas pessoais ou de bens e cumprindo objectivos de gestão do território, não há nenhuma razão para apagar um fogo nesta altura.

Este parágrafo que pode parecer estranho a muita gente, é doutrina oficial em alguns países que, começando por ter políticas de supressão do fogo (apagar tudo o que ardia), foram evoluindo para políticas de fogo controlado, quando perceberam que as políticas de supressão de fogo davam maus resultados e, face aos custos e quantidade de gente qualificada necessária para a execução de fogo controlado em larga escala (Portugal começa agora a falar, oficialmente, em 50 mil hectares anuais de fogo controlado, quando até agora dificilmente chegava aos mil anuais), evoluíram ainda para a integração dos fogos não controlados que ocorrem em condições meteorológicas que aconselham a queima e que cumprem os objectivos de gestão do território.

No lado dos técnicos de gestão florestal, em especial os que lidam directamente com a gestão do fogo, a necessidade desta evolução é consensual e, inclusivamente, tem vindo a influenciar quer o discurso de uma parte do Estado, quer mesmo a prática, ao ponto de se ter estabelecido um plano nacional de fogo controlado e se terem lançado algumas medidas de apoio à pastorícia como instrumentos de gestão do fogo.

Mas, citando o Laboratório de Fogos Florestais da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, "Existe um Plano Nacional de Fogo Controlado que não é possível executar por falta de capacidade instalada. Por outro lado apagam-se fogos pastoris que evoluem em condições ótimas de prescrição, portanto sem impactos negativos, e que não constituem qualquer ameaça. Nestes (serra do Alvão) usaram-se meios aéreos, noutros casos de que temos conhecimento houve repressão directa da população".

Para além do gasto de recursos absurdo, incluindo com meios aéreos, a apagar fogos que nem sequer deveriam ser extintos, mas sim acompanhados para evitar perdas pessoais ou de bens, a GNR, não por responsabilidade dos agentes, com certeza, que não têm obrigação nenhuma de saber que nestes dias é muito bom que arda, tem vindo a perseguir os pastores (os principais utilizadores de fogo à escala da paisagem, para além dos técnicos de fogo controlado), em vez do que seria normal, que seria acompanhá-los, apoiá-los e, já agora, pagar-lhes o serviço de interesse colectivo que estão a fazer.

É inacreditável a quantidade de pessoas que pressionam a protecção civil para que sejam apagados fogos que deveriam ser incentivados como vacina eficaz contra os grandes fogos de Verão, e revela uma sociedade com uma relação difícil com o fogo.

Infelizmente, uma parte do Estado, que só sabe de meios projectados para o teatro de operações sendo incapaz de entender o papel do fogo nos ecossistemas, é grandemente responsável pela psicose colectiva que nos afecta e que nos impele a apagar tudo o que arde.

Não, não tem de ser assim, nestes dias o que seria bom, o que verdadeiramente eu gostaria de ver, era uma televisão, em canal aberto, a acompanhar pastores a fazer as suas queimas, como quem acompanha os ciclistas que sobem à Torre, porque é isso que esses homens (posso aqui escrever, essas mulheres, e conheço algumas pastoras que justificariam o acrescento, mas a verdade é que é uma profissão em que não há quotas de género e é esmagadoramente masculina) são, uns heróis que nos entregam de graça um serviço de interesse colectivo a que muito pouca gente reconhece o imenso valor que tem.

Este post é só para lhes dizer, mesmo que provavelmente nunca o leiam, que lhes agradeço profundamente o trabalho que estão a fazer e lamento que o Estado que também eu pago com os meus impostos os trate como criminosos que é preciso travar a qualquer custo.

Um dia isto muda, mesmo que hoje não se vislumbre, em qualquer partido, o mínimo de representação política do mundo rural que possa garantir alguma réstea de bom senso nas políticas que afectam os principais gestores do território não urbano.

