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Pois é caro Duarte: um amigo meu afirma-me com convicção que, tendo em conta o património literário já consagrado e a nossa longevidade média, tirando ensaios e estudos indispensáveis para a nossa actividade profissional, ser do mais basilar bom senso não se perder tempo com obras com menos de cem anos de publicação.
A não ser que nos paguem para os interpretar, não há nada mais chato do que nos contarem sonhos. Sonhos mesmo, daqueles que temos quando dormimos. Pois bem, estava pela página 150 do calhamaço 2666 e o autor Roberto Bolaño já tinha descrito uns cinco ou seis. É claro que os três últimos já os tinha “passado”, não percebendo o que a leitura dos dois primeiros tinha contribuído para a narrativa. Quando verifiquei que o romance tinha 1030 páginas e que me estava a maçar, desisti. Não duvido do génio literário que gente muito mais capacitada do que eu atribui ao autor chileno, que morreu em 2003, mas aquela escrita em bruto, que parece que poderia ser reduzida, pelo menos, para metade, cheia de pormenores sem importância nenhuma ou especial qualidade de escrita (de que os sonhos são só um exemplo) não me interessa. Lembrei-me de uma frase, creio que de André Breton, que dizia que um autor que não compreendemos é certamente um imbecil e senti-me mais confortado por não conseguir aguentar esta “obra-prima dos nossos tempos”. Cada vez mais prefiro as obras-primas do passado. Mesmo no Verão.
Nunca prestei especial atenção ao fenómeno político e por isso, durante vinte anos, não votei. Descria, é certo, da classe política, mas confiava no contexto e nunca senti o «apelo cívico». Foram os blogues que assanharam em mim esta nova curiosidade - o facto coincidindo com a transferência da nossa governação para mãos socialistas, com a perda lenta, mas consistente, da nossa credibilidade económico-financeira, e com a multiplicação, no teatro dos nossos órgãos de soberania, de cenas pouquíssimo edificantes. Desperta a curiosidade, seguiu-se o apelo cívico. E o apelo cívico apontou-me o voto, forçando-me, na circunstância, a clarificar os meus interesses. Fi-lo e votei, nas últimas eleições, como vou votar nas próximas, com o objectivo de afastar do poder o indivíduo que presentemente o detém e exerce. E votei nas últimas eleições como vou votar nas próximas, em quem tiver mais possibilidades de o conseguir. Não irei movida por simpatias pessoais ou afinidades ideológicas, mas pela única e inequívoca intenção de «destronar» alguém que não me representa e, sobretudo, me envergonha. Dizem-me que não há alternativa válida, que a classe política está minada em todos os aspectos e quadrantes, que já não há produto sem defeito, e defeito grave. Pois não haverá. Mas aqui, como no futebol, o jogador não deixa de chutar à baliza porque as hipóteses de acertar nela são escassas ou mesmo nulas. E tanto a bola há-de rondar os postes que um dia, inevitavelmente, entra.
Fool to Cry - The Rolling Stones
Acordei com a triste notícia da morte de Mário Bettencourt Resendes, que foi meu director no Diário de Notícias e uma das pessoas a quem mais devo profissionalmente. Recordo-o como alguém extremamente bem educado, inteligente, alegre. Sempre preocupado com a qualidade do seu jornal, compreendia como ninguém a importância da tolerância, de respeitar os vários pontos de vista, do equilíbrio. Era uma pessoa de categoria, que perdemos numa altura em que elas tanta falta fazem. Sobretudo no jornalismo. Gostaria de dizer que ele influenciou as novas gerações de jornalistas, mas não vejo quase ninguém a seguir o seu exemplo.
Parece-me sinistra a veleidade socialista de suprimir os chumbos, que na senda dum igualitarismo ilusório, descredibiliza de vez o ensino e a diferenciação pelo mérito. É deplorável como esta canalha dos direitos adquiridos que anda há anos a consumir a seu bel-prazer a riqueza das gerações futuras, pretenda agora penhorar a esperança dos que acreditam na instrução e no esforço como forma de mudar alguma coisa num difícil destino.
Esta é a formula que garante ao proeminente Estado a alçada dos tachos para distribuir à seita do costume, que por estatuto ou favor estará na linha da frente para uma boa cunha e um bom poleiro. Os outros, mais ou menos impreparados, terão todos fartas e inúteis habilitações académicas.
…são um exercício de crescente desapego da muita tralha que nos distrai e constrange durante a maior parte do ano de responsabilidades, tensões e inadiáveis objectivos. Há uma vertigem neste processo de progressivo desprendimento de rotinas e fetiches que alicerçam a personagem que pretendemos ser. É o resgate da alma, o encontro com Deus, com aquilo que é essencial. Não ter controlo, aceitar a providência, sonhar acordado e sem idade outra vez. Tudo se resolve afinal.
À noite encontramo-nos preguiçosos no meio dos livros começados e dos jornais amarrotados, ao som das cigarras e do chapinhar dos barcos na maré enchente. Os pequenos já dormem enquanto a festa murmura de longe, sôfrega e batida. A fingir que o amanhã não importa.
Fotografia: Milfontes, Canal em 1933, da colecção de Filipe Menezes, com os devidos agradecimentos.
Evangelho segundo São Lucas 12, 13-21
Naquele tempo, alguém, do meio da multidão, disse a Jesus: «Mestre, diz a meu irmão que reparta a herança comigo». Jesus respondeu-lhe: «Amigo, quem Me fez juiz ou árbitro das vossas partilhas?». Depois disse aos presentes: «Vede bem, guardai-vos de toda a avareza: a vida de uma pessoa não depende da abundância dos seus bens». E disse-lhes esta parábola: «O campo dum homem rico tinha produzido excelente colheita. Ele pensou consigo: ‘Que hei-de fazer, pois não tenho onde guardar a minha colheita? Vou fazer assim: Deitarei abaixo os meus celeiros para construir outros maiores, onde guardarei todo o meu trigo e os meus bens. Então poderei dizer a mim mesmo: Minha alma, tens muitos bens em depósito para longos anos. Descansa, come, bebe, regala-te’. Mas Deus respondeu-lhe: ‘Insensato! Esta noite terás de entregar a tua alma. O que preparaste, para quem será?’. Assim acontece a quem acumula para si, em vez de se tornar rico aos olhos de Deus».
Da Bíblia Sagrada
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óptimo, pode alargar a área de fogo controlado par...
Maria,num terreno da minha família foi o Estado qu...
a ideia de que é impossível juntar várias parcelas...
Não sei responder
Se o pagamento é feito contra a demonstração de qu...