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O gráfico acima ajuda a perceber a evolução do PIB dos países com valores mais elevados. Interessante mesmo é ver a evolução da China.
O ímpeto bloquista em querer domesticar a cultura com as questões fraturantes, a ideologia de género e a igualdade feminina, leva a excessos linguísticos. Assim aconteceu quando o dirigente do BE, Pedro Filipe Soares, se dirigiu, neste passado fim de semana, à Convenção do seu partido: “Camaradas e camarados…” Bem sei que se tratou de uma gaffe. Acontece a todos mas é bem revelador do que vai na cabeça desta esquerda. Depois não se queixem dos populismos e das ameaças fascistas…
Ao contrário dos jornais e televisões, não dediquei grande tempo à convenção do BE, mas dediquei o suficiente para me divertir com a demonstração prática do combate ao discurso de ódio de que tem falado Francisco Louçã: "Os rufias tomaram conta da direita e são aplaudidos pelos milionários (...) a política suja está por todo o lado".
Talvez por isso não tenha tanto a certeza de que o que se passou por ali tenha sido uma demonstração da vontade do BE fazer parte do próximo governo de António Costa, em vez da demonstração do medo que o Bloco tem de que Costa prescinda do seu apoio no próximo governo, contando com uma direita fragmentada em que haverá sempre alguém disposto a dar a mão ao futuro governo.
O que vejo é o BE a exigir a nacionalização da banca e da energia (com uma linguagem suficientemente dúbia, para o que der e vier), a fingir que a candidatura de Mariana Mortágua a ministra das finanças é para levar a sério e, sobretudo, vejo um BE a fazer uma campanha eleitoral com o objectivo de concentrar em si o voto útil da esquerda à esquerda o PS, esvaziando o PC e preparando o proximo ciclo de oposição em posição de força, com o objectivo de se tornar a força hegemónica à esquerda do PS (pelo menos eleitoralmente).
Provavelmente estou enganado e o PC não é o maior inimigo do BE, como me parece.
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos
Naquele tempo, Jesus ensinava a multidão, dizendo: «Acautelai-vos dos escribas, que gostam de exibir longas vestes, de receber cumprimentos nas praças, de ocupar os primeiros assentos nas sinagogas e os primeiros lugares nos banquetes. Devoram as casas das viúvas, com pretexto de fazerem longas rezas. Estes receberão uma sentença mais severa». Jesus sentou-Se em frente da arca do tesouro a observar como a multidão deitava o dinheiro na caixa. Muitos ricos deitavam quantias avultadas. Veio uma pobre viúva e deitou duas pequenas moedas, isto é, um quadrante. Jesus chamou os discípulos e disse-lhes: «Em verdade vos digo: Esta pobre viúva deitou na caixa mais do que todos os outros. Eles deitaram do que lhes sobrava, mas ela, na sua pobreza, ofereceu tudo o que tinha, tudo o que possuía para viver».
Palavra da salvação.
O meu austero professor da primária, o professor Júlio (que distribuía reguadas épicas aos mais cábulas), quando apanhava os alunos em rebuliço berrava que a sala de aula "não é uma república!" Nesse sentido a assembleia em S. Bento não deixa os seus créditos em mãos alheias.
Mais do que corarmos de vergonha alheia com as justificações da deputada Emília Cerqueira no confrangedor caso das falsas presenças em plenário de José Silvano, é o ensurdecedor silêncio corporativo dos restantes partidos no parlamento. Se isto acontecesse numa qualquer democracia desenvolvida os dois deputados já teriam há muito embalado a trouxa e renunciado ao mandato. Somos a “república portuguesa”, temos aquilo que merecemos.
Proclamou a Senhora Ministra da Cultura, com pompa e circunstância, que a penalização fiscal da tourada é a novel causa fracturante da modernidade doméstica. "Uma questão civilizacional", proclamou a Senhora Ministra. Ah, grande e bela coisa, a civilização. Tão grande e bela como a cultura que a Senhora Ministra ministra. Cesse tudo o que a musa antiga canta, os mortíferos incêndios, os assaltos à tropa, as caóticas urgências, os combóios antediluvianos, as greves dos professores, que outro valor mais alto se alevanta: a civilização.