Um "statment" (como se usa dizer agora)

por João Távora, em 13.01.19

Se querem saber até acho que sou um privilegiado: a minha educação humanista (chamemos-lhe assim) exercitou-me mais na curiosidade e reflexão que no julgamento dos outros. Desde a infância frequentei o ensino público - uma autêntica escola de vida; viajei, e fiz-me homem pagando o elevado preço que às vezes pagam as pessoas demasiado livres (ou com um apurado sentido do trágico como me confidencia o meu Conselheiro Espiritual). Conheço bem as periferias da vida, e quem me conhece sabe que não estou a ser pretensioso. Talvez por isso nunca discriminei pessoas por causa da sua maneira de pensar, afinidades culturais ou outras sensibilidades. Sempre gostei do confronto de ideias; a inteligência e o desafio intelectual são para mim os aspectos muito sedutores na relação com os outros. Talvez isso justifique a diversidade de amigos que com que me fui cruzando, (e agora não me refiro à vida real) primeiro nos blogues e depois nas redes sociais. Só acho estranho que alguns, ao final do dia, ainda amuem com dificuldade em aceitar que eu sou Católico Apostólico Romano e daí tire as devidas consequências. Que a Igreja de Pedro é a minha verdadeira casa, penhor da minha liberdade. Da forma como as coisas estão, desconfio que aquilo que em breve voltará à ordem do dia é a liberdade religiosa...

Domingo - do Baptismo do Senhor

por João Távora, em 13.01.19

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Batismo de Cristo - Bacchiacca C. 1523-24

 

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas 


Naquele tempo, o povo estava na expectativa e todos pensavam em seus corações se João não seria o Messias. João tomou a palavra e disse-lhes: «Eu baptizo-vos com água, mas vai chegar quem é mais forte do que eu, do qual não sou digno de desatar as correias das sandálias. Ele baptizar-vos-á com o Espírito Santo e com o fogo». Quando todo o povo recebeu o baptismo, Jesus também foi baptizado; e, enquanto orava, o céu abriu-se e o Espírito Santo desceu sobre Ele em forma corporal, como uma pomba. E do céu fez-se ouvir uma voz: «Tu és o meu Filho muito amado: em Ti pus toda a minha complacência». 


Palavra da salvação. 

A febre das plantações

por henrique pereira dos santos, em 12.01.19

João M. Soares, com razão, resolveu fazer uns comentários na sua página de Facebook em relação aos sobreiros plantados no pinhal de Leiria por António Costa.

O Público achou graça à história e foi verificar, confirmando o que realmente João M. Soares tinha já demonstrado: uma boa parte das árvores plantadas (para usar um eufemismo) estavam mortas.

Em si mesmo esta história faz parte do ridículo a que se submete este governo por um pouco mais de propaganda (agora inaugura, com a presença de vários ministros, o anúncio de abertura de concursos para financiar projectos, uma ideia genial, do ponto de vista da propaganda, uma parente próxima da outra ideia brilhante de que Alexandre Homem Cristo fala aqui).

A questão é que resulta e o problema vai muito para além do governo, radicando numa característica da sociedade portuguesa que a imprensa acentua em vez de combater: avaliar não é prioridade para ninguém.

Há anos que existem campanhas destas de plantar árvores, promovidas por membros do governo, quando se sentem mais apertados com os tristes resultados das opções de política florestal, mas também por marcas comerciais e organizações da sociedade civil, sendo frequentes as notícias sobre grandes iniciativas de plantação, às vezes com dezenas ou centenas de voluntários.

O problema é que os senhores jornalistas que assistem a estas iniciativas e que as noticiam, quando não as apoiam directamente, como foi o caso da Renascença que apoiou umas campanhas de plantação da QUERCUS financiada pelos CTT, esquecem-se de pôr um lembrete no telefone para daí a seis meses, um ano, dois anos, três anos, ir ver o que realmente resultou do esforço feito.

