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António Costa precisava de dizer que tinha um desígnio socialmente comum e mobilizador para a legislatura de maioria absoluta, para contrariar a ideia, que se vai espalhando lentamente como a ferrugem que pode corroer o poder do PS, de que o único desígnio claro de António Costa é o de ter o poder centrado no PS (de preferência nele próprio, mas isso não é o essencial, é uma decorrência do desígnio de centrar o poder no PS).
Vai daí, sabendo que uma das linhas de corrosão mais complicadas é da dos baixos salários e da pobreza relativa em relação aos países menos ricos da União Europeia, escolheu dizer que temos de aumentar os salários em 20% e aumentar o seu peso no PIB.
Esta parte de aumentar o peso no PIB está na declaração que fez para entreter académicos e outras elites, na verdade o que vai sobrar da declaração são os 20% de aumento de salários na legislatura.
António Costa sabe que se a inflação andar pelos quatro por cento ao ano (é uma possibilidade), e ele estiver a falar de salários reais, então um aumento de 20% ao longo da legislatura é uma treta, porque a inflação come quase todo o aumento nominal dos salários.
Também sabe que existe actualmente alguma pressão para o aumento dos salários dada a escassez de mão de obra disponível, ou seja, 20% de aumento nominal dos salários é galinha.
António Costa conta, evidentemente, com a falta de escrutínio sobre o que diz e faz, para não ter os jornalistas a morder-lhe as canelas todos os dias para o obrigar a esclarecer se está a falar de salários nominais, e assumindo que taxa de inflação, ou de salários reais.
Haverá sempre algum escrutínio e por isso está lá em cima a referência ao aumento do peso dos salários no PIB, para lhe permitir dizer que é evidente que está a falar de aumentos tais que aumente o peso dos salários no PIB, dando uma resposta formalmente satisfatória, mas sem capacidade de comunicação para a generalidade das pessoas por ser matéria demasiado técnica.
O que ficará é a proposta de 20% de aumento dos salários, situação que provavelmente acontecerá (ou perto disso), ao longo da legislatura, faça o governo o que fizer.
Na prática é uma versão mais esperta do famoso cálculo do défice que o Banco de Portugal aceitou fazer a pedido do governo de Sócrates: com esse cálculo de um défice fictício, que Sócrates assumiu como referência, Sócrates conseguiu aumentar o défice, dizendo sempre que o estava a baixar e nós fomos todos (quase) atrás dessa pantominice.
Daqui para a frente, ao longo da legislatura, passaremos o tempo a usar os 20% como referência (em termos nominais), como se fosse um objectivo do governo e não uma mera decorrência do tempo, nas circunstâncias económicas que é previsível que venhamos a ter.
Como é habitual em António Costa, o que ele fez foi formatar a discussão para que não fazer nada pareça um feito digno de figurar nos Lusíadas.
E nós todos (ou quase), consciente ou inconscientemente, iremos outra vez atrás dessa pantominice, os mais avisados dizendo que António Costa não sabe ainda o que quis dizer, não pensou verdadeiramente no assunto, a generalidade das pessoas espantadas com o génio político de António Costa que, em condições difíceis, conseguiu garantir que os salários subiram 20%, ou perto disso - com um bocadinho de sorte, ainda acima disso - durante a legislatura.
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Olha! Parece quase a história do Cavaco com a Quin...
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Parabéns. Excelente ironia da nossa triste realida...
estudei matemáticas dita superiores. nunca levei a...
Sendo tudo isso verdade, e por isso referi no post...