Bem-haja a Senhora Ministra por nos apontar o caminho do progresso, qual liberdade guiando o povo (sim, porque a liberdade e o progresso também são grandes e belas coisas). E bem-haja o PCP por chumbar a eutanásia, abrindo caminho a este outro avanço civilizacional de não descer o IVA para o espectáculo obscurantista de bandarilhar um boi. Eu sei que ainda há, na Chamusca e em Aljustrel, meia dúzia de velhos proletários que não viram a luz, mas o camarada Jerónimo há-de enviar-lhes a camarada Rita Rato, como fez no casamento gay. Com a ajuda da camarada Rato, um velho proletário até engole um boi (a eutanásia é que não).
Bem-hajam, pois, a Senhora Ministra e a geringonça que a suporta por nos trazerem ao concerto das nações esclarecidas, como outrora nós trouxemos os índios e os cafres ao grémio da civilização (ah, grande e bela coisa). Que seria de nós, povo de bárbaros, se o governo do Dr. António Costa não nos iluminasse com a ciência e a virtude? Eu vos digo o que seria: a tribo do redondel a pagar o mesmo IVA que a exposição do Mapplethorpe. Parece-vos bem, brutos? Pois a mim, e à Dra. Graça Fonseca, não.
Pode o Museu de Arte Antiga falecer de funcionários, pode o financiamento das artes gerar eternos protestos, pode até o país ser representado na Bienal de Veneza por Joana Vasconcelos... Que importa, se o mundo civilizado, de Caracas à Rive Gauche, sabe que ninguém, por estas brenhas incultas, gritará "Olé!" sem pagar 13% de IVA?
"“O Governo decidiu apoiar financeiramente a retirada de plantações de eucaliptos”, disse Luís Capoulas Santos, durante uma audição parlamentar conjunta com a Comissão de Agricultura e Mar e a Comissão de Orçamento, Finanças e Modernização Administrativa.
De acordo com o governante, a portaria que consagra a medida deverá ser publicada na sexta-feira em Diário da República.
Apesar de não revelar mais detalhes, o governante disse que a “portaria vai beneficiar despesas de arranque desde que na mesma área seja colocada uma espécie resiliente ao fogo”."
Ao ler esta notícia lembrei-me de uma piada habitual nos meios da produção de eucaliptos nos anos 80, quando se deu a grande expansão da área de eucalipto e, ao mesmo tempo, se reforçaram os mecanismos administrativos de controlo da produção de eucalipto, aplicados, com frequência, por quem nunca tinha feito uma única florestação.
Quando os responsáveis perguntavam aos encarregados se tinham cumprido integralmente o projecto aprovado e, para ter a certeza, perguntavam se tinham respeitado a obrigação de ter faixas de folhosas na plantação de eucaliptos, a resposta era sempre que sim. Depois vinha a pergunta sacramental "e que folhosas puseste nessas faixas?". Eucaliptos, claro.
O Senhor Ministro da Agricultura está na mesma: não se espante se alguém resolver cumprir a obrigação de plantar espécies resilientes ao fogo usando eucaliptos, pela simples razão de ser das espécies mais resilientes ao fogo que temos por aqui.
Eu compreendo a opção do Senhor Ministro: para quem é bacalhau basta e nada disto é para levar a sério.
Nuno Garoupa no Polígrafo, a acompanhar atentamente.
«...A esquerda política e jornalística sim, quer calar as vozes que a critiquem ou contrariem, nos media e nas redes sociais. A esquerda política e jornalística quer a censura em nome da "democracia".» Estes e mais uns considerandos no Observador
Com a informação que tenho neste momento, a Quercus está a considerar uma proposta feita de compra de alguns terrenos seus, no Tejo Internacional.
Primeiro uma declaração de interesses: eu sou presidente (no máximo, por razões estatutárias, até ao fim do ano que vem) de uma associação de conservação que, essencialmente gere terrenos para a conservação da natureza, seus e de terceiros e, portanto, terei sempre interesse directo nesta venda por duas razões: 1) À partida somos sempre um potencial comprador destes terrenos, ou de outros, com objectivos de conservação; 2) A percepção de que a compra de terrenos para a conservação é um investimento pouco seguro porque as associações os podem vender a qualquer momento, afecta com certeza a nossa capacidade para mobilizar recursos para a compra futura de terrenos. É certo que nos estatutos da associação em que estou mais envolvido tivemos o cuidado de estabelecer: "Artigo 28º(Deliberações) 1. Salvo o disposto no número seguinte, as deliberações da Assembleia Geral são tomadas por maioria absoluta dos votos dos associados presentes. 2. Em conformidade com o disposto no número 2 do artigo 62.º do Decreto-Lei n.º 119/83, de 25 de Fevereiro, é exigida a maioria qualificada de, pelo menos, dois terços dos votos dos associados, expressos na aprovação de matérias referentes à análise e votação de propostas submetidas pela Direcção para a venda ou alienação de qualquer património imobiliário, acções ou participações propriedade da Associação, bem como as referentes a deliberações sobre alterações de estatutos".