Eu sou presidente de uma associação de conservação da natureza que também planta árvores quando nos pagam para isso - de resto, preferimos gerir a regeneração natural e contar com o que vai aparecendo - mas ainda recentemente, numa primeira avaliação ainda preliminar, admitimos que 50% do que plantámos no ano passado poderá ter morrido, como é normal. A plantação é uma operação técnica sofisticada e para ter elevadas taxas de sobrevivência, como acontece na plantação comercial, é preciso garantir um conjunto de operações técnicas que custam dinheiro e exigem conhecimento. A nossa opção é uma opção de baixo custo e mais tempo, e por isso taxas de mortalidade de 50% podem acontecer (pensamos que não vai ser tanto quando fizermos uma avaliação mais rigorosa, mas se for, não será uma surpresa).

Nos acordos para a plantação de árvores que temos, 25% do que cobramos é para comprar as primeiras árvores, 75% é para assegurar a gestão nos cinco anos seguintes, incluindo, naturalmente, a substituição das árvores que entretanto morram. E, insisto, ainda assim, no que fazemos, plantar é uma actividade relativamente marginal face às actividades de melhoria do solo, da fertilidade, de condução da água, de correcção torrencial, de sementeira directa, de condução da regeneração natural, etc..

A larga maioria das plantações feitas fora do contexto comercial, são feitas às três pancadas, sem horizonte de gestão nenhum, sem criteriosa escolha de espécies e, acima de tudo, sem se integrarem num processo de gestão a cinco e dez anos que possam garantir que o esforço feito não é vão.

Política e mediaticamente isto funciona porque ninguém presta contas a ninguém, como no caso dos sobreiros do pinhal que, não fora a persistência de João M. Soares (e o seu peculiar sentido de humor) e ainda hoje estaria classificado como um caso de demonstração de empenho do governo na recuperação do potencial das áreas ardidas.

Pensando bem, é uma boa metáfora de grande parte do investimento público do país: faz-se porque o povo gosta da festa da inauguração e porque existem os recursos iniciais, e depois vamos todos pôr velinhas à Senhora de Fátima para pedir que tome conta do assunto, que nós temos outras prioridades para além de fazer o trabalho de dona de casa, que é um trabalho que não brilha, mesmo sendo verdadeiramente a base do resto.

Nada mais

por Pedro Picoito, em 11.01.19

Alertado por alguns comentários no Facebook, fui ver a já célebre reportagem da TVI sobre a não menos célebre terapia da psicóloga Maria José Vilaça para "converter" homossexuais. Antes de mais, duas ressalvas. Primeira: este é um daqueles posts que preferia não escrever porque o tema é complexo, foge à simplificação das redes sociais e só me vai trazer dissabores. Segunda: conheço a Dra. Maria José Vilaça e, mesmo que não conhecesse, tenho fraco apreço por linchamentos públicos, com ou sem fogueiras. Não esperem, portanto, que vá dar uma no cravo e outra na ferradura só para parecer tolerante. De qualquer modo, tenho a pele dura, já perdi a ilusão de agradar a toda gente e prefiro chatices mediáticas a silêncios cúmplices. 

Indo directo ao assunto, a reportagem é sensacionalista (com uma musiquinha de fundo que parece saída do Tubarão do Spielberg), cínica ("salvar almas perdidas"? pleeease...) e ofensiva para os católicos. Chocaram-me, muito em particular, as filmagens ocultas no confessionário. O segredo de confissão é uma das coisas mais sagradas do catolicismo e quebrá-lo é um gravíssimo pecado. É um exemplo de manual do que se pode considerar um sacrilégio. Revelar o que se passa num confessionário sem autorização da competente autoridade eclesiástica (um dilema tão bizarro, aliás, que deu para o Hitchcock fazer um filme) é tão grave como profanar a Eucaristia ou matar a tiro Monsenhor Romero no altar. Que a jornalista Ana Leal não veja isto, ao mesmo tempo que se diz católica praticante, não é só um problema dela. É também um problema meu, que me sinto ofendido pelo abuso de confiança especialmente canalha de quem filmou as imagens e as editou. E duvido que os padres entrevistados às claras, num truque tão velho como pueril para dividir a Igreja em bons e maus, concordem com este tipo de "jornalismo". Já nem falo da violação da confidencialidade relativa às sessões de terapia. Compreendo que nem todos tenham a minha sensibilidade religiosa. O que não compreendo é que, em nome da tolerância, se desrespeitem as convicções mais profundas de milhões de pessoas.

