por Pedro Correia, em 11.10.08
Aparentemente, as pressões deram resultado: ao contrário do que se previa nas legações diplomáticas e nas redacções de muitos jornais espalhados por vários continentes, o Nobel da Paz acabou por não ser atribuído a uma das personalidades perseguidas pelo regime de Pequim. Hu Jia, de 35 anos, talvez o mais mediático dos militantes chineses pelos direitos humanos e assumido defensor das vítimas da sida num país onde a doença ainda é tabu, estava nas principais bolsas de apostas para a conquista do maior galardão destinado a distinguir a paz à escala universal.
Conscientes do risco que tal nomeação comportava, os dirigentes chineses desdobraram-se em avisos, durante a semana, dirigidos ao Comité Nobel, reunido em Oslo. Hu Jia, sublinhavam, é “um criminoso”, que se encontra detido desde Abril – quatro meses antes da realização dos Jogos Olímpicos de Pequim, o maior cartaz de propaganda oficial chinesa – e condenado a três anos e meio de prisão “por instigação à subversão dos poderes do Estado”.
A frase soa familiar. É o jargão habitualmente usado pelos regimes mais despóticos na tentativa de eliminarem todas as sementes de ‘dissidência’. Regimes como o chinês, que se especializou em silenciar todas as opiniões desfavoráveis enquanto mantém o título de recordista mundial da aplicação da pena de morte e se tornou o maior financiador externo dos Estados Unidos – um pormenor a considerar nestes tempos de grave crise económica.
“Toda a gente sabe que espécie de indivíduo é Hu Jia: um criminoso que foi condenado a pena de prisão pelo sistema judiciário [chinês]”, declarou quinta-feira o porta-voz do ministério chinês dos Negócios Estrangeiros, em conferência de imprensa. Já na véspera, Pequim advertira Oslo: “Alguns dos prévios vencedores do prémio vão contra o propósito inicial de Alfred Nobel. Esperamos que o Prémio Nobel seja atribuído a uma boa pessoa.”
Não se podia ser mais claro: a elite dirigente chinesa não toleraria a repetição do que aconteceu em 1989, quando o Nobel da Paz foi entregue ao Dalai Lama. Desta vez a Academia obedeceu, temerosa e reverente. É um significativo sinal dos tempos.