por Luísa Correia, em 25.01.13
(National Geographic)
"A capacidade criativa do homem foi a capacidade que cada homem teve de se prolongar nas obras que criou. Descobriu os materiais da imortalidade na pedra que havia à sua volta ou na pedra artificial que produziu. Flectiu os músculos da criatividade em estruturas cuja finalidade se tornaria indecifrável e em templos para a comunidade do seu tempo. Atreveu-se a esculpir imagens de si próprio e da vida que o rodeava. Transformou as palavras em mundos para reviver o passado e edificar o futuro". (Daniel J. Boorstin, "Os Criadores")
A ambição de entrar para a História é - pode então dizer-se - o sucedâneo do instinto de sobrevivência do homem como ser vivo e da vocação de eternidade do homem como ser inteligente. Poucos serão os que, conscientes de si próprios, da sua individualidade e do «incomensurável» alcance do seu pensamento, vivem conciliados com a sua finitude, sem desalentos, nem revoltas. Mas não há, infelizmente, notícia de animal racional que tenha conseguido transpor a fronteira dos cento e poucos anos – ressalvados os velhos patriarcas pré-diluvianos. Pode, no entanto, transpô-la o nome, a reboque de uma ideia, um rasgo ou um empreendimento que, de algum modo (incluindo destrutivo), tenha marcado uma época e repercutido sobre o desenvolvimento das seguintes. E essa transposição, essa permanência do nome para além da pessoa é a glória máxima a que é possível aspirar.
Não me surpreende, portanto, que haja políticos – ávidos de imortalidade como nenhum outro mortal - dispostos a sacrificar o conforto do povo que governam à obra que há-de garantir-lhes um lugar na memória dos séculos. E não me surpreende que vão ao extremo de arriscar, com isso, a sua própria popularidade, cientes que estão de que a memória do povo é curta, tal como a memória dos séculos é selectiva e capaz de, sob o fascínio da obra ou o impulso dos ventos, apagar todo um registo de vilanias, injustiças e traições. Resta saber se, por estes dias, o povo ainda aceita servir de capacho a semelhantes políticos e semelhantes vaidades. Gostaria tanto de ver contrariada a impressão, que me dá a História, de que a vontade de um homem é sempre mais forte do que a vontade de um povo.