Em segundo lugar, um pouco de enquadramento.
Fui, durante muitos anos, sócio da Quercus (inclusivamente fundador de um dos seus núcleos) e saí em ruptura com uma direcção que, na sua ânsia e hábito de contestar politicamente tudo e mais alguma coisa que pudesse trazer mais presença da Quercus numas linhas de jornal (e de influência política), resolveu pôr em causa o trabalho técnico dos meus colegas do ICNF na delimitação da rede natura e, quando alertada para o absurdo do que estavam a dizer, não só não reconheceu o erro como, cobardemente, se recusou a ir ao terreno discutir os pontos de discórdia, que eram verificáveis.
Também são públicas as minhas críticas ao modelo de gestão das associações ambientalistas, mais ligado aos financiadores que aos sócios, mais preocupado com os jornais que com a realidade e, progressivamente, menos sustentado tecnicamente.
Estive directamente envolvido nos processos de que resultaram algumas compras de terrenos no Tejo Internacional (fui eu, por exemplo, que desenhei a solução financeira que permitiu à CGD emitir uma garantia essencial para o recebimento do financiamento comunitário que permitiu a compra do Monte Barata, fora o algum dinheiro que mobilizei para essa compra) e portanto não gosto da hipótese de se venderem terrenos que hoje estão, formalmente (se o estão de facto, não sei) consagrados à conservação.
O que me faz escrever este post não é esse desconforto, mas a forma emocional, pouco racional e desinformada com que está a ser feita esta discussão, semelhante ao que se passa no conjunto de outras discussões que envolvem o interesse público (seja ele prosseguido pelo Estado ou pela sociedade).
Já há quem diga que é o Monte Barata que está à venda (o que não é verdade) e outras coisas que tais.
O que está em causa é um conjunto de terrenos dispersos que calculo que a Quercus tenha dificuldade em gerir e controlar (há quem rasgue as vestes por se tratar de uma venda a uma entidade ligada à caça, mas não perca cinco segundos a perguntar se não há caça furtiva nesses terrenos e de que meios dispõe a Quercus para se opôr à eventual caça furtiva nesses terrenos), para os quais a Quercus recebeu uma proposta que resolveu considerar porque, tanto quanto me parece, no ano passado fez um grande esforço para comprar uma outra propriedade contígua ao Monte Barata, obtendo assim uma área substancial, com maior concentração e, consequentemente, mais gerível e com maior potencial de conservação.
Pessoalmente eu serei sempre contra vendas deste tipo, como princípio, mas admito sempre que as decisões finais dependam das circunstâncias e dos fundamentos para esta opção de gestão e deveriam ser essas circunstâncias (em que se inclui a situação financeira da Quercus, que não conheço em profundidade, mas também um melhor desenho das propriedades afectas à conservação que permita uma melhor gestão) mas custa-me muito que a discussão das opções possíveis saia imediatamente desse plano de racionalidade para o campo da pura histeria emocional.
Grande parte das pessoas que agora se indignam nunca fizeram rigorosamente nada, nem sequer pagar as quotas, para que estas associações tenham uma base de recursos mais sólida, nem foram exigentes com uma gestão progressivamente mais desligada a realidade.
E, sobretudo, incomodam-me as pessoas que tendo fortes responsabilidades na actual situação financeira da Quercus, e nos seus défices de democraticidade e de envolvimento e mobilização dos sócios e que depois de surpreendidos por uma derrota de eleitoral que os levou a ir fundar outra associação, com uns estatutos suficientemente pouco democráticos para não estarem sujeitos às surpresas da democracia, aparecem agora a lamentar as decisões dificeis de quem tem o barco nas mãos.