Isto bastaria para tornar a reportagem repugnante. Mas há mais. Pela maneira como é montada, fica-se com a impressão de que as pessoas expostas à terapia são sujeitas a uma espécia de lavagem cerebral. Ora, convém lembrar que, mesmo que a terapia seja discutível do ponto de vista científico (e em psicologia, para não dizer em ciência, o que é que está acima de discussão?), os "pacientes"  seguem-na de livre vontade. Ninguém os obriga a participar nas sessões organizadas, a acatar os conselhos dados ou a concordar com o que lhes dizem. Nem poderia ser de outra forma. Há muito que a homossexualidade deixou de ser crime em Portugal (embora não no Irão, na Arábia Saudita, na Indonésia e em vários países simpáticos que aguardam a visita de Ana Leal). Sugerir que pessoas adultas, livres, conscientes, com uma vida sexual activa, estão a ser forçadas seja ao que for é um insulto à sua inteligência e à nossa. Talvez para espanto de muitos, há mesmo homossexuais que querem deixar de o ser. A TVI autoriza?

Porque, no fundo, o verdadeiro problema é este. A terapia de mudança do comportamento homossexual comete uma heresia: propõe, imaginem, mudar o comportamento homossexual. Isto é imperdoável nos tempos que correm. Não porque se duvide realmente que um homossexual pode deixar de o ser. Na era do amor líquido, as identidades sexuais imutáveis passaram à história. De resto, os apóstolos do progresso pregam em abundância a mudança de comportamentos. Que troquemos o tabaco pela canábis, a carne pela soja, o carro pela bicicleta, o plástico pelo papel, as manhãs da TVI com Mário Machado pelas noites da TVI com Ana Leal. E ninguém nega que um viciado no jogo ou no álcool possa mudar. Não é isso. O verdadeiro problema está na condenação moral da homossexualidade. O "politicamente correcto" não quer apenas que deixemos os gays em paz (o que já acontece, excepto no Ribatejo e nos tais países que Ana Leal devia visitar). Não quer a sua liberdade, nem o casamento, nem a adopção (que já têm). Quer, isso sim, normalizar qualquer comportamento sexual e, portanto, a homossexualidade (para usar os conceito sociológicos de desvio e norma). Ou, por outras palavras, quer que ninguém possa dizer que um comportamento sexual, seja qual for, é moralmente errado. Só a pedofilia fica de fora. Por enquanto.

E é aqui que a coisa fia ainda mais fino. A Igreja sempre considerou a homossexualidade uma desordem moral. Acolher os homossexuais, como o Papa Francisco tem dito, não significa aprovar o seu comportamento. Significa aceitar as pessoas pelo que são, não pelo que fazem. Doutrina tão antiga como o Evangelho. Quando Jesus, diante da mulher adúltera, diz aos seus acusadores "quem de vós estiver sem pecado que lhe atire a primeira pedra", diz-lhe também "vai e não voltes a pecar". O perdão não anula a consciência do pecado. Pelo contrário, pressupõe-na. Querer impedir a Igreja católica, ou a Dra. Maria José Vilaça, ou um americano ignoto de defenderem a mudança de comportamento dos homossexuais por razões morais e religiosas é, nem mais nem menos, apelar à censura e atacar a liberdade de expressão. Mais uma vez, não vejo aqui grande tolerância. Vejo um combate democrático a travar, por muito impopular que seja. Note-se que ninguém está a defender a violência contra os gays, ou a criminalização da homossexualidade, ou a terapia de choque  aplicada ao Presidente da Opus Gay in illo tempore. Deixem-se de mitos urbanos. O que está em causa é que uma psicóloga possa propor uma terapia de mudança comportamental. E que um homossexual possa segui-la. Nada mais.


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