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Faltava aqui a esquerda moderna

por Luís Naves, em 28.02.07



O post do João sobre as conversas femininas provocou justa indignação do povo anonymous em torno do uso (considerado leviano) do termo criada. Considero que se trata de uma tempestade em copo de água tépida, mas a violência de alguns comentários fez-me pensar sobre essa antiga instituição da criadagem de casa. Os ingleses conseguiram transformá-la em interessantes produtos televisivos (lembram-se da série da Família Bellamy?), onde também surgia o retrato benévolo que o João tentou fazer. Na sala de espera de um consultório médico que tenho frequentado há uma televisão ligada na TVI e tive a oportunidade de observar novelas portuguesas que passam a meio da tarde: há sempre umas empregadas de casa (ou criadas de servir, como escrevia um anonymous) sempre muito boazinhas, que gostam muito dos "meninos" e que os ajudam a superar um qualquer mau na família (ou adjacentes), geralmente a prima afastada que, forçada a um empobrecimento súbito, tem de servir o bem público familiar e o faz com excesso de zelo que, mais tarde na história, será devidamente castigado (presumo eu). Curiosamente, os meninos são todos loirinhos, e as casas são eenooormes, pecebeu?
Francamente, acho que tudo isto não passa de uma visão ideológica (e extremamente falsa) do povo português e da realidade contemporânea.
As criadas de servir tinham algum sentido numa determinada economia, que antes do 25 de Abril já não existia. Era uma coisa rural e um anacronismo que as famílias ricas do país ainda mantinham, sobretudo pelas aparências. Como dizia alguém num comentário, este sistema só podia existir porque estas mulheres não tinham qualquer instrução nem perspectivas de vida. Muitas ansiavam por um casamento que lhes desse alguma liberdade. De resto, dependiam da boa vontade da família que as sustentava e para quem trabalhavam, nesse sistema paternalista que o João descreve.
Mas o mundo mudou, parece. Hoje, a economia das famílias (mesmo dos ricos) não permite sustentar um sistema como aquele. Agora, as mulheres pobres tentam obter uma instrução. O serviço de casa é feito sobretudo por imigrantes, em regime de part-time. É disso que as mulheres falam no cabeleireiro, porque é um sarilho arranjar empregada. As mais honestas e que trabalham melhor, exigem os seus direitos e fazem-se pagar. Existe um mercado no serviço doméstico, onde funciona a lei da oferta e da procura. E está a surgir um novo mercado, o do acompanhamento de idosos, que é bem pago e exige qualificações, nomeadamente algumas noções de enfermagem e uma dura couraça de paciência.
Enfim, acabou o tempo das virgens saloias que vinham servir lá em casa, que mal podiam namorar e que acabavam solteiras e velhas, encalhadas no serviço das famílias abastadas. O seu desaparecimento não tem nada a ver com o 25 de Abril, mas com as mudanças sociais e económicas que já estavam a acontecer antes (a Revolução apenas acelerou o processo). Por isso, não discutam o que não existe.


18 comentários

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De Anónimo a 28.02.2007 às 15:54

Ah, pois é, não podemos atribuir conotações modernas ao conceito de criadas de servir. É mesmo à antiga que deve ser!
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De João Távora a 28.02.2007 às 15:47

"As criadas de servir tinham algum sentido numa determinada economia, que antes do 25 de Abril já não existia. Era uma coisa rural e um anacronismo que as famílias ricas do país ainda mantinham, sobretudo pelas aparências. Como dizia alguém num comentário, este sistema só podia existir porque estas mulheres não tinham qualquer instrução nem perspectivas de vida."

Caro Luís:

Isto que diz é verdade, eu ainda assisti aos finais dessa transformação.
O que não podemos é passar a vida a "julgar" os fenómenos do passado, a atribuir conotações modernas a conceitos antigos. Essa é uma forma doentia de encarar o passado e a história que eu não partilho.
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De L. Rodrigues a 28.02.2007 às 14:50

E claro que se perguntarem a uma dessas senhoras se foi feliz ela diria que sim. Olhar para 60 anos de vida e apenas ver servidão é algo de que o nosso sistema imunitário psicológico nos protege.

Já agora é bom lembrar que a "Família Bellamy" no original se chamava "Upstairs, Downstairs". Os de cima e os de baixo.
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De Anónimo a 28.02.2007 às 14:13

Eu já era crescidinho quando aconteceu o 25 de abril. Sei que, até essa altura (mais ou menos, não digo que fosse tudo obra da revolução), essas pessoas não tinham horários, não tinham folgas, não tinham direito a férias, pagavam-lhes uma miséria quando pagavam (não havia dia certo), não tinham direitos nenhuns (podiam ser postas na rua de um dia para o outro), eram muitas vezes abusadas pelos da casa e nem lhes passava pela cabeça irem-se queixar (aonde?).

Por isso o discurso do sr. Lobos me pareceu completamente irrealista, falso e facho.

E quem não se apercebe da humilhação das pessoas na situação de «criadas de servir» não merece comentários meigos. Tenho dito.
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De Anónimo a 28.02.2007 às 14:06

Cá no meu ver, o Anacleto e a Drago têm criadas sempre muito boazinhas, que gostam muito dos "meninos" e que os ajudam a superar um qualquer mau na família, além do que mal podem namorar.
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De Anónimo a 28.02.2007 às 13:45

Com o devido respeito, o autor do post está a ver a coisa mal. O que acontecia era, como judiciosamente afirma o sr. Villalobos, que "Elas criavam e eram criadas num lar de família e a família crescia em conjunto com elas". Era o verdadeiro paraíso para essas felizes criaturas, hoje em vias de extinção.
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De Anónimo a 28.02.2007 às 13:40

Mai nada...
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De Anónimo a 28.02.2007 às 13:39

"acabou o tempo das virgens saloias que vinham servir lá em casa, que mal podiam namorar e que acabavam solteiras e velhas, encalhadas no serviço das famílias abastadas"

Só por esta frase o post do ´Luís Naves valeu.

Mas acho que ele erra ao confundir o fenómeno recente da imigração com a evolução da sociedade portuguesa decorrente do 25 de Abril, coisa que já vai a caminho dos 33 anos. Em nenhum país decente há hoje criados ou criadas.

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