Estre caso é bem uma metáfora do país e do estado lamentável em que se encontra a discussão racional e civilizada dos problemas que são comuns a muita gente: a procura dos factos é muito limitada, o juízo emocional ilimitado.
Durante a campanha eleitoral no Brasil, alguns tribunais eleitorais locais tomaram decisões completamente tontas, como se documenta aqui.
Como é bom de ver, estas acções foram rapidamente contestadas e proibidas pelas instâncias superiores do sistema de justiça brasileiro, demonstrando que funcionaram os mecanismos de garantia das liberdades.
Em nenhum momento Bolsonaro foi tido ou achado no assunto.
Isso não impediu que os que discordam dele de forma mais radical lhe atribuíssem a "responsabilidade moral" pelo que se passou (no que diz respeito ao condicionamento da liberdade de expressão, não no que diz respeito à rápida reposição das garantias constitucionais), tal como David Dinis não tem qualquer dúvida em atribuir o envio de cartas bomba nos Estados Unidos ao discurso de ódio de Trump (um rapaz que, como todos sabemos, é delicadamente tratado pelo imprensa todos os dias, sem o mínimo vestígio de ódio, como se pode verificar neste discurso fofinho de Robert de Niro, baseado na conhecida forma tradicional de cumprimento entre amigos, no Porto).
Ontem, por eu me ter limitado a assinalar duas ou três coisas fora da cartilha estabelecida sobre Bolsonaro (com fascistas a única atitude aceitável é estar na barricada oposta e quem tiver alguma dúvida de que o homem seja fascista ou, sendo-o, talvez não tenha condições para impôr um regime fascista, é porque é tão fascista como ele) fui praticamente insultado duas ou três vezes por amantes da liberdade de expressão e da democracia.
Uma das coisas que motivaram esta crispação foi eu ter assinalado que uma notícia que por aí circula (a queima de uma sede do IBAMA) como sendo um resultado prático da eleição de Bolsonaro e a demonstração de que a ditadura está a ser implantada, era de há um ano.
Eu já nem reajo à enésima partilha desta notícia, mas como era feita por uma jornalista experimentada, lá fiz uma pequena nota sobre a data da notícia, o que motivou o seguinte comentário: "Admito que não reparei na data da noticia, porque a notícia não me admirou na era bolsonaro. A notícia é de 2017, vi agora, mas infelizmente notícias como esta vão repetir-se cada vez mais no Brasil".
E é isto, de cada vez que alguma coisa sirva para demonstrar o avanço da ditadura no Brasil (ao fim de dois anos de Trump já começa a ser mais difícil encontrar demonstrações de que Trump vai destruir a democracia americana), sejam decisões de tribunais eleitorais, sejam queimas de edifícios de há um ano, sejam incêndios em acampamentos do Movimentos dos Sem Terra (por sinal, incêndios de que existem notícias há vários anos, em vários sítios), seja o facto de um governador e um tribunal impedirem um espectáculo de Caetano Veloso numa ocupação ilegal, sejam assassinatos de opositores de Bolsonaro (só no Rio ocorrem 16 homicídios por dia, em todo o Brasil a média diária corresponde ao número de assassinatos em Portugal num ano e meio, portanto haverá gente de todos os partidos a serem assassinados todos os dias), tudo isso é atribuído a Bolsonaro para que seja possível dizer que quem se limita discordar de Bolsonaro, tratando-o como qualquer outro político até prova em contrário, é um inimigo da democracia que merece o ostracismo.
O problema é outro e bastante inquietante: o que fragiliza a democracia é o candidato derrotado de uma eleição fazer um minuto de silêncio pela democracia antes do seu discurso de derrota, o que fragiliza a democracia é a insistência de que a lavajacto é uma operação política e não uma investigação a um monumental esquema de corrupção, o que fragiliza a democracia é considerar que Lula é um preso político e não um político preso, isso sim, a demonização do outro, a descredibilização das instituições democráticas, em especial do sistema de justiça, e a ideia de que defender a proibição do aborto, a liberalização do porte de arma e outras coisas que tais, sendo certas ou erradas, são ataques à democracia e não escolhas sociais legítimas que devem ser discutidas civilizadamente, isso sim, é que é inquietante.
