Uma excelente reportagem assinada pelo jornalista britânico Alex Perry, publicada há dias na revista
Time, revela bem o inferno em que se transformou o
Zimbábue, que nos anos 80 tinha a segunda mais próspera economia da África Austral – logo após a imbatível África do Sul. Sob o mando despótico de
Robert Mugabe, o país afundou-se, recuando a padrões de vida que remontam ao início da década de 50, quando ainda estava sob o domínio colonial. O desemprego atinge 80% da população activa e a inflação subiu a 1.792,9% em Fevereiro, pensando-se que no fim do ano atinja níveis ainda mais astronómicos, rondando os 3700%.
“Uma perda da moeda com esta magnitude significa, por exemplo, que na prática um só tijolo custa hoje mais do que uma casa com piscina em 1990”, escreve Perry, que foi detido logo no primeiro dia em que chegou à antiga Rodésia e relata com minúcia a sua amarga experiência prisional neste país transformado num imenso cárcere que perdeu cerca de dois milhões de habitantes nos últimos anos e onde grande parte dos que ainda não partiram são forçado a caçar animais selvagens para sobreviverem.
Segundo dados da Organização Mundial de Saúde, a esperança de vida no Zimbábue é de 34 anos para as mulheres e 37 para os homens – a mais baixa do planeta. E no entanto o ditador, de 83 anos, mantém-se agarrado ao poder, procurando perpetuar o seu regime de terror que não hesita em silenciar todas as vozes discordantes – incluindo políticos, sindicalistas, clérigos e jornalistas.
Nada inédito no continente africano, desde sempre um fértil viveiro de tiranias. Admira-me apenas o silêncio cúmplice de tantos intelectuais comprometidos com o progresso, que nem uma palavra de indignação exprimem contra a ditadura de Mugabe. Ou talvez nem deva admirar-me: conheço demasiado bem os manuais de indignação selectiva deste gente, que fala alto e se cala, alternadamente, consoante o quadrante geográfico ou a costela ideológica que estiverem em causa.