As parvoíces sistemáticas que tentam transformar declarações políticas normais, como a de que entre Haddad e Bolsonaro é difícil ou mesmo impossível uma pessoa moderada tomar partido, procurando encostar Fernando Henrique Cardoso, Ciro Gomes ou Assunção Cristas ao campo do fascismo, só porque recusam uma visão maniqueísta do bem e do mal, são muito mais perigosas do que parecem à primeira vista porque na realidade, podendo não ser o seu objectivo, o seu resultado é o condicionamento da opinião que não encaixa no quadro de referência estabelecido pela esquerda dominante.
Se algum dever têm os democratas não é o dever de ostracizar Bolsonaro, é o dever de se recusarem a aceitar o quadro mental em que se quer meter toda a gente, recusando o condicionamento de opinião chantagista em que nos querem enfiar.
A nomeação de Sérgio Moro para o governo de Bolsonaro tem motivado comentários variados, alguns tão fora de propósito que não merecem que se perca muito tempo com eles, como o editorial do Público de hoje, por David Pontes (um pornográfico branqueamento de Lula e do PT como se o problema principal não fosse o gigantesco esquema de corrupção existente, mas o facto do principal juiz ligado ao caso abandonar o processo para aceitar um cargo político), outros manifestamente bem intencionados mas que me parecem falhar completamente o alvo.
Comecemos pela ideia de que esta nomeação reforça a judicialização da política, para o que se usa, frequentemente, o exemplo de Gárzon. É um comentário que não me parece fazer o menor sentido porque a judicialização da política acontece quando decisões que são da esfera da política são atiradas para o sistema judicial (por exemplo, quando o nível remuneratório dos funcionários públicos é decidido pelo pelo Tribunal Constitucional e não pelo Governo eleito) ou, como é admissível que se diga de Gárzon, os juízes interferem, enquanto juízes, no processo político.
Neste caso Moro é alguém que sai da justiça para a política, não é um juiz que, enquanto juiz, tem uma actuação política, pode ser uma decisão certa ou errada, ter efeitos positivos ou negativos na confiança das instituições e na percepção sobre a separação de poderes, mas não é esta decisão que possa ser classificada como judicialização da política: a partir de ontem Moro não é um juiz, é um político como os outros.
Pode argumentar-se que Moro, enquanto juiz, teve uma actuação política (há muitos que dizem que mandou prender o candidato mais bem colocado para ganhar as eleições, mas talvez valha a pena lembrar, citando Paulo Gorjão, que não existe o crime de "candidato mais bem colocado para ganhar eleições" e portanto ninguém é preso por isso num estado de direito e, no caso concreto, o que há é uma acusação de corrupção e lavagem de dinheiro ao candidato mais bem colocado para ganhar as eleições, acusação que foi contestada pelo próprio e confirmada pelas instâncias superiores do sistema judicial brasileiro, não foi uma decisão arbitrária e solitária de Moro) mas para isso é preciso provar que foi essa a sua actuação enquanto juiz, não chegando esta nomeação (posterior e evidentemente imprevisível no momento das decisões, quer de Moro, quer dos tribunais superiores) para demonstrar essa actuação política: a mim parece-me de meridiana clareza que o futuro raramente (se alguma vez) é causa do passado.
Pessoalmente a aceitação de Moro incomoda-me porque preferia que levasse o processo até ao fim e porque esta aceitação corresponde a dar o flanco aos que a vão usar para enfraquecer o processo (como desde o primeiro momento tem estado a fazer o PT e o faz o editorial de hoje do Público, para além de muitos outros) e as instituiçoes do estado democrático brasileiro.
À minha pequena escala e das minhas pequenas coisas de serviço público já tive algumas (felizmente poucas) vezes de optar entre a minha tranquilidade ética e o risco de deixar passar a oportunidade de contribuir para um melhor funcionamento de entidades públicas. Sem excepção decidi-me por bater com a porta e ir-me embora (o que corresponderia a Moro não aceitar o convite, salvas as devidas proporções) mas ainda hoje não estou convencido de que tenha sempre feito a melhor opção e, nalguns casos, tenho mesmo a certeza de que o que se seguiu foi mesmo muito mau, do ponto de vista do interesse público. Não tenho pretensões a ser super-homem, mas duvido que eu não tivesse conseguido servir melhor o bem público ficando onde estava e não facilitando a minha substituição.
Talvez por isso tenho uma espécie de simpatia pelo Teixeira dos Santos dos santos últimos dias de Sócrates: sabia perfeitamente, desde muito antes, que caminhava para um beco sem saída, mas saltar do comboio seria melhor ou pior? O choque contra a parede que tivemos em 2011 foi suavizado por Teixeira dos Santos estar lá, a tentar introduzir um mínimo de racionalidade naquela cabeça louca, ou se ele tivesse saltado do comboio mais lá atrás o risco de termos um maquinista tão alienado como o comandante do comboio não seria maior e o choque contra a parede bem mais doloroso para todos?
Suspeito que essa foi a situação em que Moro se viu envolvido no momento da decisão de aceitar ou não o convite.
Bolsonaro queira um símbolo para deixar claro que o combate à corrupção e ao crime organizado seria implacável mas respeitador da lei e Moro era o símbolo perfeito para isso.
A Moro restava recusar, não correndo riscos e mantendo o seu prestígio intacto para no futuro seguir uma carreira política, quer a coisa corresse bem, quer corresse mal com Bolsonaro, ou agarrar a oportunidade de realmente ter uma agenda anti-corrupção e anti crime organizado, mas à custa de riscos muito elevados de falhar e, com isso, deixar de rastos o seu prestígio e perder a sua capacidade de influenciar positivamente uma reforma do Estado brasileiro.
Repito, incomoda-me que tenha aceite, o que significa trocar um juiz seguramente útil pela incerteza de um político sujeitos aos constrangimentos inerentes ao que é possível fazer.
Mas sou incapaz de fazer um juízo moral sobre esta aceitação, só me resta esperar para ver se valeu a pena, hipótese em que eu dificilmente poria todas as minhas fichas.
Parece, saiu recentemente, numa revista semanal, uma reportagem sobre a nobreza em Portugal. Não a li, nem pretendo ler. De antemão conheço a cantilena e apenas condeno os que se prestaram aos propósitos da coscuvilhice dos jornalistas.
Isto é importante no exacto sentido em que à conta dessa "nobreza" se pretende denegrir a nossa Monarquia. Nada é por acaso...
Porque, afinal, o que é ser "nobre"? Se é ser detentor do Poder, as "Necessidades" estão agora no Rato. Como já estiveram em outras "Soeiro Pereira Gomes". A nobreza actual é a classe política, aliás bem apoiada por algum poder económico (vd. diversos processos judiciais, de todos conhecidos). Os nobres de agora iniciam-se nos "paços" académicos, armam-se cavaleiros nas lojas maçónicas e alcançam o foro supremo nas bancadas parlamentares. Há muito mais duques do que antigamente - são os ministros.O mal - a burrice - está em alguns membros de famílias com história se deixarem fotografar adiante dos quadros de antepassados, em pose responsável e patriota, e em nada contribuindo para a Restauração. Mesmo a jeito do jornalista ir lá rir-se um bocado...
Enquanto isso:
Em décadas que já lá vão, conheci bem, e fui amigo, de um grande monárquico - o Dr. Mário Saraiva. Médico, viera do Cadaval para Guimarães, onde ficou até ao fim dos seus dias. Foi dos derradeiros discípulos de António Sardinha e integralista de alma e coração. Jamais trouxe à conversa os seus antecedentes familiares. E escreveu - que era monárquico não pelo coração, antes pela razão. Chegara lá de dedução em dedução, como bem explica no seu Razões Reais. E foi-o toda a vida, convictamente, enfrentado a II e a III República, sempre no seu quase anonimato. Publicou obra extensa, de que me orgulho de possuir diversos volumes dedicados e autografados.
Era o exemplo acabado do verdadeiro monárquico. Acreditando apenas na eternidade da Nação e nos meios de a preservar. Nunca viveu em palácios.
Mas preparou várias gerações. Ensinou-as, melhor, sensibilizou-as. Nem queria saber de casamentos inter-classe, nem de distâncias sociais, nem de eventos e fatiota a rigor. Nem, é claro, de poder político ou de enriquecer neste mundo promíscuo. Simplesmente queria o Rei, símbolo da Nação, e o mando disseminado pelas terras do Reino.
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.
Não há como discordar Felizmente temos blogs com o...
de vez em quando você diz umas coisas acertadas e...
Eu vi a entrevista em directo e fiquei muito incom...
É do mais simples que há: o acesso é verificado co...
Há sempre uma coisa que tenho em mente e